Salem Nasser: Quero acreditar que o sangue das crianças palestinas vencerá a espada que o derramou

Tempo de leitura: 4 min
Foto: Matt Artz/Unsplash

Palestina #5 – O Sangue e a Espada

De vocês, a espada / E de nós, o nosso sangue / De vocês, o fogo e o chumbo / E de nós, a nossa carne

Por Salem Nasser, em Cegueira Seletiva

Escrevo enquanto nos perguntamos todos se a trégua na guerra sobre Gaza – que terminaria hoje – será prolongada, ou se os combates e os massacres serão logo mais retomados.

Como podem ver, destaquei alguns termos no parágrafo anterior. Explico agora o porquê.

Primeiro, como chamar o que acontece em Gaza?

As possibilidades são várias: guerra de Gaza, guerra sobre Gaza, guerra entre Israel e Hamas, ataques israelenses contra Gaza, massacre de Gaza, Genocídio israelense…

Cada um de nós tenderá a usar um ou outro desses modos de nomear a realidade.

Faremos isso revelando o modo como tendemos a ler os fatos ou a percebê-los, quer nossa percepção seja consciente ou não, pensada ou naturalizada.

Faremos isso, também, querendo fazer com que os outros percebam as coisas de determinado modo, estrategicamente, portanto.

Há quem diga, por exemplo, que não se pode falar de “guerra” porque para isso seria preciso haver “dois Estados em conflito”.

Essa opção, fundada na pressuposição de que a Palestina não é um Estado, serve, entre outras coisas, a reforçar a ideia de que se trata de uma violência essencialmente unilateral, do massacre de uma população desprovida de representação política e de soberania.

Seria possível discutir a pressuposição, afirmando, por exemplo, que a Palestina é reconhecida como Estado por mais de 140 países, ainda que tenha seu território ocupado por Israel.

E é certamente possível disputar a ideia de que as guerras só se dão entre Estados.

Essa tese contém, inclusive, um perigo que deveria ser evitado por quem se preocupa com a posição mais frágil dos palestinos quando em situação de conflito armado: a ausência de “guerra” levaria à discussão sobre a aplicabilidade das normas do direito da guerra, ou seja, do direito humanitário que, sem dúvida, hoje é cotidianamente violado por Israel.

Não irei muito mais longe na explicitação dos sentidos carregados pelos demais nomes; deixo que o leitor os investigue em seu espírito. Digo apenas que faço a minha escolha conscientemente e explico o que quero afirmar com ela.

Chamo de guerra porque considero que o conceito não se restringe aos conflitos entre Estados.

Sei que as convenções do direito humanitário (as Convenções de Genebra de 1958) apontam para a diferença entre conflitos internacionais e aqueles internos e sei que isso pode ter relevância jurídica para a determinação, especialmente, da existência de crimes de guerra. Mas sei que hoje não resta dúvida de que o direito humanitário se aplica a qualquer conflito armado.

E chamo também de guerra porque vejo trocas violentas entre dois campos em conflito. É por essa razão que destaquei a palavra “combates” no meu primeiro parágrafo. É certo que há desproporção de forças e de violência, mas não posso tirar dos palestinos o fato de que estão lutando, bravamente.

A desproporção de forças e da violência tem a ver com as vantagens comparativas que cada lado traz para o campo de batalha: os israelenses trazem suas armas e equipamentos tecnologicamente avançados, seus aviões, seus tanques, sua variedade de munições, seu acesso ilimitado a novas armas e munições, garantido por uma retaguarda que é, ao final, a maior potência do mundo; por outro lado, os combatentes palestinos trazem a sua disposição para a luta corpo-a-corpo, seu domínio do terreno e do subsolo, sua certeza de que a causa é boa e de que o eventual sacrifício é preferível a uma vida indigna.

