Jeferson Miola: Mourão e a ditadura militar que se avizinha

Tempo de leitura: 4 min
Mourão se despede do Exército cumprimentando o então comandante general Eduardo Villas Bôas. Foto do twitter

Combateu o terrorismo e a guerrilha, por isso ele é um herói. General Hamilton Mourão, em 28.02.2018, ao passar para a reserva, elogiando Carlos Alberto Brilhante Ustra, acusado de ser torturador pela Comissão da Verdade

O general Mourão e a ameaça de escalada ditatorial

por Jeferson Miola

No artigo Limites e responsabilidades [Estadão, 14/5] o vice-presidente Hamilton Mourão não cita uma única vez Bolsonaro e, como na peça Entre quatro paredes de Jean-Paul Sartre, ele proclama que “o inferno são os outros”.

Mourão culpa pelo “desastre” do país todo o mundo exterior ao “quarto fechado” em que o governo militar se encerra.

Para ele, o inferno [inimigos] são imprensa, legislativo, judiciário, governadores, cientistas, intelectuais, oposição …

Há quem entenda que o vice-presidente quis mostrar credenciais para substituir Bolsonaro na eventualidade de afastamento dele pelo Congresso ou pelo Supremo.

Mourão, porém, não só eximiu Bolsonaro e o governo de responsabilidades, como culpou e ameaçou os outros pelo desastre.

No subtexto, que parece representar o sentimento reinante nas Forças Armadas, Mourão implicitamente sinaliza a perspectiva de escalada ditatorial com Bolsonaro.

É importante sublinhar: Mourão defende uma ditadura com Bolsonaro, não uma ditadura sem Bolsonaro ou apesar do Bolsonaro.

A turbulência política, o colapso social e a conjunção das catástrofes econômica, política e sanitária deverão acelerar a escalada autoritária.

A resposta ao caos será a ordem e a autoridade imposta pelos militares, como rezam os manuais castrenses.

A blindagem do Bolsonaro na Câmara já foi comprada com a entrega de fatia bilionária do orçamento a deputados do hiper-corrupto Centrão.

Com isso, a autorização para o julgamento dele tanto pelo Congresso [crimes de responsabilidade] como pelo Supremo [crimes comuns] fica bloqueada, pois hoje a Câmara não tem os 342 votos [2/3 dos 513] para autorizar o início dos processos.

Os atos inconstitucionais que pedem intervenção militar, fechamento do Congresso e do STF, e nos quais o próprio presidente da República participa, não são rechaçados pelo comandante do Exército e pelo ministro da Defesa, como seria esperável.

E os militares desprezaram várias ocasiões para afastar categoricamente as suspeitas de que estão conspirando para a ruptura institucional.

Numa delas, em 19 de abril, dia do Exército, em frente ao Quartel-General do Exército, Bolsonaro proclamou que “a Constituição sou eu!”, para sua matilha que mostrava faixas com pedido de “intervenção militar com Bolsonaro no poder”.

É sintomático que terroristas tenham tido consentimento para bloquear a rua do Quartel-General do Exército, área de segurança nacional, para atacar a Constituição e os poderes de Estado.

Outra ocasião foi em 3 de maio.

Naquele domingo, depois de prestigiar da rampa do Planalto sua matilha fascista pedir o fechamento do STF e do Congresso e agredir jornalistas, Bolsonaro bradou: “chegamos no limite. Acabou a paciência”, “as Forças Armadas estão ao nosso lado”.

No dia seguinte, o ministro da Defesa Fernando Azevedo e Silva divulgou nota em que condenou a agressão a jornalistas mas, em termos práticos, referendou os ataques do Bolsonaro à Constituição.

A democracia, para se manter, dispensa declarações de militares a favor do Estado de Direito, porque a presença deles na arena política é incorreta e, além disso, eles não são tutores ou guardiões da democracia, embora tutelem o presidente do STF Dias Toffoli.

