Médico Hêider Pinto denuncia: Após ser aprovado em 1º lugar para professor de Saúde Coletiva de universidade, concurso é cancelado por razões suspeitas

Tempo de leitura: 13 min

por Conceição Lemes

Suponho que muitos de vocês, assim como eu, defendem que o ingresso nos serviços públicos– federal, estaduais e municipais –seja via concursos.

Obviamente, espera-se que:

*Sejam selecionadas as pessoas mais preparadas e com melhor perfil para os cargos. Em se tratando de áreas que lidam diretamente com a população – como Saúde e Educação – então nem se fala. É vital.

* Os concursos sejam feitos com lisura absoluta; funcionários e dirigentes respeitem as regras pré-estabelecidas; e as instituições não sejam usadas para beneficiar os amigos de quem está no poder, tampouco perseguir aqueles considerados “adversários”, inimigos.

Só que, na prática, muitas vezes a realidade é outra.

Aparentemente foi o que aconteceu com o médico sanitarista Hêider Aurélio Pinto, 40 anos, no concurso para professor do Departamento de Promoção de Saúde da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).

Em 6 de abril de 2017, saiu no Diário Oficial da União – DOU, páginas 53 a 56, o edital do concurso público de títulos e provas para professor de várias áreas da UFPB.

Entre elas, uma vaga para docente efetivo na área de Saúde Coletiva do Departamento de Promoção de Saúde, dedicação exclusiva, assistente classe A.

Dez candidatos se inscreveram, sete fizeram as provas escrita, quatro obtiveram pontuação para a etapa seguinte – a prova didática. Dois passaram para a fase final – a prova de títulos.

No 7 dia de julho, o Departamento de Promoção de Saúde da UFPB divulgou o resultado final.

Hêider foi aprovado em primeiro lugar. Somou 97 pontos em 100. Diferença de 22,2 pontos sobre a segunda colocada, que atingiu 74,8.

Curiosamente, dois meses depois, a universidade cancelou o concurso.

Mais ou menos o seguinte: o juiz não gostou do resultado do jogo, pegou a bola e foi embora, dizendo que a partida não valeu.

É a primeira vez que vejo isso acontecer depois de o resultado já ter sido divulgado e o departamento responsável pelo concurso – no caso o de Promoção de Saúde — tê-lo aprovado por 20 a zero (nenhum voto contra!).

Detalhe: a reunião que decidiu pelo cancelamento do concurso em 6 setembro, uma quarta-feira, véspera de 7 de setembro, em meio a um feriadão.

Por quê? Quem ia tirar quem da forca?

Essas são apenas duas de muitas perguntas em aberto.

Mas, como a função da verdade verdadeira é aparecer, é questão de tempo para termos as respostas a elas e a muitas outras que surgirão a partir de agora.

Indignado com a decisão, Hêider entrou nessa terça-feira (17/10) com um mandado segurança, que objetiva a revisão da decisão.

Hêider e seus advogados argumentam que a decisão não tem base legal, é tecnicamente equivocada e a motivação só pode ser política: impedi-lo de ser efetivado como docente daquela Universidade.

Em entrevista exclusiva ao Viomundo, ele diz que mesmo que não tivesse qualquer chance de reverter a decisão na justiça —  o que não é o caso –, ele denunciaria:

“Não podemos nos dobrar ante o arbítrio”.

“Algumas pessoas não usam o diálogo e a democracia como método para lidar com as diferenças, usam a força para esmagar a diferença”.

“Quanto mais permitirmos isso, mais daremos espaço ao crescimento dessas práticas autoritárias e protofascistas”.

Segue a nossa entrevista.

Viomundo – O documento em que anunciado o cancelamento do concurso é assinado pelo professor doutor José Carlos Batista; está impresso em papel timbrado do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia. O senhor conhece o professor Batista?

Hêider Pinto – Conceição, primeiro, por favor, me chame de você. Segundo, não o conheço, não.  Nunca ouvir falar e, sinceramente, acho que é uma peça do jogo.

Viomundo –Nesse documento, que tem sete páginas, o professor Batista fala de exigência editalícia que o senhor não teria cumprido. O que seria exigência editalícia?

Hêider Pinto — Quer dizer que eu teria descumprido o edital, o que é falso. Eu cumpri integralmente o edital! Quem o desrespeitou, do início ao fim — pasme! — foi o próprio Centro de Ciências Médicas, como demonstramos no mandado de segurança.

Viomundo- O senhor se inscreveu, apresentou documentos e fez as provas do concurso, como determina o edital? Foi em tempo hábil?

