Para enfrentar ação articulada Alckmin-Temer, organizadores querem cordão de parlamentares, personalidades públicas e artistas
Tempo de leitura: 4 minimagens Daniel Arroyo
por Luiz Carlos Azenha
A PM paulista agiu de forma deliberada para tocar terror e desencorajar participação nas próximas manifestações, concluiram hoje em São Paulo líderes de movimentos sociais, o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) e o senador Lindberg Farias (PT-RJ).
Eles estavam presentes quando policiais dispararam sem motivo contra cerca de duas mil pessoas que ainda estavam na dispersão da marcha de domingo, no Largo da Batata, Pinheiros, zona Oeste de São Paulo.
As milhares de pessoas que participaram do ato — 100 mil, no cálculo dos organizadores — desceram tranquilamente a avenida Rebouças, sem incidentes.
A maioria era de mulheres e jovens. Quando encontravam os grupos de policiais que monitoravam a marcha, cantavam um de dois refrões: “ai que coincidência, não tem polícia, não tem violência” ou “vai acabar, não acabou, vai acabar a Polícia Militar”.
Segundo organizadores, 400 pessoas foram destacadas para evitar a ação imprópria de manifestantes, o “vandalismo” que vem sendo destacado pelo Grupo Globo, a central do golpe que construiu a narrativa para justificar a derrubada de Dilma Rousseff.
Uma análise das ações da PM paulista nos últimos dias demonstra que os soldados agem com sangue nos olhos.
Num episódio denunciado pela TV Record, o motorista de uma viatura da PM atropelou um manifestante com o intuito de prendê-lo. Usou o automóvel como arma.
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Em outra cena, um policial atira gás de pimenta dentro de um bar em que pessoas apenas diziam que não pretendiam tirar “selfies”com PMs — não havia ali objetivo que não o de vingança — tarefa que não consta das atribuições de quem detém o monopólio da violência estatal.
Cenas que você pode ver acima, filmadas por Daniel Arroyo, mostram que a PM atirou bombas de gás inclusive no meio do trânsito. Se uma delas acertasse o interior de um automóvel poderia afogar o motorista ou passageiros — e se houvesse uma criança? Na estação de metrô da Faria Lima, onde a PM atirou bombas, uma imagem registra um bebê sendo conduzido às pressas para longe da fumaça.
O ex-ministro Roberto Amaral, atingido por uma bala de borracha no braço, registrou em seu blog:
Ao final, [o ato] começou a dispersar-se, pacificamente, repito, recebendo dos organizadores a recomendação de ‘evitar provocações’. Não adiantou, porque o projeto da PM era espancar (como forma canhestra de intimidação) respondendo a provocações ou não. Já distantes do centro da aglomeração, que, repito se dispersava, ordeira e pacificamente, estávamos, além de mim, os médicos Aitan e Helenita Sipahi, septuagenários como eu, o deputado Paulo Teixeira e o senador Lindbergh Farias, que dava uma entrevista. Foi quando nos vimos atingidos por uma onda de gás lacrimogênio e eu senti no braço esquerdo um forte impacto seguido de dor aguda. Havia sido atingido por um projetil de borracha. Já era muito difícil respirar, a garganta ardia, nossas vozes sumiam, os olhos lacrimejavam, a visão se tornara turva e, sem alternativas, corremos em busca de saída que era simplesmente sair do foco e procurar respirar. Fomos amparados por jovens populares que nos guiaram pelas ruas do bairro. Atrás de nós explodiam bombas de gás lacrimogênio e de efeito moral e lá no fundo jatos d’água. O cenário me fez retornar aos anos de chumbo da ditadura militar. Assim se inaugura a ‘ditadura constitucional’ de Temer-Alkcmin. Nunca foi tão necessário resistir.
A juíza Kenarik Boujikian passou por experiência semelhante na manifestação anterior: teve um ferimento no supercílio, conforme registrou em texto publicado no Viomundo.
NÃO TEM LADO
O homem que comandou a repressão no Largo da Batata é o tenente-coronel Henrique Motta. O UOL registrou que, confrontado por um manifestante, ele afirmou que politicamente não tem lado. “Eu represento o Estado. Eu estou aqui para manter a lei e a ordem”.
Uma visita à página do oficial da PM no Facebook demonstra, no entanto, que ele compartilha de forma contínua posts antipetistas.
Um deles ironiza a estudante Deborah Fabri, da Universidade Federal do ABC, que teve o olho esquerdo perfurado na explosão de uma bomba. “Quem planta rabanete, colhe rabanete”, diz o post.
Motta também reproduziu opinião de jornalista segundo a qual a culpada pela perda parcial de visão de Deborah foi a presidente derrubada Dilma Rousseff.
Na ação da PM pode haver uma dose de acerto de contas contra aqueles enxergados como adversários ou inimigos políticos.
ARTICULAÇÃO
Para o deputado federal Paulo Teixeira e o senador Lindberg Farias, no entanto, a ação da PM domingo foi articulada com o governo federal.
O objetivo seria esvaziar as próximas manifestações. Como indício, o fato de que o hoje ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, foi secretário de Segurança Pública de Geraldo Alckmin.
Teixeira se referiu à prisão de 26 jovens pela PM antes do protesto da Paulista. Eles foram encaminhados ao DEIC, a Diretoria Estadual de Investigações Criminais.
Um delegado do DEIC pretendia enquadrá-los por formação de quadrilha. “Qual foi o crime?”, perguntou Teixeira. “Não houve vítima”, acrescentou. O delegado disse que seria um “crime de mera conduta”.
Os presos ficaram mais de 8 horas sem acesso a advogados. Um deles denunciou que um PM tentou “plantar” uma barra de ferro como prova de que ele estaria disposto a cometer violência.
Na audiência de custódia, o juiz concordou com os advogados de defesa e determinou que todos fossem colocados em liberdade.
Além de denunciar a truculência policial à Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA, o senador Lindberg disse que seria necessário provocar o Ministério Público Estadual de São Paulo, responsável pelo controle externo da polícia. Isso já foi feito pela Associação dos Juízes pela Democracia.
Para as próximas manifestações a intenção é de organizar cordões de isolamento formados por parlamentares, personalidades e artistas.
A Frente Brasil Popular e a Frente Brasil Sem Medo anunciaram quatro mobilizações ainda em setembro: dia 7, com concentração na praça Oswaldo Cruz e passeata pela Brigadeiro Luís Antonio; dia 8, concentração às 17 horas no Largo da Batata; dia 13, em Brasília, contra a redução de direitos do funcionalismo público; dia 22, das centrais sindicais contra as reformas trabalhista e previdenciária.
“Temer tem pavor da mobilização popular”, disse o senador Lindberg. Depois do que viu domingo em São Paulo, concluiu “podemos chegar a 200, 500 mil pessoas nas ruas”.
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