Na histórica Greve Geral de 2017, Globo fez pior do que nas Diretas Já de 1984

Tempo de leitura: 3 min

por Luiz Carlos Azenha

Em 1983 eu era repórter da TV Bauru, afiliada da Globo no interior paulista. Porém, vivia “cedido” à emissora em São Paulo, cobrindo férias de colegas. Morava no Hotel Eldorado da rua Marquês de Itu, no Higienópolis, na capital paulista, como repórter do chão de fábrica.

Fui, como pessoa física, à primeira manifestação pelas Diretas Já em São Paulo, diante do estádio do Pacaembu, à qual compareceram cerca de 15 mil pessoas. Foi em 27 de novembro de 1983, poucos dias depois de meu aniversário.

Outros protestos já tinham acontecido antes, pedindo que a ditadura estabelecida em 1964 tivesse fim com eleições presidenciais diretas. Outras aconteceriam depois, com destaque para Curitiba, onde se reuniram cerca de 40 mil pessoas.

Portanto, posso dizer que eu estava lá vivendo a realidade paralela pela primeira vez: enquanto as notícias fundamentais para o futuro do Brasil aconteciam do lado de fora, a TV Globo desconhecia as notícias do lado de dentro — especificamente, na sede da emissora em São Paulo, na praça Marechal Deodoro.

Era uma sensação bizarra. As ordens vinham do Rio: na Globo, nada de Diretas Já.

Portanto, não houve exatamente surpresa quando, no aniversário de São Paulo, em 25 de janeiro de 1984, o repórter Ernesto Paglia falou sobre a manifestação de cerca de 300 mil pessoas na praça da Sé, que reivindicava outra vez Diretas Já, como se fosse a comemoração da efeméride. Sim, é fato que a reportagem tratou dos discursos e da manifestação em si, mas foi embalada pelos editores, a mando da direção da Globo no Rio, como se fosse a cobertura de uma festa.

A maneira como a TV Globo tratou a histórica Greve Geral do 28 de abril de 2017 é, na minha avaliação, muito pior do que aconteceu com a cobertura das Diretas Já em 1983/1984.

Àquela época, a emissora poderia alegar — como alguns globais chegaram a alegar — que vivíamos os estertores de uma ditadura militar e que desafiar o regime poderia ter consequências para a própria abertura “lenta, gradual e segura” prometida pelo ditador Ernesto Geisel, que João Figueiredo então representava.

Agora, não. Graças às redes sociais — facebook, twitter, whatsapp — qualquer pessoa pode avaliar o grau de descontentamento com as medidas de impacto social tomadas por um governo que tem o presidente da República e nove de seus ministros sob suspeita e/ou investigação, medidas que por sua vez são submetidas a um Congresso igualmente sob suspeita.

Mesmo os mais devotos apoiadores do impeachment de Dilma Rousseff e antipetistas vários sabem que Michel Temer não foi eleito vice-presidente para tomar o rumo que tomou, nem tem legitimidade para golpear os direitos sociais da forma como pretende fazê-lo.

Age em nome do 1% do topo, com 4% de ótimo/bom na pesquisa de opinião pública mais recente e desemprego na casa dos 14%, quando a promessa era de que a derrubada de Dilma provocaria um cavalo-de-pau imediato na economia.

Portanto, desta feita a TV Globo e seus satélites não tem onde se esconder: o apoio dado às medidas do governo Temer expressa acima de tudo o interesse político e econômico dos próprios donos da mídia e dos usurpadores do poder no Planalto e no Congresso que os representam.

No caso da emissora, é absolutamente impossível do ponto-de-vista jornalístico que uma organização com tantos tentáculos espalhados por todo o Brasil tenha sido incapaz de registrar o descontentamento popular ANTES da greve geral, de forma a expressá-lo em seu noticiário.

Será que só nós, internautas, vimos por exemplo as manifestações da CNBB e de um terço dos bispos da Igreja Católica, os quais certamente não podemos acusar de agirem a mando do anarco-sindicalismo?

A Globo, para ficar apenas na nave mãe, simplesmente fez mau jornalismo. Não foi pela primeira, nem será pela última vez.

Agora, porém, não tem como se esconder atrás da ditadura, da qual foi a principal beneficiária, como fez em 1984.

Agora, fez mau jornalismo — distorcido, omisso, descontextualizado — porque coloca seus interesses empresariais, representados pelo governo Temer, acima do interesse da maioria dos brasileiros.