Por conta dessas diferenças, Israel recorre ao que melhor fazem seus aviões, tanques e navios: desde longe e desde cima, derrubam sobre os civis os edifícios inteiros e matam mulheres e crianças aos milhares. Se apenas isso fosse suficiente para ganhar guerras…

Já os combatentes palestinos esperam pacientemente pelas forças israelenses que, sem assumirem algum controle sobre a faixa de Gaza, não poderão cantar vitória e, por isso, terão que ir ao seu encontro e enfrentar o combate pessoal que temem e queriam evitar. Os resultados mostram que os palestinos levam vantagem nesse tipo de guerra.

Mas, enquanto há combate, e enquanto os palestinos, os combatentes e a população como um todo, não estão derrotados – pelo contrário, estão apenas esperando o momento em que se declararão vitoriosos – há também os “massacres” que eu também destaquei.

São milhares e milhares de crianças, de mulheres, de famílias inteiras, são hospitais, são igrejas e mesquitas, são ambulâncias e médicos, são os feridos e os bebês prematuros… São tantos que é preciso perguntar como é possível, como se dá que o mundo inteiro ainda não se revoltou…

O sangue – e é tanto o sangue! -, o sangue, sobretudo, das crianças evocou em mim os tantos quadros que nos belos museus da Europa representam o Massacre dos Inocentes.

E quis o destino que me chegasse aos ouvidos novamente um poema de Mahmud Darwich, e que ficassem ecoando em minha mente alguns dos seus versos:

Vocês que passam entre as palavras fugazes
Carreguem os seus nomes
E vão embora
Retirem as suas horas do nosso tempo
E vão embora
Roubem das fotos o que quiserem
Para saberem
Que não virão a saber
Como uma pedra da nossa terra
Edifica o teto do céu

Vocês que passam entre as palavras fugazes
De vocês, a espada
E de nós, o nosso sangue
De vocês, o fogo e o chumbo
E de nós, a nossa carne

De vocês, um outro tanque
E de nós, uma pedra
De vocês, uma bomba de gás
E de nós, a chuva…

Inevitavelmente, mais uma vez, como tão frequentemente me ocorre quando penso na Palestina, no Líbano, no Oriente Médio, nas diferenças de poder, nas vítimas civis e nos combatentes que se dispõem a enfrentar forças superiores militarmente, encontrei a ideia de “vitória do sangue sobre a espada”.

Perguntaram-me, é claro, como é possível que o sangue vença a espada que o derrama? o que pode algo assim significar?

A resposta, para mim, ao menos, é mais facilmente intuída do que racionalmente construída.

Na origem, essencialmente, a expressão diz que o sangue derramado em nome de uma verdade, em nome de uma questão de justiça, é o custo e o sacrifício pagos para que vingue a verdade e para que se faça a justiça.

Quero acreditar que o sangue das crianças palestinas vencerá a espada que o derramou.


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Zé Maria

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O HAMAS DO PONTO DE VISTA HISTÓRICO E POLÍTICO

Um dos Principais Atores dos Conflitos no Oriente Médio é o Hamas,
Grupo Político da Palestina que liderou um Ataque contra Israel
no dia 7 de outubro deste ano, sendo considerado uma organização
terrorista por países como o próprio Estado Israelense, e EUA, Japão,
Reino Unido da Grã-Bretanha, e nações da União Européia.

Para entender a guerra atual na Palestina, é preciso conhecer
as origens e a história desse Movimento Palestino de Resistência .

O Hamas, Sigla em Árabe para “Movimento de Resistência Islâmica”,
foi fundado em 1987, após o Início da Primeira Intifada que foi uma
Ampla Revolta do Povo Palestino contra a Ocupação [Invasão] de
seus Territórios (Cisjordânia, Jerusalém e Faixa de Gaza) por Israel.
O Grupo Políco foi então criado a partir da Irmandade Mulçumana,
Organização Egípcia que, até então, fazia um Trabalho de Assistência
Social na Palestina.

Ao Contrário do Fatah, Partido Político que hoje administra parte da
Cisjordânia, o Hamas se opôs aos Acordos de Oslo (*), na Década
de 1990, que levaram a Organização pela Libertação da Palestina (OLP)
a depor as Armas e negociar com Israel.
À época, o Hamas não aceitou desistir da Luta Armada.