Hêider Pinto– Sim, claro. Eu me inscrevi no concurso, apresentei toda a documentação exigida no edital, tanto que minha inscrição foi homologada e pude participar de todas as etapas de provas: escrita, prova didática e, por fim, a de títulos.

Viomundo –Que documentos o edital do concurso exigiu?

Hêider Pinto – Eles estão listados no item 5.3 do edital. Inicialmente, a saber: identidade, CPF, comprovação de estar em dia com o serviço militar e justiça eleitoral e comprovante de pagamento da inscrição.

Depois, como prevê também o edital, após eu ser classificado na prova escrita e antes de realizar a didática, tive que apresentar meu currículo com documentos comprobatórios para a pontuação na prova de títulos.

Os documentos relacionados ao perfil exigido no concurso – por exemplo, diplomas de graduação e pós –só devem ser exigidos e apresentados na posse,

É o que estabelece o item 10 do edital. É também o que determina e decidiu o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em sua súmula n° 266: “o diploma ou habilitação legal para o exercício do cargo deve ser exigido na posse e não na inscrição para o concurso público”.

Viomundo – Pelo que eu apurei dez pessoas disputaram a única vaga na área de saúde coletiva. Duas foram aprovadas, sendo o senhor em primeiro lugar com 97 pontos contra 74,8, da segunda colocada. Esse resultado foi oficial? Que setor o aprovou?

Hêider Pinto – Sim, oficial e aprovado pelo Departamento de Promoção de Saúde da UFPB. Foi por 20 votos a zero, nenhum contra; apenas uma abstenção.

Viomundo – Então, a Universidade não terceirizou a realização do concurso?

Hêider Pinto– Não, não. Foi o próprio Departamento de Promoção de Saúde, detentor da vaga em disputa, que fez o concurso. Foi também o Departamento que publicou no site oficial da Universidade o resultado de cada etapa da avaliação.

O concurso terminou em 7 julho. No dia 10, a comissão designada pelo Departamento publicou o resultado final.

Viomundo — O Departamento de Promoção de Saúde detectou alguma irregularidade?

Hêider Pinto – Nãããããããããão. O edital e o regimento da Universidade determinam que seja feita avaliação do concurso, depois de encerrado. Essa avaliação foi feita em 27 de julho. Nenhuma irregularidade foi constatada. E, repito, por 20 votos a favor, uma abstenção e nenhum contra, o Departamento de Promoção da Saúde aprovou o concurso.

Viomundo – Mas, antes da reunião do dia 27 de julho, você publicou no Facebook que havia passado no concurso. Por quê?

Hêider Pinto –(risos). Veja bem, no dia 10 de julho, o Departamento publicou no site oficial da Universidade o resultado final das provas. Foi aí, na sequência, que eu, bem feliz da vida, comuniquei que havia passado no concurso, que me mudaria para João Pessoa, assumiria e iniciaria carreira docente etc.

Mas hoje pensando retrospectivamente a alegria não foi o único motivo.

Como gato escaldado tem medo de água fria – afinal, já sofri e tenho sofrido várias perseguições — eu acho hoje que, além da alegria, o que me fez dar publicidade foi o receio de que algo pudesse ser tentado para complicar a minha posse. O que, de fato, acabou acontecendo, mesmo.

Viomundo – Soube de alguma coisa antes da notícia do cancelamento?

Hêider Pinto – Amigos médicos tinham me avisado que a minha intenção de iniciar carreira docente na UFPB estava sendo vista como um problema por grupos mais conservadores.

Viomundo – Por quê?

Hêider Pinto – Por eu ter sido coordenador do Programa Mais Médicos no governo Dilma e ser conhecido defensor de mudanças e renovações na Universidade e na formação médica. Por exemplo, uma formação que garanta mais protagonismo aos estudantes, responsabilidade social, atuação multiprofissional, integração ao SUS e orientação segundo as necessidades de saúde da população.

Na verdade, nada diferente do que determinam as atuais diretrizes curriculares, mas que ainda encontram resistência na Universidade.

Viomundo — Mas se o concurso foi aprovado, não entendi em que momento nem por que foi anulado.

Hêider Pinto – O regimento da UFPB determina: entre a aprovação do concurso e a publicação no Diário Oficial, que é de responsabilidade da Reitoria, ele precisa ser validado formalmente na Unidade da qual faz parte o Departamento.

No meu caso, no Centro de Ciências Médicas (CCM), que seria o análogo à Faculdade de Medicina.

