Entidades apoiam combate à indústria de fake news, mas sem censura ou violar a liberdade de expressão

Tempo de leitura: 5 min
A família das fake news. Reprodução

Jornalistas, veículos e entidades assinam manifesto contra censura e fake news

Do Barão do Itararé

Um dos temas que têm mobilizado setores importantes da sociedade brasileira é como enfrentar a pandemia de mentiras e desinformação que tomou conta do debate público, principalmente em razão da escala e velocidade que as novas formas de circulação da informação conferiram à este fenômeno.

O problema colocado é bastante delicado: como enfrentar as “fake news” sem gerar censura e violar a liberdade de expressão.

Além disso, caberá a quem, a qual instituição definir o que é verdade ou não? A partir de quais critérios?

Está claro que é preciso envolver a sociedade nessa discussão, para evitar que soluções aparentemente fáceis e rápidas produzam um estrago ainda maior.

É este o alerta que as entidades, veículos de comunicação e jornalistas querem transmitir ao publicar o manifesto “Democracia se constrói com informação de qualidade, sem censura e sem fake news”.

O documento trata do perigo que representa a tentativa do Senado em aprovar, na próxima semana, o projeto de lei de autoria do Senador Alessandro Vieira (PL 2630/2020) para combater Fake News.

O Projeto de Lei, elaborado conjuntamente pelos deputados Felipe Rigoni e Tabata Amaral, que apresentaram na Câmara dos Deputados projeto do mesmo teor, propõe uma série de medidas que, se não forem devidamente debatidas e estudadas, podem dar ainda mais poder para as plataformas de Internet (Facebook, Twitter, Instagram, Youtube e outras) arbitrarem sobre o que deve ou não circular em suas plataformas, legitimando práticas de remoção de conteúdo.

Confira, a seguir, a íntegra do manifesto e a lista de signatários.

Para assinar, envie e-mail com nome, ocupação veículo e/ou entidade para [email protected]

DEMOCRACIA SE CONSTRÓI COM INFORMAÇÃO DE QUALIDADE, SEM CENSURA E SEM ‘FAKE NEWS’

A disseminação em massa de “fake news” é um fenômeno global que tem consequências devastadoras para a vida e para a democracia.

O problema é real e exige respostas efetivas que preservem o direito fundamental à liberdade de expressão, que permitam o livre debate de ideias e de perspectivas sobre os acontecimentos.

A sociedade precisa enfrentar essa pandemia de mentiras e desinformação, que são produzidas de forma coordenada por setores ideológicos, políticos e econômicos, que investem muito dinheiro e inteligência para distorcer propositadamente a realidade, com o objetivo de alcançar seus objetivos e defender seus interesses.

A crise sanitária, que neste momento atinge o mundo, revelou de forma dramática o perigo que as “fake news” representam: líderes políticos ignorando a ciência para dizer que o Covid-19 é apenas uma “gripezinha”, estímulo ao uso de medicamentos sem comprovada eficácia científica, a disseminação de conteúdos afirmando que a doença não existe, ou foi fabricada para derrubar o presidente, etc.

Em meio a essa crise, surge uma pressão para que o Congresso Nacional dê resposta legislativa para o combate às “fake news”.

É fundamental que deputados e senadores tomem a iniciativa de realizar um amplo debate público sobre o melhor caminho a ser adotado para enfrentar a pandemia da mentira e desinformação.

Nós, jornalistas e comunicadores sociais — que trabalhamos para oferecer informação de qualidade para a sociedade, que lutamos para dar expressão e visibilidade a fatos e opiniões que não têm espaço na mídia hegemônica, que temos contribuído para conferir mais pluralidade e diversidade ao debate público no Brasil — afirmamos que não se pode, sob o pretexto de combater as “fake news”, criar mecanismos privados de avaliação da veracidade de conteúdos jornalísticos.

Alertamos para o perigo que representará para a democracia e para a liberdade de expressão conferir às plataformas privadas da internet a responsabilidade de definir que conteúdos são ou não verídicos, iniciativa que inclusive viola o Marco Civil da Internet.

