Emir Sader: Razão e paixão

Tempo de leitura: 2 min

27/05/2010

por Emir Sader, em seu blog

O discurso da esquerda necessariamente parte da denúncia da realidade das nossas sociedades. Busca revelar as mazelas da realidade, às vezes avança na compreensão das raízes dos problemas. Essa é uma atividade permanente e indispensável da militância de esquerda, na luta por uma sociedade justa, solidária, humanista.

Porém, a denúncia e até mesmo a análise das raízes dos problemas são práticas necessárias, mas não suficientes, se não desembocarem em propostas, em alternativas superadoras dos problemas apontados. Os intelectuais e algumas organizações da esquerda se limitam às vezes às denúncias, alguns inclusive reivindicam o papel de “desmascarar” o que consideram ser falsidades propagadas por outros setores da esquerda, como se a verdade pudesse ser resultado da simples denúncia.

O marxismo, que constitui o melhor método de análise e fonte de projetos transformadores da realidade, pretende ser não apenas uma interpretação nova da realidade, mas ter no seu bojo, intrinsecamente, projetos de transformação revolucionária do mundo. Não existe separação entre análise e ação política para o marxismo. Nas palavras de Álvaro Garcia Linera, ele mesmo intelectual revolucionário e dirigente revolucionário boliviano, não pode haver separação entre razão e paixão.

O intelectual tende a privilegiar a teoria – os princípios, a teoria em estado puro – em detrimento da utilização do método dialético, que busca a verdade concreta nos processos históricos realmente existentes. A verdade é concreta, costumam ressaltar sempre Lenin e Gramsci. E não se trata de que a análise sem proposta de intervenção concreta fica incompleta. Não. A análise desvinculada da perspectiva de intervenção não capta os fios que articulam a realidade e perde a capacidade de compreensão da realidade também. As propostas de superação das contradições da realidade existente são um momento de julgamento da veracidade das análises, são a prova concreta de que as análises captaram a realidade na sua dinâmica profunda.

Não por acaso os intelectuais tendem a visões ultra-esquerdistas, quando desvinculados da prática concreta. Porque, entre a pureza da teoria e a impureza das formas concretas que assumem os processos políticos, ficam com a primeira, contrapondo-se à realidade concreta, desqualificada como “impura”. Tendem ao pessimismo e à inação.

Como contrapartida, o pensamento dialético, buscando captar a realidade no seu movimento, articulado em torno das contradições, tende a projetos que apontam para espaços de ação, de acumulação de forças, de intervenção,, de transformação da realidade, de paixão intimamente vinculada à razão.


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Comentários

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Márcio Bustamante

Correção!!

Por "velho filósofo" me referia a Proudhon.

Grato!

Márcio Bustamante

Vou concordar com o Sader sobre a eficiência do Marxismo no que toca a explicação do Capitalismo ou, e outras palavras, da sua qualidade e capacidade de fazer o melhor diagnóstico. No entanto discordo no que tange à sua avaliação quanto às perspectivas transformadoras dessa mesma teoria. Primeiro porque consiste numa teoria que, por mais que tenha a questão prática em vista, não deixa de ser uma teoria – ou doutrina – que ainda não abandonou certa percepção substancialista e ontológica da realidade – sobretudo política e social. E, como bem sabemo, foram essas filosofias responsáveis pelas grandes "merdas" do século XX. Mas concordando com o fato de que não adianta fazer denúncias sem propor alternativas, creio que a tradição libertária faz muito melhor o link entre teoria e prática. Já que trabalha com a dialética numa perspectiva relacional, pluralista, antidogmática e não-linear, ou seja, nada mais aplicável à nossa realidade do que as idéias desse velho filósofo. Devemos recuperar as premissas libertárias, que já vem se fortalecendo com movimentos anti-globalização das mais variadas naturezas como: Zapatismo, algumas tendências descentralizadoras do movimentos verde, AGP etc etc. Voltar à lógica bidimensional do marxismo é querer manter a esquerda no limbo da história contemporânea – enfim, no que toca à propostas de projetos, ele já não tem mais o mínimo fôlego – talvez, apenas, em perspectivas bastante revisionistas das quais não tenho maior conhecimento.

francisco.latorre

'morte à metafísica.'

a metafísica essa já morreu. século dezenove. assombrou mais um século.

falta enterrar. e despachar o encosto.

se demorar o gato cobre.

..

mundo. real-concreto.

o resto é mitologia mal-digerida.

ou distúrbio. projeção psicológica.

..

dukrai

"A análise desvinculada da perspectiva de intervenção não capta os fios que articulam a realidade e perde a capacidade de compreensão da realidade também."

Krai, véi, tende à poesia e mostra como a turminha dos psóis anda mais avoada que balão de São João.

william porto

Tudo blablabla, ate parece que esta redescobrindo a roda.A verdade e que a esquerda esta pela bola sete, acabou a militancia, hoje e tudo yterceirizado, a juventude nao bota mais estrelinha no peito, no poder a esquerda lambuzou-se toda, gostou do mel mas foi com muita avidez ao pode, ai nel nem cabaca, nao tem nada a ver com lenin, gramsci etc, falta e vergonha na cara.Falta no Brasil um Che Guevara.

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