Secretário Jorge Bittar contesta denúncias de vereador do PSOL

Tempo de leitura: 7 min

por Conceição Lemes

Em entrevista ao Viomundo, o vereador Eliomar Coelho (PSOL-RJ) denunciou o estilo  das remoções de moradores no caminho de obras ligadas à infraestrutura para a Copa de 2014 e Olimpíadas de 2016, na cidade do Rio de Janeiro:

* As remoções são marcadas pela truculência, e o processo, perverso.

* As indenizações não dão para comprar imóvel igual ou melhor.

* Identificados os obstáculos à abertura de ruas e vias expressas, as pessoas não são tratadas adequadamente. Há um desrespeito muito grande à cidadania, por serem pessoas de poder aquisitivo baixo.

* Moradores das comunidades não são procurados por órgãos que estão à frente desse tipo de ação, como o secretário da Habitação e o Prefeito, para explicar a situação, assim como também não conseguem ser recebidos por eles.

“Essas denúncias não condizem com o que  nós estamos praticando”, contesta Jorge Bittar. “Nós estamos desenvolvendo um programa habitacional sem paralelo na história da Secretaria Municipal  de Habitação, muito menos na história deste município. Desde janeiro de 2009, já reassentamos 14.508 famílias, sempre com o maior respeito humano.”

Jorge Bittar é secretário da Habitação da cidade do Rio de Janeiro, deputado federal licenciado (PT-R) e engenheiro de formação. Segue a entrevista que ele nos concedeu.

Viomundo – Secretário, a sua assessoria nos disse que o senhor estranhou muito a matéria com denúncias feitas pelo vereador psolista. Por quê?

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Jorge Bittar – Primeiro: aqui, nós trabalhamos o tempo todo pela via do diálogo, da negociação. Até porque as questões de caráter social e democrático, entre as quais a da moradia popular, sempre pautaram a minha trajetória. São a minha história de vida.

Eu jamais – JAMAIS! — estaria sentado nesta cadeira se fosse para ser carrasco do povo mais pobre dessa cidade, repetir o que fez Carlos Lacerda na década de 1960 e outras coisas desse tipo.

Segundo:  estamos desenvolvendo um trabalho de qualidade no sentido de alcance social e respeito às pessoas. Estou absolutamente em paz com a minha consciência.  Convido o Viomundo a visitar algumas das nossas frentes de obra, conhecer o trabalho de reassentamento e depois tirar as suas próprias conclusões.

Viomundo – Como se faz, na prática,o reassentamento das pessoas que estão tendo de deixar suas moradias devido a obras públicas na cidade?

Jorge Bittar –Todos os nossos reassentamentos são feitos com base em um decreto municipal, que estabelece regras claras, republicanas, baseadas nos direitos humanos e na busca da moradia digna.

O primeiro decreto é o de número 20.454, de 24 de agosto de 2001. Depois disso, ao longo do tempo, ele sofreu alterações e atualizações. O mais recente é o 34.522, publicado no Diário Oficial do Município do Rio em 4 de outubro de 2011. Ele atualiza, sobretudo, os valores a serem pagos aos moradores pela Prefeitura. Portanto, todos os reassentamentos são feitos, sim, de acordo com o decreto vigente.

Agora, os reassentamentos não decorrem apenas da necessidade de obras públicas mas também – e principalmente – devido a moradias em condições impróprias.

Viomundo – Detalhe isso, por favor.

Jorge Bittar – Nós reassentamos pessoas basicamente por duas situações. Uma delas é por morar em condições impróprias. A cidade do Rio de Janeiro, por ser área da Serra do Mar e da Mata Atlântica, possui encostas com situações de risco muito graves. Em abril de 2010, quando choveu atipicamente, ocorreram muitos deslizamentos na cidade. Naquele momento, reassentamos milhares de famílias que ficaram desabrigadas.  Por isso nós temos um programa rigoroso, permanente, de reassentamento que visa aos moradores das encostas mas também aos  de áreas alagáveis,  próximas à beira de rios.

