Lei paulista que autoriza venda de 25% dos leitos do SUS a planos de saúde será julgada na próxima terça

Tempo de leitura: 5 min

por Conceição Lemes

Importante batalha para o futuro do Sistema Único de Saúde (SUS) vai ser decidida na próxima terça-feira, 15 de maio, no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP).

Os desembargadores José Luiz Germano, Cláudio Augusto Pedrassi e Vera Angrisani, da Segunda Câmara de Direito Público do TJ-SP, julgarão  o recurso do governo paulista contra a decisão do juiz Marcos de Lima Porta, da 5ª Vara da Fazenda Pública, que derrubou a lei nº 1.131/2010.

A Lei da Dupla Porta, como é conhecida, permite aos hospitais públicos geridos por Organizações Sociais de Saúde (OSs) vender 25% dos seus leitos e outros serviços a planos privados de saúde e particulares.

“A lei 1.131/2010 lesa o direito do cidadão à saúde. É a terceirização-privatização da saúde em São Paulo”, denuncia o médico pediatra e de Saúde Pública Gilson Carvalho, que convoca entidades de saúde e  sociedade civil. “Ajamos já contra a usurpação de 25% dos serviços dos SUS para servir às organizações sociais.”

“Esperamos que os desembargadores decidam pela defesa da população usuária do SUS e não permitam a destinação de leitos do SUS a particulares e usuários de planos de saúde”, defende o médico Renato Azevedo Júnior, presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp). “Os contratos entre operadoras de planos de saúde e OSs que administram hospitais estaduais poderiam, com respaldo da ‘lei da dupla porta’, privilegiar a assistência aos pacientes de convênios e particulares, em detrimento dos usuários do sistema público.”

“A lei 1.131/2010 é injusta, inconstitucional, vai contra a ética médica e está errada do ponto de vista ético-social”, acrescenta Azevedo. “Fatalmente ela levará à dupla fila; será uma forma dos pacientes particulares  e de planos de saúde furar a fila no SUS.

Pela “porta 1”, entram os usuários do SUS. Pela “porta 2”, apenas os conveniados e particulares.  O argumento dos defensores da dupla-porta é que o pagamento dos serviços ajudaria a pagar a conta dos doentes do SUS.

A questão é que, nas mesmas instituições públicas, pacientes SUS têm diagnóstico e tratamento mais tardios do que conveniados ou particulares para males idênticos. E aí está x do problema, até porque esses hospitais foram construídos com recursos do SUS.

“A lei A lei 1.131/2010 é uma política Robin Hood às avessas, tira dos mais pobres para dar às empresas privadas de saúde e aos mais abastados”, denuncia o médico Arthur Chioro, presidente do Conselho de Secretários Municipais de Saúde do Estado de São Paulo (Cosems-SP) e secretário de Saúde de São Bernardo do Campo, no Grande ABC. “Reduz em até 25% a capacidade dos hospitais públicos que hoje já é insuficiente para atender aos usuários do SUS. É uma afronta às constituições estadual e federal. É uma lei anti-SUS [Sistema Único de Saúde]. Os planos de saúde vão economizar e paulistas pagarão a conta.”

A Lei da Dupla Porta é o maior ataque desferido contra o SUS desde o PAS [Plano de Atendimento à Saúde], do Maluf, que, da mesma forma, entregou os serviços públicos ao setor privado.

SERRA, GOLDMAN E ALCKMIN CONTRA O CLAMOR DA SOCIEDADE CIVIL

Teoricamente as OSs são entidades filantrópicas. Só que, na prática, funcionam como empresas privadas, pois o contrato é por prestação de serviços.

A lei de OSs, de 1998, estabelecia que apenas os novos hospitais públicos do estado de São Paulo poderiam passar para a administração das OS.  Porém, uma lei de 2009, do então governador José Serra (PSDB), derrubou essa ressalva. Ela permite transferir às  OSs o gerenciamento de todos os hospitais públicos do estado.

