Jonathan Cook: A tentativa de Murdoch de comprar a Casa Branca

Tempo de leitura: 3 min

Murdoch, Petraeus e a Matrix da Mídia dos Estados Unidos

por Jonathan Cook*, em 21.12.2012, no Common Dreams

Carl Bernstein, famoso por conta do Todos os Homens do Presidente, faz comentários reveladores no [diário britânico] Guardian de hoje, embora não reveladores inteiramente da forma como ele parece acreditar. Bernstein destaca uma notícia divulgada no início deste mês pelo seu colega Bob Woodward, de que o barão da mídia Rupert Murdoch tinha tentado “comprar a presidência dos Estados Unidos”.

[NdoV: Bernstein e Woodward, atuando juntos como repórteres no Washington Post, ajudaram a provocar o impeachment do presidente Richard Nixon, nos Estados Unidos, nos anos 70]

Uma conversa gravada mostra que no início de 2011 Murdoch mandou Roger Ailes, chefe de sua empresa de mídia mais importante nos Estados Unidos, a Fox News, ao Afeganistão para persuadir o general David Petraeus, ex-comandante das forças dos Estados Unidos, a concorrer contra Barack Obama nas eleições presidenciais de 2012. Murdoch prometeu bancar a campanha de Petraeus e assumiu o compromisso de colocar a Fox News para apoiar completamente o general.

As tentativas de Murdoch de colocar seu próprio homem na Casa Branca fracassaram porque Petraeus decidiu que não queria disputar a Casa Branca. “Diga [ao Ailes] que se um dia eu concorrer…”, diz Petraeus na gravação, “não vou… mas se um dia concorrer eu aceito a proposta”.

Bernstein se mostra horrorizado não apenas pelo ataque frontal à democracia mas também pelo fato de que o Washington Post se negou a dar em manchete o furo jornalístico mundial. Em vez disso, enterrou a nota na seção de estilo de vida, apresentando-a como — disse o editor do caderno — “uma notícia espalhafatosa… que não tinha importância mais ampla” que justificasse um maior destaque.

No mesmo padrão do Washington Post, as empresas de mídia dos Estados Unidos ou ignoraram a notícia ou diminuiram sua importância.

Podemos provavelmente assumir que Bernstein escreveu seu comentário a pedido de Woodward, como forma encoberta de expressar o ultraje de Woodward com o fracasso completo de seu jornal em usar a notícia para gerar um merecido escândalo político. A dupla provavelmente esperava que a notícia provocasse audiências no Congresso sobre uso indevido de poder por Murdoch, em paralelo com as investigações que revelaram no Reino Unido o controle de Murdoch sobre políticos e a polícia de lá.

Como Bernstein observou: “A notícia do Murdoch — sua corrupção de instituições essencialmente democráticas dos dois lados do Atlântico — é um dos casos políticos/culturais mais importantes dos últimos 30 anos, um conto em andamento e sem igual”.

O que Bernstein não consegue entender é o porquê dos barões da mídia não enxergarem as coisas como ele. Bernstein reserva seu maior desprezo à “resposta hã-hã da imprensa e do establishment político norte-americanos, seja por medo de Murdoch, de Ailes e da Fox — ou, talvez, pela falta de surpresa com o desprezo revelados por Murdoch, Ailes e a Fox em relação aos valores do jornalismo decente ou ao processo eleitoral transparente”.

Na verdade nenhuma das explicações de Bernstein para o comportamento da mídia é convincente.

Uma razão muito mais provável para a aversão da mídia pela notícia de Petraeus é que coloca em risco a parede de interferência estática, no estilo da Matrix, gerada precisamente pela mesma mídia, parede esta que esconde de forma bem sucedida o relacionamento confortável entre as corporações (donas da mídia) e os políticos do país.

Esta notícia sobre Petraeus causa distúrbio na mídia precisamente porque destroi a fachada da política democrática dos Estados Unidos, uma imagem cuidadosamente criada para persuadir o eleitorado norte-americano de que ele escolhe o presidente e decide o futuro político do país.

Em vez disso, a notícia revela a charada do jogo eleitoral, no qual poderosas elites corporativas manipulam o sistema através do dinheiro e da mídia que controlam, restringindo as escolhas dos eleitores a candidatos quase idênticos. Estes candidatos têm a mesma opinião em 80% das questões. Mesmo quando as políticas deles diferem, a maior parte das diferenças é desfeita nos bastidores pelas elites através da pressão que exercem na Casa Branca via grupos lobistas, a mídia e Wall Street.

A importância da notícia de Woodward não é que ela prova que Rupert Murdoch é um perigo para a democracia, mas sim que revela o domínio absoluto do sistema político dos Estados Unidos por corporações globais que controlam o que ouvimos e vemos. Essas corporações incluem, naturalmente, os donos do Washington Post.

