A morte de Jayme Tiomno, um craque da física brasileira

Tempo de leitura: 2 min

Jayme Tiomno e o silêncio da mídia

Por Antônio Arapiraca*, no Fóton Blog, por sugestão da Emille Ishida, desde Tóquio

De Reims/França

Na madrugada do dia 12 de janeiro de 2011 o Brasil perdeu um dos mais importantes cientistas do mundo. O físico teórico Jayme Tiomno morreu, aos 90 anos, no Rio de Janeiro e mais uma vez não vimos sequer uma linha escrita sobre o fato nos grandes veículos de comunicação do país. Concordo que a contratação de um grande craque do futebol para um dos maiores times brasileiros possa ser a primeira página, afinal o futebol é uma paixão nacional. Uma tragédia como a da região serrana fluminense deve ocupar também as chamadas principais.

Porém, nem uma nota de rodapé noticiando a perda de um cientista da envergadura de Jayme Tiomno. Isso chega a ser uma indelicadeza, uma falta de respeito com a memória nacional.

O professor Tiomno foi um dos precursores no desenvolvimento da física no país e, juntamente com César Lattes, José Leite Lopes, Marcelo Damy, Mário Schemberg entre outros, ajudou na formação de uma sólida estrutura de pesquisa. Ele também participou da fundação de instituições como o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) no Rio de Janeiro. Pouco é divulgado, mas o Brasil conta com uma das mais sólidas escolas em física de partículas do mundo e grandes avanços na área foram protagonizados por pesquisadores brasileiros como Jayme Tiomno. O prestigiado físico norte-americano John Archibald Wheeler declarou certa vez, em 1998, sobre Tiomno: “Eu sempre penso que Tiomno foi um físico pouco reconhecido. Seu trabalho de 1947-1949 sobre captura e decaimento de muons foi pioneiro e mereceria o devido reconhecimento via premiação adequada”[1] .

Estaria Wheeler se referindo à Real Academia de Ciências da Suécia? Sim, em carta escrita  ao físico sueco Stig Gunnar Lundqvist, em 6 de fevereiro de 1987, Wheeler recomenda a inclusão de Tiomno na concessão da honraria daquele ano (o Prêmio Nobel de Física). O episódio está relatado em mais detalhes em artigo da Revista Brasileira de Ensino de Física publicado em 2003 pelos físicos José Maria Filardo Bassalo e Olival Freire Júnior, professores das Universidade Federal do Pará e da Universidade Federal da Bahia respectivamente. Neste artigo entitulado “Wheeler, Tiomno e a Física brasileira” os autores passam em revista as relações entre o físico brasileiro e o físico norte-americano, seus trabalhos em parceria e como o regime militar afetou o desenvolvimento desta ciência no país.

O reconhecimento de Wheeler não foi suficiente para o comitê do Nobel, mas o impacto dos trabalhos de Tiomno é amplamente reconhecido na literatura especializada da área. Todos os dias no mundo inteiro suas formulações são utilizadas, mesmo que no nosso país pouco se saiba sobre este e tantos outros cientistas.

Para mim foi tão espantoso a ausência de qualquer comentário acerca do assunto na grande mídia, que me debrucei teimosamente sobre algumas editorias de ciência. Nenhuma citação sobre a morte do cientista. Em lugar de uma pauta como essa, estampava na chamada principal da editoria de ciência de um “grande” jornal do país: “Cientistas criam frangos que não desenvolvem gripe aviária”. Chega a ser patético tamanho amadorismo, contra-senso e sensacionalismo. Acredito eu que o leitor, de qualquer que seja o nível, entenderia que cientistas modificam e não “criam” frangos. Com esse exemplo, talvez até Aldous Huxley, no universo ficcional do seu brilhante Admirável Mundo Novo, com seus ovos bokanovskizados, acharia mise-en-scène, factóide e deselegante a atual cobertura de ciência e tecnologia da mídia nacional.

*Antônio Arapiraca é físico, professor do CEFET/MG e editor do fóton Blog


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Comentários

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Flávia Vianna

Essa atitude da mídia em relação às ciências no Brasil não me surpreeende. Gerson citou a reação da imprensa na época da morte do Milton Santos. Lembro que houve uma atitude semelhante na época da morte do Paulo Freire, em 1997. Citação breve, nada mais. Isso mostra que nossa mídia é extremamente colonizada, dando pouca ou nenhuma importância à produção científica brasileira.

    Luís

    Coloca no mesmo balaio o Imre Simon.

Pitagoras

É o que dá a privatização corporativa da informação, direito humano e constitucional. Lembrando sempre que a concessão de canais de radio-difusão sempre foi para beneficiar aliados políticos, sendo que o saudoso presidente sarney (aquele dos 80% de inflação ao mês) foi o campeão de distribuição de mimos a seus correligionários, daí sua lastimável influência na política atual.

Henri Cappilori

Se ele fosse professor de uma universidade paulista, talvez a USP, certamente a mídia falaria. Mas não sendo, não há interesse… não duvidem do bairrisimo elitista da imprensa que temos.

    Luís

    Não por isso. A mídia ignorou completamente o Imre Simon.

