Jorge Bermudez e Ronald dos Santos, sobre a monkeypox: Vamos ter um novo apartheid de vacinas?

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Ilustração: Politize

Monkeypox: Vamos ter um novo apartheid de vacinas?

Por Jorge Bermudez e Ronald Ferreira dos Santos*, especial para o Viomundo 

Como vimos no recente exemplo trágico da pandemia pelo novo coronavírus, todas as manifestações de solidariedade — por acesso universal, direitos humanos e compartilhamento de tecnologias e vacinas — foram atropeladas pela ganância da indústria farmacêutica e pelo nacionalismo exacerbado dos países centrais, contrapondo mais uma vez saúde x comércio.

Em que pesem o apartheid, o negacionismo e a relutância em confrontar a pandemia, avançamos na vacinação contra a covid-19. 

Hoje, as estatísticas nos mostram que 80% da população brasileira acima de 5 anos está vacinada, sendo 45% tomaram a terceira dose ou dose de reforço.

Mesmo assim, a progressão é lenta. Além disso, o mundo volta a sofrer a ameaça de novas variantes do SARS-CoV- 2 (o vírus causador da covid-19) com maior transmissibilidade e capazes de superar a imunidade vacinal.

Para complicar, o mundo e a humanidade podem vir a enfrentar uma nova ameaça: a monkeypox.

Embora as vacinas contra a varíola sejam consideradas eficazes contra esta zoonose, a erradicação da doença desde 1980 e a consequente interrupção da imunização podem fazer com que ela ressurja com maior gravidade.

A partir de 1970, casos humanos foram identificados em 11 países africanos, mas também no resto do mundo.

Hoje são contabilizados mais de 12.500 casos no mundo, sendo cerca de 1.400 nos EUA e 310 no Brasil.

A Organização Mundial da Saúde (OMS), em sua última reunião do Comitê de Emergência, informou que, desde maio deste ano foram-lhe relatados 3.040 casos oriundos de 47 países.

O Comitê de Emergência definiu que ainda não é necessário categorizar a doença como emergência de saúde pública de interesse global. Porém, deve se reunir novamente nos próximos dias e reanalisar o quadro.

Mesmo com a erradicação da varíola em 1980, o receio de que pudesse reaparecer fez com que novas vacinas fossem  desenvolvidas. E que certamente também teriam utilidade em frear a transmissão humana da monkeypox.

As vacinas tradicionais de primeira geração não se encontram mais disponíveis em escala geral.

É nessa direção que o instituto Bavarian Nordic, da Dinamarca, desenvolveu a vacina Imvanex (MVA-BN smallpox vaccine).

Já está aprovada na União Europeia (UE) e no Canadá, é a única vacina em vias de autorização pela FDA, dos EUA. 

Os acordos da Bavarian Nordic com EUA, UE e Canadá estão apenas começando e certamente provocarão um novo apartheid de vacinas no mundo.

A iniciativa norte-americana BARDA (Biomedical Advanced Research and Development Authority) que desempenhou  papel essencial no enfrentamento da pandemia de covid-19, já anunciou entendimentos com a Bavarian Nordic para a comprade 7 milhões de doses da vacina para varíola.

A farmacêutica dinamarquesa, portanto, multiplica seu faturamento a passos rápidos.

Certamente o seu mercado ficará restrito aos países centrais que pagam antecipadamente.

Enquanto isso os países periféricos ficarão relegados a segundo plano.

Como a história se repete em ciclos, vamos ter um novo apartheid de vacinas contra a monkeypox?

*Jorge Bermudez é pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP/Fiocruz)

*Ronald Ferreira dos Santos é presidente da Federação Nacional dos Farmacêuticos (Fenafar)

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Zé Maria

Se depender do Cartel de Laboratórios
Multinacionais Norte-Ocidentais, vale dizer,
da OTAN, sim, teremos Reserva de Mercado
aos Países Ricos pelas Matrizes Coloniais
[EUA + União Européia + Reino Unido]
Detentoras do Oligopólio Mundial da
Produção de Fármacos e Imunizantes,
ou seja, dos Insumos Farmacêuticos
Ativos (IFA).

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