Pepe Escobar: Líbia, exposta a negociata EUA-sauditas

Tempo de leitura: 4 min

1/4/2010

por Pepe Escobar, Asia Times Online

Tradução do Coletivo da Vila Vudu

Vocês invadem o Bahrain. Nós derrubamos Muammar Gaddafi na Líbia. Essa, em resumo, é a negociata acertada entre o governo de Barack Obama e a Casa de Saud. Duas fontes diplomáticas na ONU confirmaram, independentes uma da outra, que Washington, pela boca da secretária de Estado Hillary Clinton, deu sinal verde para que a Arábia Saudita invadisse o Bahrain e esmagasse o movimento pró-democracia no país vizinho, em troca de um voto “sim” da Liga Árabe para aprovar uma zona aérea de exclusão sobre a Líbia – único ‘fundamento’ que levou à Resolução n. 1.973.

As fontes são dois diplomatas, um europeu e outro de país BRICS; os dois falaram separadamente, a um professor e intelectual norte-americano e ao jornal Asia Times Online. Não terão seus nomes divulgados. Um dos diplomatas disse: “Por isso não era possível votar a favor da Resolução 1973. Acompanhávamos o argumento segundo o qual Líbia, Bahrain e Iêmen são casos similares; para nós, era preciso nomear missão de investigação para ir à Líbia. Mantemos nossa posição: entendemos que a resolução não é clara e pode ser interpretada na direção de mais beligerância.”

Como Asia Times Online noticiou, é mito que toda a Liga Árabe teria aprovado a zona aérea de exclusão sobre a Líbia. Dos 22 membros plenos, só 11 votaram. Seis desses são membros do Conselho de Cooperação do Golfo, o clube de reinos/ditaduras do Golfo apoiados pelos EUA, dos quais a Arábia Saudita é o cão-chefe. A Síria e a Argélia votaram contra. A Arábia Saudita teve de dobrar apenas outros três membros, para obter o número necessário de votos presentes, e aprovar o que queria aprovar.

Tradução: só 9, dos 22 membros da Liga Árabe votaram a favor da zona aérea de exclusão. A votação foi, de fato, operação conduzida pela Casa de Saud, com o secretário-geral da Liga Árabe Amr Moussa interessado em mostrar serviço a Washington, interessado em obter a presidência do Egito.

E assim aconteceu que, um dia, houve um Grande Levante Árabe de 2011. E então, inexorável, desceu sobre ele a contrarrevolução comandada por EUA-sauditas. (…)

Digam o que disserem Barack Obama, Clinton e outros, nada alterará os fatos – resultado da suja dança do par EUA-Sauditas. Para saber quem lucra com a intervenção militar na Líbia, veja aqui. E acrescente àquela lista de beneficiários também a dinastia al-Khalifa no Bahrain, uma cesta sortida de fabricantes e mercadores de armas e todos os suspeitos neoliberais de sempre loucos para privatizar tudo que encontrem, na nova Líbia – até a água. E nem se falou até aqui dos abutres ocidentais que já sobrevoam a indústria de petróleo e gás da Líbia.

Mas a mais surpreendente descoberta, de fato, é a extensão da hipocrisia do governo Obama. Pode-se dizer que nunca antes na história desse mundo vira-se governo dos EUA apresentar um descarado golpe geopolítico no norte da África e no Golfo Persa, como se fosse operação humanitária. E quanto a chamar a nova (mais uma!) guerra dos EUA contra nação muçulmana, de mera “ação militar cinética”? (…)

Prendam os suspeitos de sempre

(…) Na Líbia, vê-se hoje um curioso desenvolvimento: a OTAN está permitindo o avanço das forças de Gaddafi ao longo da costa mediterrânea, deixando que façam recuar os “rebeldes”. Já há dois dias não há novos “ataques aéreos cirúrgicos”.

O objetivo da OTAN é, provavelmente, chantagear também o Conselho Nacional de Transição [ing. Interim National Council (INC)] infestado de desertores líbios, inclusive um ex-ministro da Justiça Mustafa Abdel Jalil; o ex-secretário de planejamento Mahmoud Jibril; e o ex-morador de Virginia, vizinho da CIA nos EUA por 20 anos e “novo comandante militar” dos “rebeldes” Khalifa Hifter. O ingênuo, embora decente e louvável Movimento de Jovens 17 de Fevereiro – que começou o levante em Benghazi – foi completamente posto de lado.

