Ignacio Delgado: Como desfazer a mitologia bolsonariana de um faroeste tupiniquim

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NORMAL E PATOLÓGICO. CIVILIDADE POLÍTICA, ECONOMIA, CORRUPÇÃO E SEGURANÇA PÚBLICA

por Ignacio Godinho Delgado*

Não há como comparar as eleições de 2018 com nenhuma outra, desde 1989.

O PT resistiu como a mais importante identidade partidária fincada no seio do povo, e o antipetismo tornou-se o núcleo do discurso fascista.

Até então, o antipetismo era apenas um elemento de uma configuração partidária e política que tornava o PSDB o polo alternativo ao PT. Tudo muito normal e civilizado.

Parte importante dos eleitores de classe média que votou em Aécio em 2014, porque antipetistas, não se identificou com o discurso tosco e autoritário de Bolsonaro.

O golpe criou o monstro, destroçando uma polaridade, sempre desafiada aqui e ali, mas que conferia racionalidade ao sistema político brasileiro.

Parte de tais eleitores já não está com Bolsonaro. Outros podem deixá-lo.

Por sua vez, o crescimento de Bolsonaro entre os eleitores lulistas decorre, fundamentalmente, da proeminência que ganhou a questão da segurança pública para a vida das pessoas e da insatisfação com a política, motivada pela onipresença do tema da corrupção no debate brasileiro.

Colocado como centro de um discurso que procura aniquilar o adversário, sem buscar a raízes e o remédio institucional para sua correção, tal discurso liberou os instintos mais primitivos e as pulsões autoritárias e conservadoras da alma brasileira, contidas pela operação de um jogo político cheio de problemas, mas que funcionava.

Seu produto é esta horda fascista que hoje promove os achaques diários aos “inimigos do povo”, conforme os vêm as “pessoas de bem”, esnobemente ignorantes.

Por isso, é preciso trazer, de fato, como assinalou Haddad, os temas econômicos para o centro do debate, de modo a mitigar a peroração vazia e moralista, que não permite ao país vislumbrar um projeto de futuro.

É crucial mostrar que Bolsonaro subscreveu todas as ações antipopulares e antinacionais do governo Temer, enfatizando que seu projeto significa o aprofundamento desta política.

Ademais, isso permitirá esclarecer como a instabilidade política proporcionada pela ruptura com as regras do jogo, desde a contestação à eleição de Dilma em 2014, jogou o país no abismo, mesmo admitindo equívocos de condução de seu governo.

Mas quem não os comete? Eleições servem para corrigir erros.

Aécio hoje, possivelmente, estaria disputando de forma competitiva as eleições presidenciais, se não tivesse se movido pelo ressentimento pueril, impatriótico e antidemocrático com a derrota que sofreu em 2014. Se fosse assim, provavelmente, não teríamos diante de nós o fantasma do fascismo.

Por fim, há que se enfrentar com firmeza os temas da corrupção e da segurança pública.

O primeiro tem sua origem, na história republicana, nas formas de financiamento das campanhas eleitorais no país.

O PT não fez nada diferente do que fazem os outros partidos e tomou medidas para enfrentar a corrupção que acabaram por atingi-lo.

Foi vítima, é certo, da ação desimpedida, partidária e salvacionista de corporações que acabaram contaminadas pelo espírito fascista que germinou na cena brasileira desde 2013, com a demonização do PT e, à frente, de toda a atividade política.

Mas nenhum mal faria admitir que cometeu erros e tem buscado corrigi-los. É uma purgação que permitiria desanuviar os espíritos e amainar o antipetismo.

No tema da segurança pública, a esquerda precisa dissociar-se da tentação sociológica de fazer campanha apontando apenas as condições sociais geradoras da ampliação da violência.

Além das medidas de política econômica, social e educativa para combater as raízes da violência, é preciso ter forças policiais preparadas, bem pagas e um sistema de segurança inteligente e eficaz.

Se conseguir demonstrar isso, a mitologia bolsonariana de um faroeste tropical pode se desfazer e o povo afastar-se das tentações bárbaras que o impulsionam contra os direitos humanos e em direção o fascismo.

Temos 18 dias  pela frente. É possível.

*Ignacio Godinho Delgado é professor titular aposentado da Universidade Federal de Juiz de Fora.

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Hudson

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#BolsoÉTemer

“É crucial mostrar que Bolsonaro subscreveu todas as ações antipopulares e antinacionais do governo Temer, enfatizando que seu projeto significa o aprofundamento desta política.”

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