Ucrânia que não sai na mídia: Desde o início, Kiev optou pela violência

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O congressista Liashko (de boné) dá uma de robocop para mostrar serviço 

21 de julho de 2014

Manipulando os fatos

A Anistia Internacional e a Guerra na Ucrânia

VLADISLAV GULEVICH, no Counterpunch

A Anistia Internacional divulgou recentemente um relatório de “virar o estômago” sobre a violência na Ucrânia do Leste (“Sequestros e Torturas no Leste da Ucrânia” – veja, por exemplo, a cobertura que a BBC deu ao relatório). De acordo com o documento, os atos de violência foram perpetrados primordialmente por grupos separatistas pró-Rússia.

O relatório da Anistia Internacional e sua conclusão a respeito da responsabilidade dos rebeldes pela maior parte da violência não se sustenta e tem pouca relação com a realidade. A violência na Ucrânia, em geral, não é analisada com propriedade e o relatório é bastante tendencioso. Não são os rebeldes e sim o exército ucraniano e as forças pró-EuroMaidan [Nota do Viomundo: Movimento que derrubou o presidente constitucional da Ucrânia] os responsáveis pelos sequestros e abusos.

Primeiramente, os rebeldes da Ucrânia do Leste contam com o apoio de quase 100% da população local. Eles não têm necessidade de cometer qualquer tipo de violência contra os locais. O exército ucraniano, ao contrário, é visto como um inimigo cruel e os soldados ucranianos sentem a animosidade dos locais.

Uma lógica simples questionaria se é o exército que tem sentido a necessidade de reprimir seus adversários locais usando da violência.

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Ainda por cima, basta falar com qualquer um dos milhares de refugiados da Ucrânia do Oeste para ouvir histórias de métodos bárbaros usados pelo exército para quebrar a resistência, para qualquer um se convencer de que o exército ucraniano é responsável pela maioria dos sequestros e torturas.

Em segundo lugar, é sabido que o EuroMaidan contava com o apoio de organizações neonazistas ucranianas.

Depois do sucesso do EuroMaidan, seus líderes foram empossados na recém formada polícia e nos batalhões da Guarda Nacional (“Azov”, “Donbas”, etc.).

De tempos em tempos a mídia internacional fala do passado neonazista destas unidades militares ucranianas, mas na maior parte das vezes, esse fato é ocultado. É difícil esperar deste soldados algum respeito por direitos humanos ou o respeito a qualquer outro tipo de lei.

Os fatos mostram que as autoridades do EuroMaidan iniciaram a campanha do terror imediatamente após derrubarem o governo, ou seja, bem antes do começo da guerra. A espiral de violência que se alastra agora na Ucrânia do Leste é a sequência do drama geopolítico chamado EuroMaidan.

Além disso, para observar toda a escala de violência na Ucrânia é preciso levantar informações sobre sequestros, torturas e outros abusos em todo o país e não somente na Ucrânia do Leste. E o período estudado deve ser mais extenso: é necessário levar em consideração toda a violência praticada desde a vitória do EuroMaidan e não somente o que aconteceu desde o começo das hostilidades.

Quando o novo governo pós-EuroMaidan foi formado ele desencadeou medidas repressivas sem precedentes que se tornaram mais e mais estritas e violentas. Policiais e suas famílias foram os primeiros alvos. Eles foram ameaçados anonimamente, seus apartamentos queimados e alguns policiais foram mortos.

Os policiais não foram os únicos perseguidos, mas qualquer pessoa conspicuamente leal ao governo anterior. Jornais inaceitáveis foram forçados a fechar, jornalistas independentes foram presos.

O movimento pró-europeu mais radical, “Right Sector”, promoveu a ideia de que “a revolução continua e vamos caçar os inimigos da revolução”.

Depois disso, ativistas civis foram submetidos a ataques brutais e os mais ativos deles foram presos.

Agora Kiev vai ainda mais longe. Seguindo o exemplo dos EUA no Iraque, as autoridades ucranianas estão produzindo um jogo de cartas com os rostos dos comandantes rebeldes e também com os rostos do jornalistas “errados”, para distribuir aos soldados na Ucrânia do Leste. O exército deve prendê-los ou matá-los.

Depois do EuroMaidan, a Ucrânia se tornou um país cheio de presos políticos. O número de jornalistas e escritores conhecidos que teve que escapar do país é grande: Alexander Chalenko, Rostislav Ishchenko, Vladimir Rogov, eu, e muitos outros.

Até mesmo grandes congressistas do parlamento ucraniano, como o político anti-EuroMaidan Oleg Tsarov, tiveram que deixar a Ucrânia ameaçados de prisão.

Antes de fugir, Tsarov foi atacado por um bando de ativistas do EuroMaidan e selvagemente espancado.

O vídeo do ataque e as imagens de Tsarov machucado, com as roupas rasgadas, foi exibido na TV. A casa dele em Dnepropetrovsk foi queimada por coquetéis molotov lançados por criminosos “desconhecidos” muito conhecidos.

Agora Tsarov dá assistência jurídica a oficiais de polícia e ativistas perseguidos pelas autoridades. De acordo com Tsarov, muitas pessoas estão sendo presas em toda a Ucrânia e as prisões estão se enchendo de presos políticos.

O último caso foi o da prisão de Alexander Samoylov, o vice-reitor da Universidade Internacional Eslavônia em Charkov. A foto de Samoylov espancado, com manchas escuras em torno dos olhos, está circulando na internet.

A violência contra rivais ideológicos se transformou em propaganda política para os políticos ucranianos que dão apoio ao EuroMaidan com o objetivo de dissuadir. Congressistas do conhecido partido xenofóbico e nacionalista Svoboda entraram à força no escritório do diretor do Canal Nacional de TV Ucraniano, o espancaram e o forçaram a pedir demissão. Eles não gostaram da maneira com que o canal de TV cobriu o conflito na Criméia entre Moscou e Kiev.

O congressista notório e conhecido do partido Radical, Oleg Liashko, é famoso por suas ações de relações públicas na zona de hostilidades. Ele quase sempre aparece por lá acompanhado de um grande número de guarda costas e demonstra sua atitude com relação à população da Ucrânia do Leste.

Existem vários vídeos que mostram Liashko humilhando seus adversários e ameaçando matá-los – como o vídeo em que Liashko e seus guarda costas forçaram rudemente um deputado local de Slawiansk a entregar o cargo e ameaçaram linchá-lo em praça pública – ou ameaçando jogá-lo na cadeia; como no vídeo em que Liashko interroga um homem de 68 anos com um saco na cabeça e ameaça mantê-lo na cadeia para o resto da vida.

Vale à pena mencionar que em março de 2014, um mês antes do começo das hostilidades entre Kiev e os rebeldes das províncias, quando ainda era possível dialogar, Liashko mandou prender um dos líderes da Ucrânia do Leste, Arsen Klinchaev.

Isso foi feito de forma rude e humilhante e Liashko participou pessoalmente da ação. Klinchaev foi preso em seu escritório e não com uma arma na mão, mas foi tratado como um terrorista perigoso.

No lugar do diálogo, Kiev escolheu a violência.

Vladislav Gulevich é jornalista ucraniano e analista politico. Ele fugiu para a Rússia recentemente e pode ser contatado no seguinte e-mail: [email protected].

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