Laurindo Lalo Leal: A Universidade e a Ley dos Médios

Tempo de leitura: 3 min

A fundamentação existente na Ley dos Médios argentinos tem grande contribuição acadêmica e poderia servir como referência para a Universidade brasileira. Ao invés de infindáveis e insossas discussões sobre “teorias da recepção”, teríamos o pulsar da vida real das nossas sociedades.

por Laurindo Lalo Leal Filho, em Carta Maior

Passou desapercebido por aqui. Não fosse a menção feita pelo jornalista Eric Nepomuceno, na revista Carta Capital, poucos ficariam sabendo que a Ley de Médios argentina está sendo implantada, apesar da oposição feroz dos grandes grupos de comunicação locais.

No noite de 21 de junho, a presidenta Cristina Kirchner apareceu em rede nacional de televisão para fazer um anúncio capaz de tirar o sono dos controladores monopolistas da radiodifusão. O governo abria, naquela data, uma licitação para a concessão de 220 novas licenças de serviço de audiovisual no país.

Como determina a lei metade dessas concessões será destinada a emissoras privadas e a outra metade dividida entre os governos estaduais, o federal e as organizações sem fins lucrativos. Fórmula encontrada para romper com oligopólio existente hoje na comunicação argentina.

Claro que a mídia comercial brasileira esconde esses avanços e quando fala da Ley de Médios argentina é para atacá-la, chegando habitualmente a taxá-la de censura, quando trata-se exatamente do oposto. Seu papel é o de permitir o acesso aos meios de comunicação de um número muito maior de atores sociais, hoje sem voz.

Mas aos que se opõem à lei interessa a omissão e a desinformação. Para isso usam uma estratégia eficiente: apropriam-se de um símbolo facilmente compreensível, como é a censura, e com ele carimbam a lei, interditando o debate de forma liminar.

A legislação argentina mereceria no Brasil estudos e debates mais sérios e aprofundados. As críticas feitas por aqui são superficiais, ecoando apenas o temor dos controladores da mídia nativa com o possível contágio da experiência vizinha.

Não é levado em conta o formidável trabalho de pesquisa realizado para se chegar ao texto final. Seus 166 artigos não caíram do céu. São resultado de um levantamento minucioso daquilo que existe de mais avançado no mundo, em termos de legislação para área das comunicações.

Dos meios comerciais não se pode esperar nada, além das críticas habituais. Os meios públicos pouco se dedicam ao tema e a internet o trata de forma esporádica. Mesmo as redes sociais, com conteúdos mais críticos, não tem como aprofundar a discussão e acabam, em determinados momentos, dialogando com os grandes meios nos mesmos níveis por eles impostos.

Resta como alternativa a Universidade, teoricamente menos sujeita às imposições externas. Mas parece que, no geral, ela não despertou ou não se interessou pelo assunto. Falo, obviamente, dos setores universitários ainda não cooptados pela grande mídia, propiciadora de cursos e eventos destinados ao conformismo e a alienação.

Fico a pensar na riqueza de um debate não só da Ley de Médios argentina, mas das experiências de democratização das comunicações que vêm sendo articuladas na Venezuela, Bolívia, Equador, Paraguai e Uruguai, por exemplo.

Ao invés de infindáveis e insossas discussões sobre “teorias da recepção”, tão ao gosto dos acadêmicos alinhados com “status quo” da comunicação, teríamos o pulsar da vida real das nossas sociedades.

A Universidade – pública ou privada – repousa sob um tripé formado pelo ensino, a pesquisa e a extensão. Um tema como o aqui proposto atenderia com desenvoltura esses três objetivos.

Colocaria o aluno em contato com a disputa que se trava no continente em torno do papel social da comunicação, deixando mais claro o cenário onde se dará, no futuro, sua atuação profissional.

Propiciaria uma ampliação no campo das pesquisas, necessitadas cada vez mais de interdisciplinaridade. O estudo da comunicação só ganha concretude quando dialoga com o Direito e as Ciências Sociais em geral.

E finalmente, a extensão se daria com a formulação de projetos e propostas capazes de contribuir para o debate político que se trava na sociedade em torno das novas leis para a comunicação.

A fundamentação existente na Ley dos Médios argentinos tem grande contribuição acadêmica e poderia servir como referência para a Universidade brasileira.