Porém, a partir dos Anos 2000, o Hamas, como Partido Político, aceitou
disputar Eleições para o Governo da Autoridade Nacional Palestina (que
até então, incluía a Cisjordânia e a Faixa de Gaza) e em 2006 conquistou
Maioria no Poder Legislativo, ganhando 76 das 132 Cadeiras do Parlamento, em um Pleito Considerado Limpo por Observadores Internacionais.

Porém, Israel, os Estados Unidos da América (EUA) e as Potências
Coloniais Europeias não aceitaram o Resultado Eleitoral, o que levou
à Separação da Área Territorial de Atuação dos Principais Partidos
Políticos da Palestina, Fatah e Hamas, com o Fatah controlando
parte da Cisjordânia e o Hamas ficando com toda a Faixa de Gaza.

Desde então, Gaza vive um Bloqueio Imposto por Israel, que monitora
a Entrada e Saída de Pessoas e Mercadorias.

Para entender melhor a História desse Grupo Islâmico, a Agência Brasil
entrevistou Dois Especialistas no Assunto.

O primeiro foi o Professor de Jornalismo da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), José Arbex Junior, que é Escritor e Doutor em
História pela USP. Autor do livro “Terror e Esperança na Palestina”, ele foi Correspondente Internacional da Folha de São Paulo em Moscou e Nova
York.
A segunda foi com a Professora Rashmi Singh, Pesquisadora no
Programa de Pós-Graduação (PPG) em Relações Internacionais
da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG),
também Escritora.
De Origem Indiana, ela estuda a Questão Árabe-Israelense
há Mais de 20 Anos.

[ Reportagem: Lucas Pordeus León | Edição: Aline Leal | Agência Brasil ]
https://twitter.com/LucasPLeon/status/1728766938569195935

ìntegra das Entrevistas em: (https://t.co/QMWOReXsaB)

https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-11/entenda-origem-do-hamas-grupo-islamico-palestino-que-controla-gaza

(*) “Entenda os acordos de Oslo, tentativa de paz entre Israel e Palestina”

Negociações completam 30 Anos em meio à Intensificação dos Conflitos

https://t.co/1dnOp4Ckid
https://twitter.com/LucasPLeon/status/1723363646141575635
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Zé Maria

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“Mapeando a Política Palestina”

“Visão Interativa das Principais Instituições e Atores Políticos Palestinos”

https://ecfr.eu/special/mapping_palestinian_politics/
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Zé Maria

29 de Novembro

“Dia de Solidariedade ao Povo Palestino é Celebrado Hoje”

Data foi Criada pela ONU em 1977

Para Bernardo Kocher, Professor de História da UFF,
contribuíram para aumentar a Visibilidade da Causa Palestina
a Entrada na ONU de países recém-independentes da África e
do Mundo Árabe, o Contexto da Guerra Fria e a Crise do Capitalismo
da Década de 1970:

“A ONU começou a sofrer pressões que levavam em conta
a Causa Palestina, e ela foi obrigada a se sensibilizar.
Houve uma brecha para que a Questão Palestina viesse a luz.”

[Reportagem: Lucas Pordeus León | Agência Brasil | 29/11/2023]

Em 1977, dias após condenar a manutenção da ocupação militar de Israel
nos territórios palestinos, a Assembleia-Geral das Nações Unidas (ONU)
aprovou a resolução 32/40 B, criando o “Dia Internacional de Solidariedade
ao Povo Palestino”, a ser comemorado todo 29 de novembro.

Devido a atual escalada do conflito no Oriente Médio, o dia será lembrado
em diversas cidades brasileiras e do mundo.

O dia 29 de novembro é o mesmo dia da aprovação da resolução 181 da ONU,
de 1947, que recomendou a partilha da Palestina entre judeus e árabes.

Após 30 anos dessa resolução, em 1977, os palestinos continuavam
sem Estado e acumulavam 10 anos sob ocupação militar de Israel.

Foi nesse contexto que a ONU criou o dia para prestar solidariedade
ao povo palestino.

A resolução afirma que a data é necessária para dar “maior divulgação
possível de informações sobre os direitos inalienáveis do povo palestino
e sobre os esforços das Nações Unidas para promover a realização
desses direitos”.

