Flávio Aguiar: Brasil, cautela e caldo de galinha…

Tempo de leitura: 4 min

por Flávio Águiar, em Carta Maior

…nunca fizeram mal a ninguém. Volto para Berlim, de uma temporada no Brasil, muito animado e um pouco assustado também.

Animado: o país passa por uma fase evidente de melhoras e ascensão social. Deixo as estatísticas para o Prof. Márcio Pochmann e o IPEA, que aliás, está excelente sob sua batuta (apesar de gremista, como sempre digo). Ao invés das estatísticas (que não são desprezíveis nem desprezáveis, muito pelo contrário), prefiro falar das expectativas. Fazia tempo que não encontrava tanta gente otimista, ainda que cautelosamente. Mais ou menos assim: empresários empresariando, operários operariando, crianças criançando (apesar de haver ainda essa praga do trabalho infantil), velhinhos velhando, a classe média se remediando e, é claro, nossa anacrônica direita cuspindo fel, fogo e baba pela boca (vide matérias na CM sobre o encontro do Instituto Millenium).

A impressão que dá, e a troquei com o professor Antonio Candido, meu fiel interlocutor e termômetro socioeconômicopolíticocultural, é que “o país entrou nos trilhos”, seja lá onde isso vai nos levar. Quer dizer: o país entrou num rumo que vai ser difícil mudar radicalmente, apesar da direitona tramar isso por debaixo e por cima do pano de suas promessas com pele de cordeiro de que “as boas coisas da administração Lula serão mantidas”.

Quem quiser acreditar que morda o dedo e faça um despacho na encruzilhada. Mas o que eu e o professor queríamos dizer é que se alguém quiser mudar esse rumo de crescimento social sustentado e de inclusão, vai enfrentar uma resistência de amargar-lhe a vida.

Peguei também nessa temporada o momento ascensional da candidatura de Dilma nas pesquisas de opinião. Foi animador. Afinal de contas, ela é sim uma candidata competitiva e competente. Botou em ordem a casa, junto com o “CTG” (Marco Aurélio Garcia e Tarso Genro) de que faz parte, ainda que venha das Minas Gerais, em momento difícil para o PT e o governo, antes das eleições de 2006. Sustentou o fogo do adversário, e deu lastro para que Lula envergasse Alckmin a ponto deste ter menos votos no 2° do que no 1° turno. Repito: animador.

Mas… aí começaram as preocupações. Porque naquele momento ascensional de Dilma notei que entre vários de meus amigos e correligionários de esquerda instalava-se um tentador clima de “já ganhou”, de “ninguém mais duvida de que Serra vai perder” (não era nem de que “Dilma vai ganhar”). Vi-me envolvido por um verdadeiro foguetório parecido com aqueles de quando o Brasil entra em campo, e a gente esquece de tudo, na antecipação da vitória: esquece a hecatombe de 1950, esquece o desastre de Sarriá, na Espanha, contra a Itália, os vexames de 1954 (olha que sou velhinho!), 1966, 1974 e 1978, 1998 e 2006. É verdade que, em geral, no futebol, o Brasil, quando perde, é porque dá vexame. Porque se resolve jogar, poucos times agüentam o tranco.

Mas na política, entre direita e esquerda, não é assim. O nosso time pode jogar bonito, e perder o jogo. Não foi assim em 1989? Que eleição aquela! Até hoje me arrepia a lembrança de Chico, Milton e Djavan (parece uma linha média) cantando o “Lula lá”. Mas o outro lado, além das pilantragens do costume, coisa de marquetear edição de debate, botar camiseta de petista em autor de seqüestro, colocar as barbaridades da Míriam Cordeiro no ar sem nenhum pudor nem candor, repito, o outro lado jogou melhor.

Melhor? Melhor. Eu não jogaria do jeito que eles jogaram. Mas eles, naquela ocasião, exploraram melhor as fraquezas e as limitações do nosso lado. Não estou fazendo o julgamento nem a caveira de ninguém. Só alertando que o outro lado joga pesado, feio, é contra a política-arte e a favor do tranco, do pé no peito e do carrinho dentro da área, mas que isso, em política, pode ser jogar bem também. A gente tem que estar preparado, porque vem artilharia pesada, torpedos e bombardeios, além de possíveis ogivas nucleares para cima da candidatura da Dilma e para todo o nosso lado.

