Ricardo Melo: Do livro Operação Banqueiro ninguém quer falar

Tempo de leitura: 3 min

A quem o povo assusta?

03/02/2014

Ricardo Melo, na Folha, sugestão do Julio Cesar Macedo Amorim

Imagine o cenário. Vencido o prazo para os condenados da AP 470 pagarem as multas, nenhum apareceu. José Genoino, olhe só, alegou que o valor supera o preço de sua casa. Os outros tampouco respeitaram a sentença. O que aconteceria?

Pelo que se tem lido e ouvido, batata. “Mensaleiros do PT desprezam Justiça.” Ou então: “Além de truculentos e corruptos, petistas dão calote no Tesouro”. Ou parafraseando aquele ministro falastrão: “Eles merecem mais que o ostracismo: ademais de incomunicáveis, precisam apodrecer na cadeia e receber apenas uma refeição por dia. E mais: entrar para sempre na lista negra da Serasa!”.

Outra hipótese. Com dois ou três telefonemas, ou num regabofe no coração de Higienópolis, condenados se acertam com a banca e o dinheiro surge em segundos – o tempo de uma TED. Formalmente, tudo dentro da lei: não é crime receber auxílio para pôr contas em dia. Para os banqueiros, seria apenas uma gorjeta diante de lucros nunca antes imaginados. O juízo midiático, contudo, também seria inapelável. “Cai a máscara: bancos ajudam ‘companheiros’ a pagar multas.”

Surpresa (ou decepção) para muitos: nada disso ocorreu. Sem afrontar instituições, sem desrespeitar qualquer direito (diferentemente do que ocorre com os dos condenados), Genoino e cia. agiram como deveria ser habitual num partido de raízes populares: recorreram à militância. Quem se assustou? Todo mundo para quem não passa pela cabeça alguém doar dinheiro por acreditar em alguma coisa, alguma ideia, algum futuro.

A reação mostra o grau de envenenamento do clima político atual. Partiu-se para a troça. Alguns leitores pediram desde uma vaquinha para honrar carnês até auditoria implacável nas doações. Houve mais. Embaladas como coisa séria, reportagens acusaram os petistas de arrecadar mais dinheiro que a Pastoral da Criança! O que tem a ver uma coisa com a outra? Por acaso a Pastoral está em campanha? Pareceria mais razoável comparar o orçamento dessa ONG com fundos auferidos pelo Criança Esperança – mas aí a coisa complica diante do calibre dos interesses envolvidos.

O deputado tucano Jutahy Magalhães Júnior, por sua vez, exagerou no ridículo. “Isso é um acinte, um deboche.” Por quê? Talvez porque os condenados, em vez de seguir o recém-divulgado manual de propinas de empresas como a Alstom, optaram pela arrecadação popular e voluntária.

Não há anjos em política, mas a democracia em vigor prevê o respeito a decisões judiciais, até num caso polêmico como a AP 470. A democracia não obriga, contudo, ao conformismo bovino – exceto no caso da vigência de ditaduras disfarçadas ou quando se está sob o tacão de juntas togadas travestidas de supremas.

Muito ainda vai se falar da campanha de doações petista. Pode ser que impropriedades tenham sido cometidas. Mas certamente nada tão grave, por exemplo, como a montanha de denúncias fartamente documentadas no livro primoroso do jornalista desta Folha Rubens Valente, “Operação Banqueiro”. Como se sabe, a obra desvenda relações promíscuas entre Poderes da República e o personagem Daniel Dantas. Investigá-las ou não fica ao gosto do freguês.

Feitas as contas, o mais sincero entre os apavorados foi o líder do PMDB na Câmara, Eduardo Cunha. Como se discute o financiamento público nas eleições, o deputado sentiu a água subir: “Só o PT vai ter dinheiro. Se da cadeia ele arrumou isso, imagina da Esplanada”.

Qual o “crime” do partido? Para o deputado, o PT é o único com militância suficiente para arrecadar grandes quantias em defesa de ideais. Em vez de fazer o mesmo e disputar apoiadores entre o povo, a turma suprapartidária de Cunha prefere levantar dinheiro na surdina para melhor abafar suas próprias causas.

