Beatriz Cerqueira: Quando a Vale vai entregar os 22 corpos que faltam do seu crime em Brumadinho?

Tempo de leitura: 3 min

por Beatriz Cerqueira*

Em 25 de janeiro de 2019, por volta das 12h30, a barragem da Vale S/A, em Brumadinho (MG), se rompeu, assassinando de uma só vez 272 pessoas.

No próximo domingo, 25 de agosto, o crime completará 7 meses e os responsáveis impunes.

Sofrimento sem fim.

A contrário do que alardeia, a mineradora não está dando toda a assistência devida às famílias que perderam entes queridos nem aos trabalhadores sobreviventes.

Duzentos e cinquenta corpos já foram identificados. Faltam 22!

No dia 7 de agosto, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Barragem de Brumadinho, da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), fez mais uma reunião — a trigésima, desde a sua instalação.

Esta do dia 7 foi para debater aspectos da reparação trabalhista, já que a mineradora tem violado sistematicamente os direitos dos seus próprios trabalhadores e dos atingidos.

Entre os participantes, o Comitê de Resposta Imediata da Vale, que de imediato não tem nada.

Reprodução de vídeo

Já ouvimos mais de 100 pessoas, que nos permitiram descobrir um absurdo maior do que o outro.

Alguns deles:

*A Vale não fez uma ligação para as famílias. Nós ouvimos de mães que perderam seus filhos e estão vivendo à base de remédios: “o IML [Instituto Médico Legal] ligou, gente dos movimentos sociais ligou, mas da Vale não recebi nenhuma ligação”. Nenhuma, mesmo!

* Até hoje, a Vale não publicou nos grandes meios de comunicação do Estado pedido de desculpas às famílias e ao povo mineiro pelo sofrimento causado.

Desde o crime, eu vi apenas um pedido de desculpas do presidente no twitter. Em compensação, vi dezenas de peças publicitárias da empresa na mídia se elogiando. Pedir desculpas faz parte da reparação.

* A Vale não reconhece os seus funcionários como atingidos e não manteve afastados aqueles em tratamento psiquiátrico devido ao crime que ela cometeu.

Assim, impôs o retorno ao trabalho ou o encaminhamento deles ao INSS.

Neste momento, funcionários em estado emocional deplorável – afinal, poderiam ter morrido em 25 de janeiro, foram resgatados da lama, viram seus colegas serem assassinados — estão sendo forçados a trabalhar com maquinário pesado, mesmo fazendo uso de medicamento psiquiátrico.

*A Vale não fez nada pelos terceirizados. Os que vieram à CPI nos contaram que estão sendo  assistidos pelas suas empresas, mas pela Vale, não. Muitas vezes não houve sequer o reconhecimento desses trabalhadores pela mineradora.

*A Vale colocou os seus próprios funcionários atingidos para fazer busca dos colegas assassinados que ainda estão na lama.

Esses funcionários não são especializados em buscas, não receberam nenhum treinamento para isso.

Por vezes encontram pedaços dos corpos dos seus colegas e são obrigados a continuar.

Isso quando o maquinário que estão usando não corta pedaço do corpo do colega que está lá há seis meses.

* Em julho havia no Instituto Médico Legal pedaços de corpos sem condições de serem identificados corretamente por falta de insumos, pois o IML não estava preparado para um crime que assassinaria 272 de uma só vez.

Nós pedimos ao IML a lista dos insumos pendentes.

A CPI recebeu a lista, entregamos à Vale, que disse estar providenciando. E nada.

Nós acompanhamos o caso da Andrezza, que chorava a morte do filho de 26 anos.

Durante um mês, ela ficou indo à lama na expectativa de encontrá-lo.

Só que fazia um mês que o corpo dele estava no Instituto Médico Legal e não havia sido identificado porque a Vale não entregou os insumos no tempo correto.

Ou seja, a Andressa ficou um mês a mais de luto indefinido porque não conseguia enterrar o seu filho.

A propósito: quando a Vale vai entregar os 22 corpos que ainda faltam?

Essas 22 pessoas precisam ser devolvidas, veladas e enterrada pelos seus familiares!

Aliás, é possível que algumas dessas 22 pessoas estejam entre os pedaços de corpos que estão no IML e que não foram identificados ainda por falta de insumos.

É a história de um senhor que toda semana vem à reunião da CPI, senta no fundo com a camiseta da filha segurando dois recém-nascidos. Ela tinha acabado de voltar da licença maternidade.

Além de ter que cuidar dos netos e explicar porque a mãe nunca mais vai voltar, ele não consegue enterrar a filha!

Daí, pergunto, como é possível  a Vale dizer que um dos seus pilares é garantir a segurança, a reparação total, se nem condições para identificar os mortos ela está dando?

Como é possível falar em segurança, se não está dando reparação total aos funcionários atingidos?

Como é possível obrigar os seus próprios funcionários a procurar os colegas mortos?

Obrigar, sim, pois que trabalhador empregado num país com 13 milhões de desempregados diz não para o patrão?

Conduta cruel, monstruosa.

Lamentavelmente, para a Vale a vida dos trabalhadores, famílias e população em geral não vale.

*Beatriz Cerqueira é deputada estadual (PT-MG), integra a a CPI da Barragem de Brumadinho. É presidenta da Comissão de Educação, Ciência e Tecnologia da ALMG e diretora do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação (Sind-UTE/MG).


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