Revista de História: A lista dos acusados de torturar

Tempo de leitura: 4 min

A lista dos acusados de tortura

Dos papéis de Luiz Carlos Prestes consta um relatório do Comitê de Solidariedade aos Revolucionários do Brasil, de 1976. O documento traz uma lista de 233 torturadores feita por presos políticos em 1975

Alice Melo e Vivi Fernandes de Lima, na Revista de História

29/12/2011

O acervo pessoal de Luiz Carlos Prestes, que será doado por sua viúva, Maria Prestes, ao Arquivo Nacional, traz entre  cartas trocadas com os filhos e a esposa, fotografias e documentos que mostram diferentes momentos da história política do Brasil. Entre eles, o “Relatório da IV Reunião Anual do Comitê de Solidariedade aos Revolucionários do Brasil”, datado de fevereiro de 1976.

Neste período Prestes vivia exilado na União Soviética e, como o documento não revela quem são os membros deste Comitê, não se pode afirmar que o líder comunista tenha participado da elaboração do relatório. De qualquer forma, é curioso encontrá-lo entre seus papéis pessoais.

O documento é dividido em seis capítulos, entre eles estão “Mais desaparecidos”, “Novamente a farsa dos suicídios”, “O braço clandestino da repressão” e “Identificação dos torturadores”, que traz uma lista de 233 militares e policiais acusados de cometer tortura durante a ditadura militar. Esta lista foi elaborada em 1975, por 35 presos políticos que cumpriam pena no Presídio da Justiça Militar Federal. Na ocasião, o documento foi enviado ao presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Caio Mário da Silva Pereira, mas só foi noticiado pela primeira vez em junho de 1978, no semanário alternativo “Em Tempo”. Segundo o periódico, “na época em que foi escrito, o documento não teve grandes repercussões, apenas alguns jornais resumiram a descrição dos métodos de tortura”. O Major de Infantaria do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra é o primeiro da lista de torturadores, segundo o relatório. A Revista de História tentou ouvi-lo, mas segundo sua esposa, Joseita Ustra, ele foi orientado pelo advogado a não dar entrevista. “Tudo que ele tinha pra dizer está no livro dele”, diz ela, referindo-se à publicação “A verdade sufocada: a história que a esquerda não quer que o Brasil conheça” (Editora Ser, 2010).

A repercussão da lista em 1978

A Revista de Históriaconversou com um jornalista que integrava a equipe do “Em Tempo”.  Segundo a fonte – que prefere não ser identificada – a redação tinha um documento datilografado por presos políticos. Era uma “xerox” muito ruim do texto, reproduzido em uma página A4. Buscando obter mais informações sobre o documento, os jornalistas chegaram ao livro “Presos políticos brasileiros: acerca da repressão fascista no Brasil” (Edições Maria Da Fonte, 1976, Portugal). Depois desta lista, o “Em Tempo” publicou mais duas relações de militares acusados de cometerem tortura.

Na época, a tiragem do semanário era de 20 mil exemplares, rapidamente esgotada nas bancas, batendo o recorde do jornal. A publicação fechou o tempo para o jornal, que sofreu naquela semana dois atentados. A sucursal de Curitiba foi invadida e pichada. Na parede, os vândalos deixaram a marca em spray “Os 233”. O outro atentado aconteceu na sucursal de Belo Horizonte: colocaram ácido nas máquinas de escrever. Na capital mineira, a repercussão foi maior porque os militantes de esquerda saíram em protesto a favor do jornal. O próprio “Em Tempo” publicou esses dois casos, com fotos.

Os autores da lista

As assinaturas dos 35 que assumem a autoria também foram publicadas no “Em Tempo”. Hamilton Pereira da Silva é um deles.  O poeta – conhecido pelo pseudônimo Pedro Tierra e hoje Secretário de Cultura do Distrito Federal – fez questão de conversar com a Revista de História sobre o assunto, afirmando que a lista não foi fechada em conjunto. Os nomes e funções dos torturadores do documento teriam sido informados pelas vítimas da violência militar em momentos distintos de suas vidas durante o cárcere.

