Congresso vai investigar assédio na orquestra

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Crise na OSB: Congresso investigará denúncias denúncias de assédio moral e integridade física aos músicos da orquestra

por Andrea Mazilão

A Frente Parlamentar Mista em Defesa da Cultura no Congresso Nacional decidiu aprofundar investigações sobre as denúncias de assédio moral e ameaça à integridade física feitas pelos próprios integrantes da Orquestra Sinfônica Brasileira (OSB) e a OSB Jovem durante audiência pública realizada pela Comissão de Cultura da Assembleia Legislativa do Estado do Rio (Alerj) na tarde da última segunda-feira (18|abril). Depois de ouvir esclarecimentos dos músicos da OSB, o deputado estadual Robson Leite (PT), que preside a Comissão de Cultura, decidiu provocar o Ministério Público do Trabalho para investigar as causas de uma crise que já dura mais de seis meses e parece longe do fim.

Depoimentos. Os esclarecimentos prestados pelos músicos, professores da OSB e representantes do Sindicato dos Músicos do Rio de Janeiro serviram para confirmar as fortes evidências que vinham sendo divulgadas pela grande mídia nos últimos meses. Para Robson Leite, autor da iniciativa, as informações são suficientes para justificar a adoção de mais rigor nas investigações, além da aplicação de medidas punitivas. “Além de ser regente da OSB, descobrimos que o maestro Roberto Minczuk também é diretor artístico do Theatro Municipal. Isso é ilegal. Há uma violação de direitos do estatuto dos músicos e há dinheiro público federal aplicado na OSB que não sabemos como está sendo utilizado”, afirma.

Congresso Nacional.
A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que preside a Frente Parlamentar de Cultura no Congresso Nacional, prometeu levar adiante as investigações iniciadas pela Alerj. Segundo ela, a ideia é somar os esforços das comissões de Educação e Cultura e Esporte do Senado e Finanças, Controle e do Trabalho da Câmara e tratar do assunto conjuntamente e garantir mais agilidade no gerenciamento da crise.  “Pretendemos provocar a Receita e Ministério Público Federal e do Trabalho, além de realizarmos audiências públicas nas duas Casas. O indispensável é que consigamos garantir transparência em todo o processo de gestão”, declarou a parlamentar.

Depois de colher todos os relatos, inteirar-se do Estatuto do Sindicato dos Músicos Profissionais do Rio e conhecer o contrato de trabalho do maestro Roberto Minczuk, Jandira disse estar convencida sobre a existência de sérias irregularidades. “O estatuto determina que qualquer demissão deve ser submetida à Comissão de Músicos da OSB e isso não aconteceu. Ele está assinando um atestado de incompetência ao pedir que seja feita uma avaliação da orquestra que ele mesmo rege há cinco anos. Se Minczuk não teve capacidade para analisar o desempenho dos músicos durante cinco anos, o que dizer de apenas 30 minutos de prova”, indaga.

Jandira lembra que antes da audiência pública na Alerj, o contrato do maestro Minczuk também se constituía em outro grande mistério. Seus rendimentos foram omitidos por uma inexplicável “cláusula de sigilo”, que a parlamentar nunca conseguiu descobrir nem mesmo quando foi Secretária Municipal de Cultura do Rio. Mas, o silêncio foi quebrado quando Jandira leu publicamente o teor de um contrato terceirizado com empresa prestadora de serviços para a Fundação OSB, o que credita ao caso mais um detalhe intrigante. Embora o regente Minczuk não seja funcionário da OSB, seus proventos chegam a 200 mil reais mensais, além dos rendimentos como diretor artístico e maestro da Filarmônica de Calgary, no Canadá.

Demissão.
No mesmo dia em que foi realizada a audiência pública na Alerj, a assessoria da Fundação Theatro Municipal do Rio de Janeiro, presidida pela atriz Carla Camurati, divulgou uma nota informando que o maestro Minczuk solicitou exoneração do cargo de diretor artístico, sendo substituído pelo maestro Sílvio Viegas, titular da Orquestra Sinfônica do Teatro Municipal (OSTM).

