Kátia Gerab Baggio: PSDB converteu-se na nova UDN

Tempo de leitura: 4 min

A avaliação de seus mandatos captada em pesquisas explica o motivo de Alckmin e Serra não terem defendido o seu legado. O que fará Aécio Neves?

“O PSDB, quem diria, transformou-se em uma nova UDN, um partido golpista”

por Kátia Gerab Baggio

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em artigo intitulado “Chegou a hora” [sic!], publicado no último domingo, escreveu o seguinte: “[…] ou há uma regeneração ‘por dentro’, Governo e partidos reagem e alteram o que se sabe que deve ser alterado nas leis eleitorais e partidárias, ou a mudança virá ‘de fora’. No passado, seriam golpes militares. Não é o caso, não é desejável nem se vêm sinais. Resta, portanto, a Justiça. Que ela leve adiante a purga; que não se ponham obstáculos insuperáveis ao juiz, aos procuradores, delegados ou à mídia. Que tenham a ousadia de chegar até aos mais altos hierarcas, desde que efetivamente culpados.”

Além de golpista, o artigo é insultuoso: chama Lula de “mandão” e Dilma de “mandona”. FHC, de fato, propõe um golpe “branco”, feito pela Justiça. Evidentemente, com o apoio da mídia direitista e do Congresso, agora com Eduardo Cunha na Presidência da Câmara.

Este artigo é simplesmente indigno de um ex-presidente da República que se diz defensor da democracia.

Mas não é só FHC que tem insistido no discurso golpista. Outros líderes do PSDB vêm, há tempos, reiterando o mesmo.

Alberto Goldman (vice-presidente do partido), no dia 21 de janeiro, afirmou: “Se houver motivos para denunciá-la (a presidente) como tendo cometido crime de responsabilidade e se o quadro político e econômico continuar a se deteriorar, pode ser a saída democrática necessária. Talvez a única.”

Saída democrática? Não, saída golpista.

Goldman fez menção ao “impeachment” de Collor, para rejeitar a acusação de golpismo. Mas o PT não é o PRN, Dilma não é Collor, e o Brasil de 2015 não é o mesmo de 1992. Collor havia perdido, praticamente por completo, o apoio da população brasileira. Apesar de descontentamentos com os governos liderados pelo PT, principalmente em relação aos problemas econômicos e às medidas de ajuste fiscal, a maioria da população brasileira reelegeu Dilma há pouco mais de três meses. E o fez conscientemente sobre o que queria e o que não queria. Ao contrário do que já afirmou FHC, as pessoas não votaram em Dilma desinformadas. Os eleitores que votaram em Dilma reconheceram a importância das políticas sociais e educacionais implementadas durante os governos liderados pelo PT e não queriam a volta do PSDB ao poder!

Além de FHC e Goldman, outros líderes do PSDB têm, como se sabe, feito declarações em que buscam desgastar e desautorizar Dilma, além de criar um clima de apoio a um possível impedimento da presidenta.

Aloysio Nunes chegou a falar em “crime de responsabilidade fiscal” e “impeachment” — antes da aprovação, pelo Congresso, do projeto que alterou a meta de superávit primário — e Aécio teve o impressionante desplante de declarar (já que sabe ser blindado pela “grande” mídia) o seguinte: “Eu não perdi a eleição para um partido político. Eu perdi a eleição para uma organização criminosa”.

Ou seja, não são declarações intempestivas, mas uma estratégia orquestrada entre os líderes do PSDB e a “grande” mídia para criminalizar o PT e o governo Dilma. E isso vem acontecendo há anos. Estratégia essa que é inequivocamente golpista.

Na Folha de S. Paulo, o tributarista Ives Gandra Martins publicou um “parecer sobre a possibilidade de abertura de processo de impeachment presidencial” e concluiu o seguinte: “À luz desse raciocínio, exclusivamente jurídico, terminei o parecer afirmando haver, independentemente das apurações dos desvios que estão sendo realizadas pela Polícia Federal e pelo Ministério Público (hipótese de dolo), fundamentação jurídica para o pedido de impeachment (hipótese de culpa)”.

