Régis Barros: Cracolândia, do ético ao terapêutico

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Régis Barros: O Estado e a sociedade estão dispostos a investir para recuperar uma proporção desses usuários ou querem limpar a limpar as ruas? Fotos: Arquivo pessoal e Rovena Rosa/Agência Brasil

Cracolândia, do ético ao terapêutico

Por Régis Barros*

Pois bem, novamente, a questão está posta sobre a mesa. A cidade de São Paulo não sabe o que fazer com o problema “cracolândia”.

Tenta-se criar um algoritmo ou uma equação que solucione o problema rapidamente. É impossível de fazê-lo!

Por esse motivo, se o Estado dispersa os dependentes de crack, inclusive usando de violência, eles se reagrupam noutros espaços espalhados pela cidade.

Se o Estado restringe a circulação com qualquer medida, por exemplo, internação compulsória, outros usuários vão se agrupando e muitos dos que foram internados, ao terem alta, retornam a esse agrupamento.

Estamos diante de um dilema não só de saúde pública, mas também, sobretudo, um dilema filosófico e ético.

E, nesse aspecto, faço um recorte com enfoque na internação psiquiátrica compulsória. Ela é um instrumento capitulado em lei e que, se bem empregado, acaba sendo um recurso necessário.

O problema habita no mau uso desse modelo de internação, pois, se assim for feito, teremos um ato que não terá eficiência e que açoitará a ética por esmagar a autonomia individual e coletiva.

Nesse contexto, tirando o efeito político e a retórica ideológica, encher ônibus com usuários de crack e levá-los compulsoriamente a uma internação não resolverá absolutamente nada.

De certo, de início, haverá uma sensação de limpeza do espaço urbano, porém acreditem: em poucos meses esses mesmos espaços estarão preenchidos por outros e, talvez, pelos mesmos usuários.

Não há solução mágica, pois, se houvesse, tudo já teria sido resolvido.

Há de se pensar entendendo que temos um limite em termos práticos. Há de se entender que o problema tem vários vetores e que, muitas vezes, são individuais.

E para completar e finalizar, ressalto que a abordagem dessa situação é financeira e estruturalmente muito onerosa.

Então, termino com essa pergunta reflexiva: o Estado e a sociedade estão dispostos a investir para recuperar uma proporção desses usuários ou estão dispostos a limpar as ruas?

*Régis Barros é médico psiquiatra, professor universitário e integrante do Médicos em Movimento DF

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