Mauricio Dias: Ministério Público, da vanguarda ao atraso

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A ministra Eliana Calmon defende a instituição do auxílio-moradia para todos os membros do Ministério Público da União e dos estados. Para o advogado Luiz Moreira, conselheiro do CNMP, esse privilégio é uma forma de driblar o aumento oficial. Fotos: Marcelo Camargo e Elza Fiúza/ ABr

por Mauricio Dias, em CartaCapital

Está na pauta do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) a proposta para a criação do auxílio-moradia e o pagamento de verbas indenizatórias em relação ao auxílio-saúde recebido pelos membros do Ministério Público da União e dos estados.

Aprovado, o benefício alcançará cerca de 20 mil procuradores e, por discutível isonomia, beneficiará os juízes em número igual ou superior. Esse privilégio se soma ao vale-alimentação e ao plano de saúde já existentes.

A criação do auxílio-moradia, no valor aproximado de 3 mil reais mensais, trará embutido o princípio da retroatividade de cinco anos.

Quem estiver interessado faça as contas. Antes, porém, sente-se para suportar o susto provocado por essa retroatividade: 3 mil reais por mês viram 36 mil anuais; multiplicado pelos 60 meses referentes aos cinco anos retroativos, o resultado se transforma em 180 mil, sem contar a correção. Agora basta multiplicar pelos integrantes do MP. E não se pode esquecer, posteriormente, de fazer a mesma conta para a Magistratura. Esse princípio de equiparação, segundo a ministra Eliana Calmon, foi estabelecido pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Justiça, neste caso, em causa própria.

A enaltecida ministra, vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), recebeu, em setembro, 84 mil reais do citado auxílio-alimentação. Naquele mês, o jornal O Estado de S. Paulo revelou que o contracheque dela registrou salário de R$ 113.009,50.

Com a mesma coragem com que denunciou juízes corruptos ou, segundo ela, “bandidos de toga”, a ministra respondeu publicamente ao jornal: “O Ministério Público já recebe esse vale-alimentação sem questionamento algum. O Conselho Nacional de Justiça entendeu o processo de equiparação e isso levou ao pagamento”.

Data venia, a magistrada não se saiu bem quanto a esse privilégio. Sobre esse ganho, cerca de mil reais por mês, não incide Imposto de Renda. O Leão é manso. Não ruge nem morde essa gente.

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O procurador-geral da República paga vale-alimentação a todos os membros do Ministério Público da União, sem que haja lei prevendo tal benefício. A Constituição fixa a remuneração dos integrantes do MP como “parcela única”, o subsídio. O pagamento seria, portanto, ilegal.

Tudo indica que isso se transformou numa artimanha para contornar as decisões da Presidência e do Congresso. Ou seja, inconformados com o aumento oficial que recebem, articulam aumento sobre o aumento. Tudo em causa própria.

A ministra Eliana Calmon errou também quando disse que o MP vem recebendo o vale, isso sem questionamento algum. Há quem questione, sim.

Luiz Moreira Lima, conselheiro do CNMP, que travou e venceu, praticamente isolado, a luta com Gurgel e asseclas para ser reconduzido à função, tenta fazer prevalecer a lei. Ele pediu vista e, ao avaliar a instituição auxílio-moradia, desmontou esse sistema alternativo criado para driblar o aumento oficial.

Essa situação mostra mais um retrocesso nos princípios republicanos. O Ministério Público ganhou vida nova com a Constituição de 1988. Tornou-se uma instituição de vanguarda do Estado brasileiro na luta contra velhos vícios da República. Há exceções, mas a regra não durou muito.

O corporativismo renasce recrudescido numa das mais importantes instituições da República.

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