Aí está a primeira guerra africana da OTAN, como o Afeganistão foi a primeira guerra da OTAN no Centro/Sul da Ásia. Já firmemente configurado como braço armado da ONU, esse OTAN-Globalcop está em marcha, implementando o “conceito estratégico” que foi aprovado na cúpula de Lisboa em novembro passado (sobre isso, vide “Bem vindos ao OTANSTÃO”, 20/10/2010, Asia Times Online, em português em http://redecastorphoto.blogspot.com/2010/11/bem-vindos-ao-otanstao.html)

A Líbia de Gaddafi tem de ser varrida do mapa, para que o Mediterrâneo – o mare nostrum da antiga Roma – torne-se lago da OTAN. A Líbia é a única nação do norte da África não subordinada ao AFRICOM, ao CENTCOM ou a qualquer dos muitos “parceiros” da OTAN. Outras nações africanas não parceiras da OTAN são a Eritreia, A República Árabe Democrática Sawahiri, o Sudão e o Zimbabwe.

Além do mais, dois membros da “Iniciativa Istambul de Cooperação” [ing. Istanbul Cooperation Initiative] da OTAN – o Qatar e os Emirados Árabes Unidos – combatem hoje ao lado do AFRICOM/OTAN, pela primeira vez. Tradução: parceiros da OTAN e do Golfo Persa fazem hoje guerra na África. A Europa? Provinciana demais. O Globalcop já deu as costas à Europa.

No duplifalar oficial do governo Obama, há ditadores que podem contar com “o braço dos EUA” – por exemplo, o Bahrain e o Iêmen. Esses podem relaxar e fazer, na prática, virtualmente o que bem entenderem. Quanto aos candidatos a “alteração de regime”, na África, no Oriente Médio e na Ásia, esses, abram o olho. O OTAN Globalcop vai pegar vocês. Com negociatas e acordos sujos, ou sem.


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Comentários

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Silvio I

Azenha:
Quem esta olhando de camarote e resfregando as mãos, e Osama Bin Laden. Está esperando ansioso que caia a Casa de Saud,em Arábia Saudita, assim ele se faz cargo, da Arábia.

Wallerstein: A grande manobra diversionista na Líbia | Viomundo – O que você não vê na mídia

[…] Leia aqui o artigo de Pepe Escobar sobre a negociata EUA-sauditas em relação à Líbia   […]

Heloisa Villela: Obama 2012, repeteco do discurso de mudança | Viomundo – O que você não vê na mídia

[…] Leia aqui “Líbia, exposta a negociata EUA-sauditas”, de Pepe Escobar. […]

Jair de Souza

É o momento propício para rever (ou ver, para quem ainda não tinha visto) o documentário de John Pilger "A guerra que você não vê – The war you don't see". Depois de vê-lo, ou revê-lo, entenderemos bem a razão para os meios de comunicação do grande capital (FSP na vanguarda no Brasil) resolverem retransformar Gadaffi num demônio, depois de terem passado a última década em afetuoso romance com ele. O imperialismo não dorme no ponto, e sabe que pode contar com sua mídia, nos EUA, na Europa e, logicamente, aqui no Brasil. Relembro o link para acessar o documentário: http://www.youtube.com/watch?v=jzSmGf0vJgw

Gu4rd1ao

A maioria dos americanos se opuseram à intervenção directa na Líbia, 48% acreditam que Washington não deveria derrubar Kaddafi , enquanto 41% aprovam o plano. E esse ataque militar ordenado pelo Obama (aqui do Brasil) desencadeou intenso debate no Congresso sobre o custo económico do conflito no momento em que democratas e republicanos estão envolvidos em uma luta para diminuir o investimento em vários programas, pois a autorização do ataque não partiu do Congresso americano, mas apenas do Obama (fantoche), foi uma decisão da Elite para dar continuidade à agenda.
E enquanto Khadafi avança sobre as cidades petrolíferas, os rebeldes recuam mais, rebeldes esses que de acordo com o almirante americano James Stavridis, disse que pode haver um pequeno número de militantes da al-Qaeda e outros terroristas da Líbia, (eu diria: os terroristas da CIA e todas as suas “crias”) mas que o número não é significativo.
Não existe vitória e nem democracia, a Elite controla absolutamente tudo e manipula os meios de informações para que pensemos e criemos de acordo com o que eles desejam. mais em.. .http://forum.antinovaordemmundial.com/Topico-os-bastidores-da-guerra-na-l%C3%ADbia-e-profecia%E2%80%A6

