Paulo Nogueira Batista: Nas negociações com europeus, Brasil de Temer vai tomar outro 7 a 1

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Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Túnel no fim da luz

por Paulo Nogueira Batista Jr., no GGN

Nunca o partido de Joaquim Silvério dos Reis esteve tão presente e atuante em Brasília.

Nem no período FHC – e isso é dizer muito, leitor. O quadro é alarmante.

O que temos hoje é uma mistura rara – mesmo para os padrões do vira-latismo nacional – de subserviência, entreguismo e corrupção.

Os lances bisonhos se multiplicam vertiginosamente.

Faltam agora menos de seis meses para o fim do governo Temer. E estamos contando!

Em diversas frentes, ocorrem decisões e negociações problemáticas, que ameaçam interesses nacionais estratégicos.

Hoje vou escrever um pouco sobre uma delas: a negociação de um acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul. Mais uma rodada de negociações foi confirmada para Bruxelas entre os dias 9 e 13 julho.

No final de junho, em Colônia, por ocasião do Encontro Econômico Brasil-Alemanha, um representante do governo brasileiro fez um apelo enfático, tangenciando o patético, para que o acordo fosse concluído rapidamente.

Em seu discurso, proclamou que é hora de “pensar grande” e que a conclusão do acordo nunca esteve tão próxima.

Ora, quando uma das partes se mostra tão ansiosa em fechar negócio, já se sabe o que tende a acontecer.

Os europeus estão aguardando mais concessões do Mercosul.

Segundo se noticia, o padrão tem sido o seguinte: a cada rodada o Mercosul faz novas concessões, enquanto a União Europeia coloca pouco ou nada na mesa.

Já no início deste ano, o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, deu a seguinte declaração sintomática: “O Mercosul entregou tudo e custou caro para nós essa entrega. Sinceramente, não temos mais nada a entregar”.

Repare, leitor, na escolha das palavras…

Não se sabe exatamente o que está sendo negociado, pois os entendimentos vêm ocorrendo em sigilo, sem nenhuma transparência.

Mas pelos vazamentos e informações disponíveis, é muito provável que um acordo, se concluído pelo atual governo, venha a ser lesivo para o Brasil.

Não se deve perder de vista que esses acordos de “livre comércio” patrocinados pelos países desenvolvidos envolvem muito mais do que a liberalização do comércio de mercadorias.

Incluem temas como serviços, investimentos, patentes, marcas, propriedade intelectual, compras governamentais, regimes de licitação e até mecanismos para solução de controvérsias entre investidores e Estados.

Embora não se conheça com precisão o alcance do acordo em negociação com a União Europeia, as indicações são de que vários desses temas estão contemplados, com o potencial de criar entraves para a definição autônoma das políticas nacionais.

Por outro lado, os europeus – liderados, neste ponto, pelos franceses – não se dispõem a fazer ofertas expressivas no comércio agropecuário, que é área de interesse estratégico do Mercosul.

Querem conservar níveis elevados de proteção para seus produtores agrícolas. Livre comércio…

Com governos enfraquecidos no Brasil e na Argentina, qualquer acordo tende a sair muito desfavorável a nós – com reduções de tarifas industrias, concessões em áreas como serviços, propriedade intelectual, marcas, compras governamentais, mas sem a contrapartida de aumento significativo do acesso a mercados europeus de produtos agropecuários.

O problema transcende as relações com a União Europeia. Fechar um acordo desfavorável com os europeus levaria a que outros países desenvolvidos pleiteassem acordos semelhantes, o que reduziria progressivamente a autonomia e a margem de manobra das políticas públicas no Brasil.

Assim como na atabalhoada tentativa de aderir à OCDE, a postura do governo Temer é típica da mentalidade da elite tupiniquim.

Busca resultados simbólicos – acordos com países importantes como sinal de “prestígio” – em troca de concessões substantivas e até ruinosas.

É a reprodução atávica das relações entre os índios e os portugueses – os primeiros cediam suas terras e recebiam em troca espelhos, apitos e chocalhos.

No mencionado Encontro Econômico Brasil-Alemanha, em Colônia, os brasileiros descobriram, constrangidos, que os anfitriões estavam promovendo, como atividade beneficente, a venda de pedaços da rede usada no jogo em que a Alemanha venceu o Brasil por 7 a 1, na Copa de 2014.

Cada pedaço custava 71 euros.

O respeito foi para o espaço. A verdade é que o governo Temer já se desmoralizou completamente e não tem condições de negociar mais nada.

*Paulo Nogueira Batista Jr. é economista, foi vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento, estabelecido pelos BRICS em Xangai, e diretor executivo no FMI pelo Brasil e mais dez países

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