STF decide se lei do uso controlado do amianto viola o direito constitucional à saúde

Tempo de leitura: 4 min

por Conceição Lemes

Dois meses após a audiência pública com 35 especialistas brasileiros e internacionais, o uso do amianto volta a ser debatido no Supremo Tribunal Federal (STF).  Nesta quarta-feira 31, serão julgadas três ações Direta de Inconstitucionalidade (ADI):

ADI 4066/2008 – A relatoria é do ministro Ayres Britto. Ela pede a declaração da inconstitucionalidade da lei federal (9055/95) do uso controlado do amianto. Foi proposta pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) e Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) contra a União.

ADI 3357/2004 – O relator é também Ayres Britto. A ação é da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Indústria (CNTI) contra a lei que baniu a fibra cancerígena no Rio Grande do Sul.

ADI 3937/2007 – Relatada pelo ministro Marco Aurélio Mello e proposta pela CNTI, é contra a lei que “proíbe o uso, no Estado de São Paulo de produtos, materiais ou artefatos que contenham quaisquer tipos de amianto ou asbesto ou outros minerais que, acidentalmente, tenham fibras de amianto na sua composição”.

A engenheira Fernanda Giannasi, auditora-fiscal do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e fundadora da Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (Abrea), está confiante: “Esperamos que a lei federal seja declarada inconstitucional e as estaduais validadas”.

LEI DO USO CONTROLADO VIOLA O DIREITO À SAÚDE AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO

O amianto está associado a vários problemas de saúde. No curto prazo, um ou dois anos, pode reduzir a capacidade respiratória devido a um processo inflamatório.

Em geral, depois de 10, 15 anos de exposição, o mineral assassino (como é conhecido), pode alterar a estrutura do pulmão, causando a asbestose, ou fibrose pulmonar. O pulmão “endurece”, perdendo progressivamente a sua capacidade de se expandir. Provoca falta de ar, dor nas costas, cansaço, emagrecimento. Não tem cura, mesmo que a pessoa nunca mais entre em contato com amianto. Leva lentamente à morte.

No longo prazo, o amianto pode promover alterações nas células, causando câncer de pulmão. Leva 25 a 30 anos para se manifestar. A pessoa exposta ao amianto e, ao mesmo tempo, fumante tem 57 vezes mais probabilidade de ter esse tumor maligno do que quem não está nessas duas situações. É que o  amianto e o tabaco têm efeito sinérgico: um potencializa o malefício do outro.

Também, no longo do tempo, pode induzir ao mesotelioma de pleura (membrana que reveste o pulmão), de peritônio (membrana que reveste a cavidade abdominal) e de pericárdio (membrana que recobre o coração). É  um tumor maligno e extremamente agressivo, incurável e fatal e pode aparecer 35, 40 e até 50 anos após o primeiro contato com o amianto.

Todas as formas e tipos de amianto são cancerígenos, inclusive a crisotila pura existente no Brasil. É a posição da IARC (Agência Internacional para a Pesquisa do Câncer), da Organização Mundial da Saúde (OMS), da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da Organização Mundial do Comércio (OMC) e do Instituto Nacional de Saúde e Pesquisa Médica (INSERM), da França. Também a da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e do Instituto Nacional do Câncer (Inca), ambos no Rio de Janeiro e ligados ao Ministério da Saúde.

“A asbestose é dose-dependente”, sustenta o médico pneumologista Hermano de Castro, coordenador do Centro de Estudos  da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana da Fiocruz. “Quanto mais o trabalhador fica exposto ao amianto, maior a probabilidade de ele desenvolver a doença.”

Já o mesotelioma não é dose-dependente. “É mentira que exista dose segura para o câncer; a única quantidade que protege é a exposição zero”, alerta Hermano de Castro. “Mesmo que você se exponha por curto período e sob baixa dose ao amianto, pode vir a ter mesotelioma no futuro”.

“O amianto não é apenas questão de saúde ocupacional; é problema de saúde pública, também”, acrescenta. “Estudos epidemiológicos indicam que parte das pessoas atingidas pelo mesotelioma tem história de exposição direta, explícita. Mas outra parcela, não; neste caso, as evidências são de exposição ambiental. Os mais suscetíveis, mesmo expostos em baixas doses, correm o risco de ter esse tumor maligno.”

