Eugênio Aragão: Comportamento de Toffoli ao bajular Bolsonaro é indecente

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Marcos Corrêa/PR

Não é justo, não é decente e não é leal à Constituição!

“Entristeço-me com o pouco caso que se faz com o heroico apoio de forças democráticas ao STF, quando seu presidente pactua sorridentemente com aqueles que querem seu ocaso”

por Eugênio Aragão *, no Congresso em Foco

O atual governo é chefiado por um cidadão que ganhou as eleições presidenciais na base da mentira, da agressão e da recusa de debater. Seus correligionários promoveram, ao longo de sua campanha, ataques virulentos ao Tribunal Superior Eleitoral, sua presidente e seus ministros. Colocaram sob suspeita a imparcialidade da Corte e sua capacidade de organizar um pleito sem fraudes.

Depois, empossado Jair Bolsonaro, meteram-se – inclusive a líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann – a pedir o fechamento do STF, a exigir o impedimento de seu presidente e, dentre outros, do ministro Gilmar Mendes. Acusaram-nos de corrupção, sem qualquer prova robusta e vilipendiaram a reputação do judiciário.

As forças democráticas do país reagiram de pronto na defesa das instituições. Juristas, esforçados em preservar a Constituição e o Estado Democrático de Direito, subscreveram documento de apoio à Corte Suprema e o entregaram solenemente a seu presidente, demonstrando repúdio aos ataques covardes dos que, circulando em torno do chefe do governo, queriam a destituição de seus magistrados.

Vemos com surpresa, agora, o mesmo presidente do STF, que foi atacado, aceitando “pactuar” com o cidadão eleito pelo engodo, comprometendo-se com a pauta mui controversa de seu governo.

E ainda chamam isso de “Pacto Republicano”, quando o eleito não tem pejo de dizer que se sente feliz ao ver a Corte estar “de seu lado” e posa a fazer “coraçãozinho” com as mãos, juntamente com a mesma Joice Hasselmann que queria o fechamento do Supremo, ao lado… pasmem…! sim, do presidente do STF, tão arduamente defendido pelos juristas democratas!

O “elogio” do chefe de governo, a atribuir descaradamente parcialidade ao tribunal mais alto do país, não sofreu qualquer nota de crítica ou de desmentido por sua assessoria de comunicação social.

Pelo contrário: no dia seguinte, a imprensa divulga amplamente a fotografia com um presidente do STF risonho em tal deplorável companhia. E, para não deixar dúvida de que a conversa com o presidente do país foi muito produtiva, anuncia-se a retirada de pauta da discussão, em controle concentrado de constitucionalidade, da descriminalização do uso de cannabis sativa – maconha – exigida por parte da sociedade e combatida pelo governo atual, em sua agenda conservadora e moralista.

Encerrada a peça de teatro de mau gosto, noticia-se, mais, que Jair Bolsonaro recebe visita do Corregedor Nacional de Justiça na companhia de seu filho investigado na justiça do Rio de Janeiro, senador Flávio Bolsonaro. Por certo, não para trocarem receitas de bolo ou para conversarem sobre como anda o tempo em Brasília.

Essas atitudes tornam inevitável, também, lembrar de episódio protagonizado pela ex-presidente do STF, em que, ao charlar com empresários num almoço, avisara que não pautaria as ações de controle concentrado sobre a extensão da presunção constitucional de inocência, porque o ex-presidente Lula “não deveria receber tratamento diferenciado”.

A declaração assume renovado significado quando o juiz que o condenou sem provas, apenas por convicções, se torna ministro da Justiça do governo do presidente que ficou feliz de ver a Corte Suprema “de seu lado”, ao mesmo tempo em que o relator de habeas corpus impetrado em favor de Lula no mesmo tribunal não vê razões para declarar a suspeição do juiz governista, mesmo diante de tanta evidência de parcialidade.