Antigas críticas.
O acúmulo de funções por Roberto Minczuk vinha sendo criticado pelos músicos do teatro. Já na OSB, a crise era bem mais profunda: depois de alguns afastamentos, o clima ficou tão tenso que parte do corpo da orquestra pedia à fundação que administra a orquestra que o maestro fosse afastado. A insatisfação do corpo de músicos da Fundação em relação ao maestro Roberto Minczuk se agravou com a tentativa de se implantar um teste de avaliação aos membros da orquestra.

Trinta e três músicos, descontentes com a medida, foram demitidos. Em carta aberta para divulgar suas contrapropostas, músicos da OSB querem que os 33 demitidos sejam readmitidos, convertendo as justas causas em suspensão de dois dias, e criar um comitê artístico para auxiliar a direção artística de 2011.

Outros esclarecimentos. O ex-presidente da Comissão dos Músicos da orquestra, Luzer David, também foi ouvido. “Nunca fomos contra a avaliação dos músicos, apenas somos contra a maneira como ela é feita. Em nenhum lugar do mundo – e isso sabemos porque entramos em contato com orquestras do mundo inteiro -, uma avaliação desse porte é feita em uma apresentação individual, por 30 minutos e na frente de uma banca internacional. A avaliação sempre é feita através da observação da integração diária na orquestra, vendo como cada um se dedica”, contou.

Representante da Comissão dos Músicos da OSB Jovem, Ayram Nicodemo explicou o motivo da recusa da orquestra em se apresentar no concerto do último dia 9, quando os artistas se levantaram e se retiraram do palco. “Desde que tomamos ciência do que acontecia com a orquestra profissional, ficamos abalados. A maioria dos demitidos tinha uma ligação grande com muitos de nós, por serem professores e amigos. Após semanas de debates na comissão, decidimos, no dia anterior ao concerto, que não iríamos nos apresentar. Tentei me explicar para o público, mas o microfone foi cortado. Mesmo assim, conseguimos divulgar nossa carta de desculpas”, explicou Ayran, que garantiu não ter sido coagido por nenhum dos músicos demitidos.

Ele também contou que Minczuk ia aos ensaios escoltado por seguranças armados. “Um colega meu disse ter sido ameaçado por um dos seguranças do maestro somente por ter se aproximado da sala de Minczuk”, declarou Nicodemo, comentando o medo que os integrantes da OSB Jovem tinham do regente da orquestra. Para o deputado Robson Leite, os músicos, apesar de jovens e aprendizes, foram muito corajosos. “Eles colocaram em risco suas bolsas de estudos pelo bem-estar comum de toda a OSB”, ressaltou.

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Débora Cheyne, que representou o Sindicato dos Músicos do Rio de Janeiro, afirma que espera que haja conciliação entre a direção da OSB e os músicos da entidade, mas ressalta que a demissão dos músicos trouxe a interrupção do processo de criação e de maturação das peças que seriam apresentadas na temporada.

ENTENDA O CASO. Pouco antes de um concerto em homenagem ao pintor Candido Portinari, os músicos da OSB Jovem abandonaram o palco em protesto ao maestro Roberto Minczuk e às demissões dos integrantes da orquestra principal. O programa iria inaugurar a temporada deste ano.   Todo o corpo da OSB Jovem já estava no palco posicionado perante o público quando Minczuk entrou em cena e foi recebido por vaias. Um representante do grupo leu um manifesto afirmando que a OSB Jovem se recusava a substituir a orquestra principal. “Para haver música, deve haver músicos. Para haver músicos, deve haver respeito”, dizia um trecho. Do lado de fora, músicos demitidos da OSB e simpatizantes faziam um protesto nas escadarias. O público deixou a sala e o concerto previsto para o domingo seguinte foi cancelado. O episódio ocorreu no último dia 9/abril (sábado).

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