Parêntese. O dr. Hermano está sendo interpelado judicialmente pelo lobby do amianto, capitaneado pelo IBC – Instituto Brasileiro do Crisotila. É mais uma tentativa clara de intimidação para calar os cientistas e todos os que defendem a proibição da fibra cancerígena. Essa ação gerou protestos no mundo inteiro, especialmente na comunidade científica e acadêmica. Fechando o parêntese.

O amianto está totalmente banido em 66 países. No Brasil, ele já é proibido em São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Mato Grosso e Rio Grande do Sul. A CNTI entrou com ADI no STF contra essas leis estaduais, excetuando-se a de Mato Grosso. Alegam que o estado não pode legislar sobre a questão, já que existe a lei federal, a do uso controlado, e que haveria, assim, invasão de competência, sendo prerrogativa exclusiva da União legislar sobre a matéria.

“Como não existe nível seguro de exposição ao amianto, a lei federal do uso controlado viola os dispositivos da Constituição que garantem o direito à saúde e ao meio ambiente equilibrado”, argumenta Fernanda Giannasi. “A sua impugnação pelo STF é o caminho mais adequado para o banimento completo do amianto no País, já que o governo continua priorizando a indústria do amianto em detrimento da vida e da saúde dos brasileiros e brasileiras.”

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Comentários

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Rodrigo Leme

É impressionante o Brasil estar em 2012 e essa discussão do amianto ainda render. É tão claro o dano do material à saúde do trabalhador que eu teria vergonha de defender isso.

Antonio Carlos Fon: Ato ecumênico em memória dos mortos e desaparecidos « Viomundo – O que você não vê na mídia

[…] STF decide se lei do uso controlado do amianto viola o direito constitucional à saúde […]

Antonio

TRISTE FIM DO STF: http://www.youtube.com/watch?v=R3RCP4jHGHY

RicardãoCarioca

Se os fabricantes sabem que o amianto faz mal à saúde da popolução, então eles possuem o ‘domínio do fato’. Usando-se da ‘flexibilização’ e da ‘elasticidade’ da interpretação da Lei, em adição, mesmo não sendo ‘crime de sangue’, esses empresários devem ser presos e condenados por formação de quadrilha… Ah, não. tudo isso foi apenas para os petistas. Afinal, ‘a verdade é uma quimera’…

    Rodrigo Leme

    Considerando que amianto (ainda) é legal e esquema de corrupção não, justifica-se a diferença de tratamento.

    RicardãoCarioca

    Tudo bem, para a oposição eu desenho. Não é à toa que estão em extinção. Amianto é ilegal em vários países e aqui está prestes a se tornar também. Se julgarem que o amianto é ilegal, quero ver o STF aplicar toda a mixórdia inventada na AP 470.

    E quero ver os comentários da turma da direita quando o mensalão tucano e o mensalão do dem forem a julgamento. Já sei que o PiG merválico vai desdizer todas as elocubrações que já produziram, porque ganham dinheiro não para serem competentes nas análises, mas sim para fazer militância oposicionista. Quero ver os comentários dos opositores que visitam esse blog. Vamos ver se a indignação com a corrupção é seletiva, como a do PiGSDB.

    Rodrigo Leme

    Tá ruim de desenho, hein?

    1. Amianto é legal hoje (ainda). Se amanhã for ilegal,e continuarem vendendo, cadeia neles. Não se pode prender por descumprir algo antes de ser ilegal. Tipo, corrupção não virou ilegal por causa do julgamento do Mensalão 470.

    2. Você não precisa esperar para ver os meus comentários, já disse pra cima e pra baixo que brigo junto com quem for para que as conedenações de alto escalão político por corrupção não parem com o mensalão.

    3. Eu gostaria muito que o item 2 acontecesse, e isso nos diferencia: você quer que aconteça com os outros, mas não com o PT. Eu quero que aconteça com todo corrupto.

    4. Estou desaparecendo? Obrigado por reparar, estou de regime + academia.

Aline C Pavia

Quais as perspectivas?
Afinal a turminha do amianto pagou vários almoços para alguns de nossos doutos ministros do STF.

Darvin Silva

O STF deve decidir pela saúde do trabalhador (irreversível após contaminado) e não pela saúde do empresário (sempre reversível).

Mardones Ferreira

Vamos torcer que o STF siga as decisões de outros países que baniram o uso do amianto.

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