Marcelo Zero: Cúpula do Império fracassa e Bolsonaro continua a ser uma espécie de zumbi político mundial

Tempo de leitura: 4 min
Marcelo Zero: Ao contrário do que dizem os desinformados, os governos do PT nunca foram “antiamericanos”. Foto: Alan Santos/PR

A Fracassada Cúpula do Império e o Papel do Pária

Por Marcelo Zero*

A Cúpula das Américas de Los Angeles pretendia ser o evento para dar um pontapé inicial na consolidação de uma nova hegemonia dos EUA na América Latina e no Caribe, após o “abandono” de Trump e ante a crescente influência da China na região.

Fracassou miseravelmente antes de começar. Como sempre, os EUA impuseram vetos políticos e ideológicos a países com governos que os desagradam.

Assim, Cuba, Nicarágua e Venezuela foram vetados unilateralmente pelos EUA. A desculpa esfarrapada foi a de sempre: esses países teriam governos autocráticos e promoveriam graves violações dos direitos humanos.

Curioso que essa tocante preocupação com democracia e direitos humanos não se aplica a países aliados dos EUA, como as ditaduras medievais do Golfo Pérsico (Arábia Saudita, Emirados Árabes, Bahrein etc.).

Diga-se de passagem, Biden se prepara para visitar o príncipe herdeiro da Arábia Saudita, Mohamed bin Salman, aquele que mandou assassinar o jornalista dissidente Jamal Khashoggi, que morava nos Estados Unidos e trabalhava para o The Washington Post.

Agora, no entanto, bin Salman é visto como “parceiro estratégico”, dada à necessidade de se produzir mais petróleo, um problema criado pelos EUA e por alguns parceiros europeus, em sua insana cruzada contra a Rússia.

Tampouco se aplica a aliados regionais dos EUA, como Colômbia, por exemplo. Nesse país, em 2021, foram assassinados 138 ativistas de direitos humanos, por grupos armados que têm apoio do governo.

Mesmo nosso país, o Brasil, tem um currículo lamentável em direitos humanos e vive hoje numa espécie de semidemocracia, tutelada pelo poder militar, sob a ameaça constante de se transformar numa nova ditadura tout court.

Entretanto, esses países foram convidados porque se submetem, de forma canina, aos desígnios geopolíticos do Império.

Mas o fato concreto é que esse veto dos EUA provocou a pronta reação de países como México, Guatemala, Honduras, El Salvador e Bolívia, por exemplo, que não enviaram seus chefes de Estado para a cúpula.

Com isso, o principal tema de debate da cúpula, a migração, ficou inteiramente prejudicado, pois o México e os países da América Central são os principais exportadores de mão-de obra barata para os EUA. Mão-de-obra essa que é tratada aos pontapés pelo governo dos EUA, em clara violação de direitos humanos.

A eleição desse tema como o principal da cúpula revela bem qual a importância da América Latina para os EUA: nenhuma.

O que importa realmente para os EUA, em relação à nossa região, são dois “problemas” que sempre são discutidos nas suas eleições: tráfico de drogas e migração irregular.

Em relação especificamente ao Brasil, há o “problema” da preservação da Amazônia e da proteção dos povos originários, temas que têm ampla repercussão no Partido Democrata.

Nesse sentido, a Cúpula é muito mais dirigida para agradar o público interno dos EUA, do que para realmente concertar agendas regionais relevantes para todos os países.  Interesses próprios da América Latina nunca tiveram muita relevância nessas cúpulas imperiais.

É preciso considerar, em tal contexto, que a América Latina sempre foi encarada, desde a época de Monroe, nos EUA, como um mero “quintal”.

Uma região de influência geopolítica exclusiva, que tem se submeter às diretrizes do Departamento de Estado e aos desejos políticos dos grupos anticastristas da Florida, swing state decisivo nas eleições presidenciais dos EUA.

A participação de Bolsonaro na Cúpula fracassada e esvaziada obedeceu também ao mesmo propósito geral de política interna.

Biden convidou Bolsonaro para um encontro bilateral com o intuito de evitar um esvaziamento ainda maior da cúpula.

