Emílio Rodriguez Lopez: Como foi construída, dia a dia, a vitória dos alunos e a derrota de Alckmin

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Entenda como se construiu a vitória dos estudantes e a derrota de Alckmin.

por Emílio Carlos Lopez Rodriguez, especial para o Viomundo

Para entendermos melhor tudo que aconteceu na semana passada que culminou em uma vitória parcial do movimentos dos estudantes, pais e professores contra a decisão de Alckmin de fechar escolas, resolvemos fazer uma cronologia dos acontecimentos:

29/11, domingo – Vaza o áudio da gravação da reunião de Fernando Padula, chefe de gabinete do então secretário da Educação do Estado de São Paulo.  Padula decreta guerra contra os estudantes, denuncia Laura Capriglione, do Jornalistas Livres.  Imediatamente diversos blogs e sites repdouzem. Até a grande imprensa foi obrigado a divulgar.

30/11- segunda-feira Os alunos começam os trancaços e param o trânsito em diversas avenidas. Isso se manterá até sexta-feira. Os telejornais da TV Globo afirmam que a destruição de escola estadual em Osasco seria culpa de militantes de esquerda que apoiavam o movimento.Tentativa desesperada para criar um fato para derrotar o movimento.

Ainda houve uma nota dos movimentos sociais, exigindo a saída do secretário da Educação e do seu chefe de gabinete.

1/12, terça-feira  Reportagem do Viomundo desmascara denuncia da Globo e a versão do governo Alckmin sobre a destruição da escola em Osasco. Esta matéria revela as estratégias sórdidas do governo paulista para promover a guerra contra os alunos, inclusive recorrendo ao uso de milícias e a invasão de escolas PM na capital, embora o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo tivesse proibido isso. A matéria mostra ainda a omissão da PM em reprimir os bandidos que quebraram a escola.

Neste dia, ocorreram duas ações de partidos políticos muito importantes:

* A bancada do PT entra com representação no Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP),  pedindo a saída do secretário da Educação e do seu chefe de gabinete, Fernando Padula. Justificativa:  atuação à frente da Secretaria, cujo ápice foi o desastroso processo de “reorganização” escolar e a declaração do secretário à CBN  de que sentia vergonha da Educação do governo Alckmin

Tanto o deputado Ivan Valente como a bancada do PT questionaram também a reunião de Fernando Padula,  na qual ele declarava guerra ao estudantes e o uso da polícia secreta para perseguir os movimentos sociais.

Uma ação judicial do Ministério Público que pedia a suspensão da reorganização na região de Presidente Prudente. Entre os argumentos utilizados, o de que  “a mudança na rede não visa a melhoria da qualidade de ensino, mas economia de recursos.

* Administrativamente o governo publica decreto para promover a reorganização da rede e o fechamento de  93 escolas.

2/12, quarta feira – Ouvidoria da PM decide apurar ação dos policiais nas ocupações de escolas.  Destaco este trecho de reportagem que saiu no Estadão a respeito do assunto:

“De acordo com o ouvidor, Julio Cesar Fernandes Neves, os dois casos já encaminhados ao MP tinham “mais indícios” de lesão aos alunos e as agressões foram gravadas em vídeo. Uma delas aconteceu na terça-feira na Escola Estadual Maria José, na Bela Vista, no centro de São Paulo. Os policiais entraram em confronto com os estudantes, “agredindo um deles no peito e derrubando-o no chão”. “Na sequência, fecharam a porta, tudo isso visto em vídeo que está nas redes sociais”, diz o ouvidor.

A outra denúncia foi de uma ocorrência registrada na escola Coronel Sampaio, em Osasco, na Grande São Paulo, em que PMs teriam jogado bombas nos alunos, “mas não impediram que invasores ateassem fogo no colégio”, segundo o ouvidor.

Neves defende que a Secretaria da Educação do Estado abra diálogo com os alunos e chegue a um consenso para evitar consequências “nefastas” que já estariam acontecendo, como nos casos de agressão aos manifestantes”.

Deste modo, as denúncias dos estudantes e do site Viomundo são comprovadas e o governo do Estado perde mais um vez.

3/12, quinta feira –  Os paulistas ficam  horrorizados com o autoritarismo do governador que se recusava a negociar, além da cenas de barbárie e truculência policial vividas nas ruas e transmitidas com brilhantismo pelos Jornalistas Livres e outros grupos, depois pela grande mídia.

Atendendo aos apelos  da sociedade paulista o Ministério Público e a Defensoria Pública entram com ação na Justiça, pedindo a suspensão da reorganização  e do fechamento das escolas, proposta pelo Governador Alckmin.

O cerco se fechava sobre o governo Alckmin e ficava claro para todos de bom senso que  era preciso agir para impedir a morte de algum aluno, como foi bem lembrado por pelo blogueiro Leonardo Sakamoto no dia anterior.

4/12, sexta-feira – O dia começa com o movimento paralisando várias avenidas com grande repressão. Os estudantes param a Avenida Paulista e fazem uma grande ciranda, mas como de costume são violentamente reprimidos.

Na Justiça, o governo Alckmin sofre nova derrota e o juiz de Guarulhos suspende a reorganização na cidade. Com isso, fica claro que a tendência do Poder Judiciário era rejeitar a proposta do governador.

A Folha de S. Paulo publica a queda da popularidade do governador,  mostrando que 61% dos paulistas apoiavam o movimento dos estudantes.

