Artur Araújo: A “crise” do crescimento acelerado

Tempo de leitura: 5 min

O PSDB, o FMI e a turma dos 30%

Artur Araújo*, na Carta Maior

O espectro de uma pergunta ronda as redações e, se formulada, desnudará o que realmente separa as duas principais candidaturas à presidência. Basta indagar de José Serra: “o senhor propõe parar o Brasil?”

Explico-me, a partir de três exemplos muito recentes: um artigo de Luis Carlos Mendonça de Barros, os 50 anos de Brasília e as manchetes sobre a orientação do FMI para que o Brasil reduza sua taxa de crescimento.

Em artigo publicado na FSP de 16/04, Mendonça de Barros , o ex-ministro de FHC de volta a sua vida de financista, revela o que é o centro da “economia política” do PSDB. Tido e havido como desenvolvimentista, anti-Malan, da escola de Sérgio Motta e José Serra, Mendonça expõe uma tese: “a euforia pelo crescimento nos levará a bater no muro das restrições econômicas; esse filme tem final triste”. E para quem esperava as clássicas formulações – sobre os gargalos de infraestrutura, a baixa taxa de expansão da capacidade instalada, a “gastança” em custeio que impede o investimento público – ele abre seu coração e surpreende:

“A maior parte da oferta na economia brasileira é constituída por bens e serviços que não podem ser importados. O mais importante deles é o mercado de trabalho e nele é que está a componente mais ameaçadora que vejo para a frente. […] Poderemos chegar ao fim deste ano com uma taxa de desemprego da ordem de 6%, mantido o crescimento atual da geração de postos de trabalho. Em março, o número de empregos formais aumentou em 266 mil, número muito forte para o mês.
[…] A pressão sobre os salários desse segmento dos trabalhadores já está ocorrendo e deve se acelerar. […] São evidências de instabilidade grave. Dou um exemplo: a produção de caminhões da Mercedes-Benz brasileira em março foi o dobro da matriz na Alemanha. Mesmo com a crise na Alemanha esse número é um aleijão para mim.”

 Trocando em miúdos: crescer rápido é um “problema”, porque pode gerar aumentos salariais para os trabalhadores e reduzir a taxa corrente de lucros. A ótica do imediatismo salta aos olhos; nem mesmo de relance, o articulista se refere a um ciclo virtuoso, em que o crescimento real da massa salarial implica ampliação da demanda efetiva, cria as condições para expansão da capacidade produtiva (e da formação de mão-de-obra) e para a expansão da própria acumulação de capital, pelo crescimento do volume produzido e realizado.

O seu negócio é o aqui e agora, é o lucro já; e o futuro, provavelmente, nem a Deus pertence. O espantalho que agita é o da inflação de demanda, que se recusa a atacar pela via do choque de oferta, do mercado interno de massas e da expansão das exportações de maior valor agregado. Sua panacéia é o aumento dos juros.

Já na cobertura dos jornais paulistas sobre os 50 anos de Brasília, um velho espectro ressurgiu, explicitamente referido, por exemplo, em editorial de “O Estado de São Paulo”: Brasília, entre outras mil de suas supostas mazelas, estaria na origem da espiral inflacionária do início dos anos 1960. Sem, até hoje, compreender o que de fato Brasília operou, como meta-síntese do programa de desenvolvimento nacional de Juscelino, as vozes do passado afloram, opondo-se às obras públicas, à ação do Estado na criação de infraestrutura, na indução econômica e na integração democrática de todos os brasileiros e de todo o território nacional.

A rádio CBN tem apresentado uma ótima série de reportagens sobre a história da criação de Brasília. Em um dos programas, o tema era o debate na imprensa daquela época. A matéria narrava a campanha cerrada que o engenheiro da UDN Gustavo Corção, guru de Carlos Lacerda, movia contra a construção da cidade. Um de seus temas preferidos era  o Lago Paranoá que, do alto de sua sapiência, o Dr. Corção garantia que nunca ficaria cheio, dados o regime de chuvas e as características do solo do cerrado.
No dia em que o lago ficou completo, JK, pleno de mineirice e bom humor, telegrafou para a redação do jornal em que Corção escrevia. Usou uma só palavra: “Encheu”.

O que Juscelino enfrentava era uma herança maldita, um Brasil litorâneo que só via a si mesmo, que desprezava mais de dois terços de seu território. A Marcha para o Oeste significou, muito além de Brasília, a experiência pioneira de Ceres, cidade-modelo agrícola implantada em Goiás, em que se desenvolveram as técnicas de correção de solo que permitiram a expansão agrícola, que hoje faz do Brasil um ator mundial em alimentos e biomassa para geração de energia. Significou, também, a abertura da rodovia Belém-Brasília (aquela que Jânio e a UDN chamavam de estrada para onça), articulando os eixos Norte e Oeste do nosso desenvolvimento.