Já Bolsonaro, sejamos francos, foi à cúpula com a missão exclusiva de tirar uma foto com Biden para distribuir nas suas redes sociais. Pretende, com isso, mostrar ao público interno que não é um pária, uma espécie de zumbi político mundial.

Em vão. O encontro entre os dois foi algo patético. Protocolar. frio e tenso, o encontro não produziu mais que declarações genéricas e vagas, previamente acertadas pelo corpo diplomático.

Os temas sensíveis que realmente importam na relação bilateral foram cuidadosamente evitados. Os dois levaram “colas” previamente preparadas pelas assessorias para saber o que dizer e evitar atritos.

Até mesmo a linguagem corporal revelou a distância pessoal e política entre os dois mandatários. Não ouve apertos de mão e Bolsonaro evitou olhar para Biden.

Afinal, Bolsonaro só tem olhos para Trump, por quem professa explícito e devotado amor. Depois, o nosso capitão tentou consertar o estrago, aproximando-se sorridente a Biden, nos estertores da cúpula.

Embora Bolsonaro diga que se “maravilhou” com Biden, é certo que o presidente norte-americano e o resto do mundo continuam a vê-lo como aquilo que ele realmente é: um governante medíocre, reacionário e ignorante, que nada tem a dizer de relevante nos foros mundiais, um político do qual todo o mundo quer distância.

Não há cúpula capaz de sanear essa imagem consolidada e merecida de Bolsonaro, o qual, aliás, chegou atrasado para o discurso de encerramento e a foto oficial. Nosso presidente, como se sabe, não tem muito apreço pelo mundo do trabalho, pessoal e politicamente.

Ao contrário do que afirmaram algumas cabeças colonizadas, Bolsonaro nunca foi, não é e nunca será um estadista.

E não o é porque não fala inglês. Não o é porque não consegue falar nada de significativo e interfere negativamente na agenda mundial.

Lula não fala inglês, mas foi e é um estadista de nível planetário, porque fala coisas importantes para o mundo e intervém positivamente na agenda internacional. Lula é asset e solução; Bolsonaro é estorvo e problema.

Independentemente dessas digressões sobre as relações bilaterais Brasil/EUA, o mais importante a ser destacado aqui é que a Cúpula fracassada e esvaziada revela tendência geopolítica inexorável. A América Latina não será mais apenas um quintal dos EUA. Pelo menos, não de forma monolítica.

O mundo mudou de forma profunda, política e economicamente. É inevitável que a China, a nova locomotiva econômica, tenha uma influência cada vez maior em nossa região, até mesmo porque Beijing, ao contrário de Washington, não exige contrapartidas políticas e ideológicas para estabelecer laços de cooperação e de investimento.

A Rússia, por sua vez, também tem, hoje, grande interesse em nossa região.

É natural, portanto, que muitos países do nosso entorno regional tenham interesse em diversificar suas parcerias estrangeiras, de modo a melhor promover seu desenvolvimento interno. 

Foi o que o Brasil fez, com muito êxito, na época de Lula. No mesmo diapasão, a Argentina se prepara agora para ingressar no BRICS e desfrutar dos investimentos chineses que serão feitos no projeto estratégico da Nova Rota da Seda.

Como dizia o poeta Cazuza, o tempo não para. Mesmo os EUA não são capazes de detê-lo.

E Bolsonaro, que parou no tempo, mais especificamente na década de 70 do século passado, quando o Brasil vivia na ditadura de que ele tanto gosta, será uma vítima daquilo que Hegel dizia: a história mundial é uma corte de julgamento.  Não esquece e não perdoa.

*Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais.


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Zé Maria

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Este é o “Deep State” nos Estados Unidos da América (EUA)
independentemente de quem esteja na Presidência de lá:
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“Simone Biles e Dezenas de Ginastas Norte-Americanas [+de 90]
exigem Indenização de 1 Bilhão de Dólares do FBI por Negligência
às Denúncias de Abuso Sexual cometido por Médico das Atletas

Simone Biles, McKayla Maroney, Aly Raisman e Maggie Nichols testemunharam
perante o Senado sobre os abusos que as quatro ginastas sofreram por parte
de Larry Nassar, o ex-médico da equipe nacional feminina de ginástica dos
Estados Unidos

RFI (Com informações da AFP)

A Ginasta Multi-Campeã Olímpica e mais de 90 outras ginastas norte-americanas
processaram, na quarta-feira (8/6), o FBI em US$ 1 bilhão por “negligência” no
escândalo do abuso sexual cometido pelo ex-médico Larry Nassar, quando ele
atuava na Seleção de Ginástica Feminina dos Estados Unidos.