Por quê? Porque a perspectiva de ficar mais 4, 8, talvez 12 ou 16 anos fora do Palácio do Planalto deixa a turma dos amigos do Millenium (e dele mesmo) apopléticos, com risco de ataque de asma espiritual, taquicardia política e risco de anorexia financeira e organizativa. O DEM vai definhar, o PSDB pode implodir, Alckimistas de um lado e Serralhos do outro e FHC no meio segurando o pincel, os Verdes são capazes de esverdear, com musgo e mofo se alastrando de seu lado direito em direção à sufocação do seu lado esquerdo – pois terão de deixar essa postura que vêm mantendo, de que o que a minha mão direita faz a outra mão desconhece, e vice-versa.

Já o PSOL, bem, o PSOL ficará onde sempre esteve, isto é, não se sabe muito bem aonde, ou, como se diz na minha terra, “mais perdido que cusco em procissão” e “mais nervoso que gato em dia de faxina”. Isso, quanto à direção. O povo do PSOL vai acabar votando na Dilma.

Voltei convicto de que o Brasil vai bem obrigado. Que as chances de Dilma são reais. Mas que as de Serra também. Ou seja: vamos pra frente que o futuro é da gente. Mas que hay que trabalhar para lá chegar. E muito. A peleia promete ser das boas.

 Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.


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Comentários

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Eudes H. Travassos

No final fiquei surpreso com texto do Sr. Flávio Aguiar, otimismo é bom, é real, tem inclusice razão prá se ter, mas não é prá se ter.
Eleição ganha quem tem os melhores argumentos e o melhor conteudo prá ocupar os argumentos. É bem verdade que Dilma tem muito mais que o Serra que aliás, não tem argumento. Em compensação um terceiro elemento ele tem demais, o apoio conservador do país e o bobo que substimar está derrotado.
Em suma vai ser guerra, os barões conservadores contra o povo, e a nossa terefa será de fazer com que chegue a este último o conteúdo argumentado por Dilma.
Vai ser GUERRA.

Erivaldo de Souza

Eu tenho absoluta certeza que dá certo.
Mas o Flavio Aguiar tem razão.
Eles jogam feio, pesado. Não têm medo de matar a jogada com golpes ilegais.

Temos que ficar atentos e fortes. Sem tempo para temer a morte.

O PT, o pessoal que vai a campo, tem que saber que nada é fácil.
e nós aqui da arquibancada, se for preciso invadimos o campos.
Xingaremos o juiz, como sempre. E sua mãe.

mas é preciso mais, muito mais. Que gritos.
Precisamos das ruas. Em qualquer momento, em qualquer canto.
Mínimo que for.
Sempre e´um voto a mais.

Fred Oliva

Interessante o raciocínio desta senhora, a tal de Judith Brito, presidente da ANJ, ou algo similar…

Ela acha que a imprensa tem que fazer oposição porque a oposição (PSDB/DEM) é incompetente para fazer oposição.

Como até as pedras sabem que foram incompetentes também nos oito anos que tiveram o poder (FHC), a dedução é cristalina:

“Vamos fazer oposição ao governo Lula para que quem foi incompetente, como governo e oposição, volte ao poder”

Durma-se com um barulho desses…

Roberto Locatelli

Vamos colocar mãos a obra?

Acabei de "zipar" cerca de 40 pequenos textos para

– serem mandados por email para amigos e parentes (máximo de 1 por mês para não forçar a barra)
– serem postados em sites do uol, folha, terra, estadão, cbn, etc. Há textos sobre vários temas ligados às eleições.

São trechos editados e compactados de posts da blogosfera, trechos de notícias, etc.

O arquivo .zip está neste link:

http://www.adrive.com/public/51cb1d82d570c459ef43

Sugiro que os leitores do VioMundo também criem seus próprios textos e tornem público, para facilitar a vida de todos.