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SILOÉ

OLHA SÓ QUE MARAVILHA !!!
A gente se infiltra e incita o povo à uma revolução para derrubar o ditador, que quer nacionalizar o seu petróleo.
Aí, a gente ajuda fornecendo as armas mais modernas, e os aviões super poderosos, que rasgando os céus do Oriente médio e com mundo todo assistindo pela televisões quer maior propaganda gratuita que essa?
Além disso eles se matam entre si: não perdemos nenhum soldado e ficamos dono do petróleo.
Quer melhor guerra do que essa???

Marco Antonio

Duro é ouvir no Jornal Nacional a Fátima Bernardes chamar a OTAN de "a aliança do Ocidente".

Bonifa

"Amr Moussa interessado em mostrar serviço a Washington, interessado em obter a presidência do Egito." É muito provável que Moussa seja o candidato de Obama à presidência do Egito. E os americanos devem estar "trabalhando" intensamente junto aos militares egípcios do governo provisório. Os movimentos que fizeram a revolução evidentemente estão a acompanhar estes lances do jogo. E estão organizando um novo encontro na Praça Tahir para "salvar a revolução egípcia".

Bonifa

Escobar falou em outro artigo que os gregos roubaram a Atena Políada de Tróia e mesmo assim não conseguiram tomar a cidade. Mas os gregos-sauditas não quiseram roubar a Atena Políada do Barém: por via das dúvidas, resolveram explodi-la com uma carga de dinamite. Puseram abaixo o Monumento à Pérola da Praça da Pérola, não restando dele pedra sobre pedra. Entenderam que aquele monumento era a Deusa que dava forças aos rebeldes pró-democracia. Evidentemente estão enganados, estes infiéis árabes.

Marcius Cortez

Aonde moro há dois personagens singulares. Um é um figurão da política paulista, o xerife da rua. O outro é um sem teto de índole violenta e gritos dementes. O pobre homem vive só, em companhia de um cachorro de pêlo negro.Semana passada,o figurão e a Polícia sumiram com o cara. No meio da confusão, flagrei o xerife levando o cão para casa enquanto o dono do animal entrava em desespero. Contei esse acontecimento para meu neto. A criança me perguntou quais eram os nomes dos dois. Disse-lhe,o desabrigado chama-se Líbia. O cachorro, Petróleo.

RICHARD W PEREIRA

Os planos americano-sionistas foram pro BELELÉU

Os quebrados economicamnete ( ESTADOS UNIDOS, FRANÇA, INGLATERRA, ESPANHA, ITALIA), embarcaram numa mentira que agora vai ser difícil de desmanchar.

A estória que o povo LÍBIO em sua maioria queria derrubar GADAFFI caiu por terra e como já falei em outro comentário é simples entender o por quê.

Vejamos a LÍBIA segundo dados da própria ONU , tem a melhor educação e saúde do continente africano , tem a melhor renda per capita e um IDH superior ao do BRASIL., mas o GADAFFI É UM TIRANO.

Ora o GADAFFI é SUNITA , e 80% do povo LÍBIO TAMBEM O É , logo entende-se porque ele distribuiu ao povo mais de 1.000.000 de armas , por certo para virarem-se contra ele é que não foi .

Ou a corja ocidental inventa uma maneira de invadir a LÍBIA , ou GADAFFI vai rir muito da mentira apoiada pela podre imprensa mundial . ( HÁ POUCAS E HONROSAS EXCESSÕES).

richard weissheimer pereira

    SILOÉ

    Deus te ouça!!!

SILOÉ

Com o fracasso na segurança de usinas nucleares, o petróleo se tornou mais vital ainda, principalmente para quem não produz.
Antes que qualquer país produtor queira nacionalizar o seu, a "globalcorp" vem passa por cima de tudo e de todos, desrespeitando a soberania, o livre comércio e o povo dessas nações e se apossam na mão grande com desculpas esdrúxulas desse valioso recurso mineral.
O Brasil que se cuide. Em épocas de crise:
"FARINHA POUCA, MEU PIRÃO PRIMEIRO".

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