Fátima Oliveira: Começou outro carnaval…

Tempo de leitura: 3 min

A moda papal vintage e a simplicidade franciscana falam

AO INVÉS DE O CARNAVAL TER ACABADO, COMEÇOU OUTRO…

Fátima Oliveira, no Jornal OTEMPO
Médica – [email protected] @oliveirafatima_

Em meio à overdose papal das últimas semanas e ao deslumbre midiático com a operação de cosmetologia que chega ao Vaticano, um misto de estilo jesuíta e do jeito franciscano de ser, reservo-me o direito de esperar a primeira encíclica do papa Francisco na certeza de que os temas palpitantes de direitos humanos não serão olhados com misericórdia, pois integram as chamadas “questões doutrinárias” católicas, e já foi dito, à exaustão, a respeito do louvor do papa a elas.

Ao contrário do que disse o papa, que “o Carnaval acabou”, é perceptível que apenas começou outro… “Minutos após o resultado da eleição no conclave ter sido declarado na Capela Sistina, o mestre de cerimônias do Vaticano ofereceu ao novo papa a tradicional capa vermelha decorada com pele, que Bento XVI usava com orgulho em cerimônias importantes. ‘Não, obrigado, monsenhor’, teria afirmado o papa Francisco. ‘Você pode vesti-la. O Carnaval acabou!”. (BBC, 16.3). Foi uma direta, ou indireta, à moda papal vintage de Bento XVI?

Publicações de moda eclesiástica ou clerical falam da fixação de Bento XVI em vasculhar vestes antigas de papas e reeditá-las em alto estilo: reabilitou o camauro, “o mais comum dos chapéus nos retratos papais históricos – do latim camelaucum (chapéu de pele de camelo), originalmente os chapéus dos imperadores bizantinos”; o chapéu Saturno; a mozetta, espécie de capa até a altura do cotovelo, em desuso desde Paulo VI.

Para a analista de moda Lola Galan: “Ratzinger deixou clara sua preferência pela pompa das roupas litúrgicas arcaicas, pré-conciliares”. Ele disse que “a magnificência das vestes serve para a Igreja comunicar-se com o mistério e a divindade”. Bento XVI é um ícone da moda eclesiástica e um papa ‘fashion’, que usava óculos escuros da Gucci e sapatilhas Prada (o Vaticano nega!).

As más línguas dizem que o luxo acintoso das roupas do papa tinham o dedo do seu secretário particular, desde 2003, o lindo arcebispo titular de Urbisaglia e prefeito da casa pontifícia, desde 2012, Georg Gänswein, o “George Clooney do Vaticano”, que inspirou Donatella Versace, que o vê como um “sex symbol”, a criar, em 2007, uma coleção com o nome dele; e, depois, a linha masculina Gänswein.

O papa Francisco usará os sapatos vermelhos? Talvez. “A tradição de os papas usarem sapatos vermelhos tem uma longa história… Eram feitos de simples couro vermelho de Marrocos e tinham uma cruz dourada. João XXIII acrescentou fivelas douradas, eliminadas pelo seu sucessor, Paulo VI. Contudo, o antecessor de Bento XVI, o papa João Paulo II, preferiu os normais sapatos castanhos (…).

Em ‘Why Does the Pope Have Red Shoes?’, livro que responde a questões das crianças, Georg Gänswein explica o significado dos acessórios vermelhos: ‘vermelho é a cor do martírio, do amor ardente e da chama do Espírito’. Daí ser a cor preferida no vestuário de Bento XVI” (“Moda papal”, “Portugal Têxtil”, 2008).

Os jesuítas são especialistas em comunicação e mais que ninguém sabem o exato valor do ditado popular “o hábito faz o monge” – a confirmação de que a moda não apenas fala, mas como uma vestimenta pode afetar processos cognitivos.

Com a moda clerical, particularmente a papal, não é diferente. E ela funciona como uma vitrine. De modo que a simplicidade franciscana do papa jesuíta tem de estar em correspondência com as vestes de suas aparições públicas. O que não é um pormenor… A moda papal também fala: “Por fora, bela viola, por dentro, pão bolorento”.


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Comentários

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Gerson Carneiro

A nova pregação consiste em empurrar goela abaixo a tal humildade papal.

Bom tempo quando o cristão tinha que aceitar apenas a palavra do Cristo.

Mário SF Alves

Ainda hei de ler Dante, e só pra confirmar se tudo isso não passa mesmo de um cenário dantesco.
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Ou… joãozinhotríntico, quem sabe?