“O FBI sabia que Larry Nassar era um perigo para as jovens quando o ataque
contra mim foi relatado pela primeira vez, em setembro de 2015”, disse a ginasta
Maggie Nichols, citada em uma declaração do escritório de advocacia Manly,
Stewart & Finaldi.

Ela acusou os policiais do FBI de “trabalhar” com a Federação de Ginástica
dos EUA e o Comitê Olímpico dos EUA “durante 421 dias para esconder
esta informação do público, permitindo que Nassar continuasse a agredir
meninas e mulheres jovens”.

O ex-médico da equipe feminina norte-americana Larry Nassar,
58 anos, está cumprindo uma pena de prisão perpétua após ter
sido condenado, em 2017 e 2018, por agressão sexual a mais
de 250 ginastas [!!!], a maioria delas menores [!!!], na Federação de
Ginástica, na Michigan State University e em um clube de ginástica.

As acusações iniciais contra ele foram encaminhadas em julho de 2015
ao escritório do FBI, em Indianápolis.

A investigação foi rapidamente abandonada e foi necessário outro
relatório,
em maio de 2016, para que a polícia federal lançasse novas investigações.

Erros [sic] Fundamentais do FBI*
Os agentes “cometeram inúmeros e fundamentais erros e violaram
várias regras do FBI”, decidiu a Inspetoria Geral do Departamento
de Justiça [DoJ]*, mais tarde, em um relatório condenatório.

Entretanto, o DoJ anunciou, no final de maio, que não processaria
os agentes infratores.

“As outras vítimas e eu fomos traídas por todas as instituições que
deveriam nos proteger”, disse a ex-campeã olímpica McKayla Maroney,
também citada na declaração, referindo-se à Federação, ao Comitê
Olímpico, ao FBI e ao Departamento de Justiça.

“É claro que nosso único caminho para a Justiça e a cura é através do
processo legal”, acrescentou ela.

Em setembro de 2021, Maroney, Biles e Nichols disseram a uma
Comissão do Senado que as autoridades esportivas e legais
não haviam agido com base nas acusações contra Larry Nassar.

O FBI não comentou, lembrando o testemunho do diretor do
próprio FBI, Christopher Wray, perante a comissão do Senado
no ano passado.

Naquela época, ele pediu desculpas às vítimas do médico, admitindo
que “os erros fundamentais cometidos em 2015 e 2016 nunca
deveriam ter sido cometidos”.

Em dezembro de 2021, as autoridades esportivas norte-americanas
concordaram em pagar US$ 380 milhões em indenização às vítimas
de Larry Nassar.

https://www.rfi.fr/br/am%C3%A9ricas/20220608-simone-biles-e-dezenas-de-ginastas-norte-americanas-exigem-us-1-bi-do-fbi-em-esc%C3%A2ndalo-de-abuso-sexual
.
*CAIXA PRETA

ConJur (07/06/2021)

* “Parlamentares dos EUA Cobram explicação do DoJ
sobre Relação ilícita com a Operação Lava Jato”

Um Grupo de 20 Deputados e Senadores dos Estados Unidos assinou
uma carta ao Departamento de Justiça (DoJ, na sigla em inglês de
Department of Justice), pedindo que o órgão torne públicas as
informações sobre os contatos entre os órgãos investigativos* dos EUA
e a chamada Operação “Lava Jato” no Brasil.

Segundo a BBC, que teve acesso ao documento, a solicitação foi
enviada ao Secretário de Justiça Merrick Garland.

No texto, os congressistas expressam preocupações com “o
envolvimento de agentes do Departamento de Justiça dos
Estados Unidos (DoJ) em procedimentos investigativos e judiciais
recentes no Brasil, que geraram controvérsia substancial e são vistos
por muitos no país como uma Ameaça à Democracia e ao Estado de
Direito”.