Outra notícia importante sai no Estadão, desmontando as  afirmativas do governo Alckmin de sempre negar  que a reorganização e o fechamento de escolas fossem para economizar recursos. Documentos do próprio governo paulista ao Ministério Público mostravam isso:

“No ofício, o governo afirma que a “gestão financeira” é um dos “objetivos” do plano. “A racionalização dos recursos usados, que se prevê na implementação do processo de reorganização das escolas, seja com a redução de despesas com custeio, equipamentos, materiais permanentes, obras, dentre outras, alinha-se com as limitações intrínsecas à possibilidade do acompanhamento proporcional dos recursos arrecadados pelo Estado”, diz o documento enviado em novembro, ao qual o Estado teve acesso com exclusividade”.

Lembro que a queda do orçamento para a Educação foi tornada pública em matérias do ABCD Maior, que apontou corte de R$ 2 bilhões para 2016, e do Estadão.

O governo paulista viu que perdeu a lutas das idéias nas ruas e perderia na Justiça. Assim, não sobrava saída a não ser o recuo e desistir da reorganização em 2016, apesar de ainda querer fazer esta barbaridade em 2017.

Mas até  anúncio teve arbitrariedade e atentado à liberdade de imprensa, pois não deixaram Jornalistas Livres e  CartaCapital  cobrirem a coletiva .

À tarde, ainda acontece o que os movimentos sociais, estudantes e a liderança do PT  tanto pediam: a queda do secretário da Educação.

5/12, sábado – Governo revoga decreto que implantava a reorganização escolar e o fechamento das escolas para 2016, mas o Ministério Público mantém a ação na Justiça, segundo os promotores:

“ (…)Mas a ação tem um objetivo mais abrangente, que é a retomada da discussão não apenas desse projeto, mas do Plano Estadual de Educação, que está na Assembleia Legislativa”.

Isso também fica evidente na entrevista da  dra. Mara Renata da Mota Ferreira, da Defensoria Pública, na sexta-feira.

Deste modo,  o Ministério Público mantém uma espada sobre a cabeça de Alckmin, visto que houve suspensão da reorganização, mas não o seu fim.

Esta narrativa procurou tratar da semana passada, mas devemos lembrar alguns fatos anteriores  tiveram muito peso em todo este processo, a começar pela mais longa greve dos professores e pela promessa não cumprida pelo governador de reajuste salarial, apesar do próprio e de secretário terem tido aumento.

A derrota de Alckmin foi por perdido a luta das ideias. Lembro que, em meados de outubro deste ano, o Viomundo publicou texto sobre a reorganização de Alckmin  mostrando que a reorganização era para cortar custos e não melhorar a qualidade da educação.

Destaco este trecho:

“Espera-se que o Ministério Público paulista aja rápido para que o aluno não seja mais uma vez punido por um governo que pensa  Educação somente como despesa e não como investimentoEste é o centro do debate. O governo paulista tem um rombo de mais de R$ 4,4 bilhões no orçamento  e quer fazer ajuste matando o futuro do nosso Estado e a expectativas dos jovens , especialmente da periferia.

Enfim, a mudança de Alckmin usa um verniz pedagógico para justificar diminuir custos. Só que joga fora a oportunidade causada pelo bônus demográfico com  a redução de jovens, que poderia, como já ocorre em outros países, diminuir o número de alunos por sala para propiciar uma educação de qualidade.

O governador Alckmin promove assim a destruição de perspectivas de futuro, especialmente para os mais pobres. Infelizmente, os interesses financeiros pautam a sua decisão e matam o futuro de nossa juventude. Lembro que, em 1995, uma reorganização foi feita, levando a fechamento de escolas e até prédios foram vendidos. A tal municipalização não melhorou a Educação e de lá para cá a qualidade só caiu…Isso é o que vai acontecer de novo, agora não mais como tragédia mas somente como farsa”.

No aprofundamento do debate, as universidades, especialmente Unicamp, USP e Unifesp, além de outras organizações da sociedade, foram percebendo  o mesmo e apontando uma série de contradições neste projeto.

Lembro que o movimento de resistência ao fechamento de escolas no governo Covas, mesmo derrotado, foi importante para mostrar aos alunos que escolas  que 150 escolas foram fechadas, algumas foram vendidas, e mais de  vinte mil professores demitidos, e o mais importante a qualidade só caiu.

O movimento social se apoderou destes argumentos para mudar o curso dos acontecimentos e fazer com as derrotas do passado preparassem as vitórias do presente.

Em 2016, a educação paulista ainda passará por uma revolução, pois as escolas experimentaram  uma nova maneira de ser escola, que é materializada na prática de arrumar este espaço público, e em duas falas que ouvi.

Uma delas: “ Numa semana (de ocupação) aprendi mais que em um ano” . A outra é que “ a escola dos alunos é muito mais legal que a outra”, visto as oficinas e atividades desenvolvidas nas escolas.

O meu mestre Paulo Freire deve estar dando pulos de alegria lá no  céu  e a esperança nos olhos destes alunos iluminam o mundo. Eles nos dão esperanças de um futuro melhor, ante um tempo tão marcado pelo autoritarismo, repressão e a negação do direito a cidadania.

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Comentários

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Tiamat

Ouvi de um conhecido que o Floriano Pesaro (aquele do higienismo contra os excluídos) estaria cotado para assumir a Secretaria da Educação. Alguém tem alguma informação sobre isto? Desde já bato na madeira…

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