Miguel do Rosário: Na Argentina, a derrota dos que venceram

Tempo de leitura: 4 min

As eleições argentinas e a derrota dos que venceram

por Miguel do Rosário on 29/10/2013 – 12:14 pm, por e-mail

É muito difícil ler uma interpretação objetiva sobre o resultado das eleições legislativas ocorridas na Argentina, no último domingo. Mas fiz um esforço e percorri os principais jornais locais, tantos os de oposição como governistas, blogs, além da imprensa brasileira e estrangeira.

A imprensa brasileira, por exemplo, comprou uma interpretação tão histericamente antikirchnerista que eu só poderia classificá-la, piedosamente, de “exagerada”.

O engraçado é que, se você olhar os infográficos publicados nas mesmas páginas onde se exalta a retumbante derrota de Cristina Kirchner, irá se deparar com uma situação curiosa. Aqueles que a matéria exalta como “vitoriosos”, como o peronismo dissidente, de Sergio Massa, perderam espaço no Congresso, enquanto o grande derrotado, o kirchnerismo, não perdeu uma só vaga na Câmara, permanecendo como principal força, com 132 deputados.

No Senado, os kircheristas perderam duas vagas, passando de 41 para 39 senadores, mas as principais forças de oposição também sofreram baixas: a UCR perdeu 2 vagas, ficando com 19 senadores; e o peronismo dissidente perdeu 1, ficando com 7.

O El Pais, jornal espanhol conservador, claramente simpático à oposição argentina, fez uma abordagem bem mais franca que a militante imprensa brasileira. Traduzi alguns trechos:

O resultado das eleições legislativas de domingo passado na Argentina foi ambiguo. Por um lado, o kirchernismo perdeu na metade dos 24 distritos, incluindo os cinco principais no país. Por outro continua sendo a força mais votada em todo país, e manterá o controle parlamentar nos dois últimos anos do segundo governo da peronista Cristina Fernández de Kirchner (…)

O que está claro é que os prognósticos da oposição sobre o fim do ciclo kirchnerista talvez sejam prematuros até que se venha, finalmente, a eleição presidencial de 2015.

***

Sergio Massa, o “peronista dissidente”, é uma espécie de Eduardo Campos. Até junho deste ano, era aliado do governo, embora já viesse revelando atritos há dois anos. Em tese, é um candidato de esquerda, mas o namoro com os grandes grupos de comunicação, sobretudo o Clarín, o posiciona à direita do espectro político.

Por outro lado, a ascenção de Massa lança um bocado de sombras sobre Maurício Macri, do PRO, este sim, um partido conservador.

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Transcrevo, por fim, traduzido por mim, um post de um blogueiro kirchnerista, Jorge Giles, sobre o resultado das eleições de domingo.

De ganhadores e perdedores

Talvez a história escreva que o domingo de 27 de outubro, a Frente para a Vitória (FpV, principal partido kirchnerista) se impôs nas urnas a nível nacional, e portanto derrotou Clarín e suas repetidoras.

O incompreensível, no entanto, é escutar relevantes analistas repetindo, convencidos, a mesma ladainha deste grupo monopólico.

De onde fundamentam a falácia que o kirchernismo perdeu as eleições para a oposição?

A matemática é uma só e vale tanto para governistas quanto para opositores. Para dizer de outro modo: a matemática não está filiada a um partido ou outro.

Vamos aos números, então.

Ao renovar ambas as Câmaras do Congresso Nacional, a de Deputados e Senadores, resta claro que a única tabela válida para se saber quem ganhou e quem perdeu é a que indica a distribuição final das vagas obtidas. Apenas depois desta conta global, se poderá sopesar os resultados locais e seu potencial de transcedência sobre o cenário nacional. E isso é um caso de subjetividade política, não de objetividade analítica.

Na Câmara dos Deputados, a Frente para a Vitória obteve 48 vagas, que somadas às 84 que já tinham, completam as 132 que terá a partir de 10 de dezembro próximo.