“Essas informações saíam dos presídios por meio de advogados ou familiares. A esquerda brasileira, neste período, não era unida, era formada por vários grupos isolados, que não tinham muito contato entre si por causa da repressão”, conta Tierra. “Quando a lista foi publicada no ‘Em Tempo’, eu já estava em liberdade. Sei que colaborei com dois nomes: o major, hoje reformado, Carlos Alberto Brilhante Ustra, e o capitão Sérgio dos Santos Lima – que torturava os presos enquanto ouvia música clássica”.

Hamilton lembra ainda que, após a publicação da lista no periódico, a direita reagiu violentamente realizando ataques a bomba em bancas de jornal e até uma bomba na OAB, além de ameaças à sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI).

Em 1985, já em tempos de abertura política, a equipe do projeto Brasil: Nunca mais divulgou uma lista de 444 nomes ou codinomes de acusados por presos políticos de serem torturadores. Organizado pela Arquidiocese de São Paulo, o trabalho se baseou em uma pesquisa feita em mais de 600 processos dos arquivos do Superior Tribunal Militar de 1964 a 1979. Os documentos estão digitalizados e disponíveis no site do Grupo Tortura Nunca Mais.

Entre os autores da lista de acusados de tortura feita em 1975, além de Hamilton Pereira da Silva, estão outros ex-presos políticos que também assumem cargos públicos, como José Genoino Neto, ex-presidente do PT e assessor do Ministério da Defesa, e Paulo Vanucchi, ex-ministro dos Direitos Humanos e criador da comissão da verdade. Os outros autores da lista são: Alberto Henrique Becker, Altino Souza Dantas Júnior, André Ota, Antonio André Camargo Guerra, Antonio Neto Barbosa, Antonio Pinheiro Salles, Artur Machado Scavone, Ariston Oliveira Lucena, Aton Fon Filho, Carlos Victor Alves Delamonica, Celso Antunes Horta, César Augusto Teles, Diógenes Sobrosa, Elio Cabral de Souza, Fabio Oascar Marenco dos Santos, Francisco Carlos de Andrade, Francisco Gomes da Silva, Gilberto Berloque, Gilney Amorim Viana,Gregório Mendonça, Jair Borin, Jesus Paredes Soto, José Carlos Giannini, Luiz Vergatti, Manoel Cyrillo de Oliveira Netto, Manoel Porfírio de Souza, Nei Jansen Ferreira Jr., Osvaldo Rocha, Ozeas Duarte de Oliveira, Paulo Radke, Pedro Rocha Filho, Reinaldo Moreno Filho e Roberto Ribeiro Martins.

Veja a lista, conforme publicada na Revista de História:

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Luisa Paiva e Lira Alli: A fascistização oculta da sociedade


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Comentários

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marcso altenhoffen

Uma vergonha ! E ainda entram esses trolls fascistas aqui para ficar enchendo com essa conversa fiada de terrorismo. Terrorista é quem derruba um governo legítimo e se apossa do poder como um vulgar latrocida !

ZABS

A tortura, permanece vivíssima neste país!!! Nos acompanhando morbidamente, como prática institucionalizada pelo Estado Brasileiro ao longo de toda a nossa história: http://www.dhnet.org.br/denunciar/tortura/a_pdf/r….
Se estes fatos não são passados a limpo, os crimes continuam acontecendo, porém hoje o alvo dos facínoras não são estudantes de classe média, o que dá um ar de naturalidade para essas atrocidades. Afinal sempre fizemos isso: http://global.org.br/programas/relatorio-da-onu-a

EUNAOSABIA

E a lista do terroristas e assassinos frios da esquerda, a gente acha onde?

Alexandre Felix

Precisa de lista? Basta visitar o clube dos oficiais, de qualquer arma…os torturadores estão lá…

Marcio H Silva

Só quem viveu na época sabe a dimensão do que aconteceu. Só quem foi preso e torturado, sabe realmente o que é ser torturado, não dá para descrever, e os que vieram a morrer sob tortura, estes nunca falarão.
Para os defensores da ditadura e seus métodos e que comentam que houve violência dos dois lados, esclareço que para uma ação sempre haverá uma reação. Só existiu os chamados guerrilheiros porque existiu a ditadura.
O Brasil precisa tirar isto a limpo. Na pequena lista, que é resumida por 35 torturados somente e em épocas diferentes, vemos vários elementos da Policia Militar, esta mesma policia que está aí, Brasil afora, cometendo os mesmos delitos. Tirando a limpo estes crimes, daremos ( a nossa sociedade ) recado para as Policias e governadores que toda violência trará consequências e que um dia eles responderão por seus atos.
O dia que estes atos extremos forem tirados a limpo teremos uma sociedade mais justa em nosso país e andaremos de cabeça erguida..

GILMAR JOSÉ ROCHA

LULA e PRESTES são personalidades que serão lembradas nos próximos 500 anos da nossa história. Eles não foram fabricados pela mídia, eles foram moldados na luta do povo brasileiro. Prestes foi o cavaleiro da esperança. LULA foi o metalúrgico que ajudou a derrubar a ditadura.

    Donaldo

    Lula ajudou a derrubar a ditadura?! KKKKKKKKKKKKKKKKK

Geraldo

A Argentina, o Uruguai e o Chile não têm medo da verdade histórica e da justiça ainda que tardia. Estão colocando a ferros os porcos criminosos. Mas o Brasil é diferente…e se julga melhor que eles…

    joao

    Sob o manto de povo ' pacato, gentil, pacífico' o brasileiro se acomoda em sua infinita covardia e bundamolice, falta de sangue correndo na veia como tem o povo argentino, venezuelano, uruguaio, paraguaio etc, eles tem dignidade, brasileiro tem covardia e bundamolice sem igual no mundo travestidos de pacifismo.

Fabio_Passos

Documento histórico muito importante.
Estes 233 covardes que cometeram crimes contra a humanidade não serão punidos?

Lucas Rafael

Seria ótimo que os nomes de terrorista ,guerrilheros,assaltantes,assassinos e torturadores – dos dois lados,tanto da esquerda,quanto do regime-, fossem reveledos ,assim,teríamos uma visão ampla e imparcial.Quanto a divulgação da revista ,só indica o quanto que a publicação é unilateralista- esconde as ações da esquerda armada e,relembra crimes do regime -,uma pena se tratando de uma periódico acadêmico,só indica o inexpressivo grau de isenção por parte de alguns dos nossos historiadores.

    rogério

    Para começo de conversa: imparcialidade não existe. é uma prova de ingenuidade intelectual. Eu estou do lado daqueles que lutaram contra o regime fascista, subserviênte ao imperialismo e de exceção que se instalou no Brasil a partir de 1964. Esse papo de imparcialidade é de gente que tem vergonha de afirmar que defende esse regime nefando e imoral que se instalou no Brasil.

    Horridus Bendegó

    Terroristas –> Do Estado, bandidos oficiais
    Guerrilheiros –> brasileiros(as) com coragem de enfrentar os bandidos oficiais.

Bertold

Tenho muitos amigos de longa data nesta lista das vítimas. Dos torturadores, são bem conhecidos de triste lembrança.

Indignado

Seria interessante se alguém transcrevesse a lista, ao invéz de publicar uma foto do original, não? Assim fica difícil visualizar. De preferência, colocar em PDF e enviar para organizações nacionais e internacionais de direitos humanos, ministério público, comissões de direitos humanos do congresso e senado, partidos de esquerda, centrais sindicais, jornais nacionais e internacionais de grande circulação. Aí eu quero ver esse bando de assassinos fazerem atentado contra todo mundo.

    Consciência da Nação

    Não posso concordar completamente, Indignado. A visão do documento original torna tudo ainda mais real e preocupante. Quantos e quais estariam numa lista equivalente hoje, se malditos pelo próprio deus, voltássemos às botas dos ditadores? Que jornais? Que revistas? Que professores universitários? Que outros juízes de futebol? Que outros médicos? Quem estaria na lista? Não te arrepia a ideia bem plausível de que fossem inúmeros?

Leider_Lincoln

Deplorável. Mas se enquanto não pudermos metê-los a ferros (os que ainda estão vivos) podemos lhes lembrar os nomes e cobrir a memória deles de infâmia. É o mínimo que podemos fazer!

JOSE ANTONIO BATATA

Viva o Comandante Luiz Carlos Prestes. Tem gente que nasce para ser Luiz Carlos Prestes, tem gente que nasce para ser Roberto Freire Tucano. Preste ficou para a história o outro virou office-boy dos Tucanos.

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Roberval

Dá ânsia de vômito!!!

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