Moradores de Manaus relatam tratamento em casa contra a covid, com venda e aluguel de cilindros de oxigênio

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Valdo Leão/Semcom

“Foi uma cena do Titanic, cada um pegando o seu salva-vidas, que era o cilindro de oxigênio e tentando salvar. Todo mundo correndo de um lado pra outro, pegando cilindro pequeno, conectando no ventilador. E os cilindros pequenos não davam para todos os leitos, tivemos que escolher em quem colocar, ou seja, pacientes que tinham o melhor prognóstico de sair da crise da Covid, o paciente mais jovem. Tivemos que escolher quem salvar”. Profissional de saúde de Manaus narrando a emergência a Ana Luiza Basilio, de CartaCapital

Em meio à crise no sistema de saúde do Amazonas, com a falta de leitos e de oxigênio para doentes com covid-19, as polícias Civil e Militar apreenderam 33 cilindros de oxigênio que estavam escondidos em um caminhão, no bairro Alvorada, na zona centro-oeste de Manaus, na tarde desta quinta (14). Uma denúncia anônima informou sobre a movimentação estranha no caminhão, que estava parado no local, e cilindros estavam sendo retirados para veículos particulares. Da Folha

Sem leitos públicos, população de Manaus improvisa tratamento contra covid em casa

“As pessoas estão com medo de precisarem ser internadas porque não tem vaga”, relata moradora

Por Catarina Barbosa, Brasil de Fato | Belém (PA)

A segunda onda da covid-19 no estado do Amazonas apresenta números alarmantes. Dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) apontam que tanto o número de mortes como o de novas contaminações mais que dobraram nas últimas semanas.

O Brasil de Fato ouviu moradores da capital, Manaus, que narraram um cenário que mistura medo, indignação e revolta.

“Está faltando leito, está faltando oxigênio, principalmente nos casos em que as pessoas precisam ser entubadas”, relata a assistente administrativa Lilian Gato, de 34 anos.

Lilian já foi infectada pelo novo coronavírus e teve sintomas leves.

Atualmente ela tem duas amigas em estado grave. Uma está em observação no Hospital 28 de agosto, em Manaus, e a outra tem um cilindro de oxigênio em casa, onde está fazendo o tratamento.

“A gente vê que a doença se espalhou de uma maneira que não existe mais grupo de risco. Não existem aquelas pessoas alvo da doença. Todos nós somos alvo”, diz ela.

Tratamento em casa

Gato afirma que a falta de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e as condições dos hospitais tem levado a uma tentativa desesperada de “levar o tratamento de hospital para dentro das suas residências”.

“O que a gente vê aqui em Manaus é que aumentou muito o número de cilindros sendo alugados e vendidos, assim como o oxímetro em grupos de WhatsApp e a procura está muito grande, porque as pessoas estão com medo de serem internadas, porque não tem vaga. Elas estão buscando alternativas dentro da própria casa”, relata.

O boletim do Conass divulgado às 18h desta quinta-feira (14), contabiliza 5.920 óbitos e 223.360 casos da doença no estado.

Na semana do dia 3 a 9 de janeiro foram registrados 344 óbitos, sendo que na semana anterior, de 27 de dezembro a 2 de janeiro, foram contabilizadas 152 mortes.

A alta também pode ser observada no número de novos casos da doença.

Entre 3 e 9 de janeiro foram 11.129 novas pessoas infectadas e, na semana anterior – 27 de dezembro a 2 de janeiro – foram 5.930. Menos que a metade.

Um funcionário de uma Unidade Básica de Saúde (UBS) de Manaus conversou, em sigilo, com o Brasil de Fato sobre a situação no hospital em que trabalha. Para que ele não sofra retaliações pelas denúncias narradas à reportagem, sua identidade foi preservada.

Ele conta que, apesar do esforço incessante de médicos e profissionais da enfermagem, é impossível dar conta da demanda de doentes. No hospital em que ele trabalha, assim como em outros da cidade, o atendimento se tornou exclusivo a pacientes contaminados pela covid-19.

“Os médicos não querem mais atender pacientes com outras enfermidades com medo de contaminar as pessoas que procuram a unidade”, relata.

A UBS onde trabalha tem capacidade para 23 internações e está atualmente com 40.

Além da sala de emergência, as salas de observação, serviço social e odontologia foram adaptadas para internação de pacientes com covid-19.

“O hospital todo virou um local de emergência. Só atendemos pessoas entubadas, as pessoas chegam lá e tem uma lista. Quando morre alguém já se coloca outra pessoa na cama. É um negócio muito preocupante, terrível”, diz ele.

Na avaliação do funcionário, o momento vivido atualmente no estado é muito pior que a primeira onda e as autoridades não se prepararam para esse momento.