Sabemos muitíssimo bem quem é Ives Gandra: um jurista que foi sempre afinado com a direita liberal-conservadora. E ele acrescenta: “Não deixei, todavia, de esclarecer que o julgamento do impeachment pelo Congresso é mais político que jurídico”. Deveria, para ser honesto, ter reconhecido que seu parecer é político e não “exclusivamente jurídico”!

Na linha sucessória de Dilma estão, como sabemos, o vice-presidente Michel Temer e o presidente recém-eleito da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, ambos do PMDB. Lembrando que a Constituição prevê o seguinte: “Art. 81. Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga”.

O PSDB, em conluio com a mídia liberal-conservadora — assim como ocorreu nos anos 50 e 60, décadas em que a UDN usou de métodos semelhantes, junto com a imprensa, para desestabilizar os governos de Getúlio, Juscelino e Jango —, busca, desde o primeiro mandato de Lula, derrubar o PT do Poder Executivo, sem sucesso. O discurso hipócrita dos peessedebistas é o mesmo utilizado pelos udenistas há mais de 50 anos: “corrupção”, mar de lama”, “incompetência”, “irresponsabilidade”, “aparelhamento do Estado” etc. etc.

Os líderes do PSDB estão desempenhando, hoje, um papel vergonhoso. Políticos que se opuseram à ditadura militar transformaram-se — por não aceitarem a derrota nas últimas quatro eleições presidenciais — em golpistas. Não enxergo outro nome para isso.

Entretanto, não acredito, a princípio, que a estratégia do “impeachment” tenha sucesso. Mas, a depender dos desdobramentos da Operação Lava-Jato, julgo necessário que os milhões de eleitores de Dilma fiquem atentos.

Por mais que muitos militantes e simpatizantes do PT — diria mesmo que a maioria — estejam descontentes e decepcionados com várias das indicações para o Ministério, as medidas de ajuste fiscal, a estratégia política do partido (ou a falta dela), as falhas imperdoáveis na comunicação do governo (que, com frequência, não reage a acusações infundadas e insultos), creio que, para defender a democracia, pela qual tantos lutaram, para fazer valer o voto da maioria dos eleitores, e reagir ao golpismo da direita político-midiática, irão às ruas, se preciso for, para defender o governo Dilma.

Se a oposição e a mídia antipetista pensam que — com os desdobramentos da Operação Lava-Jato e Cunha na presidência da Câmara — será fácil derrubar Dilma, estão muito enganadas.

Eu, pelo menos, não tenho dúvidas. Se preciso for, estarei nas ruas contra o golpismo e pela democracia.

Kátia Gerab Baggio é  professora de História das Américas na UFMG

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Comentários

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Arnaldo Costa

DEMOTUCANOS
Ex-UDN, ex-PDS, ex-PFL e aliados,atual demotucanos, corja de picaretas retrógrados corruptos que usam da politicagem para se enriquecerem e favorecerem um pequeno grupo de comparsas. Cansamos de ser enganados!

Vicente Jr.

E, por favor, leiam o artigo de FHC.

“Nada se consertará sem uma profunda revisão do sistema político e, mais especificamente, do sistema partidário e eleitoral. Com uma base fragmentada e alimentando os que o sustentam com partes do Orçamento, o governo atual não tem condições para liderar tal mudança. E ninguém em sã consciência acredita no sistema prevalecente. Daí minha insistência: ou há uma regeneração “por dentro”, governo e partidos reagem e alteram o que se sabe que deve ser alterado nas leis eleitorais e partidárias, ou a mudança virá “de fora”. No passado, seriam golpes militares. Não é o caso, não é desejável nem se veem sinais.”

Isso, por acaso, soa como golpismo?

Vicente Jr.

Mas você quer que o PSDB faça o quê, diante de tamanha incompetência, corrupção e desfaçatez pós-eleitoral? O trabalho do Legislativo é o de fiscalizar o governo, e o da oposição, em particular, é a de desgastá-lo. Se o governo perde o apoio político e social, problema dele.

Maria

No PSDB não há corrptos porque pasteurizam-se.Pela lei, pela midia e pelo judiciário.

FrancoAtirador

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O PSDB é uma das Cabeças da Hidra de Lerna.
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M. Alessandro

Professora Kátia Gerab Baggio, parabéns pela lucidez de suas palavras e Pela lucidez do fatos históricos!

