Bolsonaro demite três generais do governo em três dias; o último, criticou privatização dos Correios

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Fotos: Marcelo Camargo/Agência Brasil, Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil e Ascom Assembleia Legislativa do Amazonas

Bolsonaro demite terceiro militar em uma semana

Após afastar Santos Cruz (Secretaria de Governo) e Franklimberg de Freitas (Funai), presidente exonera Juarez Cunha, dos Correios, por criticar privatização da estatal

Renata Agostini, O Estado de S.Paulo

BRASÍLIA – O presidente Jair Bolsonaro anunciou nesta sexta-feira, 14, a demissão do terceiro general de seu governo em três dias. Após serem afastados Carlos Alberto dos Santos Cruz da Secretaria de Governo e Franklimberg Freitas da presidência da Funai, ele decidiu exonerar do comando dos Correios o general Juarez de Paula Cunha.

Segundo o presidente, Cunha “foi ao Congresso e agiu como sindicalista” ao criticar a privatização da estatal e tirar fotos com parlamentares da oposição. “Aí complica”, disse Bolsonaro em café da manhã com jornalistas no Palácio do Planalto. O Estado participou da entrevista.

O general assumiu a presidência dos Correios ainda no governo de Michel Temer. Ele chegou ao posto por indicação de Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD.

Bolsonaro decidiu mantê-lo no cargo, mas Cunha era, na verdade, mais ligado ao vice-presidente, o general Hamilton Mourão.

O chefe dos Correios foi à Câmara na semana passada para uma audiência na Comissão de Participação Legislativa e adotou um discurso contrário à ideia do governo Bolsonaro de privatizar a estatal.

Em sua fala, disse que se trata de uma empresa “estratégica” e “autossustentável” e que os economistas não têm condições de calcular o “custo social” dos serviços por ela prestados.

“Eu não queria falar de privatização, até porque não é problema meu, mas tenho de dizer: se privatizarem uma parte dos Correios, que acredito que será do lado bom (que dá lucro), o que tirar daqui vai faltar lá (nos demais municípios), vai faltar do outro lado”, disse Cunha durante a audiência.

Parte do recado foi publicada pela conta oficial dos Correios no Twitter e compartilhada pelo ministro. Dois dias depois, o próprio presidente foi à rede social defender a venda da estatal.

“Serviços melhores e mais baratos só podem existir com menos Estado e mais concorrência, via iniciativa privada. Entre as estatais, a privatização dos Correios ganha força em nosso governo”, publicou.

Segundo um integrante do governo, já havia descontentamento com a postura de Cunha.

Causava desconforto, por exemplo, o fato de o presidente dos Correios evitar se reportar ao seu chefe, o ministro de Ciência e Tecnologia.

Isso acontecia, segundo essa fonte, porque Cunha é general do Exército, enquanto o astronauta Marcos Pontes, que comanda a pasta, é tenente-coronel da Aeronáutica – que seria o equivalente a uma patente inferior a sua.

Cunha não esperava a demissão

Ela foi anunciada pelo presidente já no final do encontro com os jornalistas quando as perguntas já haviam sido encerradas. O presidente havia tirado uma foto e decidiu conversar mais um pouco. Sem ser questionado diretamente sobre o assunto, falou da decisão.

Cunha tinha, por exemplo, uma audiência marcada para a semana que vem no Senado para debater justamente a privatização dos Correios.

Sucessor. Não está definido ainda quem será o próximo chefe da estatal. Bolsonaro disse que chegou a oferecer o posto ao general Santos Cruz, mas que ainda não há definição.

Segundo o presidente, o ex-ministro da Secretaria de Governo é “excepcional” e, por isso, gostaria que ele permanecesse no governo em outro posto.

Ele disse ainda que a saída de Santos Cruz, a quem conhece desde a década de 1980 e se refere como amigo, foi uma “separação amigável”.

“Não adianta querer esconder, problemas acontecem. Mas ele continua no meu coração”, afirmou.

O general foi avisado de sua demissão na quinta-feira em conversa com Bolsonaro no Planalto.

Apesar de ter sido substituído por outro militar, o general Luiz Eduardo Ramos, seu afastamento foi resultado de pressão da chamada ala ideológica do governo.

O grupo já havia conseguido demitir um civil, Gustavo Bebianno, que foi o primeiro ministro a cair. Bolsonaro destacou a experiência de Ramos como assessor parlamentar e disse que, por isso, ele vai “ajudar muito” na articulação política.

No encontro com jornalistas, o presidente foi questionado sobre a razão de aliados que o acompanharam na campanha estarem fora do governo.

Foram citados os nomes do ex-senador Magno Malta, que não chegou a ser nomeado para cargos, de Bebianno e de Leticia Catelani, que ocupava cargo na Apex, agência de promoção das exportações do País e foi demitida.

O presidente disse que a todos foram dadas oportunidades. Segundo ele, sua admiração por Malta continua. Mas Bebianno é “página virada” e Letícia tinha “autoridade exagerada”.

“Cada um no seu quadrado”, disse o presidente. “Não posso sacrificar o governo.”

Procurados, Correios e Cunha não comentaram. O Ministério de Ciência e Tecnologia disse que a exoneração de Cunha será feita na semana que vem. / COLABOROU DANIEL WETERMAN

Fotomontagem Fórum

Divergência sobre financiamento a blogs definiu demissão de Santos Cruz

 Janaína Figueiredo, em O Globo

RIO — A metáfora usada pelo governo para explicar a saída do ex-ministroda Secretaria de Governo da Presidência general reformado Carlos Alberto dos Santos Cruz foi a de um casamento que não deu certo e terminou em divórcio sem litígio.

