Fernanda Giannasi: A Eternit é mais uma vez derrotada na Justiça

Tempo de leitura: 4 min
Maio de 1995: A engenheira e então fiscal do trabalho Fernanda Giannasi embarga a obra de demolição da fábrica da Eternit, em Osasco (SP), por descumprimento das normas de segurança do trabalho. Fotos: Eduardo Metroviche

Por Conceição Lemes

Toda vez que um trabalhador se acidenta ou adoece devido às condições de trabalho, as empresas têm a obrigação legal de comunicar à Previdência Social  (INSS).

A comunicação formal de acidentes do trabalho chama-se CAT.

A CAT é que vai alimentar a estatística nacional de infortunística laboral.

A Eternit S/A não fazia isso com os seus trabalhadores na Bahia.

Em 2002, a empresa assinou com o Ministério Público do Trabalho (MPT) um TAC — termo de ajuste de conduta –, que previa a emissão obrigatória das CATs em caso de acidente, adoecimento ou suspeita de adoecimento.

Só que a Eternit passou anos descumprindo esse TAC.

Em 2017, O MPT entrou com uma ação contra a Eternit por descumprir a obrigação legal de comunicar os acidentes de trabalho e o respectivo TAC.

Finalmente, a Justiça determinou à Eternit que emita a CAT para os atuais e ex-empregados. Se não cumprir, terá de pagar multa vultosa.

”Até que enfim, a Eternit foi derrotada nas instâncias superiores de nossa justiça”, comemora Fernanda Giannasi, auditora fiscal do trabalho aposentada e fundadora da Abrea (Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto).

Ao longo de 50 anos, líder na exploração econômica do amianto no Brasil, a Eternit desafiou o MPT em diversas ocasiões, relembra Giannasi, aplaudindo o empenho dos Procuradores do Trabalho da instituição.

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”O trabalho do grupo temático do amianto do MPT teve papel fundamental que alicerçou os avanços obtidos na luta antiamianto no Brasil”, enfatiza.

Fernanda Giannasi é símbolo da luta antiamianto no Brasil e América Latina.

Abaixo, a matéria divulgada pelo MPT sobre a condenação da Eternit.

*****

MPT obtém condenação da Eternit por não comunicar acidentes de trabalho

Por Ministério Público do Trabalho da Bahia

A empresa Eternit S. A. foi condenada após recurso do Ministério Público do Trabalho (MPT) a emitir a comunicação de acidente de trabalho (CAT) em caso de acidente ou doença do trabalho.

A obrigação vale mesmo que o trabalhador ou a trabalhadora não precise se afastar. O processo teve início em 2017, depois do descumprimento de um termo de ajuste de conduta assinado com o MPT em 2002, que previa a emissão obrigatória das CATs em caso de acidente ou adoecimento. O TAC previa pagamento de multa. E a empresa passou muitos anos descumprindo. O valor calculado está em R$9,125 milhões.

As ações judiciais envolvendo produção e uso de amianto em processos industriais se arrastam há anos no Brasil, rumo ao banimento total da substância, sabidamente cancerígena. A Eternit foi durante muito tempo a principal beneficiária da exploração comercial da fibra, mas deixou de usar a crisotila em seus processos produtivos. As ações de responsabilização por tudo o que ocorreu no passado, no entanto, seguem, com cobranças de indenizações por danos à sociedade.

O caso julgado este mês pela 5ª Turma do TRT da Bahia teve início com uma ação de execução movida pelo MPT em 2017 pelo descumprimento da obrigação assumida pela fábrica da Eternit de comunicar acidentes de trabalho.

A ação de execução chegou a ser extinta pela 1ª Vara do Trabalho de Simões Filho, mas o MPT recorreu.

Na segunda instância, o MPT obteve agora o reconhecimento do pedido inicial, com base em precedente vinculante do Tribunal Superior do Trabalho. Ainda cabe recurso, mas não sobre a questão principal. Com a posição firmada no tribunal baiano, a empresa fica obrigada a cumprir o acordo que assinou e comunicar todos os acidentes e doenças de trabalho.

Após o MPT entrar com um recurso de revista, a vice-presidência mandou o processo para adequação a um precedente do TST, o Tema 124, que define que a correção da conduta não extingue o objeto da ação.

Na análise do caso, a desembargadora Viviane Maria Leite de Faria determinou que a Eternit emita a CAT para os empregados. Se a empresa não cumprir, terá que pagar multa.

A Eternit alegava que havia começado a emitir a CAT depois que o processo começou, mas a Justiça atendeu o pedido do MPT de obrigar a empresa a continuar cumprindo essa obrigação.

Nos últimos anos, as fibras cancerígenas vêm sendo substituídas na indústria brasileira. Mas ainda opera a última mina no Brasil, em Minaçu, Goiás.

E há estoques e rejeitos fruto de anos de uso intenso do material. Mesmo depois de parar de utilizar o amianto na produção as empresas são responsáveis por fazer avaliações ambientais e exames médicos por um período mínimo de 30 anos após a demissão do trabalhador.

Na Bahia, um levantamento recente com mais de 450 pessoas, entre familiares e ex-empregados da mina de amianto que foi explorada pela empresa Sama no município de Bom Jesus da Serra, no sudoeste baiano, busca orientar as políticas de saúde pública de prevenção e tratamento do câncer decorrente da exposição à crisotila.

Histórico

A luta contra o amianto no Brasil começou a ganhar força a partir dos anos 1980, com o aumento do número de casos de adoecimento de trabalhadores expostos ao minério. O MPT, juntamente com movimentos de trabalhadores, sindicatos e organizações não-governamentais, entre elas a Abrea, começou a pressionar por medidas mais rígidas que garantissem a segurança e a saúde dos trabalhadores.

Em 2012, o MPT criou o Programa Nacional de Banimento do Amianto, atualmente chamado Grupo de Trabalho Amianto. Foram diversas ações e acordos judiciais, além de termos de ajuste de conduta assinado com empresas que se comprometeram a não usar mais o produto.

Além disso, o MPT tem incentivado pesquisas científicas e políticas públicas voltadas para o diagnóstico, registro e identificação de trabalhadores adoecidos pela exposição ao amianto.

O Grupo de Trabalho Amianto é dividido em três eixos centrais.

O primeiro busca garantir condições adequadas de atendimento ao trabalhador exposto ao amianto.

O segundo, na esfera jurídica, busca estabelecer termos de ajuste de conduta (TAC) com empresas que utilizam amianto em seu processo produtivo, concedendo prazo para a sua substituição.

Por fim, o terceiro, diz respeito às implicações econômicas, já que o banimento leva à diminuição de postos de trabalho.

Mais de 450 pessoas em Bom Jesus da Serra e região fizeram tomografias em ação promovida pelo MPT e pela Abrea para rastrear cânceres na população exposta mais diretamente

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Comentários

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Zé Maria

Essa Criminosa Corporação Industrial
Continua Existindo ?!? É ‘Eterna’ ?!?

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