Ava Taperendi: Tentamos falar com a presidenta e os ministros do Supremo, não nos receberam

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Em entrevista à revista Fórum, cacique Ava Taperendi revela a agonia de 43 mil índios que vivem encurralados e querem morrer resistindo. Foto: Igor Carvalho

por Igor Carvalho, revista Fórum, sugestão daSGeral/MST

Recentemente, o povo indígena guarani-kaiowá, divulgou uma carta-protesto em função de uma decisão da Justiça Federal de Naviraí, do Mato Grosso do Sul, que determinou a retirada dos índios que ocupam terras da fazenda Samburá, em Iguatemi.

O documento repercutiu em todo o país e alertou para a precariedade em que vivem os guaranis. A saída por terra da região está bloqueada e, com isso, os ocupantes só podem sair e entrar pelo rio Iowa.

A Fundação Nacional do Índio (Funai) foi obrigada a se manifestar sobre o assunto nessa sexta-feira (26). O órgão reconhece a luta dos guarani-kaiowá e considera que a decisão de “não sair do local que considera seu território ancestral é uma decisão legítima.” A vice-procurado geral da República, Deborah Duprat, disse: “A reserva de Dourados é a maior tragédia conhecida na questão indígena em todo o mundo.”

São 43 mil guarani-kaiowá, divididos em 16 mil famílias, segundo Ava Taperendi, cacique dos Taquaras, uma das três aldeias ocupadas pelos índios na região de Dourados, no Mato Grosso do Sul. O líder indígena falou à Fórum e manifestou sua revolta com o silêncio da mídia e do poder público, além de pedir apoio à resistência, que ele afirma que será “até a morte”.

Fórum – Qual a situação de vocês, hoje?

Ava Taperendi – A demora da demarcação das terras está nos prejudicando, estamos sofrendo demais por conta disso, é muito enfrentamento, contra o governador, fazendeiros e Justiça. Nossos líderes estão morrendo, sendo assassinados por um grupo apoiado pelo estado, um grupo formado por assassinos contratados pelos fazendeiros, e tudo isso leva os índios a um sofrimento muito grande. Nossas crianças e anciões estão desnutridos, todos debaixo de lonas, enfrentando frio, chuva, falta de dignidade e remédios.

Fórum – E quanto à questão dos suicídios?

Taperendi – O que leva os índios a se suicidarem hoje, na área de Dourados, é que nós somos 43 mil pessoas sem condições de caçar, pescar, plantar e nem morar. Além disso, temos um problema que é a chegada das cidades, estamos encurralados entre duas cidades e queremos só viver a nossa cultura. Alguns jovens que tentaram se suicidar e não conseguiram foram perguntados do porquê, e eles alegaram que falta terra, não têm floresta, não têm por onde andar, pra onde vão já saem em uma fazenda fechada, numa chácara ou na cidade. Eles ficam muito incomodados.

Fórum – Há muita pressão para que os índios saiam de suas terras e se adaptem a uma cultura que não é deles?

Taperendi – Hoje existe muita influência de outras culturas na aldeia, e isso não poderia acontecer, porque essas terras foram demarcadas em 1984 pelo SPI (Serviço de Proteção ao Índio) e ali tem que preservar nossa cultura. O povo guarani-kaiowá quer preservar suas rezas, sua língua, religião, danças e suas casas, não queremos outras coisas lá, precisa homologar e registrar nossas terras, para preservar a nossa cultura.

Fórum – Vocês conseguem se alimentar bem, como está a saúde da população local?

Taperendi – Dependemos de uma cesta básica do governo, porque não temos condições de plantar, caçar e pescar, então só nos alimentamos com isso, é bem pouco.

Fórum – Temos notícias de violência contra os índios, o que o poder público tem feito para coibir e fiscalizar os maus tratos?

Taperendi – O próprio governo montou uma equipe contra o índio. O governador André Pucinelli disse: “Eu não vou dar nenhum punhado de terra para índio”. Ele não fiscaliza nada, ele manda é a polícia, resolve o problema de índio com polícia.

Semana passada, prenderam o Carlito [Carlito de Oliveira, liderança indígena local], acusando-o de matar dois policiais, e na verdade não foi ele que matou. Prendem o Carlito de noite, na cela, soltam de manhã, mas muitas vezes eles esquecem dele, que fica dois três dias preso, a cela foi construída dentro da aldeia.

Nós fizemos um documento e mandamos para o Ministério Público Federal pedindo a liberdade do Carlito, aí eles aceitaram liberar, mas não pode sair da aldeia. Então, o poder público não faz nada a não ser perseguir o povo guarani-kaiowá, o próprio policial civil e militar atira nos indígenas, e isso a mídia não divulga. Meu pai foi assassinado [Marcos Veron] lutando por uma terra dele e ninguém diz nada, é muito sofrimento.

Fórum – Como agem os pistoleiros?