A ironia mais triste é que os jornalistas que trabalham na mídia corporativa são incapazes de enxergar fora dos parâmetros definidos para eles pelos barões da mídia. E isso inclui mesmo os mais talentosos profissionais do ramo: Woodward e Bernstein.

*Jonathan Cook won the 2011 Martha Gellhorn Special Prize for Journalism. His latest books are Israel and the Clash of Civilisations: Iraq, Iran and the Plan to Remake the Middle East (Pluto Press) and Disappearing Palestine: Israel’s Experiments in Human Despair (Zed Books). His new website is http://www.jonathan-cook.net/.

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Comentários

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Luiz Carlos

Cada um tem o Murdoch que merece. Nós, por castigo, temos vários em várias famílias, para escolher. E nenhum deles tem nenhum pudor em financiar seus próprios presidentes. Após a ditadura já indicaram e elegeram dois, agora tentam derrubar o que fugiu à escolha deles.

Nedi

A maioria das pessoas que se pretendem informadas certamente não discutirão essa questão…tenho um amigo que dirá que isso é “teoria da conspiração”.

Marat

A Casa Branca (ou Casa Grande) já foi comprada há muito tempo. Terroristas mandam ali… Falando nisso, os meus amigos que entendem de armamentos, e que frequentam este estupendo blogue sabem me dizer o que falta para a resistência árabe obter drones? Abraços

Haroldo Cantanhede

Murdoch, como barão da mídia mais elameada, como a temos por aqui (representada por aqueles 4 pilares: redebobo, folha, estadão e abril) está mal assessorado; deveria comprar a Suprema Corte – e dar o seu golpe. Provavelmente ainda não ouviu falar do nosso PIG. Com a Suprema Corte no bolso, ele terá a certeza de ver aprovados todos os absurdos que queira fazer materializar. E o povo, lhe dirá o nosso PIG, que se dane. Mas, espero, o povo irá às ruas, tanto aqui, como lá, para colocar os pingos nos ‘is’; quero ver a Suprema Corte vendida ‘mandar prender’ todo o povo de um país, chamndo isso de ‘insubordinação’.

Francisco

Os EEUU são uma plutocracia sem maiores surpresas desde Eisenhauer, nos anos 50.

O povo dos EEUU vive num Gulag maior e mais tenebroso que os da Sibéria de Stálin, visiveis e tangiveis.

Ao povo cubano, por exemplo, basta derrubar os Castro para fazer o quem desejar da vida (independente do julgamento que se tenha dos Castro).

Mas e o povo dos EEUU? Os EEUU estão para a liberdade como a Disneylândia esta para a realidade: parece tanto que é, que tratamos como se fosse.

FrancoAtirador

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PARADIGMAS DO MILLENIUM

* O PAÍS DA LIBERDADE… PARA MATAR.

* IMPRENSA LIVRE… PARA O CRIME.

* DEMOCRACIA REPRESENTATIVA… DE 1%.
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“Excuse me, America!

I’m going to spend Christmas in Iceland.”

99%
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    Nedi

    …e eu em Burkina Faso!!!

marcosomag

Existe o fato e a percepção que as pessoas têm dele. A mediação entre mensagem e recepção dela define como será essa percepção. Portanto, eliminar a velha mídia desta função de mediação é fundamental para quem quer uma sociedade democrática. Sempre bato na mesma tecla: a oposição partidária não é importante no caso brasileiro. A base ideológica do PSDB e similares ruiu com a crise atual do capitalismo. A única oposição que importa combater é a mídia! Ela representa os setores mais reacionários no Brasil e seus tentáculos fora do nosso país. Ela deplora a democracia. Portanto, deve ser esmagada!

francisco niterói

Viomundo

Este senhor nao é socio da sky? E consequentemente da globo (sempre ela)?.

Mário SF Alves

Tá tudo dominado. E isso não é de agora. O documentário The Corporation mostra claramente os meandros e feitos do sequestro dos Estados pelas grandes corporações. Agora imagine o efeito exponencial disso quando momentânea ou permanentemente aliado ao neoliberalismo; à máxima falácia do mercado acima de tudo. Imagine a pane cerebral que tudo isso vem causando na cabeça do povo. Imagine isso na cabeça de um povo preparado ideologicamente para acreditar cegamente no tal destino manifesto. Imagine esse arranjo, essa confluência de forças totalmente descontroladas agindo em nome da concentração de poder e lucro, agindo num cenário de tecnologia excludente de mão de obra e em economia globalizada. Imagine… não, por favor, chega de imaginar; mesmo porque, como mostra o The Corporation, as corporações agem como psicopatas.

José X.

[[A importância da notícia de Woodward não é que ela prova que Rupert Murdoch é um perigo para a democracia, mas sim que revela o domínio absoluto do sistema político dos Estados Unidos por corporações globais que controlam o que ouvimos e vemos]]

Isso aí não lembra um pouco Chomsky ?

Pois é, e censura só existe na China e no Irã, não é mesmo ?

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