O que se exige dos militares, se eles de fato não estão participando de conspiração contra a Constituição, é que rechacem toda e qualquer evocação conspirativa feita em nome das próprias Forças Armadas.

É nítida a simbiose entre Bolsonaro e militares.

O genocida sociopata é o rosto político mais popular do “partido militar” que foi sendo organizado discretamente na caserna durante os últimos 35 anos, num processo sistemático de politização e ideologização das tropas.

O engajamento político dos militares deu um salto considerável com a participação deles em controvertidas missões internacionais.

As vivências como “governantes armados” do Haiti e do Congo aumentaram a autoconfiança, o apetite por poder e a aspiração política em voltar a governar o Brasil na mesma perspectiva autoritária e de contenção social aprendida naquelas experiências.

O artigo do Mourão, neste sentido, está em linha com a estratégia de militarização da política e do Estado, e de aprofundamento do poder militar.

Mourão continua coerente com a visão antidemocrática exposta na campanha eleitoral de 2018.

Em debates à época, ele defendeu a elaboração de nova Constituição por uma comissão de notáveis.

Afinal, “uma Constituição não precisa ser feita por eleitos pelo povo”, disse ele. E ele defendeu, também, a hipótese de um “autogolpe” do Bolsonaro com o apoio das Forças Armadas:

“Quando você vê que o país está indo para uma anomia, na anarquia generalizada, que não há mais respeito pela autoridade, grupos armados andando pela rua… […] As Forças Armadas têm responsabilidade de garantir que o país se mantenha em funcionamento. Cruzamos os braços e deixamos que o país afunde?”.

O caos metódico produzido por Bolsonaro, que será aprofundado com a radicalização da política irresponsável e criminosa no enfrentamento da pandemia com a substituição do ministro da saúde Nelson Teich, poderá finalmente criar o ambiente de “anomia, anarquia generalizada, que não há mais respeito pela autoridade, grupos armados andando pela rua …” para que os militares entrem em campo para “garantir a ordem”.

Esse clima fabricado pelo próprio governo genocida poderá servir de álibi para a perpetração do golpe fatal e para a instauração de nova ditadura militar.

A Globo, a Lava Jato, FHC, Aécio, Temer, a oligarquia golpista e malta canalha estão devendo um pedido de desculpas ao povo brasileiro por terem jogado o Brasil neste precipício fascista.


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Comentários

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Zé Maria

“Professor de todos nós”
Véio Ives Gandra Martins
a Olavo de Carvalho.
Tomaram conta do Jair.
https://youtu.be/zklEKLiPYR4

Zé Maria

O Véio Gandra, da OPU DEI, tentou ressuscitar a Ação Integralista Brasileira (AIB)
sinalizando um Golpe Militar às Forças Armadas, passando por cima do Supremo.
Anticomunista Paranóico, nos moldes de Olavo de Carvalho, ligado ao Mises.

Zé Maria

Governador Flavio Dino (PCdoB=MA) responde com classe
a questionamentos de Cristiana Lobo e Fernando Gabeira:
https://youtu.be/D2G8aSplrUo?t=3196
https://youtu.be/D2G8aSplrUo?t=4574

a.ali

essa turba devendo um pedido de desculpas ? mas era pra isso mesmo que deram o golpe na Presidenta Dilma e ela falou a consequencia do ato tresloucado deles, como estamos vivenciando, a cada dia!
já estamos nesse redemoinho de ditadura, desde que esse fascista e catrefas se aninharam nos poderes, esses mesmos que “estão funcionando”…
o povo, uns achando sinal de alarme (?) falso, outros adorando a idéia e outros se degladiando nas redes sociais e a milicada, entreguista, nem disfarsa mais … e os partidos, centrais sindicais, conselhos profissionais…e sociedade, no geral, esperando a pandemia passar para uma atitude ou as eleições de 2022 p/ uma “resposta madura” , como se elas fossem acontecer…

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