Os parlamentares, ainda de acordo com a BBC, temem que o envolvimento de investigadores norte-americanos em práticas que foram consideradas ilegais* pelo Supremo Tribunal Federal aqui no Brasil possa ser visto como “Interferência na Política de Outro País”.

“Há muito tempo estou preocupada com a Lava Jato e suas consequências para a Democracia Brasileira — particularmente com
o que parece ter sido um Esforço Politizado e falho para prender o
ex-Presidente Lula e mantê-lo fora das urnas em 2018.
Se o DoJ desempenhou algum Papel na Erosão da Democracia
Brasileira, devemos agir e garantir a responsabilização para que isso
nunca se repita”, afirmou à BBC News Brasil a deputada Democrata
Susan Wild, da Pensilvânia, uma das signatárias da carta ao DoJ.

Ela acrescentou ainda que “os Estados Unidos devem estar atentos
à sensibilidade de seus atos tanto no Brasil quanto em outros lugares
da América Latina, dado o Histórico de Interferência dos EUA na Região”.

Essa é a segunda vez que congressistas tentam cobrar respostas
do DoJ desde que começaram a ser divulgadas as conversas
hackeadas entre procuradores do MPF que mostram que eles
“Não Seguiram as Determinações para Cooperação Internacional”,
e tiveram Contato Direto com Norte-Americanos e Suíços Sem
o Conhecimento de Nenhuma Autoridade.

Da primeira vez, os senadores e deputados pediram explicações
em 2019, levantando uma série de questões sobre a [i]legalidade
das Relações com os Procuradores Brasileiros [especialmente a
Força-Tarefa de Curitiba].

A resposta só veio em junho de 2020, e foi uma negativa completa.

“O Departamento não pode fornecer informações sigilosas sobre esses
assuntos nem revelar detalhes não públicos das ações”, afirmou.

Cooperação “Informal”
Várias trocas de Mensagens entre Procuradores atestam que houve
Contatos Fora* dos Canais Oficiais para compartilhamento de
Informações sobre os Processos Brasileiros com as Autoridades Norte-
Americanas.

As conversas citam, por exemplo, uma reunião com representantes
do DoJ e do FBI* para troca de informações que os integrantes da
“lava jato” estavam preocupados em esconder do governo brasileiro.

Também apontam que essas reuniões e outras conversas “POR FORA”* serviram para Combinar a Negociação de Repasses do Dinheiro* das Multas Aplicadas às Empresas Brasileiras nos EUA para a Criação de
um Fundo Bilionário* no Brasil, a ser Gerido* pelos Próprios Membros
do MPF. [!!!]

O jornal francês Le Monde montou a cronologia das relações entre a
“lava jato” e os investigadores dos Estados Unidos, explicitando de
que forma os procuradores trabalharam em prol dos interesses dos
americanos, que queriam neutralizar a ascensão geopolítica brasileira
no cenário internacional.

No Brasil, o Ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), também já cobrou explicações do Governo Brasileiro
sobre os contatos, perguntando se houve intermediação do Ministério
da Justiça para os encontros entre a “lava jato” e investigadores
internacionais.

Revista Consultor Jurídico (Conjur), 7 de junho de 2021.

https://www.conjur.com.br/2021-jun-07/parlamentares-eua-cobram-explicacao-relacao-lava-jato

Morvan

Brasil, levado a potência [sexual] ou não: compra de próteses fálicas, com dinheiro do povo, e ‘entrega prioritária’ de revista Playboy para o Generalerda (generalzinho de m…) Villas Péssimas.
Depois do golpe, de ‘Pátria Educadora’ para ‘Pútria Onanista’ foi um pulo.

Sandra

“Espichado numa cadeira de pernas abertas, quase dormindo, olhando para o vazio, com uma cola na mão durante o encontro com o presidente Joe Biden na Cúpula das Américas, como se estivesse conversando na cantina do quartel, o capitão era o próprio retrato da decadência do país sob o seu governo.“
Ricardo Kotscho
Colunista do UOL
10/06/2022 14h28

Zé Maria

No que foi transformado o Brasil por esses Milicos Milicianos Sem-Vergonhas,
é uma Lástima!

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