Vladimir Safatle: Dilma é a Isabelita Perón do Cerrado

Tempo de leitura: 3 min

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Frente de esquerda para quê?

por Vladimir Safatle — publicado 28/05/2015 04h58, na CartaCapital

Não é a falta de direção que acomete a ala progressista brasileira. É a falta de coragem, o que é muito mais grave

Se fosse o caso de fornecer uma analogia histórica para a situação atual do Brasil, talvez o melhor a fazer seria voltar os olhos para a Argentina dos anos 1970. De certa forma, não há nada mais parecido com o atual governo Dilma do que a Argentina de Isabelita Perón. Dilma transformou-se em uma Isabelita Perón do Cerrado.

Uma presidenta refém de seus operadores políticos, impotente diante da dissolução do acordo peronista entre setores da esquerda e setores conservadores em torno da figura de seu finado marido, Juan Domingo Perón, Isabelita foi a figura mais bem-acabada do esgotamento do ciclo de acordos, avanços e paralisias que marcou o peronismo.

Ao se deixar guiar pelos setores mais conservadores do peronismo, Isabelita parecia uma morta-viva, a encarnação de um tempo que já acabara, mas ninguém sabia como terminar.

Agora, imaginem que estamos na Argentina dos anos 1970 e Perón não morreu. Como um fantasma, ele volta para tentar organizar a oposição contra o governo que ele mesmo elegeu, federando as vozes dos descontentes com o governo criado por ele mesmo e para o qual indicou vários ministros.

Não, algo dessa natureza não poderia acontecer na Argentina. Algo assim só pode ocorrer no Brasil. Pois não é isso o que estamos vendo com um Lula reconvertido a arauto da “frente de esquerda” juntamente com o resto do que ainda tem capacidade de formulação no PT?

O mesmo PT que, em um dia, vai à televisão para afirmar seu compromisso com a defesa dos direitos trabalhistas para, no dia seguinte (vejam, literalmente no dia seguinte) votar em peso a favor de um pacote de medidas que visam “ajustar” a economia não exatamente taxando lucros bancários exorbitantes, mas diminuindo os mesmos direitos trabalhistas que defendera 24 horas antes.

Nesse contexto, o que pode ser uma frente de esquerda a não ser a última capitulação da esquerda brasileira à sua própria impotência? Ou, antes, o reconhecimento tácito de que a esquerda brasileira só pode oferecer o espetáculo deprimente de discursos esquizofrênicos divididos entre o reino das boas intenções e a dureza das decisões no “mundo real”?

Acreditar que aqueles que nos levaram ao impasse serão os mesmos capazes de nos tirar de tal situação é simplesmente demonstrar como a esquerda brasileira vive de fixações em um passado que nunca se realizou, que nunca foi efetivamente presente. É mostrar ao País que a esquerda não tem mais nada a oferecer de realmente novo e diferente do que vimos.

Se a esquerda quiser ter alguma razão de existência (pois é disso que se trata), ela deve começar por fazer uma rejeição clara do modelo que foi aplicado no Brasil na última década, seja no campo político, seja no campo econômico.

O modelo lulista não chegou a seu esgotamento por questões exteriores, pressão da mídia ou inabilidades de negociação da senhora Dilma. Ele se esgotou por suas contradições internas e quem o criou não é capaz de criar nada de distinto do que foi feito.

Insistiria ainda em como é falsa a ideia de que a esquerda brasileira está de joelhos sem saber o que fazer.

Há anos, vários setores progressistas têm alertado para o impasse que agora vivemos.

Há anos, várias pautas foram colocadas em circulação, entre elas a revolução tributária que taxe a renda e libere a taxação sobre o consumo, a democracia direta com poder de deliberação, veto e gestão, o combate à especulação imobiliária através de leis que limitem a propriedade de imóveis, a reforma agrária, a diminuição da jornada de trabalho, a autogestão de fábricas e locais de trabalho, o salário máximo, o casamento igualitário, as leis radicais de defesa da ecologia, o fim da política de encarceramento sistemático, a exposição da vida financeira de todos os que ocupam cargos de primeiro e segundo escalão, a punição exemplar da corrupção, o fim do monopólio da representação política para partidos.

Não é a falta de direção que acomete a esquerda brasileira. É a falta de coragem, o que é muito mais grave.

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Comentários

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Carlos Salgado

Rememos para o mesmo lado!
Há muita coisa em jogo para preferirmos o enfraquecimento do PT ao invés de nos apropriarmos das conquistas obtidas!

carlos saraiva e saraiva

Poderia falar de desonestidade intelectual do articulista, imprecisão histórica e sociologia primária, mas percebo apenas grosseria sectária. E não consigo vislumbrar, nem mesmo o desejo de luta hegemônica no interior da esquerda, que seria um equívoco, mas justificável para alguns, que se autodenominam “esquerda autêntica”. Patético depoimento de um acadêmico, que perde um pouco da lucidez que tinha, trocando o “bom senso” revolucionário, pelo “senso comum publicado”. Justifica sua grosseria e mediocridade politica, comparando, primeiro, Peron, com Lula e mais lamentável e imperdoável, comparar Dilma à Isabelita. Realmente, não merece nenhum crédito, para representar segmento algum da esquerda. A esquerda, saberá, fazer auto crítica, seja no PT ou fora , para analisando a conjuntura, se unir contra a ofensiva fascista.

    lulipe

    A verdade é cruel, não Carlos???

Julio Silveira

Rsrsrsrs. Minha risadinha de ironia não é ao texto, mas ao governo. Mas pior que ele é sem ele. O PT amalgamou e absorveu para si o sentido e o discurso da esquerda, deixando orfãos os eleitores de esquerda. Não temos algo que possa substitui-los como representação de esquerda, apesar de já não serem esquerda a muito tempo. A esquerda está no limbo, perdida no espaço avido por encontrar um cometa aonde possa confiar e se agregar. Rsrsrsrsrs.

yacov

Para começar não houve redução de direitos porra nenhuma !! O que há uma regulação de abonos, pensões e seguro desemprego que estavam sendo indevidamente, o que é muito bom. Agora, que o governo não faz nada para taxar bancos e fortunas e deixa as ZELITES sonegarem como se não houvesse amanhã, é verdade, apenas para não ter sua nota de investimento rebaixada pela Moody’s.

WLADIMIR SAFATLE é um oportunista metido a sebo, e um ingenuo da uma esquerda engomadinha, a lá Marta Suplicy, que acha que uma vez no poder se poderia resolver tudo de uma canetada. Quando tiveram a oportunidade de se unir ao governo para pressionar por mais mudanças, torceram seus narizinhos empinados e saltaram fora do Barco posando de campeões da ÉTICA. RIDÌCULA é o que é a Esquerda Caviar de São Paulo.

“O BRASIL PARA TODOS não passa na REDE GLOBO DE SONEGAÇÂO & GOLPES – O que passa na REDE GLOBO DE SONEGAÇÃO & GOLPES é um braZil-Zil-Zil para TOLOS”

Liberal

É tragicômico ver a esquerda pedir mais do veneno.

Fabio

Dilma está afundando o Brasil.
Dilma é uma traíra, uma maldita tucana que agora mostra sua face.

    Carlos Salgado

    Se liga, meu irmão!
    Essa mulher erradicou a fome do Brasil, criou uma classe média que pode frequentar faculdade ao invés de limpar privada de bacana. Quando que alguém do PSDB faria isso?

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