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Comentários

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Bonifa

O ministro Gilmar Mendes acaba de falar com todas as letras no Bom Dia Brasil da Globo: “Isso foi um fenômeno de lavagem! É dinheiro da corrupção!”. Ele se referia ao dinheiro das contribuições para pagar as multas dos réus petistas, impostas pelo STF no julgamento do mensalão.

Acontece que o ministro Gilmar sabe perfeitamente que o dinheiro arrecadado veio de contribuições honestamente dadas e recebidas. Sua intervenção midiática deve ser vista apenas como uma tentativa política de minimizar o enorme efeito que esta solidariedade aos réus petistas causou.

A solidariedade fez mudar de maneira sensível o “psicológico” da situação na opinião pública. Fez subir enormemente o moral de todos os petistas e simpatizantes. Os promotores do mensalão viam seu espetáculo naufragar numa onda positiva de solidariedade humana. Viam seus juízes se aproximarem cada vez mais de serem qualificados como monstros desumanos. Era preciso uma medida radical para acabar com este efeito positivo que se espalhava. E nada melhor do que uma declaração do grande e insuspeito ministro Gilmar de que pessoalmente acredita que o dinheiro veio da corrupção, e não da solidariedade.

Como as pessoas de bem devem lidar com uma situação como esta? Tanto esforço altruísta que se juntou para construir uma rede de solidariedade intrinsecamente bela, motivo de orgulho para quem fez as doações, para tudo isso virar fumaça na opinião pública e se transformar em mais ódio contra os petistas. Acreditamos que a melhor forma de lidar com isso será a construção de outra gigantesca e célere cadeia de solidariedade, para viabilizar na justiça um mega-processo contra o ministro Gilmar Mendes, de um modo como ele nunca jamais tenha visto.

Batista Nogueira

Desculpe pessoal por mudar de assunto, este ministro vulgo capitao-do-mato pode tudo? ex:ele pode continuar provocando as pesspas com açoes do tipo: manda prender Petistas e deixa bob jeferson livre, leve e solto? isto eh o nao uma provocaçao?

José Souza

Sobre as doações para o Criança Esperança não se levanta uma voz para dizer a mesma coisa que foi dita sobre as doações aos petistas. Só falta, agora, a direita propor uma lei proibindo campanhas a favor de petistas, especificamente. Já imaginaram se o juiz tivesse dito: gostaria de ver o famoso DARF de uma certa rede de tv. Como se resolveria isso?

Marat

O Roda Viva poderia aproveitar que convidou o Tuma Jr. para um debate, e convidar também o Rubens Valente!

Messias Franca de Macedo

… E outro tucano lambe-botas e carlista roxo Antônio Imbassahy e mais um piti: “vai ingressar nesta terça (04/05/14) na Corregedoria com uma representação por quebra de decoro parlamentar contra Vargas (PT-PR), em desagravo a Joaquim Barbosa, durante a sessão de ontem de reabertura dos trabalhos do Congresso.”

É VERDADE: esses pilantras DEMotucanos devem ter, no máximo, 03 (três!) neurônios funcionantes! Coitadas das sinapses!…

Lá isso é oPÓsição, sô?!…

República da [eterna] ‘Anã’ oPÓsição ao Brasil! “O cheiro do PÓ ‘cheiroso’ e dos cavalos ao do povo!”
Bahia, Feira de Santana
Messias Franca de Macedo

Gerson Carneiro

Contribuir nas campanhas de arrecadação para pagar as multas impostas aos petistas me trouxe um bônus de prazer: a ira de quem odeia o PT.

Que delícia.

Euler

Ontem, o programa Roda Viva da TV Cultura entrevistou o delegado Tuma Jr., com o principal objetivo: tentar envolver e desmoralizar o ex-presidente Lula. Não vimos darem o mesmo cartaz para outros autores e livros como: A Privataria Tucana e Operação Banqueiro.

No referido programa, feito sob encomenda, alguns “jornalistas” tentaram ressuscitar o caso do assassinato do ex-prefeito Celso Daniel. Ou seja, tirando dois ou três jornalistas (sem aspas) que atuaram com decência, e cobraram provas nas acusações ocas e partidárias do oportunista delegado, o programa se prestou ao descarado trabalho de queimação ao governo federal e ao PT.