Hélio Filho

Está cada dia mais difícil defender a Presidenta. Ela mesma não tem feito isso. Para o povo ir às ruas defende-la, primeiro ela tem que mudar de postura. Sua comunicação é falha e ineficiente. Além disso, o governo esta de joelhos diante dos canalhas de sempre. Chega dessa tal governabilidade. Já passou da hora de encarar a inevitável ruptura com esse sistema nefasto. Se o governo não assumir a liderança desse processo, vai perder o bonde da história e cair junto. Precisamos, urgentemente, de um líder.

Carlos

Apenas num país com uma classe média analfabeta politicamente e manipulada por uma imprensa corrupta tipos como este ex-presidente e seu partido são levados a sério.

Edgar rocha

Embora a conjuntura nos EUA seja outra, Obama soube o que fazer diante de uma oposição cada vez mais fortalecida e cada vez mais disposta a arrancar o couro do presidente. Ao se ver acuado por derrotas no parlamento, por uma opinião pública descontente com a inoperância de um governo amarrado, “o cara” dos EUA chutou o pau da barraca. Posicionou-se fielmente a favor das demandas sociais, agiu com boa vontade diante de seu eleitorado e jogou a batata quente das ações impopulares no colo do parlamento. Garantiu assim, a possibilidade de fazer um sucessor e sair do governo com a imagem inabalada de alguém disposto a implementar políticas sociais eternamente adiadas pelos conservadores.
Aqui, até o momento, continua-se apostando em “ajustes”, concessões ao fisiologismo, cooptação com o “diferente” e, com isso, fortalecendo as forças dispostas a arrancar a presidente de sua cadeira. Enquanto isso, o eleitorado chupa o dedo e tem de ouvir de petistas que reformas exigem sacrifícios. Sacrifícios de quem? Das reformas, ora bolas!
Tanto acirramento ideológico às vezes impede de enxergar a sabedoria de quem está do outro lado. Obama não é santo mas, internamente, fez o que deveria ser feito. E só ganhou com isso. E a gente fica aqui, sentado em pencas de bananas republicanas, esperando a Dilma cair de madura.

Reinaldo José Mercador Dantas

Pobre fhc que restou de você??????????????

Maria Lucia Gonçalves

tenho certeza que a hora que o povo perceber que o Psdb, ” grande midia” poder judiciário, PF e outros, estou tramando para derrubar nossa presidenta Democraticamente reeleita , irão pras ruas defende-la . VIVA A DEMOCRACIA

    Jader

    Do mesmo jeito que defendeu o Collor?

Luiz Moreira

O PSDB sempre foi partido de canalhas. Quem, junto com o DEM, não é canalha? Quem pagou propina descarada para implantar sua reeleição? Quem, além do AÉCIO, dirige bêbado e esculhamba o guarda? E nega fazer teste de bafômetro. Se isto é coisa de GENTE, eu não entendo mais nada. Realmente, os políticos são uma corja de canalhas, se este é o comportamento PADRÃO. Merecem enformamento.

Leonardo

” Ao contrário do que já afirmou FHC, as pessoas não votaram em Dilma desinformadas. ”

É claro que quem votou no PT votou desinformado. A Dilme mentiu escrachadamente durante toda a campanha, se comparada as suas atitudes nos primeiros meses de mandato!!!

Desonrou o voto da maioria

    Maria Lucia Gonçalves

    Não vivemos num pais socialista meu querido , em algum momento tem que ter ajustes senão não fecha a conta , o povo tem que saber que para fazer as reformas necessários sacrifícios sempre tem , claro que torcemos para a corda não arrebentar do lado mais fraco . Agora o ideal seria se ela tomasse a iniciativa de taxar as grandes fortunas , que enquadrassem os grandes sonegadores com a Rede Globo e etc . Porem em algum momento tem que haver reajuste , afinal pra manter tudo funcionando tem ter recursos.

    Jader

    Sim, realmente. Mas por que a candidata Dilma não falou isso abertamente durante a campanha?
    Ao contrário, disse várias vezes que não o faria e que essa era a agenda da oposição. Se você já sabia que isso iria acontecer, tudo bem. Mas milhões de pessoas votaram nela acreditando que não. Votaram desinformados, SIM!

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