Narciso Alvarenga Monteiro de Castro: CNJ poderia remover Moro liminarmente
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por Narciso Alvarenga Monteiro de Castro*
De antemão fica o aviso que o presente trabalho não é uma resenha sobre o excelente filme de Spielberg, Catch Me If you can (2002), estrelado por Leonardo Di Caprio e uma constelação de astros do cinema norte-americano. O assunto é muito mais sério, se bem que se assemelhe, em alguns momentos, a uma novela mexicana. Por isso, importante uma cronologia prévia, pois como já foi apontado por muitos observadores, há um encaixe quase perfeito nos movimentos da Lava Jato (LJ), que se assemelha a uma dança de tango portenho.
Vamos às datas ou aos dados de dezessete eventos significativos.
Evento n. 1: 17/10/15 — Ministro do STF Marco Aurélio Mello sugere as renúncias de Dilma, Temer e Cunha;
Evento n. 2: 26/11/15 — prisão do Senador da República Delcídio do Amaral, ex-PSDB e ex-PT;
Evento n. 3: 20/1/16 — Lula concede entrevista a blogueiros, no qual faz a afirmativa fatal: “Não existe vivalma mais honesta que eu. Nem dentro da polícia federal, nem dentro do ministério público…”;
Evento n. 4: 3/2/16 — Em sessão do STJ, Ministro João Noronha chama o presidente da Corte, Min. Falcão, de “mau-caráter”, conforme a revista Conjur;
Evento n. 5: 19/2/16 — o Ministro Teori Zavaski manda soltar Delcídio;
Evento n. 6: 4/3/16 — condução coercitiva de Lula para Congonhas, há quem afirme que seria levado para Curitiba, preso, e que tal prisão foi impedida por um Coronel da Aeronáutica, que aliás, assistiu à tomada de declarações do investigado;
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Evento n. 7: 13/3/16 — manifestações nas ruas contra o Governo e o PT, com ampla convocação pela imprensa e financiamento ainda desconhecido;
Evento n. 8: 15/3/16: — 3a-f. Homologação da delação premiada do Senador Delcídio e levantamento pelo Ministro Teori Zavaski do sigilo do processo;
Evento n. 9: 16/3/16 — 4a-f. Moro retira o sigilo das investigações sobre Lula e libera conteúdo das gravações telefônicas. Lula foi gravado de 20/2/16 a 16/3/16, havendo conversas com autoridades com foro privilegiado, incluindo ministros e Presidente da República, além de escritórios de advocacia e advogados. No total foram 52 conversas gravadas, amplamente difundidas por todos os meios de comunicação, inclusive internacionais. Há suspeitas que o PGR, em viagem ao exterior, tenha autorizado o pedido de levantamento do sigilo;
Evento n. 10: 16/3/16 e 17/3/16 — 4a e5a-f. Seguem declarações contundentes do decano do STF, do PGR e do Ministro do STJ Noronha, criticando o conteúdo das conversas do ex-presidente;
Evento n. 11: 17/3/16 — 5a-f. Lula toma posse como Ministro-Chefe da Casa Civil. Liminares são concedidas e depois cassadas por todo o país;
Evento n. 12: 17/3/16 — 5a-f. A Câmara dos Deputados, comandada pelo investigado Eduardo Cunha, instala a Comissão do Impeachment da Presidente da República;
Evento n. 13: 18/3/16 — 6a-f. Manifestações nas ruas em apoio ao Governo, ao PT e Lula, ainda que não haja grande cobertura midiática;
Evento n. 14: 18/3/16 — 6a-f. Ministro do STJ João Noronha sugere renúncias da Presidente da República, do Presidente do Senado e do Presidente da Câmara dos Deputados;
Evento n. 15: 18/3/16 — 6a-f. Depois de defesa feita pelo Chefe da AGU, José Eduardo Cardozo, OAB decide apoiar o impeachment, mesmo após ficar comprovado que Moro feriu prerrogativas dos advogados, no decorrer da LJ e grampeando escritória de advocacia;
Evento n. 16: 18/3/16 — 6a-f. O Comandante do Exército, General Villas-Bôas, classificou como “lamentável” pessoas pensarem na instituição como solução para a atual crise. No mesmo evento, o Presidente do STF, Ministro Lewandowski, rebate Lula, ao dizer que o STF nunca se acovardou;
Evento n. 17: 18/3/16 — 6a-f, à noite. O Ministro Gilmar Mendes, que já havia antecipado a sua decisão para a mídia, concede liminar em mandado de segurança coletivo, suspende a posse de Lula como ministro e determina a volta da investigação sobre Lula para a vara do juiz Sérgio Moro.