Lembremos que o ex-presidente Lula, prospectivamente vencedor das eleições presidenciais de acordo com todas as pesquisas de voto, foi impedido delas participar pelo TSE, única causa que permitiu Jair Bolsonaro ser vitorioso e nomear ministro de estado, o juiz que condenou seu adversário, para excluí-lo do pleito.

O que pensar desse imbroglio todo? Será que os protagonistas judiciais não percebem o quanto de sua credibilidade está em jogo com suas encenações públicas? Não seria mais aconselhável, nos tempos tão conturbados que experimentamos, com tanta hostilidade à Constituição Cidadã de 1988, atitude mais discreta, mais soberana dos magistrados?

Confesso-me, como jurista, como professor de direito, como membro aposentado do Ministério Público e, hoje, como advogado, perplexo com o papel a que pessoas que nos devem conduta ilibada se prestam. Entristeço-me com o pouco caso que se faz com o heroico apoio de forças democráticas ao STF, quando seu presidente pactua sorridentemente com aqueles que querem seu ocaso.

Esses tempos de pós-verdade são estranhos demais para alguém como eu, que tem orgulho de ter valores claros como a justiça, a lealdade, a decência e a fidelidade à Constituição e ao Estado Democrático de Direito que esta fundamenta.

É curioso que Lula, hoje preso (sim, hoje preso, Sr. Ciro Gomes, injustamente preso – e não me chame de “babaca” por isso), quando presidente da República, nunca foi personagem desse tipo de tentativa (bem sucedida?) de cooptação do Poder Judiciário; cooptação, esta, que promove um verdadeiro “golden shower” sobre a Constituição brasileira.

Tratou as instituições com o respeito, com o decoro que lhes é devido, zeloso por submeter-se à sua independência e por preservar a harmonia entre os poderes.

O que consola é estar do lado certo da história.

Nós democratas, ainda acreditamos no Brasil e na sua resiliência para superar tantos cruéis desafios.

Louvamo-nos na carta do Santo Padre que, reconhecendo a profunda injustiça que se promove contra um condenado sem provas, encoraja Lula – e a todos nós – a resistir.

Resistir com a Lei do nosso lado. Resistir com a esperança que não esmorece.

Resistir com a certeza de que lutar é preciso para garantir a nossos filhos e netos um país melhor, mais livre, mais democrático, mais tolerante, mais plural e, sobretudo, mais consciente de seu papel histórico e de seu lugar no mundo.

Não há “papelão” de magistrados que nos fará perder a fé nessa luta. E, como acreditamos no ser humano, acreditamos, também, que magistrados, que todos respeitamos e defendemos no seu papel constitucional, saberão por a mão na consciência e mudar de atitude. Para o bem do Brasil e de todas e todos nós!

* Eugênio Aragão é subprocurador geral da República aposentado, professor de Direito da Universidade de Brasília (UnB). Foi ministro da Justiça e integra a equipe do escritório Aragão e Ferraro Advogados.


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lulipe

O choro é livre, lula não. #mito2022

Zé Maria

A Redundante Grande Mentira do (des)Governo de Jair Bolsonaro

Por Janio de Freitas, na FSP, via Conversa Afiada: https://t.co/3NSID58U6D

A aquietação silenciosa em que a trupe mergulhou, por toda a semana, obedeceu à reação, demorada mas enérgica, dos ministros militares à tolerância explícita de Jair Bolsonaro aos insultos de Olavo de Carvalho ao general Villas Bôas.

O “basta”, calado diante de ataques a outros generais, como Santos Cruz, e mesmo aos militares em geral, representa a primeira dissensão verdadeira, apesar das várias noticiadas, entre os generais reformados do governo e Bolsonaro.

O ataque ao ex-comandante do Exército foi agravado por dirigir-se também ao estado físico do general, condicionado à cadeira de rodas e ao auxílio respiratório.
Pior do que indiferente, a atitude de Bolsonaro desconsiderou a contribuição de Villas Bôas à sua eleição, como patrocinador da candidatura nas Forças Armadas e entre os conservadores civis.

