Da necessidade de eleger uma bancada de esquerda

Tempo de leitura: 4 min

Desalojados do poder

Maria Cristina Fernandes, no Valor Econômico
06/08/2010

Ao deixar o Planalto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva desalojará do poder o movimento sindical. É muito pequena a chance de o sindicalismo manter com o eleito, seja qual for, a interlocução e o peso alcançados neste governo. Nas duas candidaturas de oposição o afastamento é explicitado pelas alianças partidárias e programáticas que os sustentam. Na campanha petista o estranhamento vai desde os desacertos em torno do programa de governo do partido à ausência de qualquer interlocutor do movimento entre seus estrategistas.

Ao longo de sua carreira no serviço público, Dilma Rousseff, apesar de egressa do trabalhismo, nunca se aproximou do movimento sindical. Como ministra da Casa Civil, foram encontros majoritariamente empresariais que pautaram sua agenda apesar da tentativa das centrais de marcar presença. Como candidata, trata com desenvoltura da abertura de capital de estatais como a Infraero e os Correios, tema que, nas campanhas presidenciais de Lula, os sindicatos fizeram de cavalo de batalha contra tucanos inertes à estratégia da mistificação.

Esse afastamento é uma sinalização de que, no próximo governo, a retomada de propostas como a desoneração da folha ou a reforma da Previdência encontrará menos resistências internas, ainda que seja cedo para supor que a divisão de cadeiras no Congresso lhe seja favorável.

Ao se iniciar, este governo tinha ambas as propostas entre suas prioridades. Chegou a propor, sem sucesso, o fim da multa de 40% do FGTS, mas conseguiu aprovar mudanças tão ou mais significativas que as do governo anterior na Previdência, como a cobrança dos inativos, a instituição do redutor do benefício e a elevação da idade mínima.

A pauta foi suspensa com o mensalão, cujo enfrentamento levou o governo a convocar as centrais sindicais para a comissão de frente. Só seria retomada em 2007 com a apresentação pelo Executivo do projeto que institui a previdência complementar para o funcionalismo.

Pela proposta, todo servidor que ingresse no setor público depois da aprovação da lei teria direito a um teto previdenciário equivalente ao da iniciativa privada (hoje R$ 3,4 mil). Quem quisesse ganhar mais que contribua com um fundo de pensão. O projeto parte do pressuposto de que o Estado não deve ser onerado pelas aposentadorias mais altas.

Em mesa de debates durante o 10º encontro da Associação Brasileira de Ciência Política que acontece esta semana no Recife a professora da USP Marta Arretche mostrou como as desigualdades no mercado de trabalho são a principal agenda social que este governo deixou inacabada.

Ao longo do governo Lula programas sociais como o Bolsa Família permitiram acesso milhões a conta bancária e a um mínimo de consumo. O crescimento da economia elevou o nível de emprego a patamares históricos. Mas na população em idade de trabalhar não são poucas as diferenças no acesso à cidadania.

Um fosso separa o trabalhador informal de um celetista com férias e repouso semanal remunerado, vale transporte, seguro desemprego e contribuição previdenciária do empregador e de um estatutário que tem estabilidade, licença, direito à greve paga pelo erário e aposentadoria acima do teto do INSS.

Marta Arretche reconheceu que a legislação é insuficiente para explicar disparidades aprofundadas ao longo de ciclos econômicos que sempre contaram com grandes exércitos de reserva de mão-de-obra. Da mesma forma, o pleno emprego na Europa tem que considerar as levas de imigrantes que deixaram o continente nos últimos séculos e as baixas ocorridas com a Segunda Guerra Mundial. Mas em lugar algum do mundo a redução das desigualdades foi alcançada sem mudanças legais.

Listou os três governos europeus mais bem sucedidos na promoção de reformas que diminuíram essas desigualdades nos anos 1990 e em todos identificou em comum uma coalizão parlamentar de esquerda. Na França de Lionel Jospin a coalizão reuniu socialistas, comunistas e verdes, na Itália de Dini a reforma aprovada pela aliança de esquerda foi a mesma que havia derrubado o primeiro governo Berlusconi e, na Holanda, a entrada do partido trabalhista no governo foi condicionada ao apoio às mudanças.

Marta credita a paralisia das reformas em parte às incertezas em relação à viabilidade eleitoral da bancada do PT na disputa pós-mensalão. Na eleição de 2006 as pesquisas indicavam que o grau de identificação com a legenda tinha sofrido um baque, mas isso não impediu que o partido fizesse uma bancada maior.

