Ângela Carrato: O Carnaval do Jair preso e do Fora Zema

Tempo de leitura: 5 min
Fotoa: Arquivo pessoal, @debocheria e Mídia Ninja

Por Ângela Carrato*

2024 vai ficar na história por vários motivos. Um deles diz respeito ao Carnaval.

Maior festa popular do planeta, o Carnaval brasileiro este ano acabou turbinado.

Em especial dois fatos levaram milhares de foliões ao delírio: a operação da Polícia Federal que deixou Jair Bolsonaro a um passo da prisão e o vexame enfrentado pelo governador Romeu Zema, no evento com o presidente Lula, no Minascentro, em Belo Horizonte.

Como se os fatos por si só não bastassem, eles aconteceram no mesmo dia, a quinta-feira quando oficialmente a folia foi aberta em todo o país.

Para desespero dos golpistas, a Polícia Federal amanheceu com uma enorme operação, nos principais estados, de busca e apreensão de equipamentos e documentos de 33 pessoas, agora indiscutivelmente constatado como o núcleo conspirador e ativo da tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023.

Sofreram busca e apreensão em suas residências, generais como Augusto Heleno e Braga Neto, ambos da “cozinha” da família Bolsonaro. Dois assessores do Jair foram presos e ele próprio teve 24 horas para entregar o passaporte.

O antes inelegível se tornou agora também inviajável.

Sua esposa, Michelle, comprou, às pressas, passagem para os Estados Unidos e vazou para Miami.

Sabe-se que Bolsonaro tem dito para pessoas mais chegadas que teme ser preso e, pior ainda, seu desespero maior, teme pela prisão dos filhos, principalmente do Carluxo, tido como líder do
“Gabinete do ódio”.

Tamanho medo explica muita coisa, a começar pela enigmática live que fez dias antes, na qual acenou para seus apoiadores e vestiu camisa da seleção de futebol de Israel.

Mais golpista impossível, especialmente quando se sabe das ligações do governo de Israel com a ABIN paralela dos bolsonaros.

Depois de meses de trabalho intenso, o STF, à frente o ministro Alexandre de Moraes e seus diversos colaboradores, conseguiu reunir indícios e entender o que se passou no 8 de janeiro.

Ao contrário do que sustentavam os golpistas até então, aquele ataque à sede dos Três Poderes não teve nada de espontâneo.

Tratou-se de uma ação muito bem organizada e que começou meses antes, quando Bolsonaro constatou que mesmo se valendo de todo tipo de ilegalidade, iria perder a eleição.

Graças à burrice, mas também à convicção de que ficariam impunes, os golpistas deixaram provas e rastros de todo o tipo.

A desenvoltura com que agiam legou para a posteridade vídeos de reunião no próprio Palácio do Planalto em que Bolsonaro, ministros e pessoas chegadas tratavam abertamente de como colocar fim à democracia brasileira.

Uma das surpresas nesse vídeo foi a presença do então ministro da Economia, Paulo Guedes.

Até então era sabido de sua postura ultraneoliberal. Sua presença nesta lamentável reunião indica que além de conivente com todas as ilegalidades, era também o elo com um dos braços apoiadores do golpe: o mercado financeiro nacional e internacional.

Essa e demais conexões foram muito bem delineadas por Alexandre de Moraes no longo despacho que acompanhou sua decisão e colocou a Polícia Federal nas ruas atrás dos golpistas.

Em quase 200 páginas, ele descreveu como a tentativa de golpe foi armada a partir de seis núcleos de atuação, envolvendo desde desinformação, articulação com outros setores da sociedade, articulação nas Forças Armadas e até mesmo a busca por um verniz jurídico e legitimidade para tais ações.

Vale a pena ler esse despacho do ministro Alexandre de Moraes, pois ele explica, em detalhes, toda a anatomia do golpe fracassado e mostra como ele tem raízes para além da família Bolsonaro e do próprio Jair.

Está provado, como o setor progressista e a esquerda sempre denunciaram, que o 8 de janeiro não foi um raio isolado em céu azul.

Ele foi antecedido por uma série de ações como baderna, ataques à sede da Policia Federal e incêndios em Brasília no dia da diplomação de Lula como presidente eleito.

Foi antecedido por aquele fatídico 7 de setembro, quando Jair clamou contra o STF e o Exército colocou tanques nas ruas da capital federal.

Foi antecedido pelos bem pagos acampamentos em frente aos quartéis.

Observando-se com mais atenção, as ações golpistas possuem conexões e articulações mais recuadas no tempo.