Não podendo ser um dos limitados à comunicação privada, Bolsonaro refluiu as suas provocações e a falta de senso, também como efeito das cobranças e conversas afinal mais responsáveis no Planalto.

Passou a semana buscando eventos em que se mostrasse simpático, quis entrevistas, culminando com o espetáculo do enlace a que atraiu dois incautos.
Dias Toffoli e Rodrigo Maia capitularam a papéis deploráveis.

O primeiro não tem como comprometer por sua conta, em pactos ou no que seja, os demais magistrados do Supremo Tribunal Federal.
Até os desvalorizou no tal pacto político com Bolsonaro em nome do tribunal.
O outro, sonhando sempre com a Presidência, pensou subjugar às pretensões do Executivo a independência do Legislativo ditada pela Constituição.
Ambos demonstraram mais presunção pessoal do que noção dos limites de suas funções.

O silêncio da trupe e a contenção de Bolsonaro falsificaram a índole do governo. Só Abraham Weintraub, da Educação (sic), com seu desempenho tanto pior que o de Ricardo Vélez quanto, por isso, melhor para o saldo de democracia ainda existente.

A construção ou, no nosso caso, a salvação do regime medianamente democrático precisa de quem o defenda.
À falta de oposição organizada e incisiva, estudantes coadjuvados por professores entregam-se com altivez a esse papel.
Weintraub é quem os incita.

Flagrante significativo: os meios de comunicação clamam sem cessar por melhor sistema de ensino, sua única ou maior bandeira de benefício com amplitude absoluta —e recorrem a métodos conhecidos para depreciar as manifestações contra o corte de 30% dos recursos do ensino superior público.
É o famoso tiro no pé.
Há informações sobre esforços de organização para manifestações várias, já em junho, de outros segmentos prejudicados.

É o esperável de um país que degringola.
Ao se completar apenas o quinto mês de governo, os 3% de crescimento neste ano, previstos antes da posse pelo novo ministro da Economia, já estão reduzidos à faixa do zero vírgula.
Afinal divulgados, os resultados econômicos do primeiro trimestre foram desastrosos.
Os do atual não prometem coisa melhor.

A figuração das mudanças na Previdência como chave para uma grande virada é engodo.
E seus propagadores sabem que aí não há milagre algum.

Estamos vivendo dentro de uma grande mentira.
Não há sinal de que os militares do governo se inquietem além das bagunças da trupe bolsonara.

Mas os bolsonaristas do poder econômico (sim, é redundância) começam a assustar-se, ainda mais com as perspectivas do que com a má atualidade.
Por ora, pacificam-se na sua catedral, a Bolsa.
Não falta muito, porém, para que se sintam premidos a liberar as palavras ainda retidas em ambientes restritos, como fizeram em ocasiões passadas.
Sem que isso permita, necessariamente, vislumbrar uma saída saudável de dentro da grande mentira.

https://twitter.com/ConversaAfiada/status/1135174521802113024
https://www.conversaafiada.com.br/politica/janio-e-tudo-uma-grande-mentira

Sandra

A #GreveGeral deve ser ampla e irrestrita. Não é só a Educação e a Reforma da Previdência que nos indigna. Criminosos estão no poder

https://twitter.com/Haddad13Brasil/status/1135234651822403589

Paulo

Em que pese a admiração que tenho não apenas pelas palavras, mas também ações do sr. Eugenio Aragão, que muito provavelmente teriam salvado a democracia no Brasil apesar da inconsequente, incompetente, imbecil – imbecil sim pois fez de tudo para implodir o Brasil – e honesta sra. Dilma Roussef, tivesse esta tido a sabedoria minimamente desejável ao escolher seus assessores, defender uma instituição composta de ladravares não me parece uma resposta que o Brasil necessite.
Com esse pendor democratico respeitando e acolhendo ladrões, sr. Eugenio, vamos aguardar mais 500 anos

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