A criação da data ocorreu, na avaliação do professor de História
da Universidade Federal Fluminense (UFF) Bernardo Kocher,
por causa do apagamento que a questão palestina sofreu
após a criação do Estado de Israel.

Estima-se que 750 mil palestinos precisaram deixar suas terras
e mais de 500 aldeias palestinas foram destruídas em consequência
dos conflitos [invasões e expulsões] decorrentes da criação de Israel.

“Essa história foi surpreendentemente apagada porque na mídia ocidental,
principalmente, essa história foi contada como uma compensação
ao Holocausto. No entanto, o problema não só não se resolveu, como
se agravou e a ONU foi a responsável por dar início a partilha [do território]”,
explicou o professor de História Contemporânea.

Para Kocher, contribuíram para aumentar a visibilidade da Causa Palestina
a entrada na ONU de países recém-independentes da África e do mundo árabe, o contexto da Guerra Fria e a crise do capitalismo da década de 1970.

“A ONU começou a sofrer pressões que levavam em conta a causa Palestina, e ela foi obrigada a se sensibilizar. Houve uma brecha para que a questão palestina viesse a luz”, afirmou.

Ações da ONU
Entre as ações da ONU em favor da Causa Palestina, destaca-se
a Resolução 194, de 1948, que autorizou o retorno dos palestinos
às suas terras, mas que nunca foi cumprida.

Outra resolução que segue sem ser atendida é a 242, de 1967,
que determinou “a retirada das forças armadas israelitas dos
territórios que ocuparam”.

Apesar dessa resolução, a construção de assentamentos israelenses
na Cisjordânia continuou e hoje são 300 colônias consideradas ilegais, segundo a ONU, dentro da Cisjordânia ocupada, onde vivem cerca
de 700 mil colonos israelenses.

Em função da questão palestina, a ONU criou, ainda em 1949,
a Agência para Refugiados Palestinos (UNRWA), e mantém,
desde 1993, um relator especial sobre direitos humanos nos
territórios palestinos ocupados [invadidos], como forma de
dar visibilidade à causa do povo palestino.

No último informe publicado em outubro deste ano, a relatora especial
da ONU para os territórios palestinos ocupados, Francesca Albanese,
citou uma série de supostas violações de direitos humanos sofridas
pelas crianças palestinas, em especial devido às prisões.

“Os julgamentos duram, em média, 3 minutos, durante os quais as crianças
podem ver a sua família e o advogado pela primeira vez desde a prisão,
após longos períodos separados”, relatou.

Desde 2000, cerca de 13 mil crianças palestinas foram detidas,
interrogadas, processadas e presas pelas forças de ocupação israelenses,
com uma média de 500 a 700 crianças detidas anualmente.

“A maioria das crianças é acusada de atirar pedras contra veículos blindados
das forças israelitas, o que pode resultar em penas de 10 a 20 anos”,
informou o relatório da ONU.

(Edição: Fernando Fraga)
https://t.co/Z2DvZqGiH6
https://twitter.com/LucasPLeon/status/1729827913401315623

https://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2023-11/dia-de-solidariedade-ao-povo-palestino-e-celebrado-hoje

Zé Maria

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Autoridade Política do Hamas diz que Extensão da Trégua é ‘Boa Notícia’
e pede “Fim da Guerra para Frear a Agressão de Israel ao Povo em Gaza”

“Espero que possamos prolongar até chegarmos ao fim desta guerra e
parar a agressão israelense ao nosso povo em Gaza”, disse à Al Jazeera
Ghazi Hamad, Membro do Gabinete Político do Hamas.

“Acho que há um grande apoio por parte do governo do Catar e do Governo
Egípcio, e até mesmo dos Governos Ocidentais, que querem o cessar-fogo”, disse ele.

Hamad acrescentou que espera ver a comunidade internacional pressionar
Israel para acabar com a sua ocupação e “acabar com esta Catástrofe” contra os Palestinos.

Assista no Canal ‘Al Jazeera English’: (https://youtu.be/gB8jb5gTVKA)

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