Cada um que faça as ligações entre os fatos, da forma que queira ou de acordo com as suas predileções políticas ou jurídicas. Mas cabem algumas observações sumárias, sem fazer juízo de valor, inclusive alguns eventos podem não ter nenhuma relação com outros:
1 — Ao que parece, o início da efervescência ou crise constitucional atual se deu com a prisão do senador em exercício, Delcídio do Amaral, ex-presidente da CPMI dos Correios, muito contestada pelos meios jurídicos.
2 — As declarações dadas por Lula no chamado evento n. 3 pode ter desencadeado uma corrida pela prisão do ex-presidente, tachado de arrogante por alguns ou mentiroso por seus detratores. Certamente que não agradou aos seus persecutores e pode ter soado como provocação, por isso, o título do filme. Como também tal conclusão pode ser mera especulação e o plano já estava traçado há muito tempo. Desde o ano passado, tudo indicava que o objetivo principal da LJ era ou prender Lula ou deixá-lo desmoralizado publicamente, para o fim de inviabilizar a sua candidatura em 2018. Aliás, outro dado interessante é que em 2018 termina a concessão da Rede Globo que precisaria ser renovada, o que explicaria o clima de “tudo ou nada”.
3 — Existe uma pressão fora do comum para a quebra da preferência da Petrobras no pré-sal, o que acabou ocorrendo. Também a prisão do Almirante Othon e do presidente da Odebrecht, parceiros em projetos do Plano Nacional de Defesa, que inclusive inclui a construção de um submarino de propulsão nuclear e base naval, podem ficar comprometidos, prejudicando a defesa da área de exploração do petróleo e a Amazônia Azul.
4 — O conteúdo de algumas gravações em que Lula expressa, em conversas privadas, que a mais alta corte do país e a Procuradoria estariam “acovardadas” o deixariam em situação ainda mais difícil, para quase obrigar o STF a tomar medidas duras, como fez com Delcídio.
5 — O juiz Moro assim, fez uma jogada de alto risco com o evento n.9, não se importando de ser eventualmente punido, tanto criminalmente, quanto administrativamente, incluindo o seu afastamento da condução dos processos, medida que seria observada em casos normais semelhantes.
6 — A partir do citado evento n. 9, decisão de Moro, os fatos se desencadearam com uma velocidade incrível, nos três dias seguintes, até as horas de hoje, já dia 19/3/16 (sábado).
7 — O evento n. 13, grandes manifestações em todo o país, serão em parte eclipsados pelo evento n.17 e pela possibilidade mais que real da prisão de Lula por ordem do juiz Moro nas próximas horas, que foi dado como quase certo pela decisão de Gilmar, que afirmou ter sido esse o motivo que levou Lula ao Ministério de Dilma.
8 — O evento n. 15 sugere que cada governo tem o advogado-geral que merece. A decisão da OAB, revertendo entendimento anterior, podendo indicar oportunismo, mas nenhuma surpresa.
A partir daí, ninguém mais pode prever o que pode acontecer no país. Uma solução parcial seria o CNJ, comandado pelo Presidente do STF, Ministro Ricardo Lewandowski, tomasse a providência de convocar uma reunião extraordinária e urgente para remover liminarmente o juiz Moro da 13a Vara Federal, evitando maiores e desnecessárias polêmicas.
Ao que parece, diversas pessoas e instituições buscam o protagonismo em um possível sucesso na derrubada do Governo. Porém, como comparação, na queda de Collor — quando renunciou em 1992 — foi creditada apenas à Rede Globo.
Existem perguntas que não querem calar: depois da narrativa extensa dos crimes de Cunha feitos pelo PGR, porque o STF não o afastou da Presidência da Câmara? Nas propostas de renúncias coletivas, não teria ficado um dos poderes de fora, no caso exatamente aquele que dispõe de menos legitimidade? Onde está a Corregedora Nacional de Justiça, Ministra Nancy Andrighi?
Moro vai contar até cinco, antes de decretar a prisão de Lula, devido ao recado das ruas de ontem. Mas pelo seu histórico recente, bem como pela blindagem que parece ter, não há nenhuma aposta em contrário.
*É juiz em Minas Gerais
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