E significou, mais do que tudo, para todos os brasileiros, trabalhadores ou empresários, uma mudança de postura e ângulo; Brasília permitiu que olhássemos mais e melhor para os nossos próprios potenciais e capacidades.

O FMI, que não é daqui, ecoa a lógica de Mendonça. Seu mais recente relatório, diz a FSP em manchete, “vê economia brasileira ‘no limite’”. Forçado pelos fatos a revisar – para cima – sua estimativa de crescimento da economia do Brasil, o Fundo “aponta demanda ‘em estágio avançado’ e espera medidas para desacelerar crescimento de 5,5% neste ano para 4,1% em 2011.” Tanta coincidência, até nas palavras, é sintoma de um alinhamento automático, de um modo de ver e conduzir o país.

O PSDB de hoje, por vezes até mais que os “demos”, olha a economia e o Brasil com esse viés. O que o orienta é o mundo internacional das finanças e a propensão a pensar em pedaços, em satisfazer-se com políticas que incluem só um terço dos brasileiros – os mais ricos – e só uma parte de nosso território – o sul-sudeste. É a turma dos 30%.

Expansão de consumo, crescimento de salários, ampliação da produção, desenvolvimento da infraestrutura, inclusão e capacitação das pessoas, todos esses são temas ausentes de suas formulações – ou vistos como “aleijões”. Aumento continuado e real do salário mínimo, instituição de pisos salariais nacionais, redução de jornada de trabalho, diminuição de desemprego, PAC, PROUNI, são pautas que os levam à beira do pânico. Tudo que seja para todos é risco, não oportunidade.

Ainda que se dê a José Serra o benefício da dúvida, do quanto ainda preserva de seu suposto desenvolvimentismo, não é despropositado indagar como ele “resistiria” à pressão combinada do tucanato econômico, do udenismo paralisante e elitista e da banca mundial, falando pela boca do FMI. A experiência FHC não traz muitas esperanças quanto a isso. Um jornalista arguto qualificaria a pergunta que abre este texto e questionaria o que o candidato fará com a turma dos 30%, aqueles que, há décadas, estiveram do seu lado e sempre quiseram que o Brasil pudesse menos.

*Artur Araújo é consultor especializado em gestão pública e empresarial

Nota do Viomundo: Por solicitação do Artur Araújo, estamos republicando nova versão do seu artigo. “O texto publicado antes (e que também foi na CartaMaior) é uma versão inicial”, justifica o autor. “As mudanças são tópicas, mais de estilo, com uma correção factual: eu havia trocado os ‘Sérgios’, o Motta pelo Guerra.”


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Comentários

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Alexandre Porto

Além de defender o risco do emprego, o mais cínico desse artigo doi quando ele escreve:

"Também a infraestrutura econômica não está preparada para acomodar tal crescimento econômico. Afinal, são quase oito anos sem investimentos federais relevantes."

Augusto Gasparoni

Há alguns dias era pó-demais, agora pó-demenos. Acho que essa crise do Mendonça é crise de abstinência. Os caras não sabem para onde atirar. Estão atirando em miragens, fantasmas, vultos, dragões, qualquer coisa é inimigo.
Qualquer analista sério, e não sabedor de sua belicosidade, daria muitas gargalhadas de sua falta de objetividade. Se não fossem ervas daninhas tão perniciosas daria pena de sua perplexidade.

alexandre melo

quando eu era menino, o unico economista que tinha voz era o delfim,
suas teorias fracassadas nunca deram em nada,
vieram outros planos economicos que falharam mas mostraram a
incopetencia de delfim, por fim a inflacao que era um flagelo universal acabou,
nao foi por delfin , funaro, gustavo franco e outros ,
ela acabou por si.
dai em diante tenho comigo que estes economistas brasileiros sao apenas palpiteiros
tenho todos como imbecis, mestre de uma ciencia ficticia.
nao acreditem nestas bestas. muitos
a servico do pig

francisco.latorre

com 45 o brasil não pode.

nem sai de baixo.

..

robledo

Somente num país como o nosso o Mendonção dá pitaco, noutro local ele tava curtindo uma cama de cimento e olhando chave de cadeia.