É importante assinalar, por exemplo, como a própria vitória do Jair em 2018 foi fruto de uma conspiração que envolveu grande parte da classe dominante, setores das Forças Armadas, a mídia corporativa e os interesses internacionais.

Essa turma não queria a volta de Lula ao poder e montou toda aquela jogada para prendê-lo e tirá-lo das eleições.

Antes, outra operação golpista tinha sido muito bem sucedida, partindo destes mesmos setores, retirando Dilma Rousseff do poder, sem que ela tivesse cometido qualquer crime de responsabilidade.

O peso que os golpistas deram ao núcleo da agitação e desinformação, como constatado por Alexandre de Moraes, explica, vendo-se em perspectiva, a presença “espontânea” do povo nas manifestações de 2013, onde o mais recente golpismo teve início.

Agora em março, quando o golpe civil-militar de 1964 completa seis décadas, é da maior importância que as pessoas percebam a conexão entre o momento atual e aquela época.

É importante perceberem a importância da derrota do 8 de janeiro, pois ela finalmente está desmontando um esquema que tutelou toda a chamada Nova República.

Como previu Dilma Rousseff, desta vez não ficará pedra sobre pedra.

Ao contrário das marchinhas de Carnaval, das fantasias e de blocos anunciando a prisão de Bolsonaro para as próximas 24 horas, ela não deve acontecer com tamanha rapidez.

A desinformação e as mentiras levaram muita gente a cair na lábia dos golpistas. É o caso de crentes e pessoas conservadoras de boa fé.

Será necessário, e urgente, dar início a um trabalho pedagógico para mostrar quem era a corja que tomou de assalto o poder desde o golpe contra Dilma e todos os males que fez à população e ao próprio país.

Uma coisa certamente não tem a ver com a outra, mas operação da PF às vésperas do Carnaval ajudou em muito o início deste trabalho e à própria politização do Carnaval.

Do Oiapoque ao Chuí vão cair na folia pessoas, blocos e escolas de samba ridicularizando essa turma das trevas que tanto infelicitou e atrasou o Brasil.

Quanto ao governador de Minas, Romeu Zema, o Carnaval que ele tentou puxar para si e faturar em cima, azedou nesta mesma quinta-feira.

Eleito e reeleito nas águas pantanosas do bolsonarismo, ele tem feito de tudo para evitar a presença de Lula em Minas ou mesmo um encontro entre eles.

Pois não é que Lula veio a Belo Horizonte na quinta-feira, participou de em encontro gigante com políticos, empresários e populares num dos maiores espaços da capital mineira e, de quebra, Zema se viu obrigado a comparecer!

Para piorar ainda mais o início do Carnaval do Zema, enquanto Lula era entusiasticamente aplaudido, ele era vaiado com igual intensidade.

Do lado de fora do Minascentro, onde o evento aconteceu, não faltaram carros e caixas de som portáteis com a marchina do “Fora Zema”, desde já um dos hits do Carnaval mineiro.

Se depender de Momo e dos foliões, toda a turma golpista acaba na cadeia na quarta-feira de cinzas.

Tomara que as investigações continuem se aprofundando e o cerco se feche. E as prisões, porque deverão ser muitas, aconteçam para valer.

2024 tem tudo para ser o ano que entrará para a história não apenas por um Carnaval super politizado, mas por aquele em que finalmente os golpistas foram ver o sol nascer quadrado.

*Ângela Carrato é jornalista e professora do Departamento de Comunicação Social da UFMG

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Comentários

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Zé Maria

https://pbs.twimg.com/media/GFwc0vpXcAA7Wed?format=jpg
O Energúmeno de Minas toma Vacina.
As Crianças Mineiras não precisam…
https://twitter.com/liamabat/status/1755309757408104737

Zé Maria

https://twitter.com/i/status/1754655828051677646

“Deputado Nikolas Chupetinha, Senador Cleitinho,
ambos Parlamentares Bolsonaristas, e o Governador
Romeu Zema (Novo/MG), foram denunciados ao
Ministério Público de Minas Gerais, por publicar
vídeo desincentivando a vacinação infantil.”

Zé Maria

https://twitter.com/i/status/1755585576391082022

“Vacina Sim!” e “Fora Zema!”

Governador de Minas é Vaiado em Ato com Lula em BH

https://pbs.twimg.com/media/GGAWj42W4AAQjIt?format=jpg
https://twitter.com/RevistaForum/status/1755585576391082022

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