A íntegra de Lei de Meios da Argentina está disponível neste endereço:

http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/155000-159999/158649/norma.htm



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Comentários

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Ronaldo Cananéia

PT, PSB, Lula, Dilma, Hibernardo, etc., todos autistas em relação à liberdade de comunicação.

Uma decepção . . .

Tomudjin

Acima da razão, há rima.
Esquerda, direita, esquerda, direita, esquerda, direita, esquerda, direita, ………………………..aaaaaalto!!!.

Yarus

Este brilhante artigo deve ser lido por muitos: De Davis Sena Filho, Jornal do Brasil

Partido da imprensa

Tudo o que é feito em prol do povo, os homens e as mulheres de imprensa, os que ocupam cargos de mando, chamam de populismo. Mas tiveram a insensatez e a ignorância política em defender o neoliberalismo, que fracassou de forma inapelável e retumbante. Até mesmo jornalistas considerados experientes como o Renato Machado e a Renata Vasconcellos, do “Bom Dia Brasil” da TV Globo, saudaram, da forma mais imprudente e capciosa possível, o golpe sofrido, em abril de 2002, pelo presidente constitucional da Venezuela, Hugo Chávez, que foi, inclusive, absurdamente seqüestrado, com o apoio da CIA do governo de George Walker Bush, que se antodenominava o senhor da guerra.

Meu comentário não visa constranger o Renato Machado, até porque não o conheço. Cito apenas um fato real, de conhecimento público, notório e que ficou na memória e na retina de muitos brasileiros, porque a saudação ao golpe foi incrivelmente surreal, um despropósito. Renato Machado, de perfil político conservador igual a tantos outros jornalistas, apenas, talvez até inconscientemente, comemorou a queda, mesmo através da violência, de um homem constituído presidente, pois eleito pela vontade do povo. Machado simplesmente reflete o desprezo do Partido da Imprensa em relação aos interesses da sociedade, em relação às determinações e aos desejos da sociedade civil. Não há nenhuma surpresa. O Partido da Imprensa age assim, mostra-se assim, só que, muitas vezes, inversamente ao Machado, apresenta-se de forma dissimulada.

Renato Machado no dia seguinte à sua comemoração em referência ao golpe contra o presidente venezuelano apareceu visivelmente constrangido. Acho que ele não tinha dimensionado sua atitude. Sua imagem, pálida e assustada, como se tivesse levado um grande susto ou uma bronca deveria ser gravada pelas pessoas alheias ao jornal matutino da TV Globo, com a finalidade de ser levada às escolas de comunicação para servir de exemplo aos futuros jornalistas como NÃO se deve proceder ou conduzir sua profissão…….

ÍNTEGRA: http://jblog.jb.com.br/palavralivre/2011/06/28/o-

Conceição Lemes

Obrigada, Luiz. Vamos corrigir já. abs

fabrib60

Aliás, se interessar, hoje o Globo On Line está transformando o John Lennon (conhecido por seu ativismo de esquerda na década de 70) em um eleitor do Reagan.
http://oglobo.globo.com/cultura/mat/2011/06/30/jo

A matéria se baseia em um documentário produzido por um republicano convertido (Seth Swirsky) e num depoimento do assisistente mal caráter do Lennon, que tomou um processo violento da Yoko Ono (leia os autos desse processo e me diga qual a credibilidade desse Seaman: news.findlaw.com/hdocs/docs/lennon/onoseaman3dcmp.pdf )

Luiz Conceição

Perfeito. Mas as escolas brasileiras de jornalismo e comunicação social não estão preocupadas com isto. Afinal, o que se vê chegando ao mercado são bacharéis despreparados material e intelectualmente que nada sabe, nada viram ou nada leram.
Alguns acham que Machado é instrumento de trabalho usado no campo, já que não se debruçaram sobre as estórias e histórias do bruxo do Cosme Velho. Outros, ao se falar em Lima Barreto, torcem o nariz… Sei não, viu professor?
Está certo que pensar não dói, mas fazer o quê com a mídia que virou partido político e até cadernos culturais fechou e promove a renovação (?!) de seu público trocando assinaturas de jornais e revistas por inusitadas quinquilharias ou gadgets – como sói dizer…

Azenha, o link indicado está incorreto… Aqui vai o real endereço: http://www.infoleg.gov.ar/infolegInternet/anexos/

Klaus

Por que alguém não traduz a Ley dos Médios argentina e coloca aqui para lermos?

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