Taperendi – De noite e de dia. Aconselhamos nosso povo a não sair sozinho, só em grupos de cinco a dez pessoas. Mataram meu pai, amigos, líderes, nos expulsam de nossas casas com violência e depois lemos na mídia que “os índios saíram pacificamente”. Colocam fogo em nossas casas, apontam armas para nossas cabeças, nos levam até caminhões e nos levam para muito longe da aldeia, depois nos deixam na beira da estrada e mandam a gente voltar a pé. Não estamos pedindo o Mato Grosso do Sul inteiro, apenas a terra de nossos antepassados, só isso. É um massacre, um massacre.

Fórum – Hoje, após a repercussão, existe algo que o deixe otimista?

Taperendi – Nossos direitos são violados, nossas terras estão ocupadas, estamos passando necessidades, então não sou otimista. Ninguém faz nada para que nossos direitos aconteçam, nenhum parlamentar, senador, prefeito, governador, presidente, ninguém, mas vamos lutar até o fim. Quando o governo se cansar de nós, manda o exército e fuzila todo mundo, porque da minha terra eu não vou sair.

Fórum – E a carta?

Taperendi – É tudo verdade, se o governo não nos respeita, nos mate logo e acabe com a gente. Já tentamos falar com esse governo, por quatro vezes, essa presidenta não nos recebeu, nem os ministros do Supremo Tribunal Federal.

Na hora de pedir votos, todos eles lembram da gente, o Lula esteve lá, foi recebido por meu pai, chegou lá pedindo voto. Todas as lideranças eram contra o voto no Lula, para eles o Lula era comunista e comunistas fazem aquelas coisas com crianças. Naquela época (2001), os índios acreditavam nisso, meu pai que chamou todo mundo e convenceu os antepassados que o plano do Lula era ajudar os índios e demarcar as terras. Dois meses depois que ganhou, meu pai foi assassinado e ele nunca demarcou as áreas. Esse descaso é o que esse país oferece para nosso povo indígena, e a Dilma e o Pucinelli estão massacrando o maior povo indígena do Brasil. Povo brasileiro, olhem para os guarani-kaiowá, precisamos de vocês, nos ajudem. Se alguém se interessar, vá visitar meu povo, veja de perto a desumanidade, nem um bicho que vocês criam em casa vive desse jeito que vivemos.

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Comentários

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Israel Pereira de Abreu

A/C Companheira Presidenta;
Dima Rousseff;
Venho por meio deste solicitar a V.Exc;a qual me encrua em algum programa social promovido pelo Governo Federal,o qual possibilite a Eu Israel Pereira de Abreu CPF 040.696.638.94 aumentar minha renda.pois recebo do INSS um salário no valor de R$226,00.
Sendo que desde o primeiro mandato do Fernando Henrique,passando pelos Governos Lula e o Governo Dilma Rousseff, que enviamos idéias ,Planos e estratégias,sem renumeração e no momento estou necessitado.
Até que as nossas concessões as quais colocarão São Paulo e o Brasil em primeiro lugar no mundo em comunicação social sejam liberadas.

Abraços e nossos cumprimentos,além de um feliz mandato em 2013.

Dos companheiros;

Sem mais para o momento;

Atenciosamente;

Israel de Abreu,Ana Cristina de Abreu

Tia de Duda: “Nós estamos no meio de uma guerra, que não é nossa, e a gente está perdendo” « Viomundo – O que você não vê na mídia

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Índios suruís criam comissão da verdade para apurar crimes da ditadura « Viomundo – O que você não vê na mídia

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Roberval

“Fui torturada sim pela ditadura militar. Mas resolvi mudar de lado. Vc, povo brasileiro que se lixe!”

Esta é a frase que nunca é pronunciada por nossa presidenta, mas é o que sua atitude demonstra quando o assunto é população e povos oprimidos no Brasil.

É preciso uma grande articulação entre movimentos sociais e apoiadores para cobrar do governo federal e estaduais a resolução dos conflitos sociais em nosso país.

Também é necessário organizar uma ampla frente de esquerda verdadeira para concorrer as próximas eleições com um projeto de justiça social amplo, pois a tendência é cada vez mais a Frente Popular adotar postura conservadora, reacionária contra o povo brasileiro e até mesmo fascista como é a atitude atual do Governo Federal frente aos movimentos sociais do campo e das cidades.

Horridus Bendegó

maria meneses

Não há nada que explique ou justifique o que está acontecendo com esses indios ,os verdadeiros donos da terra.É uma vergonha o que essa “justiça” vem fazendo no Brasil todo. Esse Gilmar que segundo o Barbosa tem jagunços em Mato Grosso. Quer dizer: são as raposas tomando conta do galinheiro.Parem o mundo que eu quero descer.É um escândalo.

Isidoro Guedes

Só tem um jeito dos guarani serem recebidos no STF. Se forem acompanhados do Ali Kamel ou de algum executivo das Organizações Globo ou da mídia golpista e corporativa em audiência pra falar do mensalão ou da criminalização do Lula. Movimentos sociais não são bem vistos por lá, porque a questão social no Brasil (apesar dos tímidos avanços da Era Lula) ainda é vista como “caso de polícia” neste país.

assalariado.

Esta é a segunda pergunta: E quanto à questão dos suicídios?