Um absurdo o que a mídia faz, em pleno ano eleitoral, sem qualquer direito de resposta, sem qualquer preocupação ética com as pessoas atingidas, sempre somente as ligadas ao PT. Como se nos governos tucanos as falcatruas e desvios e propinas não fossem uma constante, mantidas impunes pela “justiça”, e blindadas pela mídia.

Isto não é democracia é uma verdadeira ditatura midiática, controlada pelos tucanos a serviço do que de pior existe no Brasil e no mundo. A alta Corte da “justiça” (com aspas) e a grande mídia realizam intensamente pequenos grandes golpes diários com o claro objetivo de derrotar o governo Dilma nas eleições deste ano.

    Créso

    Não teria dito melhor ! Excelente colocação das palavras ! Parabéns !

Paulo Vasco

Alguém poderia desenhar para o demotucano Lukas que o Ricardo Melo escreveu no seu artigo?

Álvares de Souza

Apenas uma observação que julgo procedente. Eu não sou petista, não faço parte, portanto, da militância. No entanto, contribui com Genoíno, Delúbio, e o farei com Dirceu e João Paulo Cunha. Penso que, como eu, muitos não petistas deram a sua contribuição e o fizeram por solidariedade à indivíduos condenados injustamente e, pior, submetidos à um processo de achincalhe, desrespeito e humilhação que beiram a perversão. Aos 73 anos de idade, nunca imaginei assistir a um massacre tão torpe como o que a mídia e, pior, a instância mais elevada do judiciário, praticaram contra seres humanos cujo único pecado foi o de pertencer a um partido político que, através dos seus filiados eleitos governantes, mudaram, definitivamente, os destinos do Brasil, gerando naqueles que se julgavam os donos do País, e que o foram até Lula chegar ao poder, um ódio capaz de todos os desatinos.
Por isto, acho que se deveria quantificar os não petistas que se juntaram nessa jornada cívica, para tornar mais desesperados ainda os que nunca esperavam que tal gesto ocorresse.

ma.rosa

Serão dois os demitidos, da “foia”! Rubens Valente e agora este jornalista, Ricardo Melo! Registrem o que estou escrevendo e aguardemos!

    lukas

    Quem será demitido da imprensa de esquerda?

Bonifa

Para a angústia do Eduardo Cunha, um ótimo e definitivo remédio: Financiamento público exclusivo de campanha política, sem quaisquer espécies de doações. Estas serão, de fato, perigosas para a paridade econômica de armas na batalha eleitoral.

Bonifa

Há alguns assuntos que estão bombando e não aparecem na imprensa escrita e na televisão. Quando aparecem, já é para tentar diminuir estragos de imagem e oferecer aos iludidos pela mídia uma versão que amenize a situação dos culpados. Deste medo a mídia tradicional vai ficando cada vez mais para trás.

RicardãoCarioca

Podíamos organizar uma vaquinha para o blog enviar um exemplar por dia para o FHC. Não enviar vários de uma vez, mas um por dia durante meses. Quem sabe para o Gilmar Dantas também…

Luís Carlos

Nem falam que Itaú (banco apoiador de Marina) e Unibanco foram flagrados pela Receita em sonegar mais de R$18 bilhões quando da fusão destes. Segundo alguns veículos de imprensa, corrupção de banqueiros não é notícia nem interessa ao povão. Esconder falcatruas dos amigos e carregar as tintas nas dos inimigos…
As arrecadações das doações demonstram o quão forte é a jdentificação popular com o PT e governo de Dilma/Lula, pois muitos que doaram sequer são filiados, para desespero da oposição e dos que negam importância de partidos e eleições.

maria cecilia vieira de godoy

Ricardo Melo é uma luz nas trevas lançadas, diariamente, pelos articulistas da folha.Recebo a folha em casa (infelizmente meu filho é assinante desse jornaleco, pseudo informativo), mas só leio Jânio de Freitas, Ricardo Melo, Bresser Pereira e alguns outros poucos sem ranço partidário. Como Lula, sinto azia qd leio a folha, o braço antipetismo, sempre tendenciosa em suas reportagens.

JMSM

Na FSP?
Falha da revisão? Como isto foi publicado?

lukas

Folha, a cada dia mais tucana, não é mesmo?

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