Manuel Domingos Neto: As Forças Armadas e a preservação das corporações

Tempo de leitura: 3 min
Nesta quinta-feira, 08/02, estes quatro generais foram alvo de busca e apreensão em suas residências: Braga Netto (ex-ministro da Defesa), Augusto Heleno (ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional -GSI), Paulo Sérgio Nogueira (ex-ministro da Defesa, ex-comandante do Exército) e e Stevan Teófilo Gaspar de Oliveira (ex-chefe do Comando de Operações Terrestres do Exército). Fotos: Agências Senado e Brasil

A PRESERVAÇÃO DAS CORPORAÇÕES

Por Manuel Domingos Neto*

As operações de busca e apreensão na residência de generais próximos de Bolsonaro e a prisão de dois oficiais superiores deixou confiantes os que prezam a democracia.

Quem grita, “sem anistia”, sentiu-se contemplado. Muitos salientaram tratar-se de momento histórico sem precedentes e aplaudem a coragem do ministro Alexandre de Moraes.

A maioria aceita a ideia de que a democracia venceu. Nestes tempos obscuros, é bom demais ter algo de relevante a comemorar.

Mas, caberia pensar… ao acatar decisões judiciais desta monta, as corporações, profundamente envolvidas em manobras antidemocráticas nos últimos anos, não passam a falsa noção de que, repentinamente, em lance histórico inédito, assumem seriamente a institucionalidade do jogo democrático?

Uma ação da Justiça, por contundente que seja, teria o condão de alterar a velha tendência castrense de interferir no jogo político?

Mais sensato seria imaginar que a postura dos comandantes revela a satisfação diante da prevalência dos desígnios das fileiras.

O atual governo não mostrou disposição para alterar as orientações da Defesa Nacional e, consequentemente, reformar instituições militares ineptas para dizer não ao estrangeiro hostil e aptas ao controle da sociedade.

O militar continua pautando o governo em matéria de Defesa. O ministro José Múcio assume com todas as letras sua condição de “representante” das Forças, abdicando da condição de integrante da corrente política sufragada nas urnas.

Como se sabe, a condução da política de Defesa guarda implicações diretas com os mais variados domínios da atuação do Estado, em particular com as relações externas, a Segurança Pública, o desenvolvimento técnico-científico e industrial.

A política de Defesa é uma peça-chave da integração sul-americana. Ao ditar a Política de Defesa o militar se imiscui como quer nas entranhas do Estado e da sociedade. Em outras palavras, persiste exercendo a tutela configurada ao longo do regime republicano.

O atual governo assegura a continuidade de práticas corporativas ancestrais que garantem a priorização do combate ao “inimigo interno” em detrimento da capacidade de dizer não ao potencial agressor estrangeiro.

O Brasil continua sustentando extensas fileiras terrestres e evitando priorizar sua capacidade aeronaval; persiste sem instrumentos de força para respaldar decisões soberanas em política externa.

As Forças Armadas brasileiras continuam integrando oficiosamente o vasto esquema militar comandado pelo Pentágono.

Vitoriosos no embate político principal, os comandos militares acatam o sacrifício de alguns dos seus em troca da preservação da capacidade de ingerir nos negócios públicos e na vida social.

Hoje, em essência, ao tempo em que a institucionalidade democrática mostra vigor, foi dado um passo importante para conter a corrosão da imagem das Forças Armadas.

Talvez seja esse o significado mais relevante da operação comandada pelo Polícia Federal: o acatamento da decisão judicial ocorre como ato de proteção corporativa.

Os comandantes sabiam da impossibilidade de sair incólumes depois da aventura em que se meteram ao apadrinhar Bolsonaro e respaldar seus desmandos.

Afinal, atuaram em favor da prisão de Lula e confraternizaram com baderneiros reunidos diante dos quartéis. Em sua trágica aventura, envolveram o conjunto das corporações.

O preço a pagar pela preservação das instituições militares seria o sacrifício de alguns camaradas, os mais notoriamente associados ao ex-presidente.

Mas nada garante que o jogo de cena em curso se desenvolva de forma exitosa.

Os oficiais hoje investigados se comportarão altivamente na defesa de suas corporações?

