Paulo Nogueira: Controle remoto da Globo influencia a Justiça

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No Innovare, Ayres Britto continua ministro: só que, agora, é ministro da Globo sem intermediários. Em parceria com o governo federal (logo abaixo os parceiros do Innovare).

“Fico muito grato pela oportunidade de participar e apoiar o Instituto Innovare. As instituições evoluem através dos bons exemplos, da melhoria continua de suas práticas e da busca de um melhor padrão de qualidade. Não por acaso, esse é o mesmo princípio que adotamos na Globo. Uma sociedade com uma Justiça de melhor qualidade é uma sociedade mais digna e mais feliz.”

Roberto Irineu Marinho

“O sonho de justiça ainda é um grande anseio da humanidade. O Prêmio Innovare revela que uma das grandes capacidades humanas é realizar os sonhos do povo.”

Luiz Fux

“O Prêmio Innovare, uma das mais bem conceituadas premiações da justiça brasileira, abrirá, no dia 10 de março, as inscrições para sua 11ª edição. Este ano, o tema para concorrer nas categorias Juiz, Tribunal, Ministério Público, Defensoria Pública e Advocacia será livre. Na categoria Prêmio Especial, o Innovare dará novamente oportunidade a profissionais graduados de qualquer área do conhecimento. Para concorrer, os interessados deverão encaminhar ao Instituto Innovare iniciativas que já estejam em prática. O tema nesta categoria será “Sistema Penitenciário Justo e Eficaz”. A data e o tema foram apresentados pela diretoria do Innovare aos membros do Conselho Superior do Instituto, em uma reunião na última terça-feira (18/02) no Rio de Janeiro. Participaram do encontro os membros da diretoria do Prêmio, Sérgio Renault, Pedro Freitas, Antonio Claudio Ferreira Netto, Carlos Araújo e a coordenadora Raquel Khichfy, além do presidente do Conselho, ministro Ayres Britto, de representantes das associações parceiras, como AMB, Conamp, Anadep, Ajufe, Conselho Federal da OAB, ANPR, Anamatra e o presidente das Organizações Globo, Dr. Roberto Irineu Marinho”.

Do site do Instituto 

O controle remoto pelo qual a Globo comanda o Brasil

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do Diário do Centro do Mundo, com adendo do Conversa Afiada

Roberto Marinho foi um gênio, há que reconhecer.

Mas um gênio do mal.

Sua maior obra foi montar um esquema inviolável de manipulação dos poderes no Brasil.

As emissoras afiliadas, entregues a políticos amigos, como Sarney e ACM, garantiram que no Congresso a Globo jamais seria questionada seriamente.

Já sem ele, a obra de controle foi estendida à Justiça pelo Instituto Innovare, do qual falei aqui outro dia.

Na fachada, o Innovare premia anualmente práticas inovadoras no judiciário em cerimônias às quais comparecem os juízes mais poderosos do país, notadamente os do Supremo.

A aproximação, neste processo, dos Marinhos com os juízes  é uma aberração do ponto de vista ético e uma agressão ao interesse público, dados os interesses econômicos da Globo.

Contar com juízes amigos é bom para a Globo e ruim para a sociedade.

Um dia Gilmar Mendes, por exemplo, terá que explicar por que concedeu habeas corpus a uma funcionária da Receita flagrada tentando fazer desaparecer os documentos da célebre sonegação – trapaça é a melhor palavra – da Globo na Copa de 2002.

Uma passagem anedótica do Innovare junta Roberto Irineu Marinho, presidente da Globo, e o juiz Cesar Asfor Rocha. Uma foto registra um abraço cordial entre ambos numa premiação. Rocha  presidia o STJ e era cotado para uma vaga no STF, na gestão Lula. Acontece que chegou a Lula uma história segundo a qual Rocha pegara uma propina para favorecer uma empresa  num julgamento.