Em tese, essa etapa seria apenas administrativa e protocolar. Tanto que o regimento recomenda que dure 10 dias, no máximo.

No meu caso, ela virou processo e reavaliação do concurso. Durante o fim de julho, agosto inteiro e início de setembro, o CCM ficou com o processo. Só no dia 6 de setembro, um dia antes do feriado de sete de setembro, ele tomou a controversa decisão de anular o concurso.

Viomundo — De quem partiu a decisão de anular o concurso? Qual a alegação?

Hêider Pinto – Sinceramente, não sei. Só que acho que a decisão foi tomada a priori.

Viomundo – Por que demorou tanto tempo?

Hêider Pinto –Imagino que para achar um motivo que pudesse servir de justificativa. Isso faz parte da denúncia à justiça no mandado de segurança que entrei contra o Centro de Ciências Médicas. A alegação atira no coração do edital, da legislação e das decisões da Justiça.

Por exemplo, o documento do CCM argumenta que, como não fiz residência em medicina preventiva e social, eu não poderia assumir o cargo de docente em saúde coletiva. Essa é a interpretação que o CCM faz do perfil do edital.

Só que:

1) Isso só poderia ser exigido na posse, segundo o próprio edital do concurso e a súmula do STJ à qual me referi.

Sou forçado, então, a cogitar que essa exigência foi inventada no meio do processo para impedir a homologação do resultado pela reitoria. E, assim, evitar que eu “adquirisse o direito” e chegasse até a posse, justamente o momento em que meus títulos  deveriam ser cobrados de mim.

2) A alegação é de que eu tenho especialização em saúde coletiva e não residência.

Ora, nem vou entrar no mérito de que: minha especialização tem formato e carga horária compatível; a Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva) considera ambos titulados como especialistas em saúde coletiva; os concursos públicos têm admitido uma ou outra formação.

Viomundo – Por que não entrar no mérito?

Hêider Pinto – Porque tenho mestrado em saúde coletiva, que é um título superior ao da residência médica e ainda mais específico para o cargo de docente em saúde coletiva.

Viomundo – Qual a jurisprudência em casos semelhantes?

Hêider Pinto —As decisões da justiça têm sido favoráveis à posse dos candidatos. Até por saber disso fiz o concurso, senão nem teria feito.

Ou seja, muito provavelmente eu não teria problema na posse. E se tivesse, recorreria judicialmente e a jurisprudência mostra que teria enorme chance de êxito.

Talvez por isso mesmo tomaram essa decisão: ou cancelavam o concurso antes da posse ou não conseguiriam me impedir de assumir o cargo na Universidade. Essa é nossa  tese; e denunciamos isso no mandado de segurança.

Viomundo –Como ficou sabendo do cancelamento? Foi chamado a se pronunciar no processo?

Hêider Pinto –Não! Aliás, este foi um dos vários descumprimentos do processo legal no meu caso.

Em nenhum momento, fui informado, procurado ou demandado para apresentar algum documento para esclarecer sobre minha formação.

Imagina a surpresa ao receber, em 13 de setembro, um email dizendo que o concurso havia sido cancelado. Sequer foi dado o motivo!

Só soube da suposta razão quando acionei o CCM, exigindo a íntegra do processo que cancelou o concurso. Só aí descobri o que estou lhe relatando agora.

O processo é tão absurdo que a pergunta que dá base a ele é a seguinte: especialização é igual a residência?

Óbvio que não! Mas essa não é a questão correta a ser feita.

A questão seria esta: um médico com especialização em saúde coletiva e mestrado em saúde coletiva preenche o perfil exigido pelo Departamento de Promoção de Saúde no concurso para a vaga de docente em saúde coletiva?

Viomundo – Como?! Inacreditável! É apostar na burrice alheia! Todo mundo que faz ciência sabe que se não sabe o que procura, não vai achar nada! Qual a razão para uma pergunta tão fora de lugar?

Hêider Pinto –Tenho uma hipótese: intenção de forçar a interpretação favorável à anulação. Só que, aí, as pessoas que tramaram (não tenho a menor ideia de quem são!) e, depois também as que assinaram embaixo, desconsideraram que eu tenho mestrado na área.

Pior ainda: não perguntaram ao Departamento de Promoção de Saúde o que achava.

Decidiram perguntar à Comissão de Residência Médica do Hospital Universitário se especialização era igual a residência. Desculpa, mas essa pergunta é ridícula para quem é da área. Uma evidente forçada de barra.

Viomundo –Essa foi mesmo a única justificativa para o cancelamento do concurso?