A outra situação que nos leva a fazer reassentamentos são as obras públicas. Nós desenvolvemos um programa de urbanização de favelas chamado Morar Carioca, que consiste em levar a essas localidades toda a infraestrutura: água, esgoto, pavimentação, sistema de drenagem, iluminação pública, praça, equipamentos sociais, como creches, escolas. Assim para possibilitar o acesso a uma comunidade ou fazer essas obras, às vezes tem de se abrir uma rua ou um espaço, o que implica realocação das pessoas que estão nessa área.

Outro exemplo. Na cidade estão sendo construídos quatro grandes corredores de transportes, que não raro necessitam de desapropriações de quem é proprietário formal assim como de áreas de posseiros, que também existem na cidade do Rio de Janeiro.

Em todas essas circunstâncias, nós observamos as normas do decreto vigente. Portanto, as pessoas são avisadas com antecedência, avaliamos as benfeitorias realizadas por cada posseiro, oferecemos alternativas. Importante: eu não lido com as desapropriações de famílias de renda maior. Eu, enquanto Secretaria Municipal de Habitação, lido apenas com as populações de baixa renda.

Viomundo – Que órgão cuida da remoção de pessoas de melhor poder aquisitivo? Por que a diferença?

Jorge Bittar – A diferença é por uma questão de atribuição de órgãos. Nas áreas formais, regularizadas, as desapropriações são de responsabilidade da Procuradoria Geral do Município. A Secretaria Municipal de Habitação atua em áreas de comunidades, sobretudo por intermédio do Morar Carioca, o programa de urbanização de favelas.

Viomundo – Como funciona esse processo?

Jorge Bittar — Nós avaliamos as benfeitorias no imóvel e ajudamos cada família a procurar outra habitação, de preferência próxima à área em que reside e que apresente todas as condições de segurança e habitabilidade. Oferecemos também unidades do programa Minha Casa, Minha Vida. E em situações limite podemos indenizar famílias que querem voltar para a terra natal e não mais  morar no Rio de Janeiro.

Ah, ia me esquecendo, há outra situação. Às vezes a família prefere aguardar um empreendimento imobiliário nosso que vai demorar ainda uns meses para estar concluído.  Nesse caso, nós passamos a pagar um benefício mensal a essa família — o aluguel social – para que ela possa se manter até a conclusão de sua casa.

Viomundo – Qual o valor do aluguel social? Uma mesma família pode recebê-lo durante quanto tempo?

Jorge Bittar — É de R$ 400 mensais. A família recebe o aluguel pelo tempo necessário até ser reassentada definitivamente em imóveis do Programa Minha Casa, Minha Vida.

Viomundo – Como são estabelecidos os valores das indenizações?

Jorge Bittar – De acordo com as avaliações feitas nas benfeitorias dos imóveis, segundo critérios previstos no decreto. Portanto, a definição dos valores ocorre caso a caso.

Viomundo – Mas acusam o senhor de pagar valores de  indenizações que não respeitam os direitos das pessoas.

Jorge Bittar – Eu faço as indenizações com base no decreto vigente, que estabelece as condições de avaliação dos imóveis, que, por sua vez, dizem respeito às avaliações medianas do mercado informal da cidade do Rio de Janeiro.

Mesmo sendo uma família de menor renda, eu não posso remunerar as pessoas do jeito que elas querem, além do que estabelece o decreto. As pessoas acham que o dinheiro público pode ser usado de maneira aleatória, e não pode. Tem critérios para remunerar as pessoas e eu sou controlado diretamente pelo Tribunal de Contas do município.

O Rio de Janeiro é hoje campeão nacional do  Programa Casa, Minha Vida. Estamos hoje com 34 mil unidades contratadas junto à Caixa Econômica Federal. Quando eu digo unidades, estou falando de casas, apartamentos, que estão distribuídos por toda a cidade do Rio de Janeiro.  São sobretudo apartamentos de dois quartos, sala cozinha, banheiro, em condomínios com áreas comuns, próximo de transporte.  Ou seja, com qualidade de vida para  os moradores.

Viomundo – Foi dito também que às vezes as famílias são deslocadas para um conjunto habitacional mais ou menos distante de onde moram.

