Marcelo Zero: A paz será aquecida no gélido Alaska?

Tempo de leitura: 3 min
O Alasca, onde ocorre a reunião entre Trump e Putin nesta sexta-feira, 15, foi vendido pela Rússia aos Estados Unidos no século 19 durante o Império Russo

A paz será aquecida no gélido Alaska?

Por Marcelo Zero*

Em condições normais de temperatura e pressão, fora da ordem hobbesiana criada pelo inacreditável Trump, uma reunião entre dois grandes líderes mundiais, convocada por antecipação para debater o fim de um conflito, resultaria, na maior parte das vezes, em um anúncio concreto de um cessar-fogo, de um armistício ou mesmo de um acordo amplo de paz.

Na realidade, quando uma reunião dessas era anunciada, tudo já estava pré-negociado. A reunião de cúpula era apenas para referendar e anunciar cláusulas e condições previamente acertadas.

Não obstante, com Trump, o laranjal de obtusidades, nada é previsível.

Tudo pode acontecer. Inclusive nada.

Mas há alguns parâmetros incontornáveis que devem ser observados.

1) Militarmente, a Ucrânia já foi derrotada

A Ucrânia tem, em primeiro lugar, um problema demográfico, de falta de homens, para formar tropas. Esse país já perdeu cerca de 600 mil homens, entre mortos e feridos graves, nesse conflito e, hoje, enfrenta dificuldades para repô-los.

A Ucrânia tem apenas 39 milhões de habitantes e sua população já é consideravelmente envelhecida, com uma idade média de 42 anos. Não há muitos jovens.

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Crescem também a recusa e a fuga do serviço militar.

Nas frentes de batalha, cada vez mais extensas, há áreas em que as forças ucranianas estão muito rarefeitas, o que vem facilitando o avanço lento porém constante das forças russas. Há vários bolsões de forças ucranianas que estão prestes a colapsar no Donbas.

Não bastasse, a Ucrânia tem inferioridade em artilharia e praticamente não tem mais força aérea. Faltam equipamentos básicos que não são repostos.

Sem querer desmerecer a coragem dos ucranianos, continuar a guerra parece algo inútil, que provocará sacrifícios desnecessários.

2) A Rússia não aceitará a paz, ou um início de processo de paz, que não contemple:

O domínio territorial sobre a Criméia e, pelo menos, sobre os dois oblasts do Donbas e os territórios conquistados em Zaporizhzhia e Kherson.

A neutralidade do território ucraniano e a renúncia à expansão da Otan até esse país, algo que estava previsto desde a década de 1990 pelo influente neocon Zbigniew Brzezinski.

Obviamente, Zelensky e a Otan se oporão a essas condições. A Europa, em particular, está obcecada com a ideia paranoica de que uma “vitória” da Rússia resultará, necessariamente, na expansão do novo “Império Russo” para o resto do continente.

Algo ridículo, pois a Rússia não tem intenções e condições de se expandir para a Europa. Isso é a simples ressureição da obtusa “teoria do dominó”, com a qual os EUA justificavam sua criminosa intervenção no Vietnã. Se o Vietnã cair, diziam, o comunismo se espalhará por toda a Ásia.

A estratégia russa nesse conflito com os EUA e a Otan sempre foi defensiva.

Curiosamente, ninguém se lembra que, antes do início desta guerra, a população russa do Donbas era constantemente bombardeada por Kiev, o que resultou em cerca de 14 mil mortos.

Assim sendo, não se deve esperar muita coisa desse encontro no Alaska, no que concerne à paz ou mesmo a um modesto e transitório cessar-fogo.

Talvez, de forma bilateral, Putin e Trump negociem alguma coisa no campo econômico (minérios críticos, quem sabe) e no que tange à contenção de armas nucleares.

Sobrarão fotos, mas creio que faltarão fatos que aqueçam os desejos pacifistas do mundo.

Por culpa essencialmente da Otan, é provável que muitos mais morram e é certo que o planeta continuará perigosamente ao borde de um conflito potencialmente mundial e nuclear.

O ar do Alaska é gélido.

*Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais.

Este artigo não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

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Marco Paulo Valeriano de Brito

A INVESTIDA DIPLOMÁTICA DO FASCISMO ESTADUNIDENSE PARA COOPTAR A RÚSSIA

Estadunidenses não são confiáveis, nenhum, nem mesmo os democratas que a centro-esquerda revisionista-reformista brasileira adula.
Donald Trump é um fascista e o que ele quer é cooptar o Putin e trazer a Rússia para o lado do capital ocidental, cuja moeda de troca é abandonar o BRICS+.
Não sejamos ingênuos!
Resta sabermos se o Putin aceitará essa jogada trumpista e em troca de um pedaço do território ucraniano nos trairá; o Brasil, a Índia, a China e a África do Sul, que são as nações fundadoras do Bloco BRICS.
Por enquanto, a nossa grande aliada é a China, e vamos assistir os EUA partirem com tudo contra os chineses, sobretudo, se a Rússia passar para o lado do Capital Norte Ocidental do eixo estadunidense-britânico.
A Índia é outra incógnita, pelo histórico de conflitos geoestratégicos, políticos e econômicos, com a China.
A União Europeia só aceitará a derrota da Ucrânia, e o domínio russo sobre a Eurásia, se os EUA permitirem uma nova aliança europeia-estadunidense de reconquista geopolítica do Sul Global e do Oriente, no que seria a retomada da América Latina e Caribe, como quintal de influência dos EUA, e o sul e sudeste asiático, incluindo o oriente médio, repartilhado entre a Europa e os EUA.
Esse é o Plano do Fascismo Capitalista Norte Ocidental e a guerra híbrida travada desde 2013 tem o objetivo central de não permitir o multilateralismo e a perda da influência europeia e dos EUA sobre o mundo.
O Brasil será recolonizado, se a China perder essa guerra híbrida do século XXI.

Marco Paulo Valeriano de Brito
Enfermeiro-Sanitarista, Professor e Gestor Público

REFERÊNCIA:

https://www.brasil247.com/mundo/putin-e-trump-reescrevem-as-regras-da-geopolitica-em-encontro-historico-no-alasca

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