Julio Silveira

Azenha parabenizo-o, por trazer sistematicamente nomes de grandes homens de nossa ciência para conhecimento publico. Infelizmente a sociedade brasileira, e ai refiro-me a todas as classes, são adestradas para apreciarem atividades mais físicas que intelectuais, trabalhar a habilidade física e pouca trabalho intelectual é garantia de suprimento de mão de obra, mas pouca concorrência ao poder. Em Roma funcionou bem por algum tempo o pão e circo tão exemplar, mantiveram preservadas as estruturas do império. Mas fico entristecido por perceber que uma morte dessas, assim como sua vida, tão pouco conhecida por seus conterrâneos, foi mais uma oportunidade perdida por muitos jovens, e outros nem tanto, (nessa me incluo), de ter tido um ídolo que fizesse diferença. Mas não culpo somente a mídia.

Julio Silveira

Na verdade, como bem temos visto, existe uma conjugação de forças as quais começamos a desmascarar. Nela percebemos que a mídia bem como seus parceiros políticos não se preocupa de fato com o nível de saber popular. Nem a do Lula, a quem referenciam sempre mais por preconceito e hipocrisia. Vejo claramente, na omissão do fato deste falecimento, mesmo vida deste grande cientista, é que eles estão imbuídos mesmo é em nos dar uma dimensão menor de nós mesmos. Manter-nos com baixa-estima, trabalhando para menosprezar nossas inteligências e lutando contra tudo aquilo que nos faz sentirmos a altura de qualquer grande povo e nação.

Rafael, BHte

Nossos físicos parece q não sabem vender bem o seu peixe

Digger

Infelizmente, não podemos esperar outra coisa dessa grande mídia colonizada.
A desconsideração com os nossos cientistas são revoltantes.

Gerson Carneiro

Esse comportamento da mídia é praxe.

Lembrei do passamento do geógrafo baiano Milton Santos, em 24 de junho de 2001, ocorrido na cidade de São Paulo. No mesmo dia faleceu alguém "importante" da Globo (que não me recordo quem). É claro, a mídia destacou o passamento do global, e nenhuma nota para Milton Santos.

Milton Santos, considerado um gênio da Geografia, destacou-se nos estudos de urbanização do Terceiro Mundo. Conhecidíssimo no Canadá, EUA, Africa do Sul, França, Alemanha, Suíça, Venezuela e etc. Lecionou inclusive em universidades nestes países, tendo inclusive sido Diretor de Pesquisas em Planejamento Urbano na Sorbonne.

O professor Milton Santos foi um dos grandes intelectuais brasileiros. E também foi esquecido pela mídia quando do seu passamento.

ma.rosa

a gde. midia, trata-nos, nos os leitores como se tudo ainda fosse o famoso jargao: "brasileiro e samba, futebol e chicote no lombo"!!!! carecemos de boas reportagens, e sem duvida a vida deste Caro Professor seria um bom exemplo de boa reportagem.

Evaristo

São colonizados, pois qualquer cientista estrangerio que morre, principalmente estadunidense, recebe todas as honrarias. Eles ainda enxergam o Brasil como um imenso cafezal, que nunca sai de suas cabeças medíocres.

Jordan Duailibe

Bom;devo alertar quanto a ideia de não ter tido nem rodapé…Ledo engano,saiu no Jornal do Brasil,e é um ótimo veículo de informação…Longe é claro;destes grandes holofotes chispantes, e suas malhas midiáticas enganadoras,midiotizando cristalinos à deriva pelas tvs…Concordo que deveria haver um clamor muito mais forte,um elemento mais à luz da urgência quando dizemos que o Brasil não tem memória,sim;o fisíco teórico Jayme deveria ter sido mais valorizado…Segue o link da matéria http://www.jb.com.br/ciencia-e-tecnologia/noticia

Oliveira

Estamos vivenciando uma grande INVERSÃO DE VALORES.

Silvio D P

Li a notícia da morte de Jayme Tiomno em algum lugar. De fato com destaque muito aquém do que ele mereceria. Faltou, contudo, no texto acima, a menção do fato que Tiomno foi cassado após o AI 5 como foram outros grandes intelectuais brasileiros (Mario Schenberg, Vilanova Artigas, Helio Lourenço, José Leite Lopes) desfalcando para sempre a inteligência brasileira (apesar de esses grandes seres humanos terem continuado sua atividade criativa alhures, as instituições que os perderam jamais se recuperaram dessa perda) .

ana lucia tcatch

Eu tenho e sinto um profundo respeito e admiraçaõ por pessoas como esse senhor,grande físico e que deixou um legado de conhecimento para a humanidade.Eu fico p. da vida quando a mídia da´´ espaço para esses jogadores de futebol analfabetos e que naõ conseguem formar uma frase inteligível,vide Ronaldinho gaúcho.O que esse cara fez pela humanidade?Tà,jogou uma bolinha,sim e daí?

fernandoeudonatelo

Assim como nossa grande mídia, não noticiou a construção do túnel hipersônico, para estudos Aeroespaciais no Brasil durante a gestão Lula.

Não noticiaram o corredor bi-oceânico para transporte hidroviário entre Brasil, Bolívia e Chile.

Não noticiaram a próxima fase do programa de satélites geoestacionários brasileiros.

Não noticiaram a Telebras como operadora soberana de um sistema de comunicações militares brasileiras.

ETC, ETC, ETC …..

    El Cid

    .. por isso é que não tenho "saco" para a "grande mídia" !!

Pedro Luiz Paredes

Em compensação, quando morre um maçom amigo dos Marinho, que ninguém conhece, eles esquecem de tirar a matéria da primeira página por 3 dias!!!(FDSP 1 ano atrás)

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