PS: Que fique registrado. Quando Lula se elegeu presidente e foi à Globo do Rio dar entrevista ao Jornal Nacional — estava em minha segunda passagem pela emissora eu fui um dos poucos jornalistas presentes que não o aplaudiram na entrada. Não acho que o papel de jornalista seja bater palma para autoridade, tampouco negar a realidade que o cerca.

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Comentários

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Bacellar

“Agora, porém, não tem como se esconder atrás da ditadura, da qual foi a principal beneficiária, como fez em 1984.”

Por enquanto. Oremos.

Wendell

Não foi só a Globo, a Record seguiu a mesma linha. Deixei de assistir os noticiários da Globo e Band faz alguns anos e optei pela Record, porém, quando se trata de Reforma Trabalhista, Previdenciária e Greve Geral, os interesses de todas as emissoras convergem com o do Grande Capital. É pau no lombo do trabalhador.

Sebastião Farias

O povo brasileiro, que é um forte e mostrou isso na Greve Geral do dia 28.04.2017, não deve mais temer o opressor e golpistas e, mais uma vez: em defesa dos seus direitos políticos usurpados; do Brasil para os brasileiros; do estado democrático de direito e respeito à Constituição Federal; da democracia soberana do povo; do estado de bem-estar social e econômico para todos; do resgate do respeito e protagonismo do Brasil no mundo em defesa dos pobres e excluídos e contra a fome e miséria humana; nesse 1° de maio de 2017, não tema, confie em Deus e, invada as praças e ruas das cidades, que são suas mostre aos golpistas que manda é a quem pertence este país, com responsabilidade, respeito aos outros e maturidade.
Sigam e pratiquem a sabedoria cearense contra mal: ” Se ficar o bicho pega, se correr o bicho come, então, se unir o bicho foge, porque ele não é o que parece”.
Vamos a luta pelo Brasil, pelo povo brasileiro e pela democracia.

Divulgando a Grande Farsa (p/ Cavalcanti)

“A #VERDADE sobre a #manifestação de hoje no #Rio de Janeiro – Por Juliana Krapp, Jornalista – Fiocruz

Não, a culpa da truculência e da absurda violência que dispersou a manifestação no centro do Rio, nesta tarde 28 de abril, não foi de vândalos. Não acreditem nisso que as TVs e os jornais – os mesmos que apoiaram o golpe civil-militar de 64 – estão querendo vender. Não teve a ver com ônibus queimados ou vidraças quebradas, amigos. Não caiam nessa esparrela, por favor.

Eu estava lá, junto a milhares de outros trabalhores que, pacificamente, protestavam contra o brutal corte de direitos que representam as reformas trabalhistas e da previdência. Nós fomos covardemente encurralados. Viramos alvo de bombas, gás pimenta, bolas de borracha.

Eu estava parada numa roda de amigos na Cinelândia, em frente à Câmara. O clima estava amistoso, tranquilo, e apenas as notícias de confusão na Alerj poderiam trazer alguma preocupação. Assim que ouvimos o ruído das primeiras bombas, vindo da Rio Branco, decidimos seguir para zonas mais à beirada. A correria nos pegou na calçada do Amarelinho, com as bombas e o gás vindo em nossa direção. Seguimos pela Alcindo Guanabara, achando que poderíamos sair do tumulto, ir embora. Mas a polícia simplesmente havia cercado tudo, feito um círculo ao redor da manifestação e seguiu nos encurralando, atirando bombas ao deus dará. Ela nos impressou, sem que houvesse saída. Uma tocaia, literalmente.

Havia crianças chorando, idosos, muita gente passando mal, em pânico. Eu e uma amiga conseguimos abrigo num prédio da Rua Álvaro Alvim, onde já havia uma pequena multidão, espremida. Uma mulher deitada ao chão chorava copiosamente, gritando que sua filha havia ficado lá fora. Estamos numa guerra, pensei. O cheiro do gás fez com que subíssemos as escadas – e cada vez mais.

Com medo de que a polícia entrasse no prédio, seguimos até a Lapa. Era tudo terror, era tudo inacreditável. Na Rua da Lapa, nova correria, mais bomba. Entramos no pátio da ACM. O carro de guerra da polícia estacionou na frente, com os policiais apontando as armas – sem deixar nenhuma dúvida de sua disposição ao ataque. Repito: não havia nada ali acontecendo. Apenas pessoas caminhando, indo embora, nada mais.