Me lembrei de meu pai que trabalhava como boia fria numa fazenda no sul de MG. Ele me contava que tinha um radialista de musica sertaneja na rádio Record, que era dono de grande porções terras (latifundiário) e que conseguiu comprar todas as terras em volta das dele. Mas quando aparecia um pequeno agricultor que não a vendia por preço nenhum, ele (acho que o nome é Zé Bétio) começava comprar as terra em volta desse pequeno agricultor e o estrangulava/ encurralava -(é o caso dos nossos irmãos indigenas)-, ao ponto de acabar por entregar a pequena porção de terra para este sujeito latifundiário. Ou seja, esta sempre foi a tática da burguesia do campo, e suas grilagens de terras dos verdadeiros donos deste Brasil que, por ora dominado pelos parasitas do capital do campo e da cidade. Isso nos mostra que esta tática do latifundio não é de hoje, com a devida benção e juramento do Estado burgues e seus cabides institucionais.

Saudações Comunistas. Sim, eles ( os indios), sem saberem, foram um dos primeiros povos a viverem em comunismo. Mais conhecido como comunismo primitivo. Só esqueceram de avisa -los.

Fernando

Frase marcante:

´´Dilma e o Pucinelli estão massacrando o maior povo indígena do Brasil.“

Urbano

É como foi dito por uma índia, se não me engano, que lhes tomaram o Continente e agora tomam a pouca terra que eles precisam para sobreviver. A partir disso, que moral nós temos para criticar os nazistas e os fascistas?

lia vinhas

É muito, muito triste. Eram cerca de 5 milhões quando os portugueses chegaram, depois veio o botim, a catequisação forçada, a tentativa de escravização e de impor os costumes dos brancos, a introdução de doenças e vícios que jamais haviam tido, a usurpação de suas terras para meia dúzia de latifundiários enriquecerem, a devastação pelos garimpos, o assassinato em massa de indígenas com a conivencia de policias, prefeitos e governadorese e,assim, foram aos poucos sendo dizimados e hoje são uma pequena fração do que eram antes de 1500.Sem falar em seu uso políticos pela direita. Será que esse líder indígena desconhece a homologação das terras indígenas pelo Lula e o ato covarde (um dos muitos) do Gilmar Mendes? Depois de escancararem suas posições com a ópera bufa do “mensalão”, temo pelos votos desses ministros no julgamento definitivo da demarcação do território dos Guarani-Kaiowa. Se houver interesses próprios e atgé de amigos no meio, já sabemos como a (in)Justiça decidirá. Só se a Dilma puder dar a palavra final.

mineiro

agora o stf nao é novidade porque essa turma ai é do lado dos poderosos e da elite maldita branca, entao nao foi surpresa desses malditos nao receberem eles , mas a pres. dilma.

    Galo Depenado

    A Dilma está doidinha para entregar o poder para a oposição em 2014…ela e o Zé Caridozo Dantas, um inerte, que viu sua Manú tomar uma surra nas urnas de POA!

mineiro

quando a maioria diz que a pres. e o pt esta se afastando dos movimentos sociais , que é a pura verdade. como numa situaçao dessas a pres. e o pt nao faz nada , nao quiseram nem receber eles. so porque é indio. depois nao reclama na epoca de eleiçoes. o ex.pres.lula recebia e conversa com qualquer um e com qualquer movimento. agora a pres.dilma esta fazendo o contrario. mas para jantar com o pig golpista ela foi.

edson tadeu

O Cacique nao procurou ver que lula demarcou as terras e que os donos de fazendo entraram com liminar junto ao stf e o stf anulou a decisao de Lula. O supremo tribunal nao pode anular uma decisao do presidente. a meu ver isso estar errado. por isso que aqui estar uma casa de baderna onde esse supremo tem mais força do que todo mundo entao sai fazendo suas barbaridasdes e quem sofre é o Lula ou a Presidente Dilma

    Galo Depenado Pelo Apito Amigo

    Ora, depois que o ex paladino da moral e da etica, juntamente com o esculachador da justiça inventaram um tal grampo sem audio, e o Lula aceitou, isto aqui virou a casa da mae Joana.

Geysa Guimarães

Quer dizer que decreto de presidente da República pode ser revogado com uma só canetada “suprema”?
Que porcaria de poder!

Aline C Pavia

A demarcação dessas terras foi homologada por Lula em 2009.
Uma liminar do STF concedida por Gilmar Mendes suspendeu a decisão de Lula.
E há mais de 3 anos a situação está nesse pé.
No Facebook o evento nacional de 9 de novembro em defesa dos Guarani-Kaiowa identifica os nomes de todas as fazendas da região, bem como seus proprietários e até mesmo alguns nomes de pistoleiros.
A produção dessas fazendas é basicamente soja, açúcar e pecuária. Chegamos a pensar em boicote aos produtos e a todos aqueles que comercializam seus produtos, mas a logística desse boicote se configura inviável. A mobilização está pensando outros meios de protesto. Ou senão, logo logo, índio só no calendário, no dia 19 de abril.

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