Maierovitch: Bastam quatro votos divergentes para um réu pedir novo julgamento

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Gurgel poderá chorar o leite derramado se o placar terminar 7 votos condenatórios contra 4 absolutórios (Foto: Fellipe Sampaio, SCO/STF)

por Walter Maierovitch, em CartaCapital

Na Idade Média, e segundo a crença, o juízo era de Deus quando houvesse uma denúncia grave contra o réu. Os mortais juízes não julgavam, apenas constavam o decidido supremamente. Para se ter ideia, preparava-se o réu para o julgamento com pernas e braços imobilizados. Pedras pesadas eram amarradas a seu corpo. Depois, o acusado era lançado num rio de águas agitadas e profundas. Aí chegava o momento do julgamento feito por Deus. Se o réu flutuasse, estava absolvido.

A humanização do Direito Penal começa em 1764 com o chamado Pequeno Grande Livro escrito pelo marquês de Beccaria e intitulado Dos Delitos e das Penas. Com a humanização, o processo criminal evoluiu ao incorporar, como sucedeu no Brasil, garantias constitucionais pétreas.

No apelidado mensalão, o ônus da prova compete à Procuradoria-Geral da República, representada por Roberto Gurgel, chefe do Ministério Público Federal. Embora a qualquer acusado não seja preciso produzir prova da sua inocência, os 38 réus preparam a contraprova em juízo.

Nas sustentações orais, todos os defensores constituídos bateram na mesma tecla: a peça acusatória não se sustentava em prova colhida sob o crivo do contraditório e não passava de ficção a afirmada compra de votos de parlamentares. E de não constar a individualização das condutas. De grafar condutas atípicas e de conter pedido de condenação baseado em responsabilidade objetiva (sem culpabilidade).

Falou-se também em surpreendente alteração fática por ocasião da sustentação de Gurgel e voltada a tentar dar nova sustentação à acusação: a compra de votos teria ocorrido na PEC paralela da Previdência e na Lei de Falência e não nas demais mencionadas na denúncia. Fora isso, alguns réus, como Delúbio Soares e Marcos Valério, admitiram o apelidado “caixa 2”, crime eleitoral cuja pretensão punitiva foi fulminada pela prescrição.

Gurgel procurou defender a denúncia elaborada pelo seu antecessor, Antonio Fernando de Souza. Quanto a José Dirceu, socorreu-se da denominada “teoria do domínio dos fatos”. Ela aceita provas orais diante da dificuldade de incriminar o chefão de uma potente organização criminosa. Gurgel, num golpe forte, pediu a condenação dos réus, exceções a Luiz Gushiken e Antônio Lamas, com imediata expedição de mandados de prisão.

Após seis dias de sustentações orais em mais de 30 horas, existe a certeza de a sociedade civil ter sido assaltada pela dúvida, ou melhor, ela ainda não sabe se a razão está com Gurgel ou com os defensores. Essa dúvida dos cidadãos é justificável em razão de um processo reservado a poucos e que apenas agora permite o conhecimento das teses técnicas das defesas.

No momento, um grande e profundo fosso separa a acusação e a defesa, que insiste na falta de prova acusatória válida para condenar, aquela colhida judicial e contraditoriamente. Diante disso, veio à luz a validade, para condenar, de prova produzida por uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI).

A boa doutrina ensina que o inquérito parlamentar é inquisitório e não contraditório. Serve para fins internos e as suas peças, havendo indícios de crime, são encaminhadas ao Ministério Público que pode arquivar, promover novas diligências ou ofertar uma ação penal. Mas, para gerar condenação criminal, precisa a prova da CPI ser confirmada pela colhida sob o crivo do contraditório. Com efeito e no caso do mensalão, as provas colhidas na CPI dos Correios só valem se confirmadas por elementos de prova produzidas judicialmente.

Para o advogado de Dirceu, não existe nenhuma prova judicial a lhe inculpar. Os três relatos que o deputado federal Osmar Serraglio tanto fala de nada valem se não confirmados em juízo. Por outro lado, a falta de prova mínima sobre a autoria e o nexo causal impedem a aplicação da supracitada “teoria do domínio dos fatos”.

Erra quem pensa que tudo se encerra com o julgamento da ação penal 470. No caso de condenação de réus, poderá haver novo julgamento. Para que este ocorra, a condenação não poderá ser por unanimidade. O regimento interno do Supremo Tribunal Federal é bastante claro no caso de ação penal e condenação com 4 votos absolutórios. Portanto, bastam 4 votos divergentes para tudo recomeçar. A propósito: é muito claro o artigo 333 do regimento interno, que estabelece o recurso chamado embargos infringentes.