Esse é o resultado de ter obtido 7.487.839 votos, ou seja, 33,15%.

Em seguida, vem o bloco da UCR e aliados, com 31 vagas obtidas que, somadas às 23 anteriores, totalizam 54 no total. Teve 4.829.679 votos, ou seja, 21,38%.

Em terceiro lugar, se encontra a Frente de Renovação (Sérgio Massa), com 16 vagas ganhas, e com as 3 que já tinha, somam as 19 com que contará a partir de agora. Teve 3.847.716 votos, ou 17%.

Depois vem o bloco pertencente ao PRO e aliados, que tinham 5 cadeiras, as quais, somadas às 13 que obtiveram agora, completarão 18 em dezembro. Foram 2.033.459 votos, ou 9% do total.

Pelo que aprendemos na escola, 132 é maior que 54 e que 19 e que 18.

Com os senadores, ocorre um percentual similar, mas como não queremos cansar-lhe com tantos números, apenas diremos que, enquanto a Frente para a Vitória obteve 11 vagas, o resto dos partidos obtiveram entre 1 e 2 cada um.

A operação de desgaste do projeto nacional do governo de Cristina entrou em sua etapa mais miserável e cínica. É preciso chamá-la do que é, com toda a contundência, para que se entenda. Daí vem a falácia que pretende criar um clima de derrota entre os vitoriosos, e de vitória entre os derrotados.

Não é um erro que cometem. É uma operação política contra o governo. Como nos tempos de Bartolomeu Mitre e os unitários, olham o país a partir somente de Buenos Aires.

Calma, senhores. Há um projeto nacional e popular para longo prazo.

***

Para aprovar uma mudança constitucional que a permitisse ser candidata novamente à presidência, Cristina Kirchner teria que aumentar sua bancada para 172 deputados e 48 senadores, isso para um total de 257 deputados e 72 senadores. Mas eu penso que é saudável que o kirchnerismo se veja obrigado a procurar nomes alternativos.

***

O governo Kirchner ainda tem dois anos pela frente. Com maioria garantida no Congresso e no Senado, terá condições de aprovar leis que granjeiem o favor do povo. O futuro do kirchnerismo dependerá da qualidade de seu governo. Para as esquerdas latinas, contudo, o maior perigo vem do PRO, representante mais explícito do conservadorismo argentino, embora procure se disfarçar, como acontece em todo continente. Até domingo, Maurício Macri, filiado ao PRO, e prefeito de Buenos Aires, era o nome mais forte da oposição. Ele é, digamos, uma espécie de Serra. Com a ascensão de Massa, cuja história é ligada ao kircherismo, a oposição continua fragmentada, e a direita vê suas chances de poder reduzidas.

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Comentários

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Diego

Viver com uma inflação de 25% é uma maravilha…. o geoverno Cristina queimou todo seu capital político com essa lei… certamente a economia argentina vai desder ladeira abaixo devido a incompetencia habitual da presidenta..

Ém 2015 os Kichneristas vão dançar… como os petistas em 2014

Mardones

É preciso manipular para fazer valer a opinião publicada. É uma guerra! E sem ley de médios por aqui… Ah, sem falar no controle remoto da Dilma.

Coitado de quem ainda acredita na imprensa grande do Brasil.

Lula desmente o Painel da Folha – Viomundo – O que você não vê na mídia

[…] Na Argentina, a derrota dos que venceram […]

augusto2

O Massa se sobrepõe ao Macri, ou seja, Campos silvério dos Reis ensombreia o Zé bolinha Ambulância. Tudo em casa.

Capilé

Enquanto isso, na Venezuela:
“O “socialismo bolivariano do século XXI” não fracassou. Talvez seja apenas uma peça de humor político mal compreendida. Na semana passada, por exemplo, enquanto o Banco Central venezuelano confirmava a falta de papel higiênico em 79% dos estabelecimentos comerciais da Venezuela, o presidente Nicolás Maduro discursava sobre a criação do “Ministério do Poder Popular para a Suprema Felicidade”. O anúncio presidencial aconteceu enquanto emissários de Dilma Rousseff cobravam, em Caracas, o pagamento de cerca de US$ 800 milhões em dívidas pendentes com exportadores brasileiros.”
Ou seja, na Venezuela está faltando papel.

