Mark Weisbrot: Apostando na crise para justificar a ditadura dos bancos

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O futuro econômico dos europeus foi sequestrado por perigosos ideólogos

Autoridades europeias, apoiadas pelo governo da Espanha, estão defendendo uma agenda política às custas da recuperação econômica

Mark Weisbrot, no diário britânico Guardian, em 30.05.2012

Tenho argumentado faz algum tempo que a crise recorrente da zona do euro não é guiada por demandas dos mercados por austeridade em um período recessivo, como se ouve frequentemente. Em vez disso, a causa primária da crise e de seu prolongamento é a agenda política das autoridades europeias — lideradas pelo Banco Central Europeu (BCE) e pela Comissão Europeia.

Estas autoridades (as quais, se incluirmos o FMI, constituem a troica que define a política econômica da zona do euro) querem forçar mudanças políticas, particularmente nos países mais frágeis, mudanças nas quais os eleitores destes países nunca votariam.

Isso está se tornando claramente óbvio aqui na Espanha, onde o governo — do direitista Partido Popular — tem a mesma agenda das autoridades europeias, talvez mais até que o FMI. O governo do PP tirou vantagem da crise para impor mudanças nas leis trabalhistas, que facilitam para os empregados ficarem de fora de acordos coletivos.

O governo também acabou com o direito dos trabalhadores de questionar demissões injustas. O objetivo é enfraquecer o trabalhismo como parte de uma estratégia de longo prazo para atacar o estado do bem estar social; estas questões não têm relação com a resolução da crise atual, ou mesmo com a redução do déficit.

O governo também determinou grandes cortes nos gastos com saúde, de 7 bilhões de euros.

Isso é comparável a cortar 25% do Medicaid [programa de saúde] nos Estados Unidos, o que seria devastador para os pobres e politicamente impossível. Outros 3 bilhões de euros serão cortados dos gastos da Espanha com educação.

Naturalmente, a redução do déficit na Espanha vai tornar pior a atual recessão — o governo da Espanha estima que o corte de orçamento deste ano, em si, vai reduzir o PIB em 2,6% .

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Num país que tem cerca de 25% de desemprego e mais da metade de seus jovens desempregados, isso deixará mais centenas de milhares de pessoas sem trabalho.

Os mercados financeiros têm um papel nesta confusão: ajudam a aumentar os custos de empréstimos da Espanha no momento em que investidores e especuladores vendem os papéis bancados pelo país.

A taxa de risco dos papéis da Espanha que vencem em dez anos atingiu 6,69%. Mas mesmo estas taxas não significam crise imediata e os mercados estão exagerando grandemente o risco de moratória.

A Espanha tem de rolar cerca de 85 bilhões de euros de sua dívida este ano, e mesmo que tivesse de emprestar tudo isso sob as taxas de juros atuais ou ainda maiores — o que é improvável — não faria grande diferença na sustentabilidade da dívida ou no pagamento de juros.

O pagamento de juros projetado para a Espanha este ano ainda está em 2,4% do PIB, o que é um valor moderado.

Muito mais importante, o Banco Central Europeu poderia facilmente intervir no mercado para derrubar as taxas de juros pagas pela Espanha, como fez em novembro passado e em outras ocasiões.

Isso não teria custo para os contribuintes europeus e requereria pequena intervenção, já que investidores privados e especuladores responderiam imediatamente, comprando papéis da Espanha se o valor deles aumentasse e a taxa de risco diminuisse.

O BCE não fará isso porque está usando a crise para forçar “reformas” direitistas em toda a zona do euro, — não apenas na Grécia, Portugal, Irlanda, Espanha e Itália — mesmo nos países mais ricos, que em dezembro assumiram o compromisso de equilibrar o orçamento de forma drástica, que seria politicamente impossível nos Estados Unidos.

Enquanto isso, o governo Obama mandou mais uma vez a subsecretária do Tesouro, Lael Brainard, para a Europa. Depois de dar uma dura na Grécia, ela vai tentar persuadir autoridades europeias a pelo menos reduzir o risco de um derretimento financeiro.

A crise na Europa, que tem o maior sistema bancário do mundo, está afetando os mercados financeiros e ameaça a campanha de reeleição de Barack Obama.

Tristemente, hoje em dia o governo Obama provavelmente tem mais influência na política econômica da zona do euro que os milhões de eleitores europeus cujo futuro econômico foi sequestrado por ideólogos perigosos.

Isso deixa claro o que a zona do euro e os governantes dela fizeram com um grupo de paises relativamente democráticos, que tinham uma população com renda ascendente.

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