Aceitarão ser punidos solitariamente preservando a imagem das fileiras?

Eis uma hipótese remota, se considerarmos a conduta do coronel Mauro Cid, que forneceu elementos preciosos aos investigadores.

Difícil imaginar homens arrogantes e truculentos, como os generais Augusto Heleno e Braga Netto resignando-se ao cárcere. Mais fácil é imaginá-los atirando, inclusive em seus desafetos fardados. A caserna cultiva camaradagem e desafeições.

Quanto ao ex-presidente, pior ainda. Quem aposta no padrão moral de Bolsonaro?

Na cadeia, esse homem, com arrobas de crimes nas costas, poderá bater com a língua nos dentes e desmontar o imaginário coletivo tão cultivado pelas fileiras. Não seria surpresa caso seja silenciado.

Qualquer que seja o rumo dos acontecimentos, o fato é que estamos longe do final de um triste e trágico capítulo da história brasileira.

Manuel Domingos Neto é doutor em História pela Universidade de Paris, escreveu O que fazer com o militar – Anotações para uma nova Defesa Nacional

Leia também

Jeferson Miola: O primeiro degrau da responsabilização dos militares

Valter Pomar: Hamilton Mourão não é uma vaca fardada

Kennedy Alencar: Os ‘legalistas’ da cúpula militar ficaram na moita, dando tempo para que Bolsonaro consumasse o golpe


Siga-nos no


Comentários

Clique aqui para ler e comentar

Zé Maria

https://pbs.twimg.com/media/GF5CUwKXIAA77Bz?format=jpg

“O projeto de lei do Mourão para anistiar os GOLPISTAS de 8 de janeiro
é a tentativa descarada de legislar em causa própria.

O ‘Paquita da Ditadura’ tem que ter o mandato cassado, ser julgado
e preso junto com Jair Bolsonaro mentores, mandantes e financiadores.”

#GeneraisGolpistasNaCadeia #BolsonaroNaCadeia

https://twitter.com/DistopiaBrazil/status/1755913831090466863

.

Zé Maria

Exército Brasileiro montou uma ação para trazer de volta ao Brasil o coronel Bernardo Romão Corrêa Netto, um dos militares alvo da Operação Tempus Veritatis.

Corrêa Netto está em Washington, nos Estados Unidos, para onde foi em 30 de dezembro de 2022 para fazer um curso de medidas administrativas no Colégio Interamericano de Defesa.

Fontes militares relataram na Imprensa que, logo após ter sido alvo da operação, o coronel foi desligado do curso.

De acordo com as investigações, Corrêa Netto é suspeito de convocar reuniões com militares “kids pretos” – também chamados de Forças Especiais (FE) – para atuarem em favor das manifestações nas portas dos quartéis e nos atos voltados às invasões no dia 8 de janeiro 2023, quando as sedes dos Três Poderes, em Brasília, foram depredadas.

Kids pretos são militares da ativa ou da reserva do Exército, especialistas em operações especiais, treinados para participar de missões com alto grau de risco e sigilo.

Agora, o Exército está providenciando uma passagem de volta para que Corrêa Netto retorne ao Brasil. Ele fará a viagem escoltado por um oficial da Força.

Quando chegar ao Brasil, deverá ser recebido no aeroporto de Brasília por agentes da Polícia Federal.

Depois, assim como os outros militares alvo da operação, ficará preso em área militar.

Na quinta-feira (8) a PF lançou a Operação Tempus Veritatis para investigar uma organização criminosa acusada de “tentativa de golpe de Estado e
abolição do Estado Democrático de Direito” nos períodos que antecederam
e se seguiram às eleições gerais de 2022, em uma tentativa de garantir a “manutenção do então presidente da República Jair Bolsonaro no poder”,
independentemente do Resultado da Eleição Presidencial.

Íntegra da Reportagem em:

https://sputniknewsbr.com.br/20240209/32973886.html

.

Zé Maria

“Cabe às Forças Armadas
apoiar a decisão da Justiça”

José Múcio Monteiro
Ministro da Defesa.
Tirando o C_ da Reta

Deixe seu comentário

Leia também