Nonato Luz

Não, bem estão a Espanha, Itália, Portugal,

FrancoAtirador

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!!! VITÓRIA DO POVO SUL-AMERICANO !!!

SUPREMA CORTE ARGENTINA DECLARA CONSTITUCIONALIDADE DA LEY DE MEDIOS

Página/12, via Carta Maior

A Corte Suprema de Justiça da Argentina colocou fim à controvérsia judicial sobre a constitucionalidade da lei de Serviços de Comunicação Audiovisual.

Buenos Aires – Após mais de quatro anos, a Corte Suprema de Justiça da Argentina colocou fim à controvérsia judicial sobre a constitucionalidade da lei de Serviços de Comunicação Audiovisual, aprovada em 2009 pelo Congresso e freada parcialmente por um recurso do Grupo Clarín.

A máxima instância da Justiça argentina declarou constitucionais os quatro artigos questionados pelo grupo midiático: 41, 45, 48 e 161.

Na decisão, os magistrados consideraram que “não se encontra afetado o direito à liberdade de expressão do Grupo Clarín” e que as “restrições de ordem estritamente patrimonial” que estabelece a norma “não são desproporcionais frente ao peso institucional que possuem os objetivos da lei”.

Afirmaram ainda que a lei “regula o mercado de meios de comunicação sem efetuar distinção alguma a respeito dos sujeitos alcançados por suas disposições”, ou seja, que não tem o objetivo de prejudicar um grupo ou meio de comunicação em particular, mas sim regular todo o mercado audiovisual.

“A perícia não aponta que as restrições tenham poder suficiente para comprometer ou colocar em risco a sustentabilidade econômica ou operacional das empresas que compõem o Grupo Clarín, ainda que possa levar a uma diminuição de seus lucros ou rentabilidade”, diz a sentença que leva as assinaturas de Lorenzetti, Zaffaroni, Highton de Nolasco, Petracchi, Maqueda e Argibay, estes últimos com dissidências parciais.

Os juízes entenderam que a conclusão do perito econômico sobre a falta de sustentabilidade que a regulação impõe ao grupo é “uma afirmação dogmática que não foi devidamente fundamentada”.

Além disso, a Corte Suprema questiona “como é possível que outros grupos resultem economicamente sustentáveis”, considerando o argumento do Clarín de que sua adequação ao limite de concessões o tornaria inviável economicamente.

A sentença aponta que a liberdade de expressão pode ser entendida em duas dimensões, a individual e a coletiva, e entende como correto que o Estado regule nesse aspecto.

“Os meios de comunicação têm um papel relevante da formação do discurso público, motivo pelo qual o interesse do Estado na regulação resulta inquestionável”, afirmaram os ministros,
argumentando ainda que é lícita a “sanção de normas que a priori organizem e distribuam de maneira equitativa o acesso dos cidadãos aos meios massivos de comunicação”.

Além disso, não levaram em conta a distinção entre as concessões que ocupam espectro radiofônico e as que não ocupam (como a televisão a cabo), sustentando que “o fundamento da regulação não reside na natureza limitada do espectro como bem público, mas sim, fundamentalmente, em garantir a pluralidade e a diversidade de vozes”.

Sobre o artigo 45, que estabelece os limites à multiplicidade de concessões, a Corte considerou que as restrições “aparecem como apropriadas ou aptas para permitir a participação de um maior número de vozes” e deu por justificada para a televisão a cabo a limitação a 35% de assinantes e a 24 licenças, assim como também a diferenciação entre TV a cabo e TV via satélite.

A sentença declarou ainda constitucional o prazo de um ano disposto pelo artigo 161 para a adequação e afirma que, após esse prazo, “o artigo 161 da lei resulta plenamente aplicável à autora”.