Hêider Pinto –Essa foi a justificativa que embasou o processo. Foi a única apresentada até o parecer final, ou seja, durante todo o mês de julho e agosto.

Mas, aos 45 minutos do segundo tempo, talvez para tentarem dar mais base a um processo muito frágil, questionável e cheio de irregularidades, buscaram produzir mais uma argumentação.

O relator do processo questionou a isenção e honestidade de uma integrante da banca, alegando que havia conflito de interesse uma vez que ela, supostamente, teria uma publicação comigo no ano de 2009.

Mas isso não é verdade. Eu não sou coautor de nenhuma publicação científica ou técnica junto com essa pessoa, que é doutora em saúde coletiva e docente muito respeitada de uma Universidade Federal.

Viomundo – Ele apresentou a “prova”?

Hêider Pinto – Não. Porque nem a docente e nem eu fomos perguntados, notificados ou chamados para explicar. A lógica do processo foi não seguir o que se exige de um processo legal: apresentação do contraditório e direito à defesa. Talvez por serem tão frágeis os supostos motivos eliminaram do processo qualquer chance de colocá-los por terra.

Viomundo – Ou seja, dois falsos motivos?

Hêider Pinto – Sim, a questão da incompatibilidade da formação e a da professora de quem seria coautor, mas não sou.

Viomundo –Há pouco você disse que a não solicitação pela Universidade de esclarecimentos sobre o teu currículo era apenas um dos descumprimentos do processo legal. Afinal, quantos foram?

Hêider Pinto – Existem, no mínimo, três irregularidades e inconsistências:

1º) O edital previa um prazo para que qualquer conflito de interesse na banca fosse apontado. Isso não foi feito por ninguém. Leia-se: demais candidatos, Departamento de Promoção de Saúde, Centro de Ciências Médicas ou qualquer outra pessoa.

2º) Usaram um documento interno de uma instituição pública no qual vários técnicos assinaram como colaboradores daquele documento. Tanto que a autoria é atribuída à instituição.

O documento sequer tem o registro de publicação, aquele número ISBN exigido pela CAPES e instituições acadêmicas para que sejam consideradas publicações científicas e técnicas. E não tem o ISBN justamente porque é um documento interno.

Ou seja, devem ter dado uma “googleada”, buscando desesperadamente mais “motivos” que pudessem ser usados para dar suporte à decisão de anular o concurso.

3º) A tese se desmorona quando são analisados os resultados de cada etapa da avaliação, considerando cada candidato e cada uma das três avaliadoras da banca.

Se forem excluídas as notas dadas pela avaliadora cuja honestidade o relator está colocando em dúvida, sugerindo abstratamente que poderia ter me favorecido, em ABSOLUTAMENTE NADA alteraria a classificação de nenhum dos sete candidatos em cada uma das três etapas do concurso.

Quem não alcançou pontuação para chegar à última etapa, não atingiria do mesmo jeito, e eu me manteria em primeiro lugar, com confortável margem de diferença.

O que mais me indigna é adotarem essa postura horrorosa “dos fins justificarem os meios”. De forjar uma acusação contra a honra e honestidade de uma pessoa com o objetivo de prejudicar outra.

Viomundo — No mandado de segurança é dito:

“verifica-se, ainda, que, desde a emissão do Relatório Final (DOC. 04), o Departamento de Promoção da Saúde, responsável pela realização do concurso, foi alijado do processo de avaliação da regularidade do certame, não tendo sido sequer ouvido ao longo do processo….”

Se eu entendi bem,  o Centro de Ciências Médicas passou por cima da decisão majoritária do departamento para o qual você prestou concurso?

Hêider Pinto — Exatamente.

ViomundoTeria sido então uma decisão política o cancelamento do concurso?

Hêider Pinto – Olha, Conceição, no mandado de segurança está demonstrado que a decisão não foi nem técnica e nem legal.

Do contrário, teriam seguido o edital, o regimento da Universidade, a legislação nacional, a jurisprudência…Teriam seguido o processo administrativo normal com notificação, pedido de esclarecimento, direito a defesa…Não teriam excluído o Departamento responsável pelo concurso…

Nada disso foi feito. Por isso, estamos argumentando que o processo é ilegal.

Também não foi técnica. Senão, teriam: pedido a opinião técnica do Departamento sobre o perfil que solicitou para o concurso; considerado as organizações e titulações da área da saúde coletiva; levado em conta que sou mestre em saúde coletiva; visto que o documento a que se referem como base para a suposição de conflito de interesse não é uma publicação…

Então, concluímos, eu e os advogados, que a decisão tem motivação política.

