Caiu o nosso muro de Berlim. E agora?

Tempo de leitura: 3 min

por Luiz Carlos Azenha

Caiu o nosso muro de Berlim. Graças a uma dúzia de militantes do Movimento Passe Livre, o Brasil terá finalmente uma democracia com povo. Agora, sim, seremos capazes de tirar a Constituição de 1988 do papel. Demolir a democracia tutelada e o pacto de elites que, desde a redemocratização, sustenta nossa eterna modernização conservadora.

Vivemos, à nossa maneira, um Caracazo. Na Venezuela, foi a demolição do pacto segundo o qual os principais partidos — AD, Copei e União Republicana Democrática — se revezavam no poder. No Brasil, é o fim dos conchavos de bastidores entre PT, PMDB e PSDB, financiados pelo BNDES. Ou pelo menos o começo do fim. Tirar 20 centavos das tarifas de ônibus é apenas o primeiro passo. Faremos, a partir de agora, a democracia nas ruas.

É, de fato, um cenário bastante tentador. Democracia direta. Horizontal. Sem partidos ou lideranças personalistas. Submissão absoluta à causa.

Não há mais direita ou esquerda, escrevem no meu Facebook.

Mas, já avisaram a direita? Ela vai ceder seus privilégios assim, de mão beijada, alguns dos quais promovidos e defendidos com unhas e dentes pela coalizão cada vez mais conservadora liderada pelo PT?

Se olharmos para a História do Brasil, provavelmente não.

Ela ensina que sempre que o povo ensaiou algum protagonismo, no Brasil, foi engaiolado. Numa das vezes, por 21 anos.

Ah, mas o mundo mudou. Escapamos das hierarquias que nos foram impostas pelo fordismo. Estamos em rede. Nosso levante é tão silencioso quanto surpeendente.

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O risco, qual é o risco?

Que a direita, enfim, de fato exista. Que se organize. Que pescando na ascensão social despolitizada promovida pelo lulismo bote na rua sua própria tropa de choque. Que explore o quadro político para nos impor um Berlusconi. Joaquim Barbosa, quem sabe, um Jânio Quadros do século 21, o Batman capaz de reeditar a vassourinha com suas asas faxineiras.

Direita e esquerda não nos representam, escrevem os que acham que as fronteiras foram abolidas e o imperialismo morreu. Ah, nacionalismo já era, é coisa da esquerda autoritária. Já era. Só falta avisar Washington.

Mas, qual é mesmo a conjuntura internacional? Capitalismo em crise. Disputa aguçada pelos recursos naturais (Líbia, Venezuela, Brasil). A América para os norte-americanos. Antigo, né? Mas real. Perguntem aos canhões da OTAN.

O neoliberalismo quer eliminar qualquer forma de organização social que não reconheça o caráter místico do mercado. Quer se apropriar do gás da Bolívia, do petróleo da Venezuela, do minério brasileiro (deste, já se apropriou). É a privataria 3.0, da água ao genoma. Organizada em torno de duas dúzias de corporações.

Como enfrentar essa conjuntura? Através dos tradicionais partidos de esquerda, dizem alguns. Não, argumentam outros: eles estão falidos, foram cooptados e são apenas um empecilho à luta social.

Um bom debate. Desde que, enquanto estivermos distraídos nele, não nos seja imposto um Berlusconi.

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