J. Carlos S. Pereira

O problema dos demotucanos é acharem que todo o mundo é burro e só eles são inteligentes. Todo o mundo percebeu que o destaque encomendado que o PiG deu às manchetes sobre "superaquecimento" da economia brasileira tinha um alvo bem definido: a reunião do Copom. Foi todo um lobby nacional, com ramificações internacionais conduzidas por aquele ex-presidente do BC, calvo, do qual não me ocorre o nome, que só abre a boca no exterior para detonar nosso país. Mas o Delfim Netto deixou o rei nú ao desmascará-los no excelente texto que publicou no Valor onde deixou bem claro a quem interessava um significativo aumento na taxa básica de juros, claro os especuladores de sempre que sustentam a candidatura demotucana. Mas se deram mal e serão cada vez menos ouvidos e menos poder de fogo terão interna e externamente, para felicidade geral da nação.

    @rldigital

    Espero que a Dilma escolha um presidente do BC melhor que esse… Além disso, essa tal "independência do Banco Central é, em minha opinião, uma aberração. Como é possível que o país tenha duas políticas de juros, uma do Governo eleito e outra do BC?

Gão

É a lógica maluca neoliberal! esse pessoal não morre tão cedo. o crescimento atual se dá em bases sólidas, não pela especulação malandra neoliberal, não venderam mais a doença mais continuam querendo vender o remédio!

Fred Oliva

Na verdade o PSDB pensa na frente… Pensa no Horário Eleitoral Gratuito que anulará o efeito PIG.

Um Brasil pujante, crescendo bem acima da média mundial (lembram quando eles diziam que o Brasil crescia menos que o
Haiti?), criando empregos e sendo elogiado no exterior é um pesadelo de proporções oceânicas.

Imaginem Dilma e Lula apenas repassando para o eleitor estes números todos? Haja Datafolha para tentar equilibrar o jogo…

Leider_Lincoln

É isso aí cambada: bora voltar no José Serra, senão o desemprego cairá, a economia irá crescer e os salários aumentarão!
Se você não quer uma desgraça destas acontecendo no Brasil, a única solução é votar em José Serra, da coligação PSDB/DEM/PPS/PCC! O número é 45, não se esqueçam!

yacov

Com certeza essa turma dos 30% não quer um BRASIL para todos, não. E, certamente pode muito menos, pois o querem só para si. Quem não os conhece que os compre. Eu não quero isso nem de graça e nem para o meu pior inimigo.

"O BRASIL NÂO PASSA NA GLOBO – O BRASIL PODE MUITO MAIS SEM OS PSDBOBOS"

kalango Bakunin

para eles o Brasil vai mal quando a população está bem
sempre foi assim
economistas fajutos, porém cheirosos

Carlos

Esse emprego de advogado do diabo é cansativo…
Sem pretender justificar os juros, ressalto que FHC entregou o governo com SELIC de 25% e inflação projetada para 2003 também em 25%
A Consituição Federal (de 1988) estabelece juros de 12%, já descontada a inflação… Faça as contas: os 9,5% estão dentro do estabelecido pela CF 88.
No DIAP, procure informações sobre a votação dos juros de 12% quando da feitura da Constituição – quem votou a favor e quem votou contra o teto de 12%?
Qual a posição do então deputado federal José Serra?

Ramon

Lembrem-se que crescer pouco significa desempregar milhões de pessoas. Lembro-me do governo FHC que gerou menos de 800 mil empregos com carteira assinada em 8 anos, enquanto Lula gerou mais de 9 milhões. Lembro-me dos reajustes do salário mínimo de 5, 6, 7, 8 reais ao ano, redução da renda dos assalariados.
Inflação é ruim, sem dúvida, mas qual o percentual inflacionário que eles estão falando?
Lembrem-se que os tucanos sempre sinalizam crises, catástrofes, epidemias, maremotos que não se manifestam ou que se realizam em escalas insignificantes.

E. Cabral

De JK também nos veio a BR 364, resgatando e integrando o norte de Mato Grosso, Rondônia, Acre e Amazonas. É por ela que estão vindo as hidrelétricas de Santo Antonio e Girau e mais crecimento e mais integração, agora também para o Norte/Nordeste boliviano, Peru, Equador e até Colômbia. O problema,Azenha, é que esses sujeitos do PIG $-errista só conhecem a geografia das apostilas do guru deles. Aquelas em que até o Paraguai são dois, o Piauí muda de endereço, etc. É preciso divulgar em todas as redes sociais essa opiniões dos TUCADEMOS pra mostrar o risco que o Brasil de nosso filhos e netos tá correnco como risco de eleição de $-erra, O BIRUTA.

