Carla Teixeira: A PEC de Rodrigo Pacheco é negacionismo científico e racismo institucional

Tempo de leitura: 2 min
Foto: Lula Marques/Agência Brasil

A PEC de Rodrigo Pacheco

A decisão do de tornar ilícito o porte de qualquer quantidade de droga é negacionismo científico, racismo institucional e total ausência de compromisso cívico dos senadores com os problemas reais da sociedade

Por Carla Teixeira*, em A Terra é Redonda

O Senado Federal aprovou em dois turnos a Proposta de Emenda Constitucional (PEC), submetida pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que torna crime a posse de qualquer quantidade de substância ilícita.

Na prática é uma resposta direta à decisão do Supremo Tribunal Federal que julga, desde 2015, a inconstitucionalidade da criminalização do porte de drogas, buscando critérios para diferenciar usuários de traficantes.

A proibição das drogas, especificamente da cannabis – vinculada por vários estudos históricos e antropológicos aos pretos escravizados do período colonial e imperial, e utilizada nos hospitais de alienados no início da República até que fosse proibida – é mais um expediente do racismo institucional brasileiro.

Proibir e criminalizar o porte de substâncias ilícitas amplamente consumidas abre caminho para que sejam utilizadas como moeda em todo tipo de crime, da organização de milícias à invasão de terras demarcadas.

Nessa direção, o Estado se converte num agente ativo para prender, matar e construir organizações criminosas essencialmente compostas por jovens negros e periféricos.

Estes, sem acesso à educação e oportunidades de emprego digno, tornam-se presas fáceis das organizações criminosas que a cada dia se entranham com mais eficiência nas instituições do Estado, a exemplo do que se passa atualmente no Rio de Janeiro e em São Paulo.

De acordo com pesquisa de 2023 realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), 68% dos réus por tráfico são negros; 72% têm menos de 30 anos e 67% não concluíram o ensino básico. Em apenas 13% dos casos há envolvimento anterior com organizações criminosas.

Ou seja, é na prisão superlotada que esses quadros vulneráveis são mobilizados pelos grupos criminosos. O Brasil possui a terceira maior população carcerária do mundo, contando quase um milhão de pessoas.

Além do custo humano, há as expensas econômicas.

O Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC) revelou que em 2017 o Rio de Janeiro gastou quase R$ 1 bilhão na guerra às drogas, enquanto São Paulo desperdiçou R$ 4,2 bilhões.

A aprovação da PEC de Rodrigo Pacheco, aliada à aprovação do projeto que extingue a possibilidade de saídas temporárias dos presídios – parcialmente vetado pelo presidente Lula por ferir os princípios da dignidade humana – aponta para um futuro temeroso de superencarceramento e prováveis rebeliões, com o crescimento das organizações criminosas e das milícias.

Tais aspectos contribuem para o fortalecimento dos grupos da extrema direita que, sedutores com suas soluções fáceis para problemas difíceis, apenas têm a ganhar com uma revolta carcerária a nível nacional, uma vez explícita – mas não enfrentadas – as ligações das milícias e das organizações criminosas com quadros parlamentares e da alta burocracia do funcionalismo público.

Como apontou Muniz Sodré em seu livro O fascismo da cor: uma radiografia do racismo nacional, o racismo no Brasil é institucional e intersubjetivo.

A PEC de Rodrigo Pacheco é apenas mais uma manifestação disso: negacionismo científico, racismo institucional e total ausência de compromisso cívico dos senadores com os problemas reais da sociedade.

Essas e outras medidas evidenciam que na democracia do Brasil atual o parlamento é apenas uma Casa para lamentar.

*Carla Teixeira é doutoranda em história na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

*Este artigo não representa necessariamente a opinião do Viomundo.


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Zé Maria

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“STF decide que é Constitucional
uso de Trajes Religiosos em Fotos
de Documentos Oficiais”

Plenário entendeu que roupas e
acessórios podem ser usados,
desde que não impeçam a
identificação facial na foto

Freira havia sido Impedida pelo Detran/PR
de utilizar o Hábito Religioso na Foto para
renovar sua Carteira de Habilitação (CNH)

Notícias do STF

Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que
a Constituição assegura a utilização de roupas e acessórios
relacionados a crença ou religião nas fotos de documentos oficiais,
desde que não impeçam a adequada identificação da pessoa,
ou seja, o rosto precisa estar visível.

A Decisão foi tomada na quarta-feira (17) pelo Plenário da Corte,
no Julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 859376, com
Repercussão Geral (Tema 953).

O caso teve origem em Ação Civil Pública (ACP) ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF) contra a União e o Departamento de Trânsito do
Estado do Paraná (Detran/PR), a partir de representação de uma freira
que foi impedida de utilizar o hábito religioso na foto para renovar sua
Carteira Nacional de Habilitação (CNH).

O MPF buscou assegurar que as religiosas com atuação em Cascavel (PR)
pudessem renovar a CNH sem o impedimento.
A Justiça Federal, em primeira instância, julgou procedente o pedido e, no
julgamento de apelação da União, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região manteve a sentença. Em seguida, a União recorreu ao STF.

Tese de Repercussão Geral
O Tribunal fixou a Seguinte Tese de Repercussão Geral:

“É constitucional a utilização de vestimentas ou acessórios
relacionados a crença ou religião nas fotos de documentos
oficiais desde que não impeçam a adequada identificação
individual, com rosto visível”.

Confira o Resumo do Julgamento:
https://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE859.376Info.Sociedade1.pdf

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