Tampouco podemos acreditar que agências privadas de checagem de notícias podem cumprir esse papel com isenção e neutralidade, ou que seja possível nomear grupos de jornalistas com o poder de classificar conteúdos jornalísticos produzidos por outros jornalistas.

Não se combate “Fake News” criando um Ministério da Verdade. Sabemos como isso acaba: com a tentativa de legitimação da censura.

O problema contemporâneo envolvendo a disseminação de mentiras e desinformação pode ser combatido de outra forma: criando instrumentos legais e usando os já existentes para desmontar os gabinetes de ódio e as fábricas de produção industrial de “fake news”.

Isso pode ser feito cruzando as fontes de distribuição de desinformação — nas redes sociais, nos sítios web — com os esquemas criminosos de financiamento dessas estruturas.

É preciso responsabilizar civil e criminalmente empresas que financiam essas estruturas para fabricar e disseminar de forma artificial esses conteúdos que podem trazer danos à vida e à democracia.

Agentes públicos que financiem e produzam esse tipo de conteúdo também devem ser responsabilizados por isso.

Também é fundamental exigir que as plataformas prestem informações transparentes sobre todos os mecanismos de mediação de conteúdos que elas já utilizam para definir o fluxo da circulação dos conteúdos.

Só é possível enfrentar essa questões a partir de um amplo debate, o que pressupõe a construção de mecanismos que incluam os mais variados setores sociais na discussão de propostas concretas.

Neste momento de isolamento social, em que a Câmara e o Senado debatem remotamente, sem a realização de audiências públicas e outras formas de participação social, não é viável garantir amplo debate sobre o tema.

Neste sentido, alertamos para o perigo que pode representar para a democracia e para a liberdade de expressão a aprovação de qualquer projeto de lei sobre esse tema, de forma sumária e sem que estas formas de participação e diálogo amplo sejam produzidos.

São Paulo, 25 de maio de 2020.

Assinam este manifesto:

Entidades

Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé

Associação Brasileira de Imprensa

Abraço – Associação Brasileira de Rádios ComunitáriasFederação Nacional dos Jornalistas

Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação

Núcleo Piratininga de Comunicação

União da Juventude Socialista – UJS

Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil – CTB

Confederação Nacional das Associações de Moradores – Conam

Agência de Notícias das FavelasUnião da Juventude Socialista – UJS

Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil – CTB

Confederação Nacional das Associações de Moradores – Conam

União de Negras e Negros pela Igualdade – UNEGRO

Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG)

Veículos

Jornalistas Livres

Revista Fórum

Brasil 247

Le Monde Diplomatique Brasil

Viomundo

O Cafezinho

Outras Palavras

Diálogos do Sul

Saiba Mais

Portal Vermelho

Jornalistas/Individuais

Altamiro Borges – presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé

André Fernandes – Fundador da Agência de Notícias das Favelas

Antônio Martins – Editor do Outras Palavras

Aquiles Lins – jornalista, editor do Brasil 247 e doutorando em Ciência Política

Denise Assis – jornalista e colunista do 247

Fernando Morais – escritor e autor do blog Nocaute

Florestan Fernandes Jr – jornalista

Heloisa Toledo – diretora de teatro

Hildegard Angel – jornalista

Inácio Carvalho – Editor do Portal Vermelho

Jeferson Miola – jornalista

José Reinaldo de Carvalho – jornalista

Juarez Tadeu de Paula Xavier – docente do curso de jornalismo da Universidade Estadual Paulista

Juca Kfouri – jornalista

Kiko Nogueira – Editor Diário do Centro do Mundo

Laura Capriglione – Fundadora dos Jornalistas Livres

Laurindo Leal Filho – jornalista e professor aposentado

Leonardo Attuch – Editor do Brasil 247

Marcelo Auler – jornalista

Marcia Tiburi – filósofa

Marcos Dantas – professor titular da Universidade Federal do Rio de Janeiro

Miguel do Rosário – Editor do Cafezinho

Miguel Paiva – jornalistas pela Democracia

Patricia Smaniotto – jornalista

Paulo Salvador – da Rede Brasil Atual

Rafael Duarte – Agência Saiba Mais

Renata Mielli – jornalista, coordenadora-geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação

Renato Aroeira – cartunista e músico

Rodrigo Vianna – jornalista

Sergio Lirio – redator-chefe da Carta Capital

Sergio Mamberti – Ator e dramaturgo

Silvio Caccia Bava – Editor do Le Monde Diplomatique Brasil

Teresa Cruvinel – jornalista

Vanessa Martina Silva – Editora da revista Diálogos do Sul

Ademir Wiederkehr – jornalista e Secretário de Comunicação da CUT/RS

Érica Aragão – jornalista e radialista

Maricélia Pinheiro de Almeida – jornalista do Sindicato dos Metalúrgicos da Grande Porto Alegre


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Comentários

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Morvan

#CassaChapaTSE
Sem uma resposta à indústria das fake news, adeus democracia, mesmo essa que temos, formalíssima, cheia de tapumes. O diálogo político some, a política é sobrepujada e o eleito dificilmente representará setores vulneráveis da sociedade. Substitui-se o semiótico pelo simiótico. Aconteceu aqui e algures. E como a pandemia do Covid-19 não foi enfrentada, de modo minimamente adequado, aqui e na Matriz diz muito, só para citar um exemplo de anomia.
Saúdo o Sleeping Giants e o Caça Fakes, pelas suas já vultosas intervenções no nosso país.

Zé Maria

Em Situação de Normalidade Democrática, na Vigência do Estado de Direito,
sob a Égide da Constituição Federal de 1988, o Aparato Estatal e a Sociedade
devem se submeter à Legislação Brasileira em vigor.
No Regime Democrático do Brasil, o Ministério Público (MP) é quem deve
representar os interesses da Sociedade, mediante o Exercício da Atividade de Defesa e Aplicação do Direito, e quem, uma vez demandado individual ou coletivamente ou pelo MP, deve julgar as ações militares, penais e civis,
inclusive as trabalhistas e eleitorais, nas instâncias competentes, é o Poder Judiciário, ficando a cargo do Supremo Tribunal Federal (STF) o Controle de Constitucionalidade das Leis e dos Atos dos Poderes Executivo e Legislativo,
além de funcionar como Última Instância de Julgamento de Recursos contra Decisões Proferidas pelas Instâncias Inferiores.

Porém, como o Brasil vive na realidade, há algum tempo, numa Balbúrdia, para não dizer Esculhambação, verdadeira Anarquia Institucional, não há Segurança
Jurídica alguma para defender qualquer Medida Normativa Excepcional, pois
corre-se o risco de sofrer um Atentado à Ordem Jurídica Vigente, sobretudo por
Atitudes Despóticas contra os Direitos e Garantias Fundamentais dos Cidadãos.

Não se arruma a mesa num Terremoto, nem se abre guarda-chuva em Temporal.
É hora de resguardar, primeiro, a Constituição e o Estado Democrático de Direito.

    Zé Maria

    PL 1429/2020
    Projeto de Lei

    Situação: Aguardando Despacho do Presidente da Câmara dos Deputados

    Autor
    Felipe Rigoni – PSB/ES , Tabata Amaral – PDT/SP

    Apresentação
    01/04/2020

    Ementa
    Institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet.

    Tramitação
    Data Andamento

    01/04/2020 Plenário ( PLEN )
    Apresentação do Projeto de Lei n. 1429/2020, pelo Deputado Felipe Rigoni (PSB/ES), que “Institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. “.

    26/05/2020 Plenário ( PLEN )
    Apresentação do Requerimento n. 1299/2020, pelas Deputadas [sic]
    Felipe Rigoni (PSB/ES) e Tabata Amaral PDT, que “Requer a retirada
    de tramitação e o arquivamento do Projeto de Lei nº 1429 de 2020
    que Institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e
    Transparência na Internet”.
    Inteiro teor [Requerimento de Retirada de Tramitação Nº 1299/2020]:
    (https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=F324FB1C615353EEAFFD7CCAF5BE75FF.proposicoesWebExterno1?codteor=1898026)

    https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=2242713

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