Mais espera, mais terror, e alcançamos a Glória. Paramos no bar Vila Rica para beber alguma coisa e tentar raciocinar, aturdidos pelo gás e por todo o resto. Não estávamos mais num protesto. Era o Vila Rica, era a Glória, com a calçada cheia de jovens aproveitando a noite de sexta, gente indo correr, cachorros passeando. Em poucos minutos, a correria nos alcançou novamente. E as bombas, e o gás. Pois a polícia não apenas encurralou manifestantes pacíficos – ela os perseguiu, por diferentes bairros.

Nos abrigamos numa padaria. As notícias dos grupos de whatsapp e via Fabebook eram assustadoras. Amigos ajudando pessoas que passavam mal na plataforma do metrô, onde o gás também chegou. Amigos ainda presos ao labirinto de bombas da Cinelândia e da Lapa. Nas ruas, pavor e correria.

Agora já estamos em casa, e eu queria muito dizer: não, não foram os “vândalos”. Não acredite nisso.” (DIVULGUEM)

Joao

Bolsonaro 2018.

Luiz Carlos P. Oliveira

A Globo é, e sempre será, o mal maior a ser combatido nesse Brasil insano e omisso.

Malconn

Infelizmente vivemos uma luta de classes que o povão ainda não percebeu se tratar, ou seja, a classe dominante vem abocanhando direitos das classes trabalhadoras e aumentando privilégios das castas mais altas no topo da pirâmide. Sim, castas. Não querem mobilidade social.
O nosso povo, infelizmente, parece boi de piranha. Tiraram uma MULHER honesta da presidência da república e colocaram um cidadão junto com seus pares do psdb acusados de corrupção e com vastas provas materiais e testemunhais.
Se o povão ficar calado, escondido embaixo da cama, a tendência é se ferrar de verde e amarelo e morrer trabalhando sem se aposentar SE tiver trabalho.
O deus-mercado provou que está e estava errado. A economia ruiu, o desemprego aumenta todo mês.
Na época do FHC teve contratos temporários pra gerar emprego, segundo o governo FHC, e tudo o que aconteceu foi milhares de falências de empresas.
Qual grande nação próspera, eua, Japão, Alemanha, Inglaterra, que segue as idéias neoliberais de A a Z, nenhuma.

Eduardo Hideto

É muito pior.
Nos jornais ontem, não vi uma foto sequer das manifestações vistas de cima. As imagens geralmente foram de pneus queimados. Ou seja, tudo não passou de baderna do povo do PT. Lamentável essa manipulação dos donos da grana em nosso país.

Agnela Ramos de Souza

Eu já votava sem muita vontade em deputados. Agora que sei que não me representam, vou votar sempre nulo. E incentivar as pessoas a votarem nulo também.
Como sou formadora de opinião, vou trabalhar de graça contra esses corruptos dos nossos direitos!

    Flávia Manzara

    Ângela, humildemente discordo de seu comentário. Não devemos votar nulo, pois na verdade assim ajudamos justamente os deputados corruptos e golpistas que queremos combater. Devemos pesquisar quais os (são poucos, é verdade e em sua grande maioria “de esquerda”) deputados e senadores que, enfrentando a duras penas o sistema, nos defendem e nos representam. Não sei de qual estado você é. Sou de São Paulo, capital da “coxinhalândia” e até aqui é possível votar em políticos que nos representam de verdade.

marcio r

Muito bom Azenha.

Eu so não entendo como vc ficou tanto tempo no PIG, na verdade porque vc foi trabalhar no PIG? O PIG nasceu golpista conheço a historia dos canalhas desde os 10 anos de idade e tive TV em casa até os 16 anos e basta ver o JN pra saber que são golpistas.

De qualquer forma estamos aqui e te admiro pelo trabalho e parabéns por não ter batido palmas para autoridade nenhuma. Muito bom. Infelizmente a mudança é lenta, medidas radicais a esquerda não faz e a população é reacionária, conservadora e fascista. A maioria parece que nasceu para ser escravo, ainda assim vale a pena lutar por uma sociedade mais igualitária.

Guillherme

Globo e coquetéis molotov. Tudo a ver – no dia em que o povo lobotomizado por essa máfia jornalística acordar.

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