Em 2010, a lei 1.131 do então governador Alberto Goldman (PSDB), aprovada pela Assembleia Legislativa paulista autorizou os hospitais gerenciados por OSs a vender  25% dos seus leitos dos SUS privados de saúde e particulares. Em julho de 2011, ela foi regulamentada pelo atual governador Geraldo Alckmin (PSDB) e passou a valer.

Só que, em agosto de 2011, atendendo à representação de mais de 50 entidades da sociedade civil, o Ministério Público do Estado de São Paulo (MPE-SP), por meio dos promotores de Justiça Arthur Pinto Filho e Luiz Roberto Cicogna  Faggioni, da Promotoria de Justiça dos Direitos Humanos – Área de Saúde Pública,  deram entrada na Justiça de ação civil pública contra a Lei da Dupla Porta, com pedido liminar.

O juiz Lima Porta acatou a representação do MPE-SP e concedeu a liminar, proibindo a venda de 25% dos serviços do SUS a planos privados de saúde. A Secretaria Estadual da Saúde de São Paulo recorreu da decisão, mas o desembargador José Luiz Germano negou o agravo. Alguns trechos da decisão histórica, que na próxima terça-feira será julgada.

 “A saúde é um dever do Estado, que pode ser exercida por particulares. Esse serviço público é universal, o que significa que o Estado não pode distinguir entre pessoas com plano de saúde e pessoas sem plano de saúde. No máximo, o que pode e deve ser feito é a cobrança contra o plano de saúde. Para que isso ocorra já existem leis permissivas…”

“A institucionalização do atendimento aos clientes dos planos particulares, com reserva máxima de 25% das vagas, nos serviços públicos ou sustentados com os recursos públicos, cria uma anomalia que é a incompatibilização e o conflito entre o público e o privado, com as evidentes dificuldades de controle”.

“O Estado pretende que as organizações sociais, em determinados casos, possam agir como se fossem hospitais particulares, mesmo sabendo-se que algumas delas operam em prédios públicos, com servidores públicos e recursos públicos para o seu custeio! Tudo isso para justificar a meritória iniciativa de cobrar dos planos de saúde pelos serviços públicos prestados aos seus clientes? Porém, é difícil entender o que seria público e o que seria privado em tal cenário. E essa confusão, do público e do privado, numa área em que os gastos chegam aos bilhões, é especialmente perigosa, valendo apena lembrar que as organizações sociais não se submetem à obrigatoriedade das licitações nas suas aquisições”.

“O paciente dos planos de saúde tem a sua rede credenciada, que não lhe cobra porque isso já está embutido nas mensalidades. Se ele precisar da rede pública, poderá utilizá-la sem qualquer pagamento, mas sem privilégios em relação a quem não tem plano. A criação de reserva de vagas, no serviço público, para os pacientes de planos de saúde, aparentemente, só serviria para dar aos clientes dos planos a única coisa que eles não têm nos serviços públicos de saúde: distinção, privilégio, prioridade, facilidade, conforto adicional, mordomias ou outras coisas do gênero”.

Em tempo 1.  Entre as entidades que estão contra a Lei da Dupla Porta, figuram: Conselho Nacional de Saúde (CNS), Conselho dos Secretários Municipais de Saúde do Estado de São Paulo (Cosems-SP), Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp), Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva (Abrasco), Associação Paulista de Saúde Pública (APSP), Centro Brasileiro de Estudos da Saúde (Cebes), Conselho Regional de Serviço Social de São Paulo –  Cress SP, 9ª Região, Fórum das ONG Aids do Estado de São Paulo, Grupo de Incentivo à Vida (GIV),  Grupo Pela Vidda-SP, Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Associação Nacional dos Médicos Residentes  (Instituto de Direito Sanitário Aplicado (Idisa), Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (MORHAN) e Sindicato dos Médicos de São Paulo (Simesp).

 Em tempo 2. Se os usuários de planos de saúde acham que o problema não lhes diz respeito, pois acreditam que serão atendidos nesses hospitais de excelência e alta complexidade, sinto desapontá-los.

Primeiro, nem todos os planos serão aceitos. A tendência é os contratos serem fechados com os planos melhores; os demais, ficarão a ver navios, como já acontece nos hospitais públicos de ensino que atendem convênios e particulares.

Segundo, hoje, vocês têm condições de arcar com os custos de um bom plano. Mas quem garante que amanhã continuará a ter?  Todos nós estamos sujeitos às trombadas da vida, portanto pensar solidariamente hoje nos que precisam, pode beneficiar vocês, mesmos, no futuro.

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Comentários

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H. Back™

Isso poderia ser também chamado de seleção natural forçada. Em um futuro próximo, só existirão pessoas com plena saúde. Os doentes têm a tendência de desaparecerem.

Eliseu Pinto Teixeira

Paulo Chacon.
Os americanos querem ser os donos do mundo.
Os paulistas/paulistanos de serem os donos do Brasil

Eliseu Pinto Teixeira

Conceição Lemes, li todo seu trabalho. Preparei mentalmente meu comentá-
rio. Li todos comentários feitos, e, bem feitos. E…quando cheguei ao fim, vi que os qe me antecederam já haviam escrito tudo que eu pretendia dizer.
Só me resta uma reflexão. O preconceito que uns paulistas/paulista-
têm em relação a nós Nordestinos…que somos “burros”
Só me resta pedir a Paulo Chacon que me deixe assinar em baixo do comentário dele. Eliseu Pinto Teixeira

H. Back™

Devemos encarar o estado de São Paulo como um tubo de ensaio do neoliberalismo brasileiro. O que ocorre lá, a tendência é se propagar para todo o país. Então o brasileiro deve se preparar prá coisas piores do que essas da venda dos hospitais públicos prá iniciativa privada.

Mariac

Sabe qual a revista onde os paulistanos adquirem instrução? Veja, KKKKKKK

Sergio Santos

ABSURDO! Como pode uma lei dessas ser aprovada? Só poderia ser mesmo em são paulo, um ninho tucano. O SUS é um programa federal e nenhum magistrado pode considerar constitucional uma lei facista como essa. O povo vai pagar a conta e nunca mais será atendido num hospital público (a menos que seja via plano de saúde). ATENÇÃO SOCIEDADE BRASILEIRA. E a OAB vai ficar calada?

Rose SP

Isso é mais uma mostra do tipo de administração tucana,incompetência e total descompromisso com o social. E aí paulistanos? Vão continuar votando nessa gente? Êta estado sem senso!

Fabio Passos

E a privataria neoliberal avança em SP sob o desgoverno tucano…
Saúde como um privilégio para quem pode pagar.
Uma mercadoria e não como direito igual para todos os seres humanos.

Antonio

A próxima batalha da Dilma é acabar com a corja do PSDB que domina a Saúde no Brasil. Os bandidos se instalaram na Agência Nacional de Saúde e estão fazendo da vida dos doentes brasileiros um inferno, que muitas das vezes vira caixão de defunto, tanto os doentes do SUS quanto os dos convênios médicos – os convênios são estelionatos cheios de mumunha. Espero que Dilma consiga sanear o País dessa quadrilha nojenta e asquerosa.

Antonio

Desses lesa-pátria a gente pode esperar coisa muito pior. Isso é fichinha perto do que eles são capazes de fazer. Agora, quem tá na roda é a Justiça de São Paulo. Vamos ver se ela está dominada por essa corja petulante e bandida.

Gil Rocha

A saúde pública no Brasil é
uma vergonha.
Sai governo entra governo e a
novela é a mesma.
E essa lei é uma vergonha.
Não existem hospitais particulares?

Paulo Chacon

E o geraldinho”opusdei”alckmin é médico. Que vergonha! Este é o tipo de gentinha que o povo de SP elege para governar(?) o estado. O paulista/paulistano adora votar em bandido e em quem vai por a corda no pescoço dele. Adora votar em ademar de barros,janio, serra, maluf, pitta, covas, alckmin, kassab, ou seja, só lixo.

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