Túlio Muniz: Em Fortaleza, movimentos sociais fazem maré virar

Tempo de leitura: 4 min

Dilma acordou?

por Túlio Muniz*, de Fortaleza, via e-mail

O conflito de hoje, 27 de Junho, em Fortaleza entre manifestantes e a polícia militar (PM), demonstra o quão grave é, no Brasil, as retóricas discursivas se materializarem.

Se nos últimos três a presidente Dilma Rousseff fez um esforço notável (embora tardio) no sentido de abrir o diálogo com movimentos sociais e sindicais, a ação desproporcional da PM em Fortaleza hoje, que tem se reproduzido em grandes manifestações, como foi em Belo Horizonte, em 26 de Junho,  pode comprometer o seguimento de qualquer negociação. Pois hoje o que se viu, em Fortaleza, foi uma multidão integrada, em sua imensa maioria, por os mais diversificados movimentos sociais.

Dentre os 5 mil presentes (segundo a PM, eu estimaria em 8 mil, 10 mil pessoas), estavam o Movimento dos Atingidos por Barragens, o Movimento das Comunidades da Praia, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a Central Sindical Popuar (ligada ao PSTU), a Central dos Movimentos Populares do Ceara, artistas e atores locais, a Associação dos Docentes da Universidade Federal do Ceará (ADUFC) e muitos professores.

Lá também estavam, pela primeira vez sem serem hostilizados, muitos militantes de partidos de esquerda, do Psol e do PSTU, e mesmo os que se identificavam como do PT, ostentando a estrela símbolo do partido. Ausentes somente os do Partido Comunista do Brasil, que, alias, ocupa a pasta dos Esportes no ministério, a que está mais à frente da organização da Copa do Mundo e cujo ministro, Aldo Rebelo, há uma semana defendeu as cargas policiais durante jogos da Copa das Confederações como o que ocorre hoje em Fortaleza, entre os selecionados de Espanha e Itália.

Exatamente depois  que o ex-presidente Lula fez um chamado aos movimentos sociais para que tomassem a frente das manifestações, o protesto de 27 de Junho em Fortaleza foi talvez o mais barbaramente repelido pela PM, por bloquear um dos três acessos ao estádio onde o jogo ocorreria.

Sobre uma avenida de bandeiras e ideologias, a PM forjou os “vândalos” com a mesma estratégia anterior: posta à frente da multidão uma barreira de policiais sem equipamento de proteção adequado, quase um convite, uma provocação às pretensões dos manifestantes mais exaltados que, hoje novamente, eram dezenas em meio a milhares. Em seguida, a carga com bombas e disparos intimidadores que atinge à toda multidão, física ou psicologicamente.

Em meio a tudo, a imprensa, com versões díspares, sobretudo as redes de TV que transmitem a Copa das Confederações (Globo e Bandeirantes). Sem jornalistas na linha de frente, a cobertura dos jornais locais é limitada.

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A Globo, em particular, é execrada por todos em uníssono. Sugiro a todos assistam ao próximo programa Custe o Que Custar (CQC), misto de entretenimento e jornalismo, da Bandeirantes, cujo double de ator e repórter, Ronald Rios, foi ovacionado e seguido por muitos quando emergiu ao meio da multidão, e foi para linha de frente no momento exato em que uma chuva de bombas da polícia lhe caiu sobre a cabeça.

Era por volta de 14h30, quando a PM decide avançar para liberar a avenida. Mesmo com a multidão recuando e em visível situação de dispersão, a ação policial não parou, e a multidão recuava.

Era, outra vez, uma multidão de imensa maioria de jovens, muitos ainda adolescentes e crianças, que sofreram com gás lacrimogênio e os riscos causados por uma multidão em provocação e pânico constante causado pela PM, a pretexto de combater “vândalos” que supostamente iniciam ataques com paus e pedras a policiais armados até a alma e protegidos por equipamentos sofisticados. Até agora, em todo o país, duas pessoas morreram por conta da repressão, um jovem em Belo Horizonte e uma mulher trabalhadora na limpeza urbana em Belém. O que falta para que se contenha a fúria policial, morrer uma criança “vândala”?

Hoje, dos cinco helicópteros que monitoravam a multidão, dois eram do Exército e um da Polícia Rodoviária Federal. Foi a Presidência quem sancionou a Lei Geral da Copa, que suspendeu regulamentos do esporte nacional durante as Confederações e o Mundial, dando à FIFA regalias e direitos alheios à legislação nacional.

O que se viu até hoje é motivo mais que suficiente para representar contra a Polícia Militar e a Força de Segurança Nacional, a comandados e comandantes perante cortes internacionais de Direitos Humanos. Corre o risco também a presidente Dilma de ser acusada de violação dos Direitos Humanos por os governadores de cidades em conflito e onde ocorrem os jogos atribuíram a responsabilidade ao comando da Força de Segurança?

Ou se tornam rapidamente concretos os avanços anunciados esta semana, tanto os recursos e soluções para Saúde e Transporte quanto combate efetivo à corrupção, ou conflitos não vão parar, sobretudo agora que os movimentos tomam a frente.

Exatamente como pediu Lula, como pediu o governo.

Voltaremos a tratar disso.

*Túlio Muniz, Historiador com Graduação (2003) e Mestrado (2005) pela UFC, na qual  atualmente é pesquisador recém-doutor   no Programa de Pós-Graduação em História. Doutor (2011) pela Un. de Coimbra, Portugal. Jornalista Profissional (Mtb 4844jp24/55).

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