Valmont

O desemprego do povo brasileiro era garantia de arrocho salarial e, no final das contas, lucro para o patrão. Esta sempre foi a lógica retrógrada das aves de rapina que governaram este país durante séculos.
Demotucanos nunca mais!!!

franklin

Nos Eua, os juros permanece a 0,25, aqui no Brasil quase 10, aí fala se em aumentar os juros, pra combater a inflação, só uma pergunta, se taxa de juros alto controla a inflação? Se sim, então os americanos e outros paises de 1º mundo stão todos quebrados e escondendo pra todo mundo, pois tem juros quase zero, logo logo, o povo cobrarará a verdade sobre juros. E perdão pelo meu analfabetismo.

gilberto silva

Sevai mal senta o pau…se vai bem tambem….uauuuuuuuuuu. é pig é pig é pig é pig…….

O Brasileiro

Crescer pouco é ruim, mas inflação é muito, muito pior!

@rldigital

É verdade, muito bem lembrado, Rios! Houve até de uma capa da Veja comparando o Brasil a uma tartaruga. Lembro-me da Miriam e do Sardenberg criticando o crescimento "pequeno". E agora eles criticam o crescimento excessivo!!

Esse é um ponto fraco para pegarmos no pé deles. O eleitor tem que saber disso.

Carlos

Artigo disponível emhttp://www.aloysiobiondi.com.br/

Carlos

Taí um exemplo de "birutice" – pra não dizer outra coisa – da oposição, que devemos levar ao conhecimento da população.
Num momento, menosprezam a taxa de crescimento, "exigindo" índices iguais aos da China…
Noutro, dizem que o crescimento deve ser reduzido sob pena de…

SÁVIO – do Ceará

O crescimento do Brasil a uma taxa de 06 ou 7%, pode ser prejudicial às pretensões Tucanas, melhor seria o desastre anunciado por Serra para este ano…

Rafael

Da para entender sim, é que psdb e esse bando nunca vão chegar a esse ritmo de crescimento mantendo os vínculos com fmi e a parte endinheirada do país.Por isso essa conversa fiada.

@faltorpan

É estranho, mas esta será mais uma eleição do menos rejeitado, não do mais apoiado. Você detesta o Serra e sua turma (Aleluia, irmãos, Aleluia!!!), então vota na anti-Serra. Você detesta a Dilma e a sua turma (os pesadelos do PIG!!!), então vota no anti-Dilma. Embora objetivamente inelutável, é uma tática bastante pobre. Melhor será se conseguirmos nesta eleição abordagens políticas mais afirmativas, positivas. O artigo acima resvala nessa possibilidade. Vale a pena que as lideranças mais lúcidas povoem o debate político com ideias mais consistentes, com argumentos em lugar de ofensas, alternativas operacionalizáveis em lugar de propagandas preconceituosas e difamantes. Mas que ingenuidade a minha!… Para um processo eleitoral assim, teria de ser possível manifestar a motivação, a referência ideológica, o custeio e o grupo de apoio por interesses entrecruzados que subjazem a todos os lados do processo. E isso é tão provável quanto um ex-sociopata…

    Edv

    Enquanto a mídia brasileira for 99% controlada por algumas "famiglias" que defendem interesses de 1%, o bom debate público de propostas para melhorar 99% do "resto" do Brasil e brasileiros contuará a tender à farsa, pois se alguém se propuser ao alto nível, será massacrado por:
    Abril, Veja e demais "trocentas" revistas
    Globo, e suas TV's, rádios, jornais e revistas afiliadas por todo o Brasil,
    Estado de SP
    Folha de SP
    Diário de SP
    Band, rádio e TV
    Cultura (TV do governo de SP)
    Portais de Internet desses grupos (G1, Uol, Ig, Terra, etc.)
    Agências de propaganda, que precisam visceralmente dessas mídias
    Col(o)nistas e blogueiros destas mídias
    Grana, muita grana!
    Há que se ficar perplexo com o sucesso e aprovação recorde do governo Lula, apesar deste "massacre" midiático!

Rios

Eu realmente não entendo o PSDB, FSP, Globo, Leitão, Serra e Cia… afinal não eram eles que bradavam aos quatro ventos que o Brasil devia se espelhar na China e crescer a 8, 9 ou 10% ao ano, e não ficarmos nos "míseros" 4,5%… e agora que poderemos chegar a 7% É UMA COISA RUIM!!! não´dá pra entender… ou melhor dá…

oanodalargartixa

The 2010 TIME 100

Luiz Inacio Lula da Silva – The 2010 TIME 100 – TIME:http://bit.ly/d810kL

Carlos

Luis Carlos Mendonça de Barros
.
Presidente do BNDES quando dos fatos relatados por Aloysio Biondi no artigo "Um estranho modo de governar", publicado na FSP de 06.02.1996.
Ministro do Planejamento (ao qual o BNDES era subordinado):José Serra.

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