Juliana Cardoso: Só se revoltar com a esterilização à força sofrida por Janaína não basta

Tempo de leitura: 3 min
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Por Juliana Cardoso

Reprodução You Tube

O  promotor Frederico Liserre Barruffini e o  juiz Djalma Moreira Gomes Júnior determinaram a laqueadura à força de Janaína  Aparecida Aquino Fotos: Reprodução You Tube

QUEM LEGISLA SOBRE NOSSOS CORPOS?

por Juliana Cardoso*

Indignação. Não há outra palavra que descreva o sentimento diante da notícia de que uma mulher foi esterilizada sem seu consentimento.

Janaína Aparecida Aquino, mulher preta e pobre da cidade de Mococa, interior de São Paulo, foi conduzida a sala de cirurgia de forma coercitiva para ser esterilizada!

Janaína foi mutilada pelo Estado brasileiro a mando de um juiz  e um promotor. A justificativa para tanto é que Janaína é usuária de drogas, é pobre, moradora de rua e já tem outros filhos.

O argumento é tão assustadoramente eugenista que em nada fica a dever à posição de Jair Bolsonaro, cujo plano de governo traz o controle de natalidade dos pobres como uma ação de combate à pobreza e a criminalidade.

Para essa gente, a pobreza se combate exterminando pobre.

Daí tantas pessoas  acreditarem na pena de morte, na redução da maioridade penal ou na legalização do porte de arma como forma de resolver o problema da criminalidade.

O caso também é emblemático da hipocrisia que assola o país quando se trata de saúde sexual e reprodutiva das mulheres.

Se uma mulher deseja realizar um aborto, seja lá por qual motivo for, ela não pode, já que o aborto é crime no Brasil.

Ainda assim calcula-se que são realizados cerca de 850 mil abortos clandestinos por ano.

As complicações decorrentes de abortos malsucedidos são a quarta causa de morte materna, no Brasil. A cada 2 dias, uma mulher morre em decorrência de abortos malfeitos. Em alguns estados chega a ser a primeira.

E sabe quem são as mulheres que morrem no Brasil? As pobres, as pretas, as periféricas, porque no Brasil, as ricas podem pagar e realizar o procedimento com segurança.

Vira e mexe, no Congresso, algum homem inventa uma lei para legislar sobre nossos corpos.

Ano passado, tivemos que enfrentar a PEC do cavalo de troia. Na prática, impediria o aborto quando a gravidez decorre de estupro,  é fator de risco de morte para a mulher ou o feto é anencéfalo.

O que o caso da Janaína revela é que nosso corpo e nossa sexualidade ainda não nos pertencem.

O Estado, por meio de seus poderes e instituições, tem poder sobre nosso corpo.

Ora somos obrigadas a parir, ora alguém nos diz  “basta de filhos”.

E sempre tem alguém para dizer  qual o melhor jeito de você parir.

E, no Brasil, o caso sempre é para cesárea, não é mesmo?

O nosso corpo é facilmente controlado pelo Estado, pelo mercado e pelos homens. Só nós não podemos viver de forma autônoma nossa sexualidade e a maternidade.

Se é errado o Estado ter realizado laqueadura numa mulher alegando a sua vulnerabilidade social como razão, é igualmente execrável o Estado condenar as mulheres negras e pobres do Brasil a serem as maiores vítimas da criminalização do aborto.

Não podemos falar da violência a que Janaína foi submetida sem falar da criminalização das mulheres que fazem aborto no Brasil. São faces do mesmo fenômeno.

Só se revoltar com a mutilação sofrida por Janaína não basta.

Temos que encará-la como questão de saúde pública.

Precisamos enfrentar o debate.

Mesmo contrariando nossas convicções íntimas, precisamos ter como diretriz a laicidade do Estado. E como tal, ele tem o dever de garantir a igualdade entre nós.

Caso contrário, nós, mulheres, ficaremos à mercê do Só se revoltar com a mutilação sofrida por Janaína não basta..

*Juliana Cardoso é vereadora (PT-SP).

Leia também:

Wadih protocola ação contra promotor e juiz do caso Janaína

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Juliana Cardoso

Deputada Federal (PT) eleita para o mandato 2023/2026.


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Comentários

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Juliana Mendes

A postagem denota certo posicionamento com informações tendenciosas. Isso perde o respeito de nós mulheres julgarmos friamente a situação a qual Janaína em diversas provas dos autos se propôs e posteriormente se arrependeu alegando esquecimento do consentimento colhido por assinatura, prova oral e testemunhas. E nenhum momento foi dito que o motivo solicitado para tal procedimento era que ela era “pobre e preta” como informa.

Seria importante saber separar os posicionamentos usando informações que não condizem ou sejam tendenciosas de maneira errada!

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