Viomundo — Por quê?

Hêider Pinto –Olha, tenho sofrido muitas perseguições. Por exemplo, ameaças a instituições e municípios que me convidam para realizar projetos, trabalhar com eles, fazer pesquisa.  Até coisas muito piores, quando tentam me imputar a prática de irregularidades administrativas e crimes. Tudo sem prova! Como parece ter virado o modo de usar o Estado para perseguir os adversários políticos. Um horror digno dos tempos da ditadura.

Viomundo –Consegue identificar os sujeitos dessas ações e suas motivações?

Hêider Pinto — Em alguns casos, eu identifico claramente. Mas em casos, como este agora, ainda estou tentando compreender melhor.

De qualquer forma, eu só posso nomear este ou aquele com provas. Além de não querer que alguém passe injustamente pelo que estou passando, acusação sem prova pode fazer que a situação se vire contra mim.

Quanto aos motivos… são vários e às vezes se somam.

Alguns acham que eu devo ser punido por algo do qual eu me orgulho muito: ter dirigido por um período o Programa Mais Médicos e a Política Nacional de Atenção Básica que o golpe acabou de revogar.

Para alguns setores conservadores e corporativos é quase um crime ser médico e defender: a saúde como direito; um sistema de saúde público e gratuito; a prática multiprofissional e uma medicina que dialogue com as demais profissões e não tente restringir a capacidade de cuidado das mesmas; colocar a saúde do cidadão em primeiro lugar e não os interesses econômicos da corporação; a democratização do acesso ao curso de medicina, porque se a população é negra, pobre e mora no interior, então porque os estudantes de medicina são majoritariamente não negros,  integrantes dos 10% mais ricos da população e residentes das capitais?

Se soma ainda o fato de eu defender essas questões desde o movimento estudantil de medicina, que por eu ter sido liderança nacional, muita gente me conhece nas organizações da corporação desde então.

E, nesse momento de intolerância e escalada do autoritarismo, acredito que, por eu denunciar o golpe, a usurpação sem fim de direitos e o absurdo desmonte das políticas sociais, em especial as de saúde e educação, a diferença de posições vira uma convicção obsessiva em prejudicar a pessoa da qual se discorda.

Penso, além disso, que quem pensa assim não vai querer ter um cara desses como colega e potencial adversário nos debates e decisões sobre os rumos da Universidade e do curso de medicina.

Infelizmente, algumas pessoas não usam o diálogo e a democracia como método para lidar com as diferenças, usam a força para esmagar a diferença.

Isso ao longo da história tem ganhado vários formatos. Pode ser a tortura e o assassinato. Pode ser a colocação ilegal das forças repressivas do Estado contra uma pessoa ou um grupo. Pode ser a negação de direitos como, por exemplo, assumir um concurso quando se passou em primeiro.

Viomundo — O que pleiteia através dos seus advogados?

Hêider Pinto –Juridicamente, pleiteamos a concessão de uma liminar que suspenda os efeitos do ato que cancelou o concurso para que prossiga normalmente. Também exigir, minimamente, que sejam escutados o candidato, eu no caso, e o Departamento responsável pelo concurso.

Mas, mesmo que eu achasse que poucas seriam as chances de reverter isso na justiça, eu entraria na justiça do mesmo modo, porque não podemos nos dobrar ante o arbítrio.

Quanto mais permitirmos isso, mais damos espaços ao crescimento dessas práticas autoritárias e protofascistas.

Hoje, achamos que não é com a gente e nos calamos, amanhã estão sendo realizadas contra todo mundo, inclusive nós.

Então, vou, sim, lutar até o fim e seguir denunciando abusos de autoridades, desrespeito aos direitos fundamentais e cobrando das instituições da justiça que façam  justiça.

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Comentários

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Dimas

Procura um bom advogado e entra na justiça, dr heider !
Acho que o concurso foi feito sob encomenda para o filho ou filha de alguém. Mediocracia.

Lunna

Que absurdo! Tomara que nesse caso o judiciário aja com com a isenção e imparcialidade que frequentemente vem lhe faltando, e restabeleça a justiça e a verdade.

Aracy

Parabéns ao Dr. Hêider pelo Dia do Médico e pela aprovação no concurso.
Lamento que gente ligada aos cuidados com a saúde humana adote práticas tão mesquinhas e covardes como a perseguição a quem pensa e age diferente, principalmente sendo um colega de profissão.
Que haja lisura no concurso. Do contrário, vou achar que essa universidade não merece um docente da qualidade do Dr. Hêider.

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