Como Gurgel abdicou de arguir a suspeição do ministro Dias Toffoli, poderá chorar o leite derramado se o placar terminar 7 votos condenatórios contra 4 absolutórios.

Walter Maierovitch é jurista e professor, foi desembargador no TJ-SP

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Comentários

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FrancoAtirador

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STF
REGIMENTO INTERNO
(Atualizado até fevereiro de 2010)

Art. 333. cabem embargos infringentes à decisão não unânime do Plenário ou
da Turma:

I – que julgar procedente a ação penal;

[Norma aplicada: art. 1º a art. 12 (processo e julgamento) da Lei n. 8.038/90.
RISTF: art. 230 a art. 246 (processo e julgamento)]

(…)

Parágrafo único. O cabimento dos embargos, em decisão do Plenário, depende da existência, no mínimo, de quatro votos divergentes, salvo nos casos de julgamento criminal em sessão secreta.

(…)

http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/legislacaoRegimentoInterno/anexo/RISTF_fevereiro_2010.pdf

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8038.htm

http://www.dji.com.br/codigos/1941_dl_003689_cpp/cpp609a618.htm
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EMBARGOS INFRINGENTES E DE NULIDADE NO PROCESSO PENAL

Por José Clevenon Alves Bezerra*, no Portal ClubJus

EMBARGOS INFRINGENTES EM MATÉRIA PENAL NO STF e no STJ

O STF tem autorização constitucional para estabelecer o processo e o julgamento de sua competência originária ou recursal e de relevância de questão federal.

Desta forma, o STF criou embargos infringentes para outras hipóteses, tais como na ação penal originária julgada procedente [aqui se enquadra a AP 470, obviamente se houver condenação de um ou mais réus],
que julgar improcedente a revisão criminal,
em recurso criminal ordinário que for desfavorável ao réu
e no recurso extraordinário, em que não se apreciam as quaestiones facti.

Tais recursos são semelhantes aos embargos previstos no parágrafo único do artigo 609 do CPP, uma vez que pressupõem decisão não unânime e desfavorável ao réu.

No entanto, diferentemente dos embargos previstos no código instrumental, os embargos infringentes no STF devem ser opostos em quinze dias, perante a secretaria, e serão juntados aos autos, independentemente de despacho.
Após a distribuição, são os autos conclusos ao relator para o juízo de admissibilidade.

Se a decisão for de uma Turma, a distribuição se fará perante a outra; se do Plenário, serão excluídos da distribuição o relator e o revisor, nos termos do artigo 76 do regimento interno do STF.

Após a admissão dos embargos, cujo despacho do relator que o faz é irretratável, a secretaria abrirá vista dos autos ao embargado, por dez dias. Deve ser efetuado o preparo no prazo de dez dias contado da publicação no órgão oficial do despacho que admitiu os embargos, antes da vista ao embargado (artigo 59, II e 335, § 3º, do Regimento Interno do STF).

A seguir vão à sessão de julgamento, facultando-se a sustentação oral por 15 minutos (artigos 131, § 2º e 132 do Regimento Interno do STF).

No caso da interposição de embargos infringentes contra decisão de plenário [caso da AP 470], será necessário que haja pelo menos quatro votos divergentes.

No caso de não admissão dos embargos infringentes, caberá agravo regimental, de acordo com o artigo 317 da lei interna do STF, num prazo de cinco dias, através de petição com as razões do pedido de reforma da decisão agravada, facultando-se ao relator que reconsidere seu despacho, caso contrário ele deverá submetê-lo ao plenário ou turma conforme a competência, caso em que seu voto também será considerado.

*José Clevenon Alves Bezerra – Advogado Graduado e Pós-Graduado pela Universidade Mackenzie. “Embargos infringentes e de nulidade no processo penal – Autor: José Clevenon Alves Bezerra”. Clubjus, Brasília-DF: 19 nov. 2009.

Íntegra disponível em:

http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.27235

Paciente

Segundo o jurista Reinaldo Azevedo na AP 470 não cabe esse recurso,chamado embargos infringentes.

O JUIZ

Sempre a oportuna sapiência do Dr. Walter de sobresaindo.
É importante que os Brasileiros entendam o que sua matéria significa.
É bom conhecermos as entranhas do STF.
Assim, e principalmente, a Globo e Cia, não poderão dar tiros para todos os lados pois acabarão acertando a si próprios.
Toda essa guerra Política, se desenrolando dentro da Côrte que teria assuntos mais importantes para resolver.
São os Globais, querendo aplicar um golpe no País, contra os trabalhadores e a qualquer custo.
Mas, toda ação sugere uma reação.
Portanto, cuidem-se senhores Globais.

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