“Nós sabíamos que teria uma segunda onda. Todo mundo comentava ‘quando vir a outra onda vai ser terrível’, mas o governo não se preparou. Talvez eles achassem que não ia acontecer mais nada, mas a coisa veio muito pior. Temos até médico infectado com a covid atendendo”.
Leia também: Justiça suspende realização do Enem no Amazonas, onde pandemia vem se agravando

Na quarta-feira (13), a UBS Nilton Lins iniciou o atendimento de pacientes com covid-19, como “parte do pacote de medidas implementadas pela Prefeitura de Manaus para enfrentar o crescente número de novos casos e agravos da doença causada pelo novo coronavírus na cidade”, segundo a assessoria de comunicação da prefeitura.

Ao todo, a Secretaria Municipal de Saúde tem 17 Unidades Básicas de Saúde (UBS), uma clínica da família e três UBSs móveis fazendo o atendimento exclusivo a pacientes com sintomas de covid-19 ou de síndromes gripais.
“Dentre as medidas para conter o avanço do vírus e o agravamento da doença em pacientes já contaminados, a prefeitura deverá fazer, também, a contratação temporária de mais profissionais de saúde”, diz nota à imprensa divulgada nesta quarta-feira (13).

Mesmo com a abertura do Hospital da Nilton Lins, com 80 leitos de UTI, o trabalhador da UBS que conversou com o Brasil de Fato em condição de anonimato considera que a situação deve piorar nos próximos dias.

“Os leitos vão ajudar, mas não vão suprir a necessidade. A coisa está terrível”, enfatiza.

“Está piorando todo dia e vai piorar ainda mais. A única solução é esperar que a vacina dê certo. A salvação é a vacina, porque se não vier a vacina vai ser um extermínio total”, conclui.

Em 6 de janeiro, a prefeitura de Manaus anunciou medidas — por um período de 15 dias — para conter o avanço da pandemia. Entre elas, a proibição do funcionamento de casas de shows, festas, reuniões públicas, aniversários, casamentos, entre outros.

No dia 7 de janeiro foi instalado em Manaus um Gabinete de Crise para enfrentamento da covid-19, com objetivo de coordenar ações integradas entre os governos municipal e estadual.

Edição: Leandro Melito


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Sebastião Farias

É vergonhoso e desumano o que testemunhamos pela imprensa.
O Brasil, é uma República Federativa e uma República Democrática, que muitos sequer conhecem e, que tem como base indissolúvel e político/administrativa, a União, o DF, os Estados e os Municípios, conforme dispõe o Artigo 1° da Constituição Federal do Brasil.
Assim sendo, os desmandos e negligências de gestão pública protagonizados por maus gestores que resultam em mortes de cidadãos, que poderiam ser evitadas, como por ex: as de Manaus-AM e do país, são casos de alta responsabilidade das 03 instâncias federativas de gestão e de fiscalização e controle, dos 03 Poderes da República.
Não esquecermos que os Poderes Legislativos (Senado Federal, Câmara Federal dos Deputados, Assembleias Legislativas Estaduais e Câmaras Municipais de Vereadores), como representantes do povo e do Estado, como legisladores e fiscais do povo, devem nesses casos, terem protagonismo e proatividade responsável em investigar com urgência, origem, causas e motivos desses crimes e, autores responsáveis responsáveis em toda a Cadeia de Gestão da Saúde Pública Federativa, conforme dispõem e recomendam, dentre outros, os Artigos, 70, 71 e 74, da CF.
Então, vamos tirar o pé do chão, deixar o palanque eleitoral para a época certa e, trabalhar sério com imparcialidade e responsabilidade e darem satisfação justa e correta, ao povo que é vossos patrão e outorgado do poder e autoridade, para fazerem o bem e justiça à população (Parágrafo Único do Artigo 1º da Constituição Federal da República Federativa do Brasil).
Portanto Srs./Sras. autoridades responsáveis, como cidadão indigninado e com amparo no Parágrafo Único do Artigo 1º da Constituição Federal da República Federativa do Brasil, é que lhes faço esse apelo de ação ética, responsável e patriotica, que deixem sua zona de conforto e hajam rápido, pelo bem da população e para que fato irresponsável como esse, não mais se repita em nosso país.

Sebastião Farias
Um cidadão brasileiro nordestinamazônida

Valdeci Elias

Não é azar , nem obra do acaso. Más sim, consequência dos atos do governo. Ano passado quando foi divulgado o áudio, da reunião do governo, além dos palavrões, viu-se uma preocupação com a Economia, e total desprezo pela Saúde. Em plena pandemia, ninguém ouviu o Ministro da Saúde. O Ministro do Turismo foi mais importante na reunião, do que o da Saúde. Em um país sério, o Ministro da Saúde seria o centro da reunião, com o Presidente perguntado como ele enfrentaria a pandemia, com o da Economia perguntado quanto recurso seria nescessário e respondendo como o país daria esses recursos, com o dos Transportes oferecendo navios, aviões, trens e caminhões para o combate a Covid, com o da Justiça dando apoio legal ao combate a doença, etc.

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