O mais curioso é que Rocha acabou votando contra quem lhe deu “uma mala de dinheiro”, segundo gente próxima de Lula. Investigado ele não foi —  nem pela Globo, nem pela Polícia Federal, nem por ninguém. Mas, se manteve a alegada bolsa, perdeu a indicação. Rocha, sem problema nenhum com a Justiça depois da denúncia, acabaria decidindo voltar depois para a advocacia.

A melhor prática para a Justiça é absoluta distância da plutocracia para que possa decidir causas com isenção e honestidade. (Investigar juízes acusados de pegar uma mala de dinheiro também vai bem.)

O Innovare é a negação disso.

Que políticos frequentem barões da mídia é lamentável, mas comum mesmo em democracias avançadas como a Inglaterra.

Nos últimos 30 anos, na Inglaterra, Rupert Murdoch – o Roberto Marinho da mídia britânica — foi procurado e bajulado por líderes conservadores e trabalhistas, indistintamente. (Um deles, Tony Blair, acabou estendendo a proximidade para a jovem mulher chinesa de Murdoch, com a qual teve um caso que levaria ao divórcio de Murdoch.)

Mas se juízes frequentassem Murdoch uma fronteira seria transposta. Jamais aconteceu. O juiz Brian Leveson não poderia conduzir as discussões sobre novas regras para a mídia inglesa se privasse com Murdoch.

Isto é óbvio, mas o poder prolongado da Globo a deixou de guarda baixa quando se trata de preservar a própria reputação.

O Innovare é um escândalo em si. E uma inutilidade monumental em seu propósito de fachada: melhorar a Justiça brasileira.

São dez anos de atividade. Quem poderá dizer que a justiça brasileira melhorou alguma coisa com o Innovare?

A Globo tem nas mãos como que um controle remoto com o qual comanda as coisas que lhe são essenciais no Brasil.

Vale a pena ver este vídeo em que, no Senado, Roberto Requião mostra a busca frustrante que fez por informações a respeito da sonegação da Globo. A certa altura, ele pergunta se a Globo comanda o Senado, tais e tantas as dificuldades que encontrou. Requião fez uma pergunta retórica, porque ele sabe a resposta muito bem.

No futebol, um negócio de alguns bilhões por ano, a Globo teleguiou durante décadas os homens fortes da CBF, Havelange primeiro e depois Ricardo Teixeira.

‘Teleguiar” significou dar propinas, ou eufemisticamente, “comissões”. O Estadão mergulhou num caso que está na justiça suíça, relativo à Fifa. E escreveu numa reportagem: “Havelange recebeu propinas de uma empresa para garantir o contrato de transmissão do Mundial de 2002 para o mercado brasileiro.”

Quem transmitiu? E que jornal ou revista investigou o caso? A Veja não se gabava tanto de seu poder investigativo? Ou só vale para seus inimigos?

A mesma lógica de ocupação manipuladora a Globo promoveu em sua fonte de receita – a publicidade.

Nos últimos dez anos, a Globo perdeu um terço da audiência, em parte pela ruindade de sua programação, em parte pelo avanço da internet.

Mesmo assim, sua receita publicitária não parou de subir. Há uma aberração no Brasil: com 20% do bolo de audiência, medido pelo Ibope, a Globo tem 60% do dinheiro arrecadado com publicidade.

Ganhar mais publicidade com menos público é façanha para poucos.

O milagre, ou truque, se chama Bônus Por Volume, o infame BV. Basicamente, quanto mais uma agência veícula na Globo, mais recebe.

Meu amigo Jairo Leal, antigo presidente da Abril, me disse que muitas agências simplesmente quebrariam se não fosse o dinheiro do BV.

É claro que uma hora o anunciante vai se incomodar com o dinheiro excessivo posto numa emissora que perde, perde e ainda perde espectadores.

Mas até lá você – em boa parte graças ao BV – vai ver os Marinhos no topo dos bilionários do Brasil.

Leia também:

Requião: A manobra do Senado para proteger a Globo

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