Segundo fontes que acompanharam de perto a crise final, um dos elementos-chave que levaram ao divórcio entre Bolsonaro e Santos Cruz foi o controle da comunicação governamental e a relação do governo com blogs e sites alinhados abertamente com o Palácio do Planalto .

A queda de braço decisiva para que o presidente terminasse optando pelo afastamento do general foi, de acordo com as mesmas fontes, com o chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), Fabio Wajngarten, homem de confiança de Carlos Bolsonaro, filho do presidente e vereador no Rio.

As fontes confirmaram que Santos Cruz representava um obstáculo para vários projetos de Wajngarten, entre eles o de intensificar o financiamento de blogs e sites que defendem o governo.

— Fábio quer promover esses blogueiros e sites, distribuir recursos, e Santos Cruz era contra. O embate ficou forte e somou-se a outras discordâncias. A convivência estava muito difícil — comentou uma das fontes consultadas.

O general Franklimberg Ribeiro, presidente da Funai demitido, diz  Nabhan Garcia, secretário Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, “saliva ódio aos indígenas”. Garcia é presidente da UDR (União Democrática Ruralista). Fotos: Ascom da Assembleia Legislativa do Amazonas, e Tânia Rego/Agência Brasil

General cai da presidência da Funai após pressão de ruralistas

Franklimberg Ribeiro de Freitas deixa cargo e diz que secretário de pasta de Bolsonaro ‘saliva ódio aos indígenas’

Rubens Valente, Brasília, na Folha de S. Paulo

O presidente da Funai, o general do Exército da reserva Franklimberg Ribeiro de Freitas, anunciou nesta terça (11), em Brasília, sua saída do cargo.

Ele disse a servidores, reunidos no auditório do órgão, que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) está sendo mal assessorado na questão indígena.

Apontou a influência negativa do ruralista e secretário especial de Assuntos Fundiários do Ministério da Agricultura, Nabhan Garcia, que, segundo o presidente da Funai, “saliva ódio aos indígenas”.

“Quem assessora o senhor presidente não tem conhecimento de como funciona o arcabouço jurídico que envolve a Fundação Nacional do Índio. O presidente está muito mal assessorado a respeito da condução da política indigenista no país. E quem assessora o senhor presidente da República é o senhor Nabhan. Que, quando fala sobre indígena, saliva ódio aos indígenas”, disse Franklimberg os servidores.

O general afirmou ainda que Nabhan, a quem chamou de “esse cidadão”, “queria acabar” com o DPT (Departamento de Proteção Territorial da Funai, setor responsável pela proteção, identificação e demarcação de terras indígenas, entre outras atividades).

Ele também disse que a Funai é vista “como óbice ao desenvolvimento nacional” por integrantes do governo no tema do licenciamento ambiental necessário para grandes empreendimentos.

O general defendeu a revisão do arcabouço jurídico que conduz a política indigenista a fim de eliminar “contradições” entre leis e regramentos, “e não penalizar a Funai por esse passivo”.

Franklimberg admitiu ainda que o orçamento da Funai “é muito pequeno para o atendimento das demandas dos indígenas” e que há um déficit de pessoal.

“A coisa [atendimento] não chega até o indígena. O que mais o presidente da Funai passa tempo aqui é defendendo a instituição de ataque de B, de interesse de B e de interesse de C […] Ataques que diuturnamente estamos recebendo”, desabafou o militar.

Ele disse aos servidores que sua exoneração do cargo deverá ser publicada na edição do Diário Oficial desta quarta-feira (12). O cargo será ocupado interinamente por outro militar do Exército até a definição do novo presidente.

“Me sinto muito tranquilo porque da primeira vez que eu entrei na Funai [2017-2018], eu entrei pela porta da frente e saí pela porta da frente. Desta vez estou entrando pela porta da frente e novamente saindo pela frente com muita tranquilidade”, disse.

É a segunda vez que Franklimberg deixa a presidência da Funai após pressões dos ruralistas.

A primeira queda ocorreu durante o governo de Michel Temer (2016-2018), quando Franklimberg entrou em atrito com parlamentares que pretendiam alterar processos de demarcação de terras indígenas.

A Funai hoje está sob o guarda-chuva do ministro da Justiça, Sergio Moro, que já declarou não ter interesse em manter a fundação sob seu comando.

O órgão voltou à pasta após uma queda de braço no Congresso entre indígenas e o governo Bolsonaro e a bancada ruralista, que pretendiam colocar a Funai no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos mas foram derrotados em votações no Congresso.

Desde o afastamento da presidente Dilma Rousseff, em maio de 2016, esta é a sexta vez que a presidência da Funai é alterada, resultando numa média de um presidente do órgão a cada seis meses. Na sua primeira vez, Franklimberg ficou no cargo de maio de 2017 a abril de 2018.

Procurado pela Folha por meio da assessoria do Ministério da Agricultura, Nabhan Garcia não se manifestou até a conclusão deste texto, assim como a assessoria do ministro Sergio Moro.


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Comentários

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Marcos Videira

O Brasil é governado por militares entreguistas. Quando algum militar não corresponde exatamente ao que determinam os traidores da Pátria, são demitidos.
Existem militares NACIONALISTAS nas Forças Armadas ou a ditadura de 64 eliminou todos eles ?
Como pode o Exército promover uma família ligada às milícias ao Comando das Forças Armadas ?

Edson Rodrigues Gonçalves

Pela quantidade de colaboradores do governo demitidos nestes seis meses percebe-se claramente que não existe nenhum critério nas nomeações. Será que não existe competência no processo seletivo? Estarrecedor!!!!!!!

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