Jorge Bittar — Quem foi para um conjunto distante de onde reside, foi voluntariamente. Ninguém foi obrigado a ir para local distante.

Viomundo — Outra acusação é a de que teve gente que precisou se mudar imediatamente assim que ficou sabendo da desocupação. É verdade?

Jorge Bittar – Isso só aconteceu nos casos de decisão judicial. Essas pessoas deveriam ter sido orientadas pela Defensoria Pública de que, uma vez decidido pelo Poder Judiciário, tem o cumpra-se. É algo não depende da nossa secretaria.

Viomundo – Mas essas queixas não chegaram a vocês?!

Jorge Bittar – Objetivamente, não. É muito discurso.

Viomundo – Mas há vídeos com moradores fazendo essas queixas.

Jorge Bittar – Em muitos desses vídeos pegaram as pessoas fora de um determinado contexto.

Viomundo — Então o que aconteceu?

Jorge Bittar — Nos reassentamentos que ocorreram na região do Recreio dos Bandeirantes devido à abertura da via Transleste, algumas famílias  foram estimuladas pela Defensoria Pública a  recorrer à Justiça  para não sair de onde estavam. E elas não saíram, apesar de haver um processo de uma via pública no local e de um sistema de transporte de grande interesse da cidade. Evidentemente a Procuradoria do Município contra-argumentou no Judiciário e obteve uma decisão favorável para fazer obra naquele local.

Eu explico. Quando as famílias perdem na Justiça, a determinação não é mais da Secretaria Municipal de Habitação mas do oficial de Justiça. Aí, os nossos opositores pegam essas cenas localizadas para dizer que as pessoas estão sendo retiradas de suas casas de uma hora para outra. O que não é verdade. Essas famílias foram mal orientadas pela Defensoria Pública. Posteriormente, quando a Defensoria perdeu na Justiça, em vez de essas famílias virem discutir conosco os valores, as condições, preferiram entrar num certo discurso político de oposição. Quando se ganha, muito bem. Mas quando se perde, tem de se submeter ao que foi determinado. É a vida. Mas esse episódio já é uma página virada.

Agora, evidentemente nenhuma pessoa atingida por obra pública fica feliz quando tem de sair da sua casa.

Viomundo – Quantas famílias foram reassentadas?

Jorge Bittar – Desde o início da minha gestão, em janeiro de 2009, já reassentamos 14.508 famílias. A imensa maioria devido a moradia em situação de risco e não por obras públicas. São famílias que melhoraram as condições de segurança e habitabilidade de suas casas.

Nós passamos décadas sem uma política pública habitacional para o município e o estado. Isso fez com que as pessoas pobres procurassem as encostas de morro, os terrenos públicos disponíveis, para poder sobreviver, ter moradia.

Agora, nós estamos urbanizando as favelas com grande qualidade. Neste momento, estamos investindo 2 bilhões de reais na cidade do Rio de Janeiro.  São moradias de excelente qualidade.

De modo que eu me sinto extremamente motivado, pois estamos fazendo um grande trabalho de moradia social, neste momento no Rio de Janeiro. É parte do legado social da Copa do Mundo, de 2014, e dos Jogos Olímpicos, em 2016. É parte também  de um momento melhor que vive o Brasil e a cidade do Rio de Janeiro.

PS do Viomundo : Carlos Lacerda foi governador do antigo Estado da Guanabara (atual município do Rio de Janeiro), de 1960 a 1965. Durante o seu governo, promoveu a remoção de favelas na Zona Sul e no bairro Maracanã. Em muitas dessas ações ocorreram incêndios criminosos, como os das favelas do Esqueleto, onde foi construída a atual UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro), Praia do Pinto e Catacumba. Seus moradores foram levados para a periferia, a quilômetros do centro da cidade, surgindo comunidades como Cidade de Deus e Vila Kennedy. Durante seu governo, descobriu-se que policiais assassinavam moradores de rua e jogavam seus corpos no rio da Guarda, afluente do rio Guandu. O governo de Carlos Lacerda foi acusado de ter dado instruções aos policiais para que realizassem estes assassinatos.

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