Sobre o final da resolução, a Corte recordou que não é sua função estabelecer “se a lei 26.522 se adéqua ou não aos avanços tecnológicos, se é uma lei obsoleta, se trata ou não de uma lei incompleta ou inconveniente, ou, em outras palavras, se se trata da melhor lei possível”.

Assinalou ainda que a norma “perderia sentido sem a existência de políticas públicas transparentes em matéria de publicidade oficial”.

Também observou que “a função de garantidora da liberdade de expressão que corresponde ao Estado” se desvirtua se através de subsídios ou da repartição da pauta oficial “os meios de comunicação se convertem em meros instrumentos de apoio a uma corrente política determinada ou em uma via para eliminar o dissenso e o debate plural de ideias”.

No mesmo sentido, rechaçou que os meios públicos sejam “espaços a serviço dos interesses governamentais” e defendeu que a AFSCA (a agência de regulação do setor na Argentina) seja “um órgão técnico e independente”.

Tradução: Marco Aurélio Weissheimer

Íntegra da Decisão, no original em espanhol:
(http://www.pagina12.com.ar/fotos/20131029/notas/fallo.pdf)
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!!! MÍDIA BANDIDA, TREMEI !!!

A Ley de Mídia fixa para os meios de comunicação privados um máximo de 35% no mercado de televisão aberta e 35% de assinantes de televisão a cabo, 10 licenças de rádio, 24 de televisão a cabo e uma de televisão por satélite.

Com a aprovação do artigo que limita o número de licenças para serviços de televisão, de rádio e de TV a cabo e a satélite, estima-se que 21 grupos privados deverão se desfazer de cerca de 330 concessões que atualmente excedem ao limite estabelecido pela nova legislação.

Dessa forma, só o grupo Clarín [a Globo Argentina] terá de vender ou transferir mais de 150 licenças, nos próximos dois anos.

Entre os outros 20 grupos privados, estão a espanhola Telefónica, a americana DirectTV e o também espanhol grupo Prisa.

Os números são do Esquadrão de Milícias Midiáticas Apátridas Apavoradas.
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lauro c. l. oliveira

Olha a globo botando suas barbas de molho! Se a “ley de médios” chega aqui .

Bernardino

Grande Cristina KICHNER.OS Peronistas sao esquerda guerreira ao contrario da nossa capenga e desmoralizada e covarde esquerda!!

È a vitoria de PIRRO:ganharam e continuam com minoria no Parlamento e a nosss MIdia BANDIDA e Porca,vendendo a mercadoria estragada da derrota o jornal canalhal nem falou da vitoria juridica da Cristina no Supremo de lá

Os Porcos e paus-mandados do grande capital de lá agora entregarao as concessoes para o bem dos Argentinos.E aqui?Há aqui a deleteria cultura portuguesa do medo e do jeitinho continurá se rastejando ao grande capital e sua IMPRENSA BANDIDA lubrificada pelos politicos pilantras e detentores de Concessoes e assim LA NAVE VA ate voltar a Portugal de onde nunca deveria ter SAIDO!!!!!

lukas

Que bom que Argentina e Venezuela estão tão bem e não há nada com que vocês se preocuparem.

francisco.latorre

a matemática é uma só.

lá. como cá.

..

francisco niterói

Será que a nosa midia dirá que a suprema corte argentina é bolivariana? Ou inventará outro motivo pra atacar a lei que a SIP chama de cubanizacao?

Aguardemos as manifestacoes.

Alemao

Engraçado que os dois últimos parágrafos revelam exatamente a razão de tanta euforia, há uma luz no fim do túnel…

Hélio Pereira

Governo Argentino,”Teve uma RETUMBANTE DERROTA,mas continua com MAIORIA”.

André Braga

Wishful thinking.

    André Braga

    Da imprensa argentina e dos jornalecos tupiniquins.

Julio Silveira

ÔÔÔ imprensazinha de militância conservadora essa nossa.

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