Carlos J. R. Araújo

O grupo de Ratzinger viu que a coisa, do jeito que estava, não podia continuar. Então, adotou três providências: o velhinho saiu (Torquemada morreu com 78 anos e nem por isso largou a farda e os adereços, o que significa dizer que nenhum deles renuncia ao cargo), o braço direito do secretário de Ratzinger à época da inquisição interna dos anos 80, de cardeal passou a Papa e, repetindo a ótica do personagem de Lampedusa, a terceira providência é a cosmetologia.

Enfim, com as exceções do Concílio Vaticano II, a Igreja foi, é e será o de sempre: uma enganação religiosa. Cristo deve estar dando risada com a refinada e cosmética hipocrisia,velha de dois milênios e cada época com mais adereços. Mas Ele decerto não se irritará, pois afinal são quase dois mil anos de cosmetologia. Ele é paciente, mas a paciência humana tem limites.

    Julio Silveira

    Perfeito.

Samira

Muitas mulheres vestem ou gostariam de vestir Prada … e são capazes de pagar centanas de reais por uma bolsa da Louis Vuiton ou Cardin. Outros e outras se contentam com celulares de último tipo, tablets mais caros e outros confortos e símbolos de status. Quem pode mesmo criticar o próximo?

Willian

Impressionante como é fácil esculhambar o catolicismo (do qual não faço parte) na blogosfera mas como falta colhões para fazer o mesmo com o islamismo ou com a umbanda. Alguém que falasse metade do que se fala do catolicismo por aqui da umbanda seria chamado de racista. Falasse metade do islamismo, estaria morto.

    Mariano Grapia

    A resposta você já deu. Só tem culhões para atacar quem não reage. Isso se chama covardia.

    Fabiana

    Caro Mariano, vamos deixar a passionalidade de lado e deixar de procurar pelo em ovo. Um artigo absolutamente simples que aborda as vestes eclesiásticas. Aponta o luxo estonteante de alguns papas e o quanto tanto luxo agride o ser humano. Há uma moda eclesiástica, que pode ser simples ou luxuosa. A gosto do freguês. O artigo trata de uma realidade. E ele não mente. Por que você achou que é um artigo que levanta falsos. Ou você é cego?

    Julio Silveira

    Sem querer no mérito das diferenças entre as diversas religiões, mas aqui vivemos as consequencias da igreja catolica prevalente, que não mata, mas perdoa assassinos, pedófilos e ditadores outorgados ou não, com a facilidade do recebimento de um dizimo regular.

    Fabiana

    Qual foi a esculhambação feita no artigo? Há alguma mentira? O artigo relata fatos que aconteceram e estão documentados. O apego de Bento 16 pelo luxo está documentado. Então onde está a esculhambação? Só mesmo no luxo exagerado das vestes papais.

    Mário SF Alves

    Ah! As terríveis comparações insustentáveis. Ah! As anti-técnicas comparações tabula rasa. Ah! O “eterno” vício de se comparar entidades incomparáveis. A prevalescer tal racicínio, por que não se tem a cara-de-pau de colocar em pé de igualdade, ou se analisar como se iguais fossem, o poderio bélico de Cuba e o dos EUA? Simples. Simplesmente por que a propaganda e os fatos, inclusive, Hiroshima e Nagazaki, mostram absolutamente o contrário. Mas, comparar o poder e a influência do Vaticano com a Umbanda, ah, isso pode, é normal, né não Willian? Afinal, o Vaticano ainda não explodiu uma bomba atômica (de fato) sobre os seguidores da Umbanda, né mesmo?
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    E por falar em covardia, quem está sendo covarde? Quem se cala e diuturnamente incensa, se vangloria e ajoelha-se diande de um dos poderes que mais assolam a Humanidade ou, o contrário, quem o enfrenta e morre se preciso for nesse enfrentamento?
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    E, afinal, por que tanto medo do Islamismo? Don’t panic, Willian, don’t panic, o Islamismo só cresce onde o cristianismo deixou de existir; onde o catolicismo o empolou de vaidade, de prepotência e de tanta submissão ao jogo de poder neoliberal e outros.
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    E creia, não bastasse isso – o referido vício – ainda temos de enfrentar a divulgação de notícias totalmente fantasiosas, totalmente desprovidas de contexto ou de circunstânscias; verdadeiros festivais de intrigas, difamação e fofocas.