    Thadeu Melo

    Legal, já começou a batalha pela manipulação de dados e mentiras desfarçadas de noticias.

    Agora sei porque no Orkut e foruns livros os petistas se calam ou GRITAM frente a confrontação. Eles tem respostas pré programadas. Noticias velhas e tiradas de contexto.

    francisco.latorre

    quer dizer que é nóis que manipula…

    haja.

Tweets that mention Flávio Aguiar: Brasil, cautela e caldo de galinha… | Viomundo – O que você não vê na mídia — Topsy.com

[…] This post was mentioned on Twitter by Rodrigo Queiroz. Rodrigo Queiroz said: Flávio Aguiar: Brasil, cautela e caldo de galinha : http://migre.me/sXDy . Belo texto! Mais um, usando o futebol para falar de política! !! […]

Donizeti Costa – SP

Concordo com o Flavio Aguiar.

Ontem à noite tomei um susto com o Serra na TV ( e não foi com a cara feia do Serra, não!).

Foi com o Serra afirmando que o Bolsa Familia foi criação dos tucanos !!!

Ué, não são eles que falam entre sí que o programa é Bolsa-Esmola ? Que não tem porta de saída ?

Estão se apropriando das realizações e do discurso do governo Lula e da Dilma !

Acorda PT, Lula e Dilma. Esse é o nivel da campanha do Serra, mentira, enganação, cara-de-pau, VALE TUDO!

Essa gente vai fazer qualquer coisa para ganhar essa eleição, pois sabem que se perderem vão desaparecer.

Roberto Locatelli

Uma das principais trincheiras de luta é a trincheira digital, a internet.

Recomendo ler, aqui mesmo, o fundamental post do Mauro Carrara: http://www.viomundo.com.br/voce-escreve/mauro-car

Contra a operação da mídia serrista, batizada de "Operação Tempestade no Cerrado", vamos desencadear a "Operação Guerreiros da Blogosfera".

Fabiano

"As boas coisas da administração Lula serão mantidas".
Foi EXATAMENTE a campanha que fizeram contra o PT no Rio Grande do Sul na campanha eleitoral em que esse partido saiu derrotado. Dêem uma olhada no que deu.

C Nunes

Caldo de galinha, com certeza fez mal a galinha….

Alcino

1)- Desmontar a afirmação de que tudo o que o Lula fez foi porque o governo de FHC modernizou o país.
2)- Mostrar em poucas pinceladas como foi o governo FHC e o que fez.
3)- Mostrar tudo o que o PAC fez, destruindo a afirmação de que fez muito pouco.
4)- Afirmar que foi a Dilma quem gerenciou o PAC.
5)- Mostrar fatos e fotos reais, ilustrativas do que o Lula fez.
6)- Mostrar o passado da oposição: privatista, exclusivista, violento e catastrófico economicamente.
7)- Mostrar o empresário que ficou feliz e o popular que ficou feliz.

Mas…Mostrar como? Como possa. Até na mídia, se ela der sopa ou cochilar.

Rosemarie Fraga

Esta ai um comentário de uma pessoa que age sem paixões políticas. Uma pessoa que não se deixa levar só pelo entusiasmo do já ganhou. Tudo é favorável ao Presidente Lula, ele esta fazendo e terminará os doi s mandatos com alta popularidade. Quanto a Dilma não podemos dizer que já ganhou, mas tem tudo pra ganhar! A economia vai bem e quando a economia vai bem o resto acompanha. Os brasileiros não podem esquecer o que foi o governo do sr. FHC, um dos piores e dos mais desmoralizados e isto está gravado na mente das pessoas que passaram por aquilo.

    Piá

    Paixão política sem viseira.
    A não ser que tenham lido / estudado, pessoas com entre 16 e pouco mais de 20 anos hoje, desconhecem – não vivenciaram – os fatos no governo FHC.
    Quantos são eles e elas?

    Piá

    Mas: em SP, quantos foram atingidos pela "progressão continuada" dos tucanos?

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