As mudanças ocorridas na bancada do PT em 2006 – a redução de parlamentares da região centro-sul ligados a bandeiras sindicais e o aumento na proporção de cadeiras do Norte e Nordeste conquistadas pela associação com programas sociais e emendas parlamentares – devem se intensificar na eleição de outubro.

O novo perfil da bancada do PT pode indicar uma maior permeabilidade às propostas de redução das desigualdades no mercado de trabalho. Além da previdência complementar dos servidores há uma infinidade de projetos que foram contidos no Congresso, como a criação das fundações estatais, a limitação do gasto com pessoal e a regulamentação do direito de greve.

Entre os sindicalistas, a aposta é outra. Como não haveria no mercado eleitoral proposta que afugente o de capitais, restaria ao partido radicalizar ao lado das bandeiras do movimento. De acordo com essa tese, isso não teria sido possível no governo Lula pelo compromisso com a Carta aos Brasileiros. O PT não poderia afugentar os mercados que o presidente, a muito custo, havia acalmado. Desta vez, não há fios desencapados na sucessão, o que liberaria o PT a agir em favor das teses que o movimento acredita serem de esquerda.

Se a tese parece razoável num cenário de vitória tucana, as chances de que vingue num eventual governo Dilma estão diretamente associadas à crença de que Lula continue bancando o movimento mesmo longe do Planalto. A pergunta que fica é por que Lula, se estivesse interessado na permanência da hegemonia sindical, teria escolhido uma candidata que não soma meia dúzia de horas de assembleia.

Sindicalistas e empresários passaram a travar uma batalha pela prioridade das reformas trabalhista e sindical. O mensalão jogou Lula no colo de sua base social e as centrais acabaram descolando seu reconhecimento legal. O crescimento acelerado da economia e a fartura do crédito aquietaram o patronato.


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Comentários

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Sagarana

Isso eu sempre tive curiosidade de saber: a carta ao "povo" brasileiro vai continuar valendo?

Ed.

Essa eu não vou nem comentar…
Ih, já comentei!

francisco.latorre

besteirinha. pra confundir.

..

Jorge

texto confuso e conservador, pois ataca a CLT e os direitos do trabalhador querendo sugerir que o PT faria isso. Absurdo. O PT jamais atuará contra os direitos trabalhistas, com Dilma ou sem Dilma.

    Lenita Santos

    Completa imbecilidade esse artigo. Nem entendo, de fato, porque foi postado aqui, um blog que me foi indicado como "sinal de vida inteligente" no jornalismo (que jornalismo?!) brasileiro.

    Dizer que, saindo Lula, algum "movimento sindical" estaria saindo com ele é a mais rematada asneira que já ouvi, simultaneamente sobre Lula e sobre o movimento sindical. Que eu saiba, só algumas senhoras-de-Santana ainda insistem nessa conversa de "Lula o metalúrgico" e "sapo barbudo", como a jornalista que escreveu esse artigo.

    Aliás, cheguei da Europa há alguns tempos e NINGUÉM por aqui avalia o respeito, de fato, a reverência com que se fala do presidente Lula por aí. Os brasileiros, sitiados pelo pior jornalismo do mundo não sabem é de nada. Infelizmente. Sou a favor de ninguém ler o jornalismo brasileiro. Mas… também aqui no blog do Azenha, sou obrigada a ler "Valor Econômico"? Por quê?

    Estou de olho

    Calma. Quer dizer que a Associação dos Sociólogos aí de não sei onde está declarando que o governo Lula "deixou inacabada" não sei que "agenda" aí?

    Mas e os sociólgos brasileiros que, além de terem deixado inacabada — pelo menos até o instante em que escrevo! — a salvação do universo e a redenção universal de todos os justos… esperava que o governo Lula "acabasse" todas as agendas?

    Quem precisa desses sociólogos brasileiros e suas 'agendas' e suas opiniões?! O último sociólogo brasileiro que andou por aqui, elegeu-se sob a promessa de que salvaria o mundo, comprou depois a própria reeleição, quebrou o Brasil TRÊS VEZES (quem garante é o Delfim Neto, que até ajudou a quebrar!) e não vejo nenhuma associação de sociólogos brasileiros exigindo que o ex-FHC e atual nada "acabe" "agenda" alguma. Muito ruim esse artigo. Só li até a metade. Começou a conversa de sociólogo, desisti e vim comentar. Será que nem o Blog do Azenha se pode ler mais?