    Willian

    Ah, Mario, as vestes do Papa podem ser motivos de post, mas o apedrejamento de uma mulher adultera muçulmana não recebe uma linha. Joguem pedra a vontade, já que o Irã é contra os EUA e, assim, é vosso amigo.

renato

O Papa caiu no Mundo, agora aguente!

Julio Silveira

Sabe me preocupo muito com estereotipos, mas as vezes não tenho como não pensar na frase atribuida ao Joazinho trinta, quando criticado sobre a opulência e a riqueza em suas fantasias de carnaval. E, talvêz esse sentimento, expresso na frase, explique um pouco do porque desses grupos, sempre atentos a um povo carnavalesco como o nosso, tratarem com superficialidade e falta de conteúdo nas ambições de nossa cidadania, usando a futilidade como tema central. A sociedade,aos meus olhos, grande numero de vezes dá demonstrações muitos pertinentes de que a razão estava com o carnavalesco, quando lhe foi atribuido ter dito que pobre gosta de luxo, quem gosta de pobreza é intelectual.

    Mário SF Alves

    Ainda vá lá que fosse apenas luxo, prezado Julio. Ainda que fosse apenas luxo; fosse apenas o braço religioso da ideologia milenarmente construída pra ser um dos sustentáculos do infindável sistema de exploração do homem pelo homem, vá lá. Fosse apenas isso e a Humanidade talvez estivesse melhor.
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    Infelizmente falta democracia e sobra inquisição; infelizmente falta democracia e sobra intervenção; infelizmente onde falta democracia, sobra dissimulação.
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    Ah! Fosse apenas ideologia e luxo; quem nos dera.

Serginho Cabralito

Começou outra tragédia na região serrana do Rio também. Com o silêncio ensurdecedor da “blogosfera independente”… ah se fosse governo do PSDB…
Cadê o dinehiro do governo federal prometido na última? Tá no maracanã…

Roberto Locatelli

Jesuitas eram aqueles padres que, no Brasil colônia, diziam que índios e negros não tinham alma e que, por isso, estuprar uma índia ou negra, ou matar um(a) índio(a), não era pecado.

    João Vargas

    Aqui no RS os jesuitas fizeram um grande trabalho de integração e evangelização dos índios. Criaram os sete povos das missões onde eram incentivados o trabalho comunitário e as artes. Infelizmente foram dizimados pelas coroas de Portugal e Espanha. Muitos jesuitas morreram ao lado dos índios. Sempre que generalizamos, meu caro Roberto, corremos um grande risco de cometermos injustiças.

    fujimori

    Nao, sr. Roberto, o que aconteceu foi bem o contrario do que o sr. propoe. Os jesuitas foram expulsos, entre outras coisas, por defenderem a “alma” indigena. Afora, o acrescimo do “estupro” parece ficar mesmo por sua conta (ignorancia historica, imaginaçao, fantasia…?).

Gilvan Miranda

Se a questão é roupa quero ver se o tal papa vai vestir-se mesmo de Franscico de Assim, que foi um cristão flagelante do passado.

Pago para ver.

Luciana Cintra

Fátima Oliveira é muito observadora. Perspicaz mesmo. Pegou um assunto aparentemente sem importância e destacou sua crucial importância. A roupa fala realmente. O glamour e o luxo exagerado de Bento 16 era mesmo um acinte. Espero que o papa Chico se toque. Simplicidade no vestir é uma boa coisa, mas não é tudo. O atual papa já disse a que veio com seu sorriso simpático: é um conservador arraigado.

Marcelo de Matos

(parte 1) Sou muito brega para falar de moda, quanto mais moda papal. Quanto à “simplicidade” de Francisco I reporto-me ao que escreveu Hélio Schwartsman ontem na Folha: “Agora que a fumaça em torno do conclave que elegeu o papa Francisco se dissipou, arrisco perguntar se a religião tem futuro?” “Isso significa que, enquanto contarmos com uma boa variedade de seres humanos, alguns deles deverão permanecer obstinadamente crentes. Daí não decorre, porém, que os clérigos estejam com a vida ganha. Há uma correlação negativa forte entre desenvolvimento social e religiosidade, da qual a Europa dá testemunho. Nos últimos 30 anos, a tendência geral no continente tem sido de forte queda da fé, como mostram pesquisas que questionam não apenas as crenças dos entrevistados mas também o peso que cada um deles atribuía à religião em sua vida. Um caso emblemático é o da Suécia. Como mostra Phil Zuckerman, menos de 20% dos suecos acreditam em um Deus pessoal”.

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