Luiz Zarref: Código Florestal ficou pior do que se imaginava

Tempo de leitura: 4 min

Código Florestal: o veto da Presidenta é a única resposta que a sociedade pode exigir

27 de fevereiro de 2012

Por Luiz Zarref

Dirigente da campanha da Via Campesina em defesa do Código Florestal

Do Jornal Sem Terra, no site do MST

Após a votação do manifesto ruralista, escrito pelo deputado Aldo Rebelo, na Câmara dos Deputados em junho de 2010, o texto de destruição do Código Florestal foi para o Senado Federal.

Em dezembro último, um novo texto foi aprovado no Senado, preparado pelos relatores Luiz Henrique (PMDB, ex-governador de Santa Catarina no período em que foi criada a lei estadual anti-constitucional, que acaba com o Código Florestal em SC) e por Jorge Vianna (PT, ex-governador do Acre, que foi consultor da Aracruz).

Essa nova proposta do Senado trouxe vários pontos novos, que atendem a outros interesses do grande capital. Entre eles, a liberação de obras para a Copa do Mundo e as Olimpíadas em Áreas de Preservação Permanente (APPs), a permissão de expansão da devastadora carcinocultura e a mercantilização das florestas e dos bens comuns.

Além disso, os pontos centrais de interesse do agronegócio foram mantidos:

a) Anistia todos os desmatamentos em beiras de rios e nascentes ocorridos até julho de 2008, obrigando a recuperação de, no máximo, metade das áreas que hoje deviam estar conservadas;

b) Anistia o plantio de lenhosas como eucalipto e pinus em áreas com inclinação maior que 45° e topos de morros. Essa anistia é muito diferente da reivindicada pela agricultura camponesa, que é a manutenção de espécies como maçã, uva e café, que possuem ciclo muito mais longo;

c) Anistia o desmatamento de Reserva Legal (RL) que ocorreu até 2008 para todos os imóveis com até quatro módulos fiscais (que varia de 20 a 400 hectares, dependendo da região). Isso desobriga estas propriedades da exigência de preservar 80% da RL no bioma Amazônico e 40% no cerrado. Tudo que o agronegócio exigia.

d) A RL desmatada pode ser recomposta com até 50% de espécies exóticas, aumentando os desertos verdes de eucalipto e pinus. Ou seja, os imóveis rurais que precisam recompor a RL ou APPs em encostas, morros e margens de rios, podem replantar com até 50% de eucalipto! Algo maravilhoso para as empresas de celulose, pois poderiam até fazer parcerias com pequenos e médios proprietários, sem ter que comprar a terra.

e) Os imóveis que terão que recompor ou preservar a RL e/ou APPs poderiam compensar o desmatamento de uma propriedade em outra fazenda que esteja no mesmo bioma, deixando uma conservada e a outra toda desmatada. Com isso, o que não faltará são falcatruas, como a grilagem de terras públicas intocáveis e a averbação de outras áreas para compensar tudo o que o proprietário desmatou na sua fazenda.

No entanto, a grande novidade no trâmite do Senado, é que, lamentavelmente, setores do Governo Federal, principalmente o Ministério da Agricultura e o Ministério do Meio Ambiente, trabalharam intensamente para a aprovação desse novo texto.

Buscaram construir um suposto consenso, criando um falso discurso de que o texto do Senado estaria melhor que o texto da Câmara dos Deputados. Como percebido, isso é uma mentira escandalosa, que serve para tentar confundir e neutralizar a crescente mobilização social contrária à destruição do atual Código.

Apesar do empenho do governo e da grande articulação feita pelo agronegócio, a luta popular conseguiu garantir o voto de diversos senadores, como Lindbergh Farias (PT/RJ), Cristovam Buarque (PDT/DF), João Capiberibe (PSB/AP), Randolfe Rodrigues (PSOL/AP) e Marinor Brito (PSOL/PA).

Próximos passos

Agora o projeto voltará para a Câmara dos Deputados, onde a votação está marcada para os dias 6 e 7 de março. Na Câmara, o texto não poderá receber novas propostas. Os deputados podem apenas aprovar a proposta do Senado integralmente ou vetar algumas mudanças, retomando parcialmente o texto original do projeto aprovado no primeiro relatório do Aldo Rebelo.

Diante dessa realidade, só há um caminho para a sociedade brasileira: exigir da presidenta Dilma Rousseff o veto de toda e qualquer anistia e fragilização das APPs e RLs, concentradas no capítulo das Disposições Transitórias. Esse primeiro trimestre é o momento de realizarmos mobilizações que demonstrem que a sociedade brasileira é contra este texto produzido no Congresso Nacional.

Os movimentos populares, sindicais e socioambientais concentrarão atos no dia 6 de março em diversos estados, mostrando que em todos os cantos do país ecoa a resistência à destruição implementada pelo agronegócio. No dia 7 de março, para quando está marcada a votação, faremos um importante ato em Brasília, repercutindo as mobilizações estaduais e cobrando o compromisso da presidenta de não aprovar um Código Florestal Ruralista.

Para o bem de nossas florestas e nossos territórios, VETA DILMA!

O que a presidenta Dilma tem que vetar:

– A possibilidade de recuperar só metade das áreas que foram desmatadas em beiras de rios e nascentes até junho de 2008.

– A permissão do plantio de lenhosas em áreas com inclinação maior de 45° e topos de morros.

– A desobrigação de recuperar as RLs desmatadas até 2008 para todos os imóveis com até quatro módulos fiscais.

– A autorização das RLs e APPs serem recompostas com até 50% de espécies exóticas, o que aumentaria os desertos verdes de eucalipto e pinus.

– A possibilidade de recuperar ou preservar a RL e/ou a APP em outra propriedade de um mesmo bioma.

– Não permitir a regularização da expansão da carcinocultura nos mangues.

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Comentários

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milton

tenho um terreno de 6 alquer, consegui limpar so 1 alquer,,, sera que vou poder tirar mais, e , que fazer com a lenha tenho duvida…

Elton Castro

Olha, eu sou leigo no assunto mas quero fazer alguns comentários sobre esses itens, pois me causam estranheza e/ou me fazem pensar:
a) Ou seja, áreas de APP que hoje estão completamente desmatadas seriam obrigadas a recuperar apenas metade do que se exige de preservação em áreas de APP não desmatadas. Pode ser um incentivo à preservação por proprietários de terras em regiões muito vascularizadas hidrograficamente e que não mantém APPs nenhuma, não? Como aquelas medidas que facilitam o pagamento de dívidas por inadimplentes.

c) Uma dúvida legítima: o texto do novo código florestal desobriga a preservação ou apenas a recuperação de áreas já desmatadas, desde que a propriedade tenha no máximo 4 módulos fiscais?

d) Não consegui entender este salto de "espécies exóticas" para "pinus". Se RL não podem ser desmatadas, pra que um proprietário plantaria pinus ou se associaria à indústria de celulose? Ou RL poderão ser desmatadas?

e) Talvez a comunidade científica já tenha se manifestado sobre este item, se alguém tiver um link eu gostaria de ler a respeito pois não está claro para mim a vantagem de se ter várias RL pequenas, fragmentadas, e não grandes RL contínuas. O texto sugere que a possibilidade de falcatruas. Se eu entendi direito é por ser mais fácil fiscalizar RL na propriedade do que fiar-se numa reserva mantida remotamente. É isso?

Abraços

Porco Rosso

Alguém REALMENTE acredita que a Dilma vai vetar esses itens aí e desagradar sua amigona Kátia Abreu e seus companheiros ruralistas?

@sergiobio

A proposta inteira é ridícula, mas quero chamar atenção para o item "e". A razão de existir das APPs é exatamente proteger as áreas onde estão inseridas. Não dá pra preservar a nascente do rio X, por exemplo, se a mata que deveria estar lá está em outra sub-bacia ou mesmo a metros da APP original. Na minha humilde ignorância jurídica, ao menos esse item será considerado inconstitucional, por produzir uma bizarrice. Seria como compensar um homicídio com o nascimento de um filho.

Depois de ver a falta de critério de nossos representantes, demonstrada nesse texto, fiquei realmente com medo do que está sendo produzido lá…

carneirouece

Do jeito que a DIlma, vulgo FHC de saias, anda contra o trabalhador e o povo que a elegeu, acho muito difícil ela vetar qualquer coisa.

Patrícia Delgado

Como assim? O Jorge Viana participou disso? ai ai… é só decepção.
Acorda Dilma!!!

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