O Brasileiro

Lembro de quando eu era criança e assistia filmes americanos onde os sindicatos eram supervalorizados. Nos quais se denunciava o estrago que a corrupção nos sindicatos poderia fazer com o trabalhismo americano. Com o passar dos anos, o bem-estar social foi sendo substituído pelo consumismo nos EUA, e por isso vemos a triste realidade de a maioria dos americanos estar longe do tal "sonho americano"!

dukrai

Primeiro a jornalista faz uma análise do governo Lula e demonstra por A + B que o governo do sapo barbudo detonou com os direitos do trabalhador, só não fez pior porque o mensalão o obrigou a se abrigar no movimento sindical e as reformas foram suspensas temporariamente.
Em seguida afirma que vai piorar porque a Dilma não tem ligações sindicais. Affffffffffe!
A Dilma não é torneira mecânica, sindicalista rs e nem de São Bernardo mas achar que ela vai estar à direita do Lula é um exercício de futurologia baseado no voluntarismo da próxima presidente. Achar que as desigualdades no mercado de trabalho é o principal ponto de uma agenda social abandonado pelo governo Lula é de uma estupidez estonteante da jornalista, por mais que cite os doutores da USP em conclave. O Lula, mesmo sem marxista, se bateu a vida inteira do lado dos trabalhadores contra a exploração do capital, esta é a questão básica, inclusive quanto ao combate ao mercado informal e/ou ao estímulo à sua regularização trabalhista.
A opção do PT em privilegiar a eleição na Câmara e Senado, em detrimento de governadores, é estratégica no sentido de implementar uma política de Estado nas áreas de energia, Pré-sal e Petrobrás e defesa, só para citar dois pontos vitais na afirmação da nação. Onde for possível acordo político, a reforma política e tributária mas deve continuar no varejo dar uma no prego e outra na ferradura, capital/social, corrigidas as distorções do czar do BC, Meirelles.
Concluindo: a bancada do PT é ordenada, é histórico o seu crescimento e não deve sofrer variações ideológicas centro-sul sindicalista e norte-nordeste assistencialista, esta é uma visão tacanha e direitista de um PT fisiológico-sarneyzista e me irrita ter que perder tempo detonando com essas abobrinhas mal-ajambradas e capengas, mas conhecer o adversário faz parte do jogo político.

fkerouac

Briga trabalhista existe na europa há mto tempo, pena que este texto "isento" só fala das ações "legais" a partir de 90.
E jogar fora mais de 200 anos de luta dos trabalhadores.

Frodobal

É o fim da República Popular Sindicalista, para o bem de todos!

M.A.P

Prezado jornalista
Na verdade nunca li um estudo realmente sério sobre as distorções que o longo e intenso fenômeno hiper-inflacionário causou sobre a sociedade brasileira.
Funcionários das chamadas carreiras de Estado e empregados das empresas Estatais tinham a inflação do periodo reposta e mais ganhos de produtividade em seus contra-cheques durante décadas.
Não é por acaso que o período inflacionário durou tanto por essas bandas.
Espero que esses privilégios terminem.

monge scéptico

Vejo LULA todo dia na mídia alternativa. O serra faria a política de subserviência a USA,
Não há futuro para a humanidade fora do socialismo e, da distribuição mais justa de renda,
que o capital jamais fará a contento. Logo uma bancada forte de esquerda seria necessária
para tentar manter os mínimos ganhos dos menores(economicamente).

Marcus

Acabei de assistir o debate pelo youtube… Impressionante, nada, nada, nada… ninguém falava nada!

Meu voto é Dilma.

Mas, só o Plínio teve personalidade e clareza. Muito importante o trabalho que ele está fazendo, colocando um ponto de vista que não existe na mídia mercantilista viciada e que candidatos de esquerda evitam, pois podem perder votos se defenderem, por exemplo, a invasão de terras pelo MST.

Mas parece que o verdadeiro candidato real a presidência acha que não pode falar a que veio.

A Dilma caiu no armadilha ou ela acredita mesmo que a carga tributário do Brasil deve cair. (eita assunto espinhoso)
Qualquer um de esquerda sabe, ou deveria saber, que a carga tributária brasileira está longe de ser a maior do mundo. A países de bem estar social que essa carga chega a 50% do PIB, só que com uma diferença fundamental, o PIB deles é maior que o nosso e a população é menor que a nossa. Ou seja, eles arrecadam 10 vezes mais por habitante, e isso que garante escola pública de qualidade, saúde pública monopolista de qualidade!!!

Não dá para acreditar num governo de esquerda que acredita que possa dar igualdade de oportunidades para o cidadão brasileiro, tenha nascido em família rica, tenha nascido em família pobre, com uma carga tributária menor que a que estamos promovendo hoje.

Só para ter uma idéia, a Inglaterra, conhecida por suas políticas neo liberais, tem uma carga tributária maior que a brasileira. Os EUA que, apesar de ter uma carga tributária menor que a nossa, arrecada 4 vezes mais o que arrecadamos no Brasil.

Meu voto é Dilma, mas a minha única felicidade foi ver o Plínio de Arruda Sampaio. Os demais não foi só chato ouví-los, foi mais que isso, foi triste.

klaus

Com o apoio do PT e de Lula, a possibilidade que o PMDB aumente a bancada é muito grande. Haverá uma dependencia maior no futuro governo, quem quer que seja eleito, do PMDB. boa sorte!

    Gerson Carneiro

    Por isso o Lula antecipadamente escalou o Temer para vice da Dilma. O Serra em sua eterna novela do vice perdeu o trem bala e enfiou o pé na jaca.

    Jairo_Beraldo

    Concordo com voce, Klaus. Infelizmente não cola no Lula os petistas. Ficou ainda uma imagem ruim deles perante o povo. O PMDB sairá bem nesta eleição. Ruim para a Dilma. Poderá ser uma forma de barganha deles contra ela.

    toni gatto

    Quem sabe a gente empresta uns Demos e Alguns tucanoides (se é que os haverá after 03/10..). Agradecemos os votos de boa sorte. Afinal, nem só de caviar vive o homem: uma cerva com sardinha assada na laje, tbm anima a platéia.

O Brasileiro

É por essas e outras que a eleição para deputado federal é fundamental.
Com os senadores não se pode contar pois são na sua maioria empresários, megalatifundiários e ex-governadores.
Temos 3 candidatos de direita com visibilidade, e 2 de esquerda com pouca ou nenhuma visibilidade.
Lula pode equilibrar isso atribuindo também às centrais sindicais importantes conquistas de seu governo!

pablo

espero que, além da bancada parlamentar, as pastas ministerias mais estratégicas (agricultura, defesa, comunicações, minas e energia) também sejam ocupadas pela esquerda.

Helio Barboza

É o PIG textualizando, de forma subjetiva, o que quer que o Movimento Sindical pense. O PIG não entendeu, até agora, que o BRASIL MUDOU, e não será ele (o PIG), com historinhas pra boi dormir, que irá interferir. Coitado do MORIBUNDO PIG!!!!

Edson Augusto

Me pareceu matéria encomendada. Por quem? – Não é difícil deduzir. Objetivos? – Óbvios. Possibilidades de atingí-los? – Nulos. Quem conhece Dilma Roussef e sua participação no Governo Lula acha essa matéria, no mínimo, incoerente se não maliciosa.

    Marat

    També me pareceu encomendada, como quase tudo o que o PIG produz…

sergio

dilma manterá o que o lula conquistou.

    Jairo_Beraldo

    Não seria mais correto dizer que ela seguirá o que Lula conquistou? As vezes a coisa foge um pouco da faceta do descendente.

Orlando Bernardes

Isto é o ovo da serpente! Só que não cola, não! Vão ter que segurar o rojão e junto com o Zé Ladeira A Baixo.

laura

O texto fala em " plataforma de esquerda" mas defende o neo-liberalismo e a perda de direitos trabalhistas. XÔ!

    @marisps

    Enrolação pura! Vou te copiar, se me permite: XÔ!

Julio Silveira

Verdadeiro texto de Direita.
Essa tática criar suspeição a Dilma dentro da sua base eleitoral, e principal força de seu partido é tatica de guerra,
Insuflar desconfiança entre o combatentes, para baixar o moral da tropa.
Essa Direita é muito dissimulada, fosse antes ninguem notaria, mas agora está dificil para eles se passarem por analistas isentos já que está cada vez mais escancarado os instrumentos que utilizam.

    H.Pires

    Concordo integralmente com o Companheiro Julio. Perfeito. Temos mais e mais que desmascarar essa direita dissimulada, mas sempre apátrida.

    Jairo_Beraldo

    Joelma está solta aqui no blog…cuidado…é onde se escondem na "tucanoland"!

    H.Pires

    Perfeito

Reginaldo

O texto nao diz coisa com coisa. E a 'tese' sobre a redução das desigualdades, na Europa dos anos 1990, não faz nenhum sentido. Briga com a história e com todos os indicadores sociais. A única coisa que faz sentido nessa matéria, talvez, seja o título – a necessidade de eleger uma bancada de esquerda. Mas isso seria importante hoje, há quatro anos, há 20. Parece aquelas matérias de jornalista que são requentadas em épocas definidas do